Das edições de 7 de Janeiro de 2017 dos jornais publicados em Portugal escolhi dois artigos que se referem a Macau a propósito da morte do ex-Presidente da República e que por inerência do cargo era quem nomeava o Governador de Macau.
Visita a Macau em 1995 |
No jornal Público, Luciano Alvarez assina o artigo "Os três momentos mais polémicos na vida de Soares", sendo o momento de Macau o segundo da lista.
"A vida de Mário Soares marcou a vida de Portugal. Uma vida rica em batalhas políticas e também em decisões e actos polémicos. O PÚBLICO elegeu três dos mais controversos do pós 25 de Abril de 1974 e que marcaram a vida fundador do PS. Decisões que lhe valeram inimigos para sempre; que quase “mataram” o soarismo e que terminou com sua mais pesada derrota de sempre. Três palavras: descolonização, Macau, Alegre. (...)
2. Macau, o maior abalo político do soarismo
Ficou conhecido como o “caso do fax de Macau” ou “caso Emaudio” e foi o episódio que mais beliscou a carreira política de Mário Soares. O caso remonta a factos ocorridos entre 1988 e 1989, cumpria Soares o seu primeiro mandato de Presidente da República. Contado de uma forma muito resumida: Em Abril de 1988, menos de um ano depois de Carlos Melancia ser empossado governador de Macau por Mário Soares, a empresa alemã Weidleplan manifestou interesse em ser consultora na construção do aeroporto local. No entanto, em Fevereiro do ano seguinte, Luís Vasconcelos, membro do Governo macaense, concessionou o contrato à Aeroportos de Paris.
Menos de um mês depois, a Weidleplan enviou ao governador de Macau um fax pedindo-lhe que devolvesse o dinheiro (50 mil contos, hoje cerca de 250 mil euros) alegadamente pago para garantir a vitória no concurso. Este fax acabaria por ser divulgado pelo semanário O Independente e a polémica que se seguiu acabaria por levar à demissão do governador e seguir para os tribunais.
Esses 50 mil contos serviriam para financiar a actividade da Emaudio, uma empresa pensada por Soares e gerida por socialistas da sua total confiança, que tinha como objectivo criar um grande grupo de comunicação social que serviria de base de apoio ao PS. O fax foi entregue a O Independente por Rui Mateus, amigo e conselheiro de Mario Soares e um dos administradores da Emaudio, que nessa altura já andava de candeias às avessas com Soares devido às contas da empresa. Mateus sempre afirmou que Soares sabia de tudo desde o primeiro minuto. O ex-presidente da República sempre negou ter conhecimento do alegado suborno, garantindo que só soube do caso e do fax quando ele foi publicado pelo O Independente.
Soares e Mateus cortaram relações e mais tarde (1996, já nos últimos meses do segundo mandato de Soares em Belém) o homem da Emaudio escreve o livro “Contos proibidos, memória de um PS desconhecido”, em que conta a sua história dos financiamentos do PS de Soares, com detalhe para o caso de Macau, em que mais uma envolve directamente o principal fundador do PS.
O assunto foi muito incómodo para Soares e para os socialistas que sempre fugiram a falar dele. Mas 20 anos depois da ocorrência dos factos, Almeida Santos, antigo presidente do PS que também esteve na Emaudio, acaba por desmentir Soares numa entrevista ao Expresso. “Mário Soares teve conhecimento prévio do Fax de Macau. Era uma situação complicada, punha problemas ao PS – ele tinha de ter conhecimento. Mas não tem culpas nisso. Eu sabia que o PS não tinha responsabilidades nisso, e Mário Soares muito menos”, afirmou.
Na sequência de um inquérito realizado em 1991, o Ministério Público acusou Melancia de ter recebido 50 mil contos de uma empresa alemã para influenciar um concurso relacionado com a construção do aeroporto de Macau, o que lhe valeu a acusação por corrupção passiva. O processo Melancia andou pelos tribunais, com recursos atrás de recursos, e só em Outubro de 2002 foi dado por encerrado pela Justiça. Melancia saiu absolvido, não ficando nunca provado que tenha sido subornado ou objecto de qualquer promessa de suborno.
Ficou conhecido como o “caso do fax de Macau” ou “caso Emaudio” e foi o episódio que mais beliscou a carreira política de Mário Soares. O caso remonta a factos ocorridos entre 1988 e 1989, cumpria Soares o seu primeiro mandato de Presidente da República. Contado de uma forma muito resumida: Em Abril de 1988, menos de um ano depois de Carlos Melancia ser empossado governador de Macau por Mário Soares, a empresa alemã Weidleplan manifestou interesse em ser consultora na construção do aeroporto local. No entanto, em Fevereiro do ano seguinte, Luís Vasconcelos, membro do Governo macaense, concessionou o contrato à Aeroportos de Paris.
