imagens do final da década de 1960
No final de 2006 o historiador Moisés Silva Fernandes apresentou publicamente mais um livro sobre a história recente de Macau. Denominado “Macau na Política Externa Chinesa, 1949-1979”, traça um perfil das relações entre Portugal e a China nesse período, numa altura em que não existiam laços diplomáticos formais entre os dois Estados - Macau era o intermediário.
No período que analisa no seu livro, o “12,3” é o momento mais marcante das relações entre Portugal e a China via Macau?Houve vários momentos que foram muito importantes. Em 1952, durante o embargo norte-americano à China, os EUA pressionaram Portugal para que evitasse a violação do embargo ocidental. Em 1955, deu-se outro tipo de incidente, relacionado com a celebração do quarto centenário de presença portuguesa em Macau. Aí, as coisas complicaram-se muito, porque a China não queria que se fizessem as comemorações. Portugal recuou. O “12,3” é importante, porque, apesar de terem sido momentos muito difíceis, o facto é que a China tomou três medidas fundamentais para restabelecer o poder português.
Essa é a sua ideia forte neste livro?
É. A China interveio militarmente, com um anel de segurança à volta de Macau, montado pelo Exército Popular de Libertação e pela marinha de guerra. Os militares tiveram mesmo que matar guardas vermelhos rebeldes que queriam entrar em Macau. Depois, Pequim criou condições para a negociação dos dois acordos que foram celebrados a dia 29 de Janeiro de 1967 [que deram por terminados os acontecimentos do “12,3”]. A China voltou a intervir em Agosto de 1968, basicamente afirmando que Portugal era responsável pela administração de Macau. Foi a legitimação e reabilitação da administração portuguesa.
Na perspectiva chinesa, qual era a importância de Macau nesse período?Macau, tal como Hong Kong, era extremamente importante. Eram os dois enclaves estrangeiros pelos quais a RPC sobrevivia face ao isolamento internacional. Estava altamente isolada e dependia dos recursos que eram gerados em Hong Kong e Macau, como é o exemplo do ouro ou das remessas dos emigrantes chineses, enviadas através do sistema bancário paralelo que existia em Macau. Para se ter uma ideia, na altura havia 340 casas de câmbio no território.
E qual era a importância de Macau para Portugal?Depois de Goa, Lisboa não queria perder mais peças do império. O interesse de Portugal em Macau era fundamentalmente político: manter a integridade do mítico império e transmitir essa ideia à população portuguesa. Os acontecimentos de Goa tinham abalado esse imaginário, demonstrando um país algo frágil.
Nessa altura, Portugal era um governo de facto em Macau ou apenas um governo “de júris”?Portugal era uma administração de facto, só que o poder era exercido de uma forma partilhada com outros actores. A administração portuguesa exercia determinadas prorrogativas, mas tinha que consultar várias pessoas em Macau, que depois tinham acesso às instâncias políticas na China, o que facilitava a gestão e governação do território. Era uma teia muito complexa.
Perante esta complexidade, Macau foi uma colónia ou um terreno sob a administração portuguesa?No período pós-Segunda Guerra Mundial, não acredito que Macau fosse uma colónia. Era outra coisa, talvez mais ambígua. Uma colónia não, porque a Associação Comercial de Macau tinha poder, negociava com a administração portuguesa, que co-optava a organização para fazer intermediação com a China e vice-versa.
Após a Revolução dos Cravos, em 1974, há a subida de Deng Xiaoping, um punhado de anos depois. Esses momentos são fulcrais para a mudança de relacionamento entre Portugal e a China?Houve uma permanência dos actores que localmente faziam a intermediação entre ambas as partes. Obviamente que, com o estabelecimento de relações diplomáticas entre os dois países, alterou-se um pouco o seu peso. Portugal e China já negociavam directamente. Portanto, decresce a importância da elite chinesa que antigamente tinha um papel fulcral.
Essa melhoria de relações acaba por levar ao memorando secreto de 1979, que está na base da transição de administração...Exacto. Posteriormente, a China vai invocá-lo formalmente para dar inicio às negociações sobre a declaração conjunta.
