(...) Podemos também citar um certo número de vocábulos de origem chinesa que, embora modificados, fazem parte integrante do dialecto de Macau. No entanto, são em menor número que os provenientes das línguas malaias, facto que parece provar a mais frequente e mais duradoira influência destes povos junto dos Macaenses. Destaquemos, pois os seguintes termos:
«Amui», rapariga; «amechon», boião, do chinês «am chông»; «apai», coxo; «atai», rapaz chinês de pouca idade; «bafo comprido» de «ch’eong hei»; «camessé», gorgeta, de «kam-sé»; «caxá-fachai», caixa de fósforos, do chinês «fachái», fósforos; «chatom», abafador de bule, de «chá tong»; «chencau», chinês baptisado na Igreja Católica, de «cheng-káu»; «chicu», variedade de inhame, de «ch’i kú»; «chile miçó», tempero chinês, de «lát chiu cheóng»; «chin-chin», saudação, de «ch’engch’eng»; «chintói», bolo de «chin-tui»; «choa», embarcação, de «ch’ou»; «choncar», chocar, de «chong»; «chuchai», cule chinês, de «chü-chai», porquinho pequeno; «colau», restaurante, de «kou lâu»; «congcong», nome de hortaliça em chinês, de «ong-chói»; «faichi», pauzinhos que substituem os nossos talheres;
«faichista», homem que no jogo do «fantam» corta os botões, a varinha por eles usada tem o formato dos «faichi»; «fantane», jogo, de «fán t’ án»; «fá-sã» ou «fásam», amendoim, de «fá-sang»; «fatião», barco chinês, de «fai t’eang» ou «fai t’êng»; «fontão», armário, de «fôngtâng», lâmpada ao vento; «fó-quei», empregado, de «fókei», criado; «ganeiro», tripulante de barco, de «kwan» com o sufixo português -eiro, aquele que na marinha asiática tem a seu cargo os petrechos de guerra, massame, poleame...; «iam-chá», termo chinês que significa um primeiro almoço tardio; «jambolam», fruto da «eugenia sambulana», comum em Macau; «laissi», presente de dinheiro pelo ano novo chinês, de «lei-si»; «lanchai», garoto da rua; «lencó», fruto, de «leng kók»; «leonfane», geleia, de «leóng fân»; «lichia», fruto muito apreciado, originário da China; «liu-liu», remo; «longane», fruto, de «lông ngán»; «lorcha», pequena embarcação chinesa; «malau», do chinês, macaco; «manquenfum», mezinha chinesa, de «mán-ken-fông»; «mestres», curandeiros chineses; «mintói», cobertor, de «min t’ói»; «mui», espécie de ameixa; «mui», moído, desfeito; «ná», partícula, com o sentido de «tome lá, veja»; «o-o-bambu», rebentos de bambu; «pacapiu», lotaria, de «pak kap piu»; «paché»; guarda-sol; «pakfanista», viciado de drogas, de «pák-fân», pó branco; «panchão», foguete chinês, de «p’au cheong»; «putão», tijela, de «put-t’âu», «quáchi», pevides de melancia, de «kuá-chi»; «sam-nam-ché», triciclo, de «sám lôn ché»; «sampan», embarcação chinesa de vela; «sanchum», vinho queimado de arroz, de sorgo, etc.; «som», comida, de «sông»; «sutate», tempero chinês; «tacó, taucó», feijão verde, de «tâu kók»; «taipane, taipanada», homem rico, de «tai-pán»; «tai-siu», jogo; «tal-mong», termo chinês designando palerma; «tancá, tancar», barco, de «tán ká», ovo, casa; «tancareira», mulher tripulante do «tancá»; «tapilu», refeição, de «tá-pin-lou»; «taufu», coágulo de feijão de soja, do chinês «tâu-fu»; «tau-leng», moeda de cinco avos; «tomtom», rebuçado, de «t’óng t’óng»; «trate», planta «nymphacea», considerada sagrada na China.
