Este Verão, quase 20 anos depois de ter deixado Macau, local onde vivi durante 8 anos da minha juventude, regressei ao território... Precisamente no ano em que se assinala o 10º aniversário da transferência de soberania. Em duas semanas revi lugares e pessoas e apresentei publicamente o livro que escrevi sobre uma instituição centenária e fulcral na história do território, o “Liceu de Macau: 1893-1999”.
Deixei Macau no início da década de 1990 com pouco mais de 3 casinos, perto de 400 mil habitantes (20 mil oriundos de Portugal) e 2 milhões de turistas por ano...Duas décadas depois tudo mudou. E nem tudo foi para melhor, mas ainda consegui ‘reviver’ partes da Macau que eu conheci. A qualidade de vida de quem ali mora é que sofreu com o crescimento desmesurado do betão. A baía da Praia Grande, o verdadeiro ‘postal’ de Macau eclipsou-se, a meu ver, sem que nada o justificasse. Nas ruínas da Igreja da Madre de Deus (S. Paulo) destaque para o pequeno mas importante museu, já o Farol da Guia, o primeiro a ser construído no Oriente, mal se vislumbra por entre os néons dos arranha-céus. De visita obrigatória é o Museu de Macau na antiga Fortaleza do Monte. Casinos e hotéis são cerca de 30 (incluindo o maior do mundo, além dos que estão projectados), a população residente ronda as 600 mil pessoas (os portugueses oriundos de Portugal contam-se pelos dedos (cerca de mil...) e o número de turistas que todos os anos visita Macau utrapassa os 30 milhões.
Em 2005, o Centro Histórico de Macau foi inscrito na Lista do Património Mundial da Humanidade da UNESCO. Um trabalho iniciado ainda no tempo dos portugueses e finalizado já sob administração chinesa. A lista é extensa e, de uma forma geral, em bom estado de conservação. O que assinalo como negativo foi o facto de, salvo um ou outra excepção, na maioria dos casos, o turista mais incauto não perceber patavina do que está a ver. Ficar-se-á pela fotografia para mais tarde recordar e, se pretender saber que igreja ou fortaleza é aquela que está à sua frente, terá de o deixar para mais tarde, porventura numa pesquisa pela internet. É certo que existem brochuras para turistas e quiosques multimédia, mas parece-me a mim que os turistas deveriam ter informação sobre o que estão a ver no próprio local. Nada do outro mundo, uma pequena inscrição, em inglês, português e mandarim... um pequeno parágrafo que fosse.
E não é só naquilo que é considerado Património Mundial que esta situação acontece. Se depressa alteraram as placas toponímicas trocando a ordem de entrada em cena da língua, primeiro o mandarim e só depois o português, certamente não será difícil melhorar o que pode e deve ser feito em prol do vasto património edificado ao longo dos quase 5 séculos de história de Macau. Para o futuro é o património que vai ficar da história de Macau pois as suas gentes, os filhos da terra, aos poucos, pelas mais diversas razões, vão acabar por saír. E é essa memória vivida de “Macau di tempo antigo” (no patuá...) que é importante preservar. O meu contributo está no blog intitulado precisamente Macau Antigo. Porque, tal como diz um provérbio chinês só “preservando o passado, compreendemos o presente e conhecemos o futuro”.
Um velho amigo que reencontrei (e foram muitos felizmente...) perguntou-me o que eu achava do Macau.. 20 anos depois. “Macau não se explica... sente-se, vive-se!” respondi. Macau é hoje uma cidade quase sem alma fruto de uma táctica que, se serviu para os primeiros 10 anos pós transferência de soberania, não será suficiente a longo prazo, onde mais do que táctica é preciso estratégia.Macau continua a ser uma terra de contrastes, mas hoje sobressai com espaço de contradições. O grande desafio que se coloca ao território é estar na vanguarda da modernidade (e tem exclentes condições para isso, a começar pelas imensas receitas estatais proveniente da indústria do jogo) sem perder a áurea do passado, aquela que se entranha na alma de quem visita Macau.
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