quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Bilhetes Hydrofoil: década 1960



1964
1968
1966
 1964
Penha

“Da Cidade Antiga à Arquitectura Recente”: 2ª parte

(continuação)
Agora, descendo pela Calçada do Tronco Velho, é no Largo do Leal Senado que desembocamos; ou, voltando à Rua Central, e atravessando o ‘corte’ moderno introduzido pela Rua-Avenida Almeida Ribeiro, atingiremos a Sé (a mais descaracterizada de todas as igrejas macaenses). Continuando por aqui, chegaremos ao ponto extremo nascente da baía (com a antiga linha de costa), onde se implantam os ‘restos’ da instalação franciscana que, como é da praxe, está o mais afastada possível dos Jesuítas e do bulício urbano (hoje rodeada por um gracioso jardim – e vem à memória idêntico destino, do edifício franciscano no Funchal) (…).
O Largo do Leal Senado é, talvez, actualmente o espaço urbano com mais carácter e vivência, de entre todos os pertencentes à ‘cidade velha’. Tradicionalmente constituía o pólo civil e administrativo da urbe, por oposição à zona atrás referida (São Lourenço/Colégio/Agostinhos) e à que se lhe segue, no percurso que escolhemos (São Domingos e São Paulo), ambas com eminente sentido religioso.
A Misericórdia e a Câmara, até 1999 designada por ‘Leal Senado’, actual ‘Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais’, são os seus dois elementos arquitectónicos principais, que dão o sentido funcional à praça, situada além disso no âmago da estrutura linear que descrevemos, o que aumenta ainda mais o seu significado. Os edifícios de acompanhamento, com características arcadas em três pisos, pintados em cores vivas, evocam indiscutivelmente o prédio do município de Margão, no território goês: essa analogia não será possivelmente obra do acaso, mas sim das relações entre Obras Públicas, serviço do Estado português, e seus autores, no quadro dos contactos Goa – Macau na transição do século XIX para o XX.
Outra força deste largo provém de ter sido ‘rasgado’ pela nova avenida rectilínea e modernizante que foi a Almeida Ribeiro, e que o transformou num espaço aberto, de ligação entre o porto interior e os novos aterros da Praia Grande. (…) há que concluir o périplo iniciado; e regressando ao Leal Senado, já se vislumbra ao fundo a silhueta da Igreja de São Domingos, que abre para a rua do mesmo nome (outro núcleo comercial fervilhante) e para a Rua de São Paulo, que leva às famosas ruínas. (…)
A seca escadaria que leva às ruínas, desinteressante e cheia de ‘hóóós!’ de turistas japoneses, era dantes ladeada por casinhas, com esquinas e beirais, como as gravuras oitocentistas de Chinnery deixam entrever; (…) Desenhos antigos reconstituem também as bolbosas torres que se erguiam para trás da portentosa fachada de dragões e caravelas (fruto de uma mistura artífice nipo-portuguesa que as idas quinhentistas ao país do Sol Nascente propiciaram), a qual é ainda hoje imagem longínqua que torna reconhecível o centro da cidade, para quem vem pelo mar…”