Entre os vocábulos originários da Índia, especialmente do concani, o dialecto de Goa, podemos nomear os seguintes:
«árvore do pagode»; «babá», rapazinho; «baniane», casaco de pano; «bicho», animal, rapaz de pouca idade ou rapariga; «bambolim», de «bombil»; «cacada», gargalhada 5; «carambola», fruta; «chachini», prato de peixe, de «chetni»; «chale», rua estreita, de «tçàl»; «daia», parteira; «fula», flor, do neo-árico «phùl»; «gargu», recipiente para água, chaleira, de «gãdjó»; «guinde», jarro; «gúni», saco grande, ;de «gon»; « ladu», doce; «mainato», lavandeiro; «mate», terra, barro, argila; «mogarim», espécie de jasmim, de «mogrî»; «mordicim», dor de cabeça, de «mordexim»; «mungo», feijão, de «mũng; «ola», folha de palmeira; «pancá», ventilador; «patinga», barriga da perna; «supo», cesto, do indo-português «supo»; «tifin», almoço pela uma hora da tarde, do anglo-indiano «tiffin»; «vaguear», ter vertigens, de «banque», espécie de cânhamo.
Das línguas dos países orientais, que igualmente tiveram relações com Macau, provieram alguns termos como sejam: «Caia», mosquiteiro, do japonês «ka-ya»; «figo-caque» «cáqui», dióspiro, do japonês «káki»; «nono», «nuno», tecido de algodão, do japonês «muno»; «quimão»; quimono, igualmente do japonês «quimono». Das Filipinas temos a registar «macupa», variedade de jambo e «pano-manila», isto é, um pano de algodão estampado de risca de xadrês, de cores vivas, muito estimado pelas antigas mulheres de Macau. Do indonésio recebeu ainda a língua de Macau, a palavra «samatra», com o significado de tempestade, do nome da ilha e, propriamente do javanês, «cate», peso com o valor de 610 gramas, ainda empregado correntemente entre os comerciantes chineses.
Das línguas africanas, ou melhor bantos, contam-se apenas dois vocábulos: «cará», crosta, do nome do tubérculo que significa «batata doce»; e «siara», no sentido de senhora.
Como já acima notámos, a fixação dos Ingleses na ilha de Hong Kong, em 1841, nas vizinhanças de Macau, tornou-se um poderoso elemento de influência na língua do território, sempre em crescimento. Assim podemos enumerar uma série de termos desta proveniência:
«Adape», sem dinheiro, de «hard up»; «afete», gordo, nutrido, de «fat»; «anidiu», melão, de «honey-dew»; «atachamento», afeição, amor, de «attachement»; «boy», rapaz, serviçal; «cacai», estrábico, de «cock-eyed»; «captain», chefe de criados; «cash», dinheiro à vista; «chope», feriado escolar, do pidgin de Hong-Kong; «corte», tribunal, de «court»; «cule», trabalhador chinês, de «coolie»; «dangeroso», perigoso, de «dangerous»; «engajamento», promessa de casamento, de «engagement»; «engajar», fazer o pedido de casamento, de «engage»; «entiçar», incitar, de «entice», tentar; «espitune», escarrador, «de spittoone»; «fluqueiro», «fluquice», jogadas erradas, boa jogada, de «fluke»», golpe ou tiro, dado por acaso ao jogo; «mámi», mamã, de «mammy»; «minche», picado de carne, de «mince»; «parcar», arrumar um carro, de «to park»; «queique», bolo, de «cake»; «reporta», levar ao conhecimento, de «report»; «rustir», assar, de «to roast»; «sós», molho, de «sauce»; «tiro-grandi», sugestão do inglês «big shot».
Embora seja difícil determinar de uma forma precisa as tendências sociais de cada um dos grupos étnicos ou dos idiomas estranhos que influenciaram a língua de Macau, podemos assinalar alguns dos aspectos mais expressivos dos léxicos nela representados.
Assim o malaio exprime muitos instrumentos de uso doméstico, medidas, vestuário, comestíveis como frutos, doces, leite de coco, culinária e certos estados abstractos.
Por sua vez, o chinês revela-se numa série de costumes próprios desta comunidade e adoptados pelos Macaenses, como nomes de refeições, géneros de alimentação, embarcações e seus tripulantes, utensílios de pesca, remédios, jogos e condições físicas.
Nos termos indianos encontram-se diferentes situações humanas, instrumentos domésticos, vestuário, doçaria e nomes de plantas.
Finalmente, do inglês provieram termos de comércio, predicados físicos, actos sociais e algumas designações de culinária. (...)
Excerto do capítulo "A Língua de Macau" in A Influência da Cultura Portuguesa em Macau, de Rafael Ávila de Azevedo. Edição: Inst. Cultura e Língua Portuguesa, 1984.
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