"The land of the blue gown" - tradução literal "A terra do vestido azul" - é o titulo de um livro com quase 400 páginas da autoria de John Little Archibald que viveu na China cerca de 50 anos. Editado em Londres em 1902 a obra é uma viagem à China da segunda metade do século 19, nomeadamente sobre usos e costumes do povo chinês, e inclui alguns relatos sobre Macau.
"An account of travels in China in the last part of the nineteenth century. Describes visits to Shanghai and Peking, Canton, Hong Kong, Macao, Swatow, Amoy, Hanchow, Foochow and Soochow. Included are accounts of missions and missionaries, anti-foreign riots in Western China and visits to little-known border tribes. The culture, customs and the people are recorded."
China 1894 Foto Sze-Yung-Ming & Co |
Impressionado com o potencial de negócios na China acaba por se fixar na província Sichuan. Aos 28 anos decide casar com uma britânica.
Alicia Bewicke (1845-1926) nascera na ilha da Madeira (Portugal) em 1845. Estudou depois em Inglaterra mas cansada de uma sociedade demasiado passiva, cedo dedicou-se à escrita.
Em 1887 chegou à China como noiva de Archibald Little passando a viver em Chungking (província de Szechuan), um feito raro na época para uma mulher ocidental. Passou a acompanhar o marido nas viagens pela China e tomou notas de tudo o que viu e ouviu para além de tirar fotografias.
Enquanto viveu na China, a Sra. Archibald, como viria a ficar conhecida, viria a envolver-se numa luta pela emancipação da mulher chinesa de uma tradição conhecida por "pés de lótus " um ritual que passava por amarrar os pés das mulheres jovens em amarras apertadas a fim de modificar o formato dos pés. Para o efeito criou uma associação em Xangai a que deu o nome de "Natural Feet Society" (Sociedade dos pés naturais). Empenhada nessa luta proferiu discursos por inúmeras cidades chinesas sendo um dos mais notáveis dado em Hong Kong em Fevereiro de 1900 tendo passado por Macau no mês seguinte.
O casal regressaria a Inglaterra em 1907 e um ano depois John morreu. Alicia continuou envolvida em múltiplas causas sociais, nomeadamente contra a escravatura branca. Morreu em 1926.
Excerto do livro que incluiu três imagens de Macau, duas delas tiradas após o tufão de Setembro de 1874.
Chapter XX - Part II
Through Macao, Swatow, Amoy, Foochow, Hangchow and Soochow
It is a little sad to have to own that anti-footbiiiding seems much farther advanced in languid, sunshiny Macao than in bustling Hong-Kong. Of course the Portuguese have been established there for centuries, and they mix with the people and inter-marry as we do not. It may be that which makes the difference. But some say a doctor, a leading member of the reform party, has made the change at Macao. There on the Praya, a miniature Bay of Naples, with the exceptionally romantic public gardens at one end and the Governor's palace at the other, the Portuguese band making music in the evenings, the waves lapping on the shore, mothers walking out with their children round them, as we never seem to see English mothers in the East, and young girls with their duennas, there in Macao several of the best European houses are occupied by Chinese, and in one, conspicuous with heavily-gilded railings, I was delighted to find that all the children were growing up unbound.
Mr Ho Sui Tin, the leading Chinese of Macao, and a Portuguese subject, not only arranged a Chinese meeting for me to address, but took me home to his house after-wards and assured me one of his little girls was about shortly to be unbound. But though they had every luxury in the way of costly and artistic furnishing, even to a billiard table, on which they said they played, it was sad to see the elder daughters with their bound feet. He had not however been a member of the Reform Doctor's Society. My interpreter had, and he seemed full of earnestness, when at a little Christian meeting, at which the enthusiasm of everyone impressed me very refreshingly, one of the first to join the society was a bound foot lady his wife who said, smiling, " If you will take my money, and accept my promise that I am going to unbind."
The secretary of the Portuguese Club, Signer d'Assompcao, was kind enough to organise a meeting there for all people, who understood English. A good many of the members, who did not, came in to listen at first, then gradually went away not quite noiselessly, and it was amusing next day to note the indignation of the Chinese portion of the audience: "The Portuguese might at least have kept quiet if they could not understand!" because the remark seemed to indicate the very different way in which the Chinese regard the Portuguese at Macao from the way in which the English are regarded at Hong-Kong. I must not however in passing forget to mention the great kindness of their then Governor Galhardo, even hampered as he was by the carnival a great affair at mediaeval Macao!