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

“Da Cidade Antiga à Arquitectura Recente”: 1ª parte

Excertos de “Macau – Da Cidade Antiga à Arquitectura Recente”, artigo publicado na revista “Arquitectura Portuguesa”, Lisboa, 1987-88. Da autoria de José Manuel Fernandes, catedrático de História da Arquitectura e do Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa
“Macau possui no seu tecido urbano, ainda hoje bem visível uma estrutura urbana provecta, de origem quinhentista, tão consolidada como preciosa, que traduz bem este tipo de malha urbana, que referimos e que se procurou caracterizar como o da ‘Cidade de Matriz Portuguesa da Expansão Marítima’, ou o ‘Modelo da Cidade Lusa no Mundo’ – malha orgânica, regrada, estruturante e orientadora, mas de feição adaptativa e irregular, que, implantada em Macau, é de tipo análogo à que no Recife se procurou reerguer após os meados de Seiscentos. Essa estrutura constitui como que um longo ‘cordão’, disposto no sentido sudoeste-nordeste, articulando as duas colinas principais e fortificadas (a da Barra–Penha à do Monte), enquadrada por elas, e tendo de permeio a curvilínea baía da Praia Grande, as silhuetas dos dois Nam Van Lakes souberam reinventar e visualmente preservar).”
“Descendo, sentimos que a norte as ruas vão ‘escorregando’ para esse lado chinês (é a Rua do Quebra-Costas, por exemplo, que lá nos pode levar), enquanto para sul são o colonial Hotel Bela Vista, actual consulado português, e a romanticamente arborizada Avenida da Praia Grande que nos atraem a atenção. Decidimo-nos pelo meio, seguindo esse cordão umbilical que, entre vários nomes, denuncia o jeito que tem para ser rua direita, e desembocamos no Largo de Li-Lau, encantadora mistura de árvores, pórticos de arruinadas casas chinesas e pequenos almoços de chá e torradas ao ar livre e refrescante da manhã. Caminhando pela Rua Padre António, chega-se ao quarteirão formado pela Igreja de São Lourenço, onde uma primeira bifurcação importante nos fará optar ou pela Rua da Alfândega (resíduo toponímico da antiga área de desembarque e inspecção das mercadorias, quando a linha de costa ali chegava?), ou pela rua que, passando a Imprensa Nacional, derivava por sua vez para São Domingos e para a Sé…
Entre as ruas de Inácio Baptista e de S. José, em frente à entrada para a igreja do Seminário, uma velha casa de dois pisos (…) – hoje provavelmente demolida – evoca claramente o solar urbano de raiz portuguesa – com o pormenor precioso dos vãos superiores possuírem ainda as lâminas feitas de conchas marinhas (que na Índia se chamam ‘karepas’, substâncias translúcidas que substituem o vidro nos caixilhos – e atestam a provável influência da arquitectura goesa nesta minúscula península) (…) o grandioso – embora desfigurado – conjunto arquitectónico do velho Colégio Jesuíta, cujo espaço conventual (…) integra igreja, zonas escolares, jardins e claustros (…) é ainda o maior conjunto de arquitectura religiosa existente em Macau, cuja centralidade e extensão em relação à malha urbana da cidade antiga atesta a importância tida noutros tempos.
Pelas ruelas à nossa direita vão-se adivinhando as árvores da Avenida da Praia Grande, quando de repente iniciamos a subida da Calçada do Teatro (um romântico edifício que titula, bem a propósito, ‘de D. Pedro V’ e chegamos à Igreja de Santo Agostinho. A maior parte dos templos cristãos de Macau são como este: impecavelmente limpo, pintado e cuidado, se por um lado atesta na fachada os vestígios da sua fundação quinhentista ou seiscentista, por outro foi amplamente remodelado com gostos ecléticos (e com uma originalidade aparentemente muito ‘oriental’) desde Setecentos…

