Durante a perseguição aos cristãos no Japão, 26 padres católicos estrangeiros e japoneses foram crucificados em Nagasaqui em 1597 e muitas centenas de japoneses cristãos mortos durante a Rebelião Shimabara, de 1637. Os ossos dos mártires e de alguns dos rebeldes foram trazidos para Macau e guardados na igreja de S. Paulo. Depois que um incêndio a destruíu, foram reunidos e levados para a Sé Catedral e, em 1974, transferidos para a Capela de S. Francisco Xavier. Finalmente, as relíquias dos Mártires do Japão e do Vietname repousam, actualmente, no Museu de Arte Sacra situado por detrás das Ruínas de S. Paulo.
Naquela época, o Colégio de S. Paulo tomou-se para a Igreja do Japão o que o Colégio de Douai representou para a Igreja de Inglaterra. Uma câmara ardente de apóstolos e de mártires. De tempos a tempos, as relíquias daqueles filhos sacrificados no Japão vinham para Macau, onde foram preservadas como um tesouro.
No Museu dos Mártires de Nagasáqui existe um documento escrito pelo P.e Pedro Morejón, e autenticado com o selo do Reitor do Colégio de S. Paulo. A data do documento é de 5 de Outubro de 1630 e confirma o reconhecimento de algumas das relíquias dos três jesuítas santos, Paulo Mique, João de Goto e Jaime Quisai, que Morejón estava a enviar para as Filipinas. No final do referido documento, P.e João de Bueras, Provincial em Manila, acusa a recepção da chegada das relíquias a 3 de Julho de 1632.
Os ossos dos três Santos foram transportados para Macau provavelmente a bordo do navio "S. António" de Rui Mendes de Figueiredo, navio esse que podemos ver representado em quase todas as pinturas do martírio dos 26 Santos, ancorado no centro do porto de Nagasáqui. O "S. António" regressou a Macau no Outono de 1597, e, entre os passageiros, encontravam-se o Bispo do Japão, Pedro Martins, e alguns dos franciscanos expulsos do Japão. Por ocasião da beatificação dos 26 mártires (1627), as relíquias foram enviadas de Macau para Roma, Lisboa e Manila. Mas a parte principal permaneceu na Igreja de S. Paulo. Em 1614, quando os jesuítas exilados chegaram a Macau, trouxeram também um outro tesouro no navio de Serrão Cunha: as relíquias de outros mártires mortos em várias partes do Japão até essa data. Aqueles mártires não eram jesuítas, mas filhos da Igreja japonesa que tinham testemunhado com o seu sangue derramado a fé recebida, sendo a maioria deles missionários de Macau. Como a Igreja de Arima perdurou até 1612, e a de Nagasáqui até 1614, as relíquias dos mártires que pereceram em outras regiões foram depositadas em Arima e Nagasáqui, e foi construída uma pequena capela no jardim da casa de "Todos os Santos" onde todas as relíquias foram depositadas a partir de 1612. Em pouco tempo, esta capela tornou-se num centro de peregrinação. De lá, os missionários levaram as relíquias para Macau, onde foram colocadas. conjuntamente com outras relíquias, numa tribuna na Capela das Onze Mil Virgens.
Eram os mártires de Bungo, o velho catequista Joram ( 1587); de latsuxiro ( 1603 e 1609); de Hagi e lamaguchi (1605); Gaspar Sarna e a sua família, de Iquitsuqui, Hirado (1609); e muitos mártires de Arima ( 1612-1613).
Anos mais tarde, outras relíquias, embora não numerosas, chegaram e foram guardadas em conjunto: as do mártir de Hiroxima, Francisco Toiama; do mercador português Domingos Jorge; do mártir de Cocura, Diogo Cagaiama Haiato. Em 1742, todas essas relíquias foram catalogadas pelo P.e José Montanha, S. J., e, em 1806, o Bispo de Macau, D. Francisco de Nossa Senhora da Luz Chacim autenticou-as. O que foi posto a salvo do fogo que destruiu S. Paulo em 1835, foi levado para vários locais até à actual localização na Igreja de S. Francisco Xavier, de Coloane.
Há três anos atrás, desloquei-me de Nagasáqui a Macau na companhia do Professor Tacaiuque Matsuxita da Universidade de Nagasáqui, a fim de identificar essas relíquias o mais cedo possível. A lista das relíquias escrita pelo Bispo Francisco Chacim, os documentos relacionados com a perseguição no Japão, muitos deles escritos sob a autoridade do Bispo Cerqueira, e as datas facilitadas pela ciência médica, ajudaram-nos a identificar alguns dos ossos da cabeça. Para mim, as horas passadas lá em Coloane em estreito contacto com aqueles heróis da Igreja japonesa constituíram uma experiência rica. Pude imaginar a irmã e o irmão Madalena e Diogo Haiaxida seguindo à minha frente para o local de execução perto do rio Arima, e escutar a voz da mãe deles, Marta Haiaxida, a exortá-los: "Meus filhos, fitai agora os vossos olhos no céu." E senti uma gratidão profunda em relação a Macau, que tinha conservado com amor aquele tesouro até aos nossos dias.