Menos de um mês depois, a Weidleplan enviou ao governador de Macau um fax pedindo-lhe que devolvesse o dinheiro (50 mil contos, hoje cerca de 250 mil euros) alegadamente pago para garantir a vitória no concurso. Este fax acabaria por ser divulgado pelo semanário O Independente e a polémica que se seguiu acabaria por levar à demissão do governador e seguir para os tribunais.
Esses 50 mil contos serviriam para financiar a actividade da Emaudio, uma empresa pensada por Soares e gerida por socialistas da sua total confiança, que tinha como objectivo criar um grande grupo de comunicação social que serviria de base de apoio ao PS. O fax foi entregue a O Independente por Rui Mateus, amigo e conselheiro de Mario Soares e um dos administradores da Emaudio, que nessa altura já andava de candeias às avessas com Soares devido às contas da empresa. Mateus sempre afirmou que Soares sabia de tudo desde o primeiro minuto. O ex-presidente da República sempre negou ter conhecimento do alegado suborno, garantindo que só soube do caso e do fax quando ele foi publicado pelo O Independente.
Soares e Mateus cortaram relações e mais tarde (1996, já nos últimos meses do segundo mandato de Soares em Belém) o homem da Emaudio escreve o livro “Contos proibidos, memória de um PS desconhecido”, em que conta a sua história dos financiamentos do PS de Soares, com detalhe para o caso de Macau, em que mais uma envolve directamente o principal fundador do PS.
O assunto foi muito incómodo para Soares e para os socialistas que sempre fugiram a falar dele. Mas 20 anos depois da ocorrência dos factos, Almeida Santos, antigo presidente do PS que também esteve na Emaudio, acaba por desmentir Soares numa entrevista ao Expresso. “Mário Soares teve conhecimento prévio do Fax de Macau. Era uma situação complicada, punha problemas ao PS – ele tinha de ter conhecimento. Mas não tem culpas nisso. Eu sabia que o PS não tinha responsabilidades nisso, e Mário Soares muito menos”, afirmou.
Na sequência de um inquérito realizado em 1991, o Ministério Público acusou Melancia de ter recebido 50 mil contos de uma empresa alemã para influenciar um concurso relacionado com a construção do aeroporto de Macau, o que lhe valeu a acusação por corrupção passiva. O processo Melancia andou pelos tribunais, com recursos atrás de recursos, e só em Outubro de 2002 foi dado por encerrado pela Justiça. Melancia saiu absolvido, não ficando nunca provado que tenha sido subornado ou objecto de qualquer promessa de suborno.
No jornal I Ana Sá Lopes assina o artigo "Macau: o maior embaraço da vida política de Mário Soares".
O caso do fax de Macau e os negócios da Emaudio foram o elemento mais tóxico da vida política de Soares, usados na campanha da reeleição. O livro de Rui Mateus foi uma bomba. Macau é um mistério na vida de Mário Soares – e um assunto tabu, de que sempre odiou falar. As suspeitas de que o financiamento do PS – e das campanhas eleitorais para a Presidência da República – provinham da ‘árvore das patacas’ que caía daquele que foi território português até 1999, foram sempre constantes. Mas provas que ligassem o antigo Presidente da República a financiamentos ilegais provenientes de Macau nunca existiram.
Na biografia que escreveu sobre Mário Soares, Joaquim Vieira afirma que o então procurador-geral da República, Cunha Rodrigues, perguntou ao já falecido procurador Rodrigues Maximiano – que investigava o caso do fax de Macau – se haveria «elementos para se ouvir Mário Soares». Rodrigues Maximiano responderia que não.
Cunha Rodrigues em discurso direto: «Se ele me disse que não havia elementos para ouvir Mário Soares e não conhecendo eu o processo, naturalmente concordei com ele. Não tenho dúvidas que se ele tivesse encontrado elementos teria avançado. Eu só pedi ao dr. Rodrigues Maximiano que trabalhasse com urgência, dado que se aproximava um ato eleitoral [as presidenciais de janeiro de 1991]. A única coisa que fiz relativamente ao processo foi tratar de promover que se contactasse os alemães com prioridade e urgência».
