Particularidades deste postal:
- editado e "sold" pela empresa O. F. Ribeiro de Hong Kong (habitualmente era uma outra empresa de Hong Kong que os imprimia e vendia)
- é a primeira vez que encontro a designação "Macao: Montanha Russa Summer Resort"
- foi enviado (posto a circular) em 1907 mas a edição é de 1890-1900;
Os primeiros postais ilustrados de Macau foram impressos em litografias monocromáticas de Hong Kong por volta de 1880.
Os postais ilustrados impressos nos primeiros anos do século XX (a partir de 1905 essencialmente) 'ganham' cor mas uma cor 'artificial... Ou seja, já existia a técnica da fotografia a cores só que era tão dispendioso que às fotografias a preto e branco eram acrescentadas cores de forma manual. Estes postais era feitos um-a-um e a partir da década de 1920 entram em desuso.
Entre os chineses de Macau é conhecido por "Ló Si Sán", o Outeiro do Caracol. Nos tempos mais antigos chamavam-lhe "Siu Lin Fông/Pequeno Cume do Lótus." Nesses tempos o jardim ficava bastante afastado da cidade... perto da praia da Areia Preta.
Luís Gonzaga Gomes escreveu (1º metade do século XX) que "era este o local em que, há uma dezena de anos, nas calmosas tardes de estio, se reunia uma parte da população, para gozar a fresca aragem trazida pelo mar, e para se deliciar com refrescos e gelados, que eram servidos nas várias mesas espalhadas pela esplanada, pois, nesse tempo, ainda não havia cafés e restaurantes pela cidade e quem necessitasse de qualquer bebida, ou tinha de ir pedi-la a uma taberna ou aos bares dos hotéis, dos clubes ou dos barcos da carreira de Hong Kong".
De seguida, um excerto de "Aquarelas de Macau 1960-1970: cenas de rua e histórias de vida" (1998) de Ana Maria Amaro...
"(...) Naquela noite cálida saímos precisamente para a zona norte de Mong Há. Ultrapassámos o pequeno bairro europeu Albano de Oliveira, pequena jóia que o capital já destruiu e procurámos a frescura do arvoredo na “Montanha Russa” (…) A noite era de Lua cheia. Os trilhos, aqui e além, estavam manchadas pela prata derramada pelo luar, rendilhada pela folhagem desgrenhada, como se fora o cabelo de quem não se penteia há muito tempo. De súbito, ouvimos cantar. Era uma voz feminina, timbrada e aguda, como a das cantoras de ópera chinesa, que entoava uma melodia estranha sem acompanhamento instrumental. As árvores, a frescura, a lua cheia, davam ao ambiente uma grande sedução, à qual a melodia talvez não fosse estranha.
Continuámos a subir. Talvez faltasse pouco para a meia-noite. Não sei, já, que horas seriam. Sei que era já tarde. De repente, numa curva do caminho por onde avançávamos, afastando com as mãos a folhagem rebelde, avistámos o cume do Caracol. No rebordo do murete pintado de branco, estava sentada, de costas, uma mulher. Vestida de branco, o cabelo solto derramado pelos ombros. Imóvel, cantava.
Meu marido queria continuar a subir. mas eu, confesso, perante aquela visão toda branca, cujos cabelos pretos pareciam brancos, também, sob o luar, tive medo. Medo não sei de quê. Talvez houvesse ladrões e a mulher constituísse uma armadilha… Não quis avançar. Vamos para casa! Insisti. Acabámos por retroceder. Seria uma mulher louca? (…)
Mais tarde, quando comecei a entender a linguagem viva de Macau, aprendi muitas histórias de Kwâi e senti o medo na voz de quem as contava. A semelhança entre o que descreviam e o que eu vira na Montanha Russa era tal, que contei o episódio a uma senhora filha-da-terra.- Vós nunca crê? Çã Kwâi. Vós já olá Kwâi di “Monti di Caracol”. Çã justo Kwâi di mulé china di barco-di-flor que ali enforcá. (...)"
Continuámos a subir. Talvez faltasse pouco para a meia-noite. Não sei, já, que horas seriam. Sei que era já tarde. De repente, numa curva do caminho por onde avançávamos, afastando com as mãos a folhagem rebelde, avistámos o cume do Caracol. No rebordo do murete pintado de branco, estava sentada, de costas, uma mulher. Vestida de branco, o cabelo solto derramado pelos ombros. Imóvel, cantava.
Meu marido queria continuar a subir. mas eu, confesso, perante aquela visão toda branca, cujos cabelos pretos pareciam brancos, também, sob o luar, tive medo. Medo não sei de quê. Talvez houvesse ladrões e a mulher constituísse uma armadilha… Não quis avançar. Vamos para casa! Insisti. Acabámos por retroceder. Seria uma mulher louca? (…)
Mais tarde, quando comecei a entender a linguagem viva de Macau, aprendi muitas histórias de Kwâi e senti o medo na voz de quem as contava. A semelhança entre o que descreviam e o que eu vira na Montanha Russa era tal, que contei o episódio a uma senhora filha-da-terra.- Vós nunca crê? Çã Kwâi. Vós já olá Kwâi di “Monti di Caracol”. Çã justo Kwâi di mulé china di barco-di-flor que ali enforcá. (...)"
“The Screw-Shaped Hill in Macao”. “螺絲山公園 / Park of the Screw-Shaped Hill / Montanha Russa |
No mesmo livro a autora (que viveu largos anos em Macau) explica que "A Montanha Russa era uma pequena elevação arborizada e ornamentada com um murete em forma de caracol, que culminava, no topo, numa pequena plataforma. O sítio retirado e, ao que constava, mal afamado, afastava os visitantes. Por isso, a vegetação, entregue a si própria adensara-se com o tempo e tornara ainda menos acessível o projectado miradouro, que tão aprazível se idealizara.”
Nota: "Kwai" (alma penada)
Nota: "Kwai" (alma penada)
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