The exquisite views, the orange trumpet flowers of the bignonia, the merry children in carnival costume, the soft sunshine, the romance that attaches to Camoens garden and everywhere romantic accessories, all transport one to Europe, and make Macao a place quite by itself in China. I caunot help hoping also that it is one of the first places where footbinding will die out. The Roman Catholic Sisters appeared eager to bring this about, though as usual it was impossible even to ask them to combine for the purpose with Protestant missionaries.
The China Merchants' Company had granted me a free pass by all their steamers, the Hong-Kong, Canton Macao Company had been equally liberal, and now the Douglas Lapraik Line did likewise. I began to feel as if it were hardly right that hotels should charge me anything when steamer companies were so generous. But it was only at Canton and Macao that it was necessary to go to hotels. Everywhere else people most kindly entertained me for the Cause.
É um pouco triste ter que admitir que a luta contra os pés de lótus parece muito mais avançada na lânguida e ensolarada Macau do que na agitada Hong-Kong. Claro que os portugueses estão lá há séculos e eles misturam-se com o povo e casam-se. Ao contrário de nós. Pode ser isso que faz a diferença. Mas alguns dizem que um médico, um membro importante do partido reformista, fez a mudança em Macau.
Na Praia (Grande), uma baía em miniatura, de Nápoles, com os excepcionalmente românticos jardins públicos de um lado, e o palácio do governador do outro, a banda portuguesa toca música à noite, as ondas batendo na praia, mães caminhando com os filhos à volta, como nunca parecemos ver mães inglesas no Oriente, e raparigas com as suas duenas, ali em Macau várias das melhores casas europeias são ocupadas por chineses, e numa delas, conspícua com grades pesadamente douradas, fiquei encantado ao descobrir que todas as crianças estavam a crescer soltas.
O Sr. Ho Sui Tin, o principal chinês de Macau e súbdito português, não só deu-me a oportunidade dum encontro, como me deixou entrar na sua casa e garantiu-me que uma das suas filhas estava prestes a nascer. Embora tivessem todo o luxo na forma de móveis caros e artísticos, até mesmo uma mesa de bilhar, na qual disseram que jogavam, era triste ver as filhas mais velhas com os pés amarrados. Ele, no entanto, não tinha sido um membro da Sociedade do Doutor Reformado. O meu intérprete tinha, e parecia cheio de seriedade, quando numa pequena reunião cristã, na qual o entusiasmo de todos me impressionou de maneira muito animadora, uma das primeiras a se juntar à sociedade foi uma senhora de pés amarrados, sua esposa, que disse, a sorrir: “Se aceitarem o meu dinheiro e aceitarem a minha promessa de que vou desassociar.”
O secretário do Clube Português, Signatário, d'Assumpcao, teve a gentileza de organizar ali um encontro para todas as pessoas que entendiam inglês. (...) Não devo esquecer de mencionar a grande gentileza do governador Galhardo, ainda que atrapalhado, como estava, por tal acontecimento, em pleno Carnaval numa Macau medieval!
As vistas magníficas, as flores laranjas da trombeta da bignónia, as crianças alegres em trajes de carnaval, o sol suave, o romance que se liga ao jardim de Camões e os acessórios românticos por toda a parte, tudo nos transporta para a Europa fazendo de Macau um lugar único na China. Não posso deixar de esperar também que seja um dos primeiros lugares onde o enfaixamento de pés vai morrer. As Irmãs Católicas Romanas pareciam ansiosas para fazer isso, embora, como de costume, fosse impossível até mesmo pedir-lhes que se combinassem para esse propósito com os missionários protestantes. A empresa China Merchants Company havia me concedido um passe livre para poder viajar em todos os seus vapores, a Hong-Kong, Canton and Macao Company foi igualmente liberal, e até a Douglas Lapraik Line fazia o mesmo. Comecei a sentir como se não era correcto os hotéis cobrarem-me a estadia quando as companhias de vapor eram tão generosas. Mas só em Cantão e em Macau era necessário ficar em hotéis. Em todas as outras partes, as pessoas recebiam-me em casa, com muito carinho pela causa.
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