O caso do fax de Macau leva à queda do Governador do território, Carlos Melancia, grande amigo de Mário Soares, acusado de corrupção – acabaria mais tarde por ser absolvido numa estranha decisão judicial onde foram condenados os corruptores mas não foram descobertos os corrompidos. Melancia é obrigado a demitir-se depois de uma reunião em Belém com o Presidente Soares. Manteve-se em silêncio até muito recentemente quando, numa entrevista para a biografia de Fernando Esteves sobre Jorge Coelho, O Todo-Poderoso, acusa Mário Soares de «traição». Soares sempre elogiaria Carlos Melancia e defenderia a inocência do antigo governador de Macau. Mas Melancia esperava uma manifestação de confiança do Presidente da República que nunca chegou.
Tudo começa – como conta Joaquim Vieira na biografia – quando «por sugestão de [Rui] Mateus, Strecht Monteiro levou os homens da Weidleplan [empresa alemã que se candidatou à construção do novo aeroporto de Macau] a enviarem por telefax a Melancia uma carta exigindo a devolução dos 50 mil contos antes doados à Emaudio, invocando um alegado incumprimento na celebração de um contrato relativo ao aeroporto de Macau. Na ausência de reação do governador e pressionado pelos alemães, Mateus resolveu então, em fevereiro de 1990, fazer o impensável: entregar uma cópia do fax ao semanário O Independente para divulgação pública». A divulgação acontece quando Soares já se encontra em pré-campanha para a reeleição. Aliás, o assunto vai ser tema de campanha quando o candidato do CDS Basílio Horta acusa Mário Soares de estar envolvido no escândalo. Basílio, num debate na televisão com Mário Soares, acusa-o de ser «o padrinho», no sentido mafioso. Soares escreverá mais tarde, na sua biografia política: «Basílio Horta (...) aproveitou os debates televisivos para atingir a minha idoneidade pessoal. Cortei relações com ele, porque uma tal acusação – feita a uma pessoa que se orgulha de ser impoluta, como eu – não se perdoa. Bastantes anos depois, pediu-me desculpa e fizemos as pazes».
Com Rui Mateus – fundador do PS e envolvido desde o início no escândalo do fax de Macau – nunca haverá pazes. Quando escreveu o livro, desaparecido dos escaparates das livrarias há anos, Contos Proibidos – Memórias de um PS desconhecido, Mateus (que foi durante anos o responsável do PS pelas relações internacionais) fez uma declaração de guerra a Mário Soares.
No livro, Rui Mateus acusa Soares de estar envolvido no fax de Macau e no financiamento da Emaudio – grupo de comunicação social ligado aos socialistas. «Recebemos instruções de Mário Soares para receber Strecht [Monteiro] e o dinheiro relativo ao aeroporto de Macau. Não estávamos autorizados a receber dinheiro sem ser por ordens de Soares. A Emaudio funcionava com dinheiros da sua campanha e os que ele e Almeida Santos arranjavam». Pouco depois da publicação do livro, Rui Mateus desaparece de circulação – nunca mais deu entrevistas. Vive fora do país.
Mário Soares acusará Mateus de vingar-se, ao escrever o livro, de lhe ter sido negado o cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros. Dirá Soares: «Mais grave foi, nessa altura, a ofensiva que fizeram contra mim, vinda da direita extrema, para me comprometerem com o caso da Emaudio (...) Na origem disso esteve um fundador do PS, de poucas letras mas que falava bem inglês, que conheci em Londres, onde era empregado num restaurante. Depois do 25 de abril regressou a Portugal ocupando-se do departamento internacional do PS. A ambição cegou-o. Pediu-me para ser ministro dos Negócios Estrangeiros. Disse-lhe que não era possível porque não tinha habilitações nem competência para tanto. Ficou ressentido comigo e chegou a escrever um livro – com a ajuda de quem? – que aliás nunca li e alimentou a intriga».
O caso do fax de Macau e os negócios da Emaudio foram o elemento mais tóxico da vida política de Soares, usados na campanha da reeleição. O livro de Rui Mateus foi uma bomba. Macau é um mistério na vida de Mário Soares – e um assunto tabu, de que sempre odiou falar. As suspeitas de que o financiamento do PS – e das campanhas eleitorais para a Presidência da República – provinham da ‘árvore das patacas’ que caía daquele que foi território português até 1999, foram sempre constantes. Mas provas que ligassem o antigo Presidente da República a financiamentos ilegais provenientes de Macau nunca existiram.
Na biografia que escreveu sobre Mário Soares, Joaquim Vieira afirma que o então procurador-geral da República, Cunha Rodrigues, perguntou ao já falecido procurador Rodrigues Maximiano – que investigava o caso do fax de Macau – se haveria «elementos para se ouvir Mário Soares». Rodrigues Maximiano responderia que não.
