O quadro acima - da autoria do pintor chinês Youqua - foi vendido há pouco tempo num leilão por cerca de 30 mil euros. Faz parte do período conhecido como "China Trade" sendo a pintura apenas um dos vários produtos integrados nesta 'corrente'.
As dificuldades em identificar a autoria destas pinturas são de tal ordem que os dois quadros apresentados acima são iguais, mas algumas fontes não o atribuem a Youqua.
Em cima estamos perante uma aguarela também atribuída a Youqua.
Todos os quadros aqui apresentados têm uma característica comum: a baía da Praia Grande é vista de Sul para Norte uma perspectiva muito menos usada pelos pintores da época que recorriam mais à vista de Norte para Sul. Pintando no local ou tendo por base uma ilustração pode datar-se o quadro como sendo anterior a 1865 (ano da inauguração do Farol da Guia que não surge representado). Outro dos aspectos curiosos que notei foi o facto de não surgir na pintura o Fortim de S. Pedro, uma construção de meados do século 17.
Youqua (tal como Tingqua, Lamqua, Sungqua, etc...) está no pequeno lote de pintores chineses do período China Trade que deixou alguns dos trabalhos que fez assinados.
No activo entre 1830 e 1870, sabe-se muito pouco sobre quem foi Youqua. Começou por ter um estúdio/atelier no nº 34 da Old Street/Old China Street em Cantão.
Numa edição de 1835 do jornal "The Chinese Repository" refere-se a existência de 30 ateliers de pintores em Cantão.
O francês Jules Itier
(1802-1877) que andou pela China e por Macau em 1844 quando publicou o diário dessa viagem (em 1848) refere-se ao atelier de Youqua:
"Il y a, dans Old-China Street, un magasin des
plus renommés pour ses peintures à la gouache
sur papier dit de riz, comme pour les dessins aut
trait et les tableaux à l’huile qu’on y fabrique. Je
me sers de ce mot, parce que ‘est réelement une
fabrique que l’atelier du célèbre Yom-qua."
In 1856, Samuel Wells Williams no Chinese Commercial Guide refere existirem em Cantão "milhares de mãos" empenhadas na produção de pinturas para exportação.
"Pictures; oil paintings, rice paper pictures. There are many shops in Canton, Whampoa, and Hong Kong, where maps and charts are copied, and scenes in oil are made in large quantities, priced from $3 to $100 a piece; pictures and engravings are accurately copied, and some of the views and Chinese landscapes are well drawn. The paintings on pith paper are well known. (...) The copying of miniatures or engravings on ivory also forms a branch of industry of some importance; and the finer specimens of work of these artists are very beautiful. Outline designs in India ink, of the crafts and professions among the Chinese, are sold in books at a cheap price, and some of them are admirably designed. Of all these the number annually carried away is very great, and their manufacture furnishes employment to hundreds of workmen."
Alguns anos mais tarde, em 1862, encontramos nova referência a Youqua. Desta feita por Félix-Sébastien Feuillet de
Conches (1798-1887), diplomata, jornalista, escritos e coleccionadro de arte, no livro "Causeries d’un curieux:
"L’atelier de Joé-Koa, à Canton, est tout à fait
dans le meme style. Plusieurs centaines
d’ouvriers, plus qu’à-demis nus, à cause de la
chaleur, y travaillent sous la direction de
contremaîtres."
Por volta de 1845, o sucesso dos trabalhos do atelier de Youqua era de tal ordem que abre outro, no recém-criado território de Hong Kong, mais precisamente no nº 107 da Queens Road. Tal como os demais colegas de profissão, as cidades portuárias como Cantão, Hong Kong, Xangai, Amoy e Whampoa foram os cenários que Youqua mais pintou.
A assinatura de Youqua no verso de pinturas |
Peritos em pintura como Car Crossman em "The Decorative Arts of The China Trade" descrevem Youqua como "inquestionavelmente o melhor pintor deste período em grande escala" acrescentando que existiam igualmente outros muito competentes no último quartel do século 19. Certo é que durante várias décadas os estúdios/ateliers de Youqua, em Cantão e Hong Kong foram dos mais reputados e procurados.
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