Agora, descendo pela Calçada do Tronco Velho, é no Largo do Leal Senado que desembocamos; ou, voltando à Rua Central, e atravessando o ‘corte’ moderno introduzido pela Rua-Avenida Almeida Ribeiro, atingiremos a Sé (a mais descaracterizada de todas as igrejas macaenses). Continuando por aqui, chegaremos ao ponto extremo nascente da baía (com a antiga linha de costa), onde se implantam os ‘restos’ da instalação franciscana que, como é da praxe, está o mais afastada possível dos Jesuítas e do bulício urbano (hoje rodeada por um gracioso jardim – e vem à memória idêntico destino, do edifício franciscano no Funchal) (…).
O Largo do Leal Senado é, talvez, actualmente o espaço urbano com mais carácter e vivência, de entre todos os pertencentes à ‘cidade velha’. Tradicionalmente constituía o pólo civil e administrativo da urbe, por oposição à zona atrás referida (São Lourenço/Colégio/Agostinhos) e à que se lhe segue, no percurso que escolhemos (São Domingos e São Paulo), ambas com eminente sentido religioso.
A Misericórdia e a Câmara, até 1999 designada por ‘Leal Senado’, actual ‘Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais’, são os seus dois elementos arquitectónicos principais, que dão o sentido funcional à praça, situada além disso no âmago da estrutura linear que descrevemos, o que aumenta ainda mais o seu significado. Os edifícios de acompanhamento, com características arcadas em três pisos, pintados em cores vivas, evocam indiscutivelmente o prédio do município de Margão, no território goês: essa analogia não será possivelmente obra do acaso, mas sim das relações entre Obras Públicas, serviço do Estado português, e seus autores, no quadro dos contactos Goa – Macau na transição do século XIX para o XX.
Outra força deste largo provém de ter sido ‘rasgado’ pela nova avenida rectilínea e modernizante que foi a Almeida Ribeiro, e que o transformou num espaço aberto, de ligação entre o porto interior e os novos aterros da Praia Grande. (…) há que concluir o périplo iniciado; e regressando ao Leal Senado, já se vislumbra ao fundo a silhueta da Igreja de São Domingos, que abre para a rua do mesmo nome (outro núcleo comercial fervilhante) e para a Rua de São Paulo, que leva às famosas ruínas. (…)
A seca escadaria que leva às ruínas, desinteressante e cheia de ‘hóóós!’ de turistas japoneses, era dantes ladeada por casinhas, com esquinas e beirais, como as gravuras oitocentistas de Chinnery deixam entrever; (…) Desenhos antigos reconstituem também as bolbosas torres que se erguiam para trás da portentosa fachada de dragões e caravelas (fruto de uma mistura artífice nipo-portuguesa que as idas quinhentistas ao país do Sol Nascente propiciaram), a qual é ainda hoje imagem longínqua que torna reconhecível o centro da cidade, para quem vem pelo mar…”

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

O Convento de Santa Clara

A sua fundadora foi a Madre Leonor (clarissa). Natural de Cural de Almuger e Mamantha, Toledo (Espanha) tinha o nome de Leonor de S. Philip. Esteve no Convento de Santa Isabel de Toledo em 1603. Partiu para Manila em 1620 e foi a primeira abadessa do Convento de Santa Clara de Macau, de que foi uma das fundadoras em 1633 juntamente com a Madre Madalena de Vera Cruz, Madre Belchiora da Trindade, Margarida de la Concepcion, Clara de S. Francisco, e Joana de la Concepcion, negociou com a elite no poder a fundação do Convento em Macau segundo a Regra de Urbano IV, que possibilitava o acesso à posse de bens por parte das seguidoras de Santa Clara de Assis. Morreu em Macau em 1651.
Quadro de 1814 da autoria de James Wathen. Em 1870 o Grémio Militar seria construído no local onde está aquele pequeno edifício do lado esquerdo da imagem. No local do convento está hoje o Quartel de S. Francisco.
Vista da Praia Grande a partir, precisamente do Convento de Santa Clara, ca. 1820
Na década de 1930 foi construída uma estrada baptizada de rua de Santa Clara. Vai da Rua do Campo e termina na Avenida da Praia Grande, ligando o Jardim de S. Francisco e o Clube Militar. Dá acesso à Igreja de Santa Rosa de Lima e ao cine-teatro.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Langdon Warner: o 'verdadeiro' Indiana Jones em Macau

Langdon Warner (1881–1955) was an American art historian, archaeologist and art historian specializing in East Asian art. He was a professor at Harvard and the Curator of Oriental Art at Harvard’s Fogg Museum. He was also one of the models for Steven Spielberg's Indiana Jones. As an explorer/agent at the turn of the 20th century he studied the Silk Road. He was elected a Fellow of the American Academy of Arts and Sciences in 1927.
Langdon Warner (1881-1955) nasceu nos EUA. Foi um historiador e arqueólogo controverso, sendo ainda professor em Harvard. Fascinado pelo Oriente, explorou a Rota da Seda na viragem do século 19 para o século 20. As suas viagens e aventuras inspiraram Steven Spielberg na criação da personagem Indiana Jones. 
A sua vida e obra é de tal maneira recheada de detalhes que não cabem no âmbito deste post, sugerindo aos interessados que efectuem a sua própria pesquisa ou a leitura de livros como The Long Old Road in China (1926).
Na sua passagem por Macau no início da década de 1920 registou estas imagens. Pode ver-se a Casa Garden, o Jardim Lou Lim Ioc e o Porto Interior.




quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Colégio de Santa Rosa de Lima: desde 1903

As irmãs franciscanas Missionárias de Maria, chegaram a Macau a 17 de Novembro de 1903 para fundarem o Colégio de Santa Rosa de Lima. Tinha como missão a "educação de pensionistas, e órfãs, gratuitamente. Também acolhia, como internas, raparigas de vários pontos do Extremo Oriente – incluindo da Tailândia." Celebram-se precisamente este mês os 110 anos da instituição. Em 1953, aquando do cinquentenário foi publicada esta notícia.
“Sua Ex.ª o Prelado Diocesano, D. João de Deus Ramalho, celebrou missa na Igreja de Santa Clara, de manhã, e presidiu às cerimónias religiosas da tarde a que assistiram alunas de vários colégios católicos e antigas alunas do Colégio de Santa Rosa de Lima, anexo ao Convento, e ainda o clero franciscano aqui refugiado. Após o acto religioso, realizou-se no Salão de Actos do Colégio uma Academia músico-literária a que assistiram Sua Ex.ª o Governador da Província, Almirante Joaquim Marques Esparteiro, e Sua Exma. Família, além de muitas outras individualidades e famílias das alunas de Santa Rosa de Lima”

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Notícias de Macau e Deolinda da Conceição

O Instituto Internacional de Macau, por ocasião do centenário do nascimento de Deolinda da Conceição (1913-1957), promove ao final da tarde (18h30) do dia de hoje em Macau uma sessão de homenagem integrada no ciclo de tertúlias dos “Serões Macaenses”.
Terá como oradores Maria Antónia Espadinha, Fernando Sales Lopes e o filho da autora, António da Conceição Júnior. Fica feito o convite.

10-9-1953
Calçada do Tronco Velho: à esquerda a Escola Comercial e à dta. ao fundo a redacção do NM

Funcionários do jornal "Notícias de Macau" em confraternização na década de 1950. Na imagem podem ver-se Herman Machado Monteiro, Deolinda da Conceição e Luíz Gonzaga Gomes, entre outros.
"Deolinda da Conceição, escritora, nasce em Macau numa época conturbada pelas guerras mundiais e pela guerra sino-japonesa. É essa vivência que retrata em Cheong Sam (A Cabaia – obra que reúne vários contos), e nas crónicas, publicadas no jornal Notícias de Macau, onde trabalhou como jornalista e responsável da Página Feminina.
Nos contos, Macau é descrito como uma cidade onde os extremos se tocam num dualismo carregado de branco e preto. Macau é o “cantinho abençoado”, um “oásis de paz”, uma “terra privilegiada e de promissão”, um “cantinho onde se podia desfrutar de uma relativa paz”, de calma, sossego, beleza, encantamento e onde o silêncio das ruas é quebrado, de vez em quando, pela “buzina de um automóvel” ou pelo relógio que bate as 12 badaladas. Noites tranquilas e belas, em que imagens encantadoras povoam o sono dos inocentes, fazem a autora sentir-se feliz e considerar que é uma maravilha viver em Macau.
De repente, toda esta felicidade é bruscamente abalada por “rostos amarelecidos pela fome constante” e pelo desespero de um presente cruel mas, sobretudo, pela visão de um futuro sem qualquer réstea de esperança. As ruas de Macau tornam-se palco no qual desfilam corpos e almas marcadas de forma profunda por uma guerra feita por homens que “de humano só têm a forma”.
Cidade de contrastes onde as padarias exibem pão quentinho e os mendigos, dia e noite, vagueiam em grupo à chuva e ao frio, enfrentando a escuridão da noite e das suas vidas, na esperança que uma mão caridosa lhes estenda um pedaço de pão ou uma moeda para comprar algo que lhes mitigue a fome.
É neste cenário de desespero e profunda miséria que a solidariedade e a compaixão das gentes de Macau suaviza a vida dos inúmeros refugiados de guerra e de todos os que aqui procuram um refúgio que os abrigue e os afaste do trágico destino a que as tradições sociais os tinham votado.
A mulher é a personagem central da maior parte dos contos: a mulher chinesa que sofre a discriminação e que tenta libertar-se da condição de inferioridade a que estava sujeita (concubinato, filho varão e venda das meninas); a mulher vítima da guerra que enlouquece de dor perante a impossibilidade de salvar os filhos da fome e da miséria; a mulher que, na sociedade fechada de Macau, tenta conquistar a sua liberdade e assumir-se em pé de igualdade com o homem, a nível profissional e social.
Ao lermos a biografia da autora podemos concluir que ela própria, enquanto jornalista, escritora, professora e tradutora, participa activamente neste movimento emancipatório da mulher, tendo-se afirmado, a nível profissional, num meio exclusivamente masculino."
Excerto de um artigo da autoria de  Maria de Lurdes Nogueira Escaleira publicado na Revista Macau nº 31 (Junho 2013)