Cunha Rodrigues em discurso direto: «Se ele me disse que não havia elementos para ouvir Mário Soares e não conhecendo eu o processo, naturalmente concordei com ele. Não tenho dúvidas que se ele tivesse encontrado elementos teria avançado. Eu só pedi ao dr. Rodrigues Maximiano que trabalhasse com urgência, dado que se aproximava um ato eleitoral [as presidenciais de janeiro de 1991]. A única coisa que fiz relativamente ao processo foi tratar de promover que se contactasse os alemães com prioridade e urgência».
O caso do fax de Macau leva à queda do Governador do território, Carlos Melancia, grande amigo de Mário Soares, acusado de corrupção – acabaria mais tarde por ser absolvido numa estranha decisão judicial onde foram condenados os corruptores mas não foram descobertos os corrompidos. Melancia é obrigado a demitir-se depois de uma reunião em Belém com o Presidente Soares. Manteve-se em silêncio até muito recentemente quando, numa entrevista para a biografia de Fernando Esteves sobre Jorge Coelho, O Todo-Poderoso, acusa Mário Soares de «traição». Soares sempre elogiaria Carlos Melancia e defenderia a inocência do antigo governador de Macau. Mas Melancia esperava uma manifestação de confiança do Presidente da República que nunca chegou.
Tudo começa – como conta Joaquim Vieira na biografia – quando «por sugestão de [Rui] Mateus, Strecht Monteiro levou os homens da Weidleplan [empresa alemã que se candidatou à construção do novo aeroporto de Macau] a enviarem por telefax a Melancia uma carta exigindo a devolução dos 50 mil contos antes doados à Emaudio, invocando um alegado incumprimento na celebração de um contrato relativo ao aeroporto de Macau. Na ausência de reação do governador e pressionado pelos alemães, Mateus resolveu então, em fevereiro de 1990, fazer o impensável: entregar uma cópia do fax ao semanário O Independente para divulgação pública». A divulgação acontece quando Soares já se encontra em pré-campanha para a reeleição. Aliás, o assunto vai ser tema de campanha quando o candidato do CDS Basílio Horta acusa Mário Soares de estar envolvido no escândalo. Basílio, num debate na televisão com Mário Soares, acusa-o de ser «o padrinho», no sentido mafioso. Soares escreverá mais tarde, na sua biografia política: «Basílio Horta (...) aproveitou os debates televisivos para atingir a minha idoneidade pessoal. Cortei relações com ele, porque uma tal acusação – feita a uma pessoa que se orgulha de ser impoluta, como eu – não se perdoa. Bastantes anos depois, pediu-me desculpa e fizemos as pazes».
Com Rui Mateus – fundador do PS e envolvido desde o início no escândalo do fax de Macau – nunca haverá pazes. Quando escreveu o livro, desaparecido dos escaparates das livrarias há anos, Contos Proibidos – Memórias de um PS desconhecido, Mateus (que foi durante anos o responsável do PS pelas relações internacionais) fez uma declaração de guerra a Mário Soares.
No livro, Rui Mateus acusa Soares de estar envolvido no fax de Macau e no financiamento da Emaudio – grupo de comunicação social ligado aos socialistas. «Recebemos instruções de Mário Soares para receber Strecht [Monteiro] e o dinheiro relativo ao aeroporto de Macau. Não estávamos autorizados a receber dinheiro sem ser por ordens de Soares. A Emaudio funcionava com dinheiros da sua campanha e os que ele e Almeida Santos arranjavam». Pouco depois da publicação do livro, Rui Mateus desaparece de circulação – nunca mais deu entrevistas. Vive fora do país.
Mário Soares acusará Mateus de vingar-se, ao escrever o livro, de lhe ter sido negado o cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros. Dirá Soares: «Mais grave foi, nessa altura, a ofensiva que fizeram contra mim, vinda da direita extrema, para me comprometerem com o caso da Emaudio (...) Na origem disso esteve um fundador do PS, de poucas letras mas que falava bem inglês, que conheci em Londres, onde era empregado num restaurante. Depois do 25 de abril regressou a Portugal ocupando-se do departamento internacional do PS. A ambição cegou-o. Pediu-me para ser ministro dos Negócios Estrangeiros. Disse-lhe que não era possível porque não tinha habilitações nem competência para tanto. Ficou ressentido comigo e chegou a escrever um livro – com a ajuda de quem? – que aliás nunca li e alimentou a intriga».
Temos matéria para um filme dentro de alguns anos talvez!
ResponderEliminarjá passei por esse título do livro nos sites da net mas não fazia ideia do que se tratava! não sei se ainda estará por aí!
a vida às vezes também não é fácil para os políticos!
continuação de um bom ano :)
com histórias de Macau!