Mas nada resta da maioria dos mártires. Quando a violência da perseguição aumentou, os corpos dos mártires eram reduzidos a cinzas, e estas, por sua vez, eram lançadas ao mar. Foi o que aconteceu ao P.e Julião Nacaúra, o último dos enviados; a baía de Nagasáqui é o seu belo túmulo.
No Museu dos Mártires de Nagasáqui existe um documento escrito pelo P.e Pedro Morejón, e autenticado com o selo do Reitor do Colégio de S. Paulo. A data do documento é de 5 de Outubro de 1630 e confirma o reconhecimento de algumas das relíquias dos três jesuítas santos, Paulo Mique, João de Goto e Jaime Quisai, que Morejón estava a enviar para as Filipinas. No final do referido documento, P.e João de Bueras, Provincial em Manila, acusa a recepção da chegada das relíquias a 3 de Julho de 1632.
Os ossos dos três Santos foram transportados para Macau provavelmente a bordo do navio "S. António" de Rui Mendes de Figueiredo, navio esse que podemos ver representado em quase todas as pinturas do martírio dos 26 Santos, ancorado no centro do porto de Nagasáqui. O "S. António" regressou a Macau no Outono de 1597, e, entre os passageiros, encontravam-se o Bispo do Japão, Pedro Martins, e alguns dos franciscanos expulsos do Japão. Por ocasião da beatificação dos 26 mártires (1627), as relíquias foram enviadas de Macau para Roma, Lisboa e Manila. Mas a parte principal permaneceu na Igreja de S. Paulo. Em 1614, quando os jesuítas exilados chegaram a Macau, trouxeram também um outro tesouro no navio de Serrão Cunha: as relíquias de outros mártires mortos em várias partes do Japão até essa data. Aqueles mártires não eram jesuítas, mas filhos da Igreja japonesa que tinham testemunhado com o seu sangue derramado a fé recebida, sendo a maioria deles missionários de Macau. Como a Igreja de Arima perdurou até 1612, e a de Nagasáqui até 1614, as relíquias dos mártires que pereceram em outras regiões foram depositadas em Arima e Nagasáqui, e foi construída uma pequena capela no jardim da casa de "Todos os Santos" onde todas as relíquias foram depositadas a partir de 1612. Em pouco tempo, esta capela tornou-se num centro de peregrinação. De lá, os missionários levaram as relíquias para Macau, onde foram colocadas. conjuntamente com outras relíquias, numa tribuna na Capela das Onze Mil Virgens.
Eram os mártires de Bungo, o velho catequista Joram ( 1587); de latsuxiro ( 1603 e 1609); de Hagi e lamaguchi (1605); Gaspar Sarna e a sua família, de Iquitsuqui, Hirado (1609); e muitos mártires de Arima ( 1612-1613).
Anos mais tarde, outras relíquias, embora não numerosas, chegaram e foram guardadas em conjunto: as do mártir de Hiroxima, Francisco Toiama; do mercador português Domingos Jorge; do mártir de Cocura, Diogo Cagaiama Haiato. Em 1742, todas essas relíquias foram catalogadas pelo P.e José Montanha, S. J., e, em 1806, o Bispo de Macau, D. Francisco de Nossa Senhora da Luz Chacim autenticou-as. O que foi posto a salvo do fogo que destruiu S. Paulo em 1835, foi levado para vários locais até à actual localização na Igreja de S. Francisco Xavier, de Coloane.
Há três anos atrás, desloquei-me de Nagasáqui a Macau na companhia do Professor Tacaiuque Matsuxita da Universidade de Nagasáqui, a fim de identificar essas relíquias o mais cedo possível. A lista das relíquias escrita pelo Bispo Francisco Chacim, os documentos relacionados com a perseguição no Japão, muitos deles escritos sob a autoridade do Bispo Cerqueira, e as datas facilitadas pela ciência médica, ajudaram-nos a identificar alguns dos ossos da cabeça. Para mim, as horas passadas lá em Coloane em estreito contacto com aqueles heróis da Igreja japonesa constituíram uma experiência rica. Pude imaginar a irmã e o irmão Madalena e Diogo Haiaxida seguindo à minha frente para o local de execução perto do rio Arima, e escutar a voz da mãe deles, Marta Haiaxida, a exortá-los: "Meus filhos, fitai agora os vossos olhos no céu." E senti uma gratidão profunda em relação a Macau, que tinha conservado com amor aquele tesouro até aos nossos dias.