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Certificados 10 patacas: 1944

Foi durante o ano de 1937, que em Macau e Hong-Kong se começaram a sentir os efeitos da Segunda Guerra Sino-japonesa, na qual o Japão ocupou parte do território chinês. Esta Guerra teve como efeitos em Macau, o crescendo da entrada de refugiados e o diminuir da entrada de moeda estrangeira. Prevendo efeitos deflaccionários resultantes de uma eventual interrupção do influxo de moedas estrangeiras num futuro próximo, o Governo de Macau, como medida cautelar, começou a acumular moeda de prata chinesa, que na altura era a que tinha maior valor intrínseco e aceitação local.De modo a acautelar situações de fraude ou falsificação, mas também para o garante de uma fiscalização oficial da parte do Governo local, foi adoptado que os Certificados teriam de conter as assinaturas manuscritas do Director da Repartição Central dos Serviços de Fazenda do Governo da ex-colónia e do Gerente da Filial do BNU de Macau (Carlos de Vasconcelos) – tal como estava consignado no artigo 2.º do Decreto n.º 33 517 e que não admitia assinatura por chancela. Tal medida fica espelhada pelo relato no qual o Gerente chegou a ter de realizar 5 mil assinaturas pelo seu punho por dia e, durante meses, assinou em média 1.500 a 2.000 Certificados diários.
Largo do Senado com destaque para os Correios e ao fundo os aterros da Praia Grande: década 1930
Esta medida permitiu acumular nos cofres da Fazenda mais de 2 milhões de Patacas em prata, o que, aliado a um Fundo de Reserva considerável em divisas estrangeiras, se revelou importante para mais tarde suportarem as emissões de papel-moeda para Macau durante os tempos de guerra. O Japão havia iniciado a invasão da China com a tomada da Manchúria em 1931. A ocupação japonesa de grande parte do território chinês tornou-se uma realidade, devido à incapacidade das Forças Nacionalistas chinesas em travar o avanço nipónico.
Neste contexto, a ex-colónia de Macau estava votada a uma situação de reclusão, encravada que estava no meio de territórios ocupados, agravada em 1941, com o que é considerado o início da Guerra do Pacífico, quando as tropas japonesas atacaram Pearl Harbor (o que forçou a entrada dos EUA na Guerra) e a invasão de Hong Kong, para além de outros pontos estratégicos no sudeste asiático.
Esta escalada implicou o aumento de refugiados e da população em Macau. A necessidade de se encontrarem instrumentos de troca também se tornou urgente, devido ao gradual desaparecimento de moedas e de notas estrangeiras, que na altura giravam no território. Muitas delas provinham de Hong Kong (o British Trade Dollar), em conjunto com moedas e notas chinesas.
Os frequentes combates navais, em conjunto com o bloqueio que as forças japonesas votaram os territórios ocupados na China, fizeram com que as remessas de papel-moeda, provenientes de Portugal não tivessem a possibilidade de chegar a Macau. Uma dessas remessas tratava-se da ‘Emissão Pagode’ no valor de 3.769.975 Patacas que, sem possibilidades de iniciar viagem, se encontrava retida em Lourenço Marques (actual Maputo) – esta emissão só mais tarde circularia em Macau, a partir de 16 de Novembro de 1945.
