Relatório de escuta da Emissora Nacional (em Portugal) reportando o incidente a 29 Agosto de 1943 |
No quarto 410 do hotel Kuok Chai a quadrilha de Wong Kong Wit, a mais poderosa e perigosa de Macau, planeia assaltar o vapor Sai On, antigo barco de carreira atracado no porto frente ao hotel com a missão de acolher refugiados. Nesta noite colaboracionistas chineses contratados pelo exército japonês a cerca de 150 mil ienes militares por cabeça apoderam-se do ferry “S.S. Sai On” – carreira Macau-Hong Kong – atracado no Porto Interior. No ataque, para além de um guarda indiano, o polícia João António José (guarda nº 612 conhecido guarda-rede do Grupo Desportivo da Polícia) e o soldado nº 4326 José Fernandes, são mortos. José António Elias (soldado nº 4392 ao serviço da PSP) e Frederico Pedruco (guarda nº 119 da PSP) ficam feridos. Isto do lado das forças portuguesas. Do outro lado, registo de oito chineses mortos ao serviço dos japoneses.
“Quando o navio ia já em frente da Av. da República dispararam rajadas de metralhadora em direcção a Macau. O dr. Delegado, Aarão de Lacerda, que vivia na rua do Miradouro de Santa Sancha, foi à janela e uma bala espeta-se na parede,” diz Mons. Manuel Teixeira, adiantando que no barco não havia refugiados “apenas duas crianças gémeas inglesas, que nada sofreram e que foram logo reenviadas para Macau pelos japoneses.”
O barco foi levado para Hong Kong e sob o novo nome de “Tak Shing” e “Tung Shan” operou até Janeiro de 1974.
É um dos mais graves incidentes ocorridos em Macau durante a guerra e talvez o mais provocatório levado a cabo pelos japoneses. Os assaltantes ocupam o Hotel Kuok Chai – no que o “A Voz de Macau” classifica como manobra de diversão para “com mais segurança alcancarem o seu desígnio” – e dominam toda a zona do final da Av. Almeida Ribeiro no Porto Interior. Só a intervenção da PSP conseguiu pôr cobro à situação. Os agentes, Samari e Fernandes, foram mortos, bem como três dos atacantes. Nas notícias veiculadas pela agência Reuters a partir de Chungking, o tema é tratado de forma efusiva e bem diferente, referindo-se a presença a bordo de mais de uma centena de refugiados e a morte de 20 polícias portugueses: “Segundo informações recebidas aqui, os japoneses apresaram no dia 18 do corrente o antigo navio fluvial britânico Sian que estava ancorado na colónia portuguesa de Macau desde o início da guerra do Pacífico. Teriam sido mortos mais de 20 polícias e guardas portugueses quando tentavam resistir aos japoneses. As informações dizem que mais de 200 polícias japoneses, em trajo civil, e tropas ‘fantoches’ chinesas chegaram junto do Sian em duas traineiras e saltaram para bordo. Os japoneses montaram metralhadoras no cais e abateram quantro polícias portugueses que tentaram intervir. O quartel-general da polícia portuguesa enviou reforços, mas estes não conseguiram dominar os japoneses. Mais de 100 passageiros, incluindo chineses, portugueses e refugiados filipinos encontravam-se a bordo do Sian que transportava igualmente grande quantidade de mercadorias.”
Terá começado aqui uma espécie de protectorado virtual do Japão sobre Macau...
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