No período que analisa no seu livro, o “12,3” é o momento mais marcante das relações entre Portugal e a China via Macau?Houve vários momentos que foram muito importantes. Em 1952, durante o embargo norte-americano à China, os EUA pressionaram Portugal para que evitasse a violação do embargo ocidental. Em 1955, deu-se outro tipo de incidente, relacionado com a celebração do quarto centenário de presença portuguesa em Macau. Aí, as coisas complicaram-se muito, porque a China não queria que se fizessem as comemorações. Portugal recuou. O “12,3” é importante, porque, apesar de terem sido momentos muito difíceis, o facto é que a China tomou três medidas fundamentais para restabelecer o poder português.
Essa é a sua ideia forte neste livro?
É. A China interveio militarmente, com um anel de segurança à volta de Macau, montado pelo Exército Popular de Libertação e pela marinha de guerra. Os militares tiveram mesmo que matar guardas vermelhos rebeldes que queriam entrar em Macau. Depois, Pequim criou condições para a negociação dos dois acordos que foram celebrados a dia 29 de Janeiro de 1967 [que deram por terminados os acontecimentos do “12,3”]. A China voltou a intervir em Agosto de 1968, basicamente afirmando que Portugal era responsável pela administração de Macau. Foi a legitimação e reabilitação da administração portuguesa.
Na perspectiva chinesa, qual era a importância de Macau nesse período?Macau, tal como Hong Kong, era extremamente importante. Eram os dois enclaves estrangeiros pelos quais a RPC sobrevivia face ao isolamento internacional. Estava altamente isolada e dependia dos recursos que eram gerados em Hong Kong e Macau, como é o exemplo do ouro ou das remessas dos emigrantes chineses, enviadas através do sistema bancário paralelo que existia em Macau. Para se ter uma ideia, na altura havia 340 casas de câmbio no território.
E qual era a importância de Macau para Portugal?Depois de Goa, Lisboa não queria perder mais peças do império. O interesse de Portugal em Macau era fundamentalmente político: manter a integridade do mítico império e transmitir essa ideia à população portuguesa. Os acontecimentos de Goa tinham abalado esse imaginário, demonstrando um país algo frágil.
Nessa altura, Portugal era um governo de facto em Macau ou apenas um governo “de júris”?Portugal era uma administração de facto, só que o poder era exercido de uma forma partilhada com outros actores. A administração portuguesa exercia determinadas prorrogativas, mas tinha que consultar várias pessoas em Macau, que depois tinham acesso às instâncias políticas na China, o que facilitava a gestão e governação do território. Era uma teia muito complexa.
Perante esta complexidade, Macau foi uma colónia ou um terreno sob a administração portuguesa?No período pós-Segunda Guerra Mundial, não acredito que Macau fosse uma colónia. Era outra coisa, talvez mais ambígua. Uma colónia não, porque a Associação Comercial de Macau tinha poder, negociava com a administração portuguesa, que co-optava a organização para fazer intermediação com a China e vice-versa.
Após a Revolução dos Cravos, em 1974, há a subida de Deng Xiaoping, um punhado de anos depois. Esses momentos são fulcrais para a mudança de relacionamento entre Portugal e a China?Houve uma permanência dos actores que localmente faziam a intermediação entre ambas as partes. Obviamente que, com o estabelecimento de relações diplomáticas entre os dois países, alterou-se um pouco o seu peso. Portugal e China já negociavam directamente. Portanto, decresce a importância da elite chinesa que antigamente tinha um papel fulcral.
Essa melhoria de relações acaba por levar ao memorando secreto de 1979, que está na base da transição de administração...Exacto. Posteriormente, a China vai invocá-lo formalmente para dar inicio às negociações sobre a declaração conjunta.
A entrevista é assinada por Emanuel Graça in Tribuna de Macau, Ano V — Nº 2312, Quarta-Feira, 13 de Dezembro de 2006
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