Mas nada resta da maioria dos mártires. Quando a violência da perseguição aumentou, os corpos dos mártires eram reduzidos a cinzas, e estas, por sua vez, eram lançadas ao mar. Foi o que aconteceu ao P.e Julião Nacaúra, o último dos enviados; a baía de Nagasáqui é o seu belo túmulo.
Houve algo, contudo, que os perseguidores não puderam impedir. Enquanto o comércio Macau-Nagasáqui se manteve vivo, nomeadamente até 1639, todos os anos os galeões portugueses traziam para Macau as notícias sobre os mártires daquele ano. Quando os mártires eram pessoas conhecidas na cidade, Macau celebrava as tristes novas com cerimónias solenes. Os sinos repicavam e, algumas vezes, como quando as notícias sobre o martírio do P.e Sebastião Vieira chegaram à cidade, até corridas de touros se realizaram.
Uma nova actividade, promovida pelo P.e Morejón, teve início por essa altura, e, mais tarde, por António Cardim: o processo da Igreja para a beatificação de alguns daqueles mártires. Temos, por exemplo, na Academia Real da História de Madrid, o Processo dos Mártires dos anos de 1633 e de 1634. Este processo é muito importante, não só em relação aos outros mártires, mas também porque apresenta muitos aspectos interessantes sobre os últimos anos das relações entre Macau e Nagasáqui.
Em Nagasáqui, quando o Xógum Tocugava Iemitsu ordenou que se fizesse um aterro no mar para fazer a ilha de Dejima (cerca de 1634), a vida dos portugueses em Nagasáqui foi-se tornando difícil. Todos os portugueses que habitavam em Nagasáqui foram obrigados a ir para um único distrito e, à noite, os portões da rua eram encerrados. A partir de então, começou o êxodo de muitos portugueses em direcção a Macau. Em Novembro de 1633 e em 1634, nos galeões de Lopo Sarmento de Carvalho, chegaram aí muitos jovens portugueses nascidos em Nagasáqui, ou que aí tinham passado muitos anos. Falavam fluentemente japonês e tinham presenciado com os seus próprios olhos a tortura e a morte dos mártires. Testemunharam no processo e as suas palavras conservaram-nos os últimos momentos dos mártires. Graças aos processos, alguns dos mártires já foram canonizados.
Uma nova actividade, promovida pelo P.e Morejón, teve início por essa altura, e, mais tarde, por António Cardim: o processo da Igreja para a beatificação de alguns daqueles mártires. Temos, por exemplo, na Academia Real da História de Madrid, o Processo dos Mártires dos anos de 1633 e de 1634. Este processo é muito importante, não só em relação aos outros mártires, mas também porque apresenta muitos aspectos interessantes sobre os últimos anos das relações entre Macau e Nagasáqui.
Em Nagasáqui, quando o Xógum Tocugava Iemitsu ordenou que se fizesse um aterro no mar para fazer a ilha de Dejima (cerca de 1634), a vida dos portugueses em Nagasáqui foi-se tornando difícil. Todos os portugueses que habitavam em Nagasáqui foram obrigados a ir para um único distrito e, à noite, os portões da rua eram encerrados. A partir de então, começou o êxodo de muitos portugueses em direcção a Macau. Em Novembro de 1633 e em 1634, nos galeões de Lopo Sarmento de Carvalho, chegaram aí muitos jovens portugueses nascidos em Nagasáqui, ou que aí tinham passado muitos anos. Falavam fluentemente japonês e tinham presenciado com os seus próprios olhos a tortura e a morte dos mártires. Testemunharam no processo e as suas palavras conservaram-nos os últimos momentos dos mártires. Graças aos processos, alguns dos mártires já foram canonizados.
Texto elaborado a partir de uma comunicação apresentada no Simpósio Internacional "Religião e Cultura", comemorativo do IV Centenário da Fundação do Colégio Universitário de S. Paulo, realizado pelo Instituto Cultural de Macau, Divisão de Estudos,
Investigação e Publicações, entre 28 de Novembro e I de Dezembro de 1994, em Macau.
Tradução do original inglês por Isabel Morais; revisão de Pedro Catalão; revisão final de Júlio Nogueira.
Investigação e Publicações, entre 28 de Novembro e I de Dezembro de 1994, em Macau.
Tradução do original inglês por Isabel Morais; revisão de Pedro Catalão; revisão final de Júlio Nogueira.
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