A Filial de Macau do BNU (inaugurada em 1902) perante este cenário de desaparecimento dos meios de troca, entendeu que teria de recorrer à emissão de moeda localmente. Exposta esta pretensão junto do Governo de Macau e após repetidos pedidos nesse sentido da parte do Governador da altura, Gabriel Maurício Teixeira, o Ministério das Colónias, em 1944, outorgou o Decreto n.º 33 517, no Diário do Governo, 1ª Série, n.º 25, que autorizava a Filial de Macau à emissão de Certificados como «moeda privativa da Colónia, do valor nominal a estabelecer pelo governador de Macau».
Estes Certificados tiveram, logo à partida, uma função provisória sendo previsto que a sua circulação cessaria assim que o restabelecimento das comunicações permitisse que a recepção de notas no território se processasse com normalidade. Isto porque, apesar de equiparados às notas, com as mesmas garantias e submetidos ao mesmo regime jurídico, o seu valor assentava no crédito da entidade que os emitia (o BNU Macau) e não numa garantia real de uma reserva constituída.
A título de exemplo, no caso das notas emitidas pelo BNU, o volume de circulação tinha de ter em conta o valor da reserva monetária e não poderia ser superior a um terço desta última, tal como havia sido contratado entre o Estado português e o BNU. Daí, a relevância de previamente se terem acumulado divisas e prata no período que antecedeu o deflagrar da II Guerra Mundial no sudeste asiático, o que permitiu a emissão destes Certificados naquele período de isolamento na ex-colónia.
Por esse mesmo motivo, o Governo em Lisboa não tinha possibilidade de determinar os valores nominais, nem as quantidades a emitir e a fixar, uma vez que não poderia aferir das necessidades do mercado local. Desta forma, essa função recaía no Governador de Macau para apurar esses números.
Esta "Emissão Certificados" foi impressa na Litografia Sin Chon & Cia em papel de fabrico local e com recurso a pedras litográficas calcárias. Numa das faces, tinham os desenhos dos Certificados. Estes tiveram como modelo a ‘Emissão António Ennes’ para Moçambique. Na Emissão macaense, a efígie de António Ennes foi substituída pelo Escudo de Portugal com palmas e laço, o selo do BNU foi elevado e manteve-se a Rosácea no fundo mas com outro pigmento.
As pedras litográficas têm um peso aproximado de 35 Kg cada. Foram cortadas em forma de hexaedro rectangular e com as arestas ligeiramente arredondadas. Apresentam na face frontal três desenhos distintos: um para a moldura, outro para o fundo e o último para a rosácea. O processo gráfico de produção dos Certificados foi a cromolitografia, que permitia a impressão a várias cores. Esta obrigação foi posteriormente alterada pelo Decreto n.º 33 577, de 15 de Março de 1944, que autorizou a delegação dessas atribuições noutros funcionários do Governo (o Subdirector ou os primeiros-oficiais) e do Banco (o Guarda-Livros, o Tesoureiro ou o Chefe de Serviços). Ainda assim foram feitas inúmeras falsificações.
Estes Certificados tiveram também a particularidade de terem sido a única emissão do BNU em que os ornatos, os textos e as imagens no Verso da nota foram impressos na vertical.
Os Certificados apresentavam como data de emissão, 5 de Fevereiro de 1944. Foram emitidos nos valores de 5, 10, 25, 50, 100 e 500 Patacas e cada valor facial tinha a sua cor. Na sua totalidade foram emitidos 1.284.000 Certificados até 1947, ano em que foram retirados de circulação.
Artigo da autoria de Nuno Carvalho
Mais informações sobre o tema no livro "Macau 1937-1945: os anos da guerra" da autoria de João F. O. Botas, também autor deste blog.