Lá onde se recosta em rocha esteril
A opulenta Macau, hospeda rica
Do Imperio Celestial.
A China, a Nação mais vaidosa do Mundo, que apesar do estado estacionario dos seus conbecimentos, devido á natureza de suas instituições, e á imperfeição da sua lingoa, se julga o povo mais civilisado, e instruido da terra, se denomina Imperio Celestial e Reino Central, porque segundo suas erradas ideias de Geographia, julgam seus Póvos que o seu Paiz está collocado no centro do Mundo. (...)
A Dinastia reinante na China tem também o titulo de Dinastia Celeste e o Imperador denomina se Filho do Céo. Bem sei que não faltará quem estranhe a denominação de Hospede da China dada a Macau, ella com tudo é exacta os Portuguezes alli sam hospedes e não donos. Aquella Cidade é Chineza. Chinezes dous terços da sua população e os Portuguezes alli habitam porque pagam huma renda annual pelo alluguer do terreno que occupam e para levantarem algum edificio público carecem do beneplacito do Suntó de Cantão, que aliás o mandaria demolir.
Já em 1593 escrevia o Senado a Filippe II 'para aqui conservar nos gastamos muito com os Chinas Gentios'. A renda tem tido diversas alterações ao presente por decisão do Imperador King long é de 500 taeis que no principio de cada anno são entregues ao Mandarim Heang sheang, pelo Procurador da Cidade, que recebe da mão d aquelle Magistrado uma quitação em forma passada pelo Thesoureiro Imperial residente em Cantão. Além disso os Mandarinos fazem visitas á cidade, devassam nella, julgam pleitos e desavenças entre Chins e Portuguezes, tomam conhecimentos de causas crimes e até mandam proceder alli a execuções de alta justiça como aconteceo em 1823 e consta da Gazeta de Lisboa naquelle anno. É certo que ha em Macau um Governador Militar, um Senado, um Ouvidor, Almotacés e outros Magistrados que governam os Portugueses segundo as posturas Municipaes, o Codigo Lusitano e as Ordens que recebem da Corte e do Governador da India, mas nem por isso as Authoridades Chinezas os julgam desobrigados de obdecer ás Leys du Imperio sem embargo da repugnancia que sempre tem mostrado para isso e de sobre esse objecto terem bavido serias questões. Veja-se sobre o aqui expendido, a excellente obra intitulada An historical sketch of the Portuguese settlement in China por André Lungsted. (...)
A gruta de Camões é um dos primeiros monumentos, que os Estrangeiros visitam em Macáu. Sera ella obra da Arte, ou da Natureza eis o que ainda não foi decidido, porque ainda não foi examinada, nem admira, á vista do desleixo dos Portuguezes para objectos desta ordem; e como hão de dar-se a estas investigações, Homens, que ainda se não lembraram de fazer a analyse chymica da agoa das Caldas da Rainha e de outras agoas thermaes do Reino. Tornando porém á Gruta de Macau, qualquer que seja a sua origem, a tradicção affirma que o grande Poéta Portugues alli se recolhia muitas vezes para meditar os grandes quadros dos Lusiadas, d'aquelle Poema sublime, que tornando o seu nome immortal, não obstou a que elle morresse de fóme!!!...
in "O Passeio. Poema", de José Maria da Costa e Silva, 2ª edição, Lisboa, 1844.
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