A Gruta de Camões
No mesmo Annuario encontramos notas interessantes firmadas por Humberto de Avellar, relativas ao delicioso retiro em que o nosso épico haverá escrito parte do seu poema immortal. O ajardinamento do terreno em que se encontra a gruta foi feito pelos inglezes, que durante largo tempo tiveram feitoria em Macau, habitando a casa onde hoje está installada a Direcção de Obras Publicas, de que o jardim depende, um agente d'essa feitoria, quando da estada em Macau do embaixador inglez Lord Macactucy, como se vê d'esta passagem do relatório que da viagem do embaixador, feita de 1792 a 1794, escreveu Stameton: «E' certo que Camões residiu muito tempo em Macau.
A interessante gruta a que se deu o seu nome está situada no jardim de uma casa em que o embaixador e duas pessoas da sua comitiva residiram durante a sua permanência na ilha. Tinham sido convidados a alojar-se ali por um dos agentes da feitoria ingleza, que lá morava quando os seus negocios o não chamavam a Cantão. De Guignes, narrando as suas viagens ao Oriente, escreveu: «Os jardins em Macau são raros e pequenos; só um é grande e guarnecido de árvores: é o da chamada Casa do Horto, há muito tempo occupado por inglezes, que dispuzeram o terreno segundo o gosto do seu paiz.
Mostra-se n'este jardim um rochedo que se pretende ter servido de retiro ao célebre Camões, quando compunha os seus Lusíadas. Em 1815 já o jardim da gruta pertencia ao conselheiro Manuel Pereira, que o comprára e mandára «branquear o alpendre e enriquecer a respeitada e saudosa lápide de Camões - diz José Ignacio de Andrade - passando depois para seu genro, Lourenço Marques. Foi êste quem collocou na gruta o busto de Camões, de Bordallo Pinheiro, em 1861, para substituir um outro, detestável, tirado em greda, por chinas, do retrato de Camões que serve de frontispício á edição dos Lusíadas do padre Thomaz de Aquino, o qual, por sua vez tinha sido collocado para substituir outro que mãos impias tinham mutilado. O alpendre de que fala Andrade era uma espécie de mirante que o mau gosto dum inglez levára a construir sôbre os rochedos. Este exemplo fructificou quando a gruta passou a propriedade de portuguezes, que lhe fizeram portas e cancellas alterando completamente o aspecto do lugar.
Em 1885, foi o jardim vendido ao Governo, que destruiu todos os appendices que desfeavam e apoucavam a gruta, restituindo-a, se não á pureza primitiva, pelo menos a uma menor desr iguração. No pedestal de pedra que sustenta o busto estão gravadas, dum lado, as estancias XXIII do canto X, LXXIX e LXXX do canto VII, e do outro as estancias XCV do canto VI. XLII do canto VIII e LXXXI do canto VII. Gravadas no Granito em terno da gruta, lêem-se ainda: os tercetos á gruta Camões de Garrett: cinco quadras em latim de J. F. Davis, escriptas em 1835; um soneto em inglez de D. Bowring, datado de 30 de Julho de 1849; o soneto do Tasso a Vasco da Gama; duas quadras em hespanhol de D. Humberto Garcia de Quevedo, escriptas em 1889: outras duas de Francisco Maria Bordallo, datadas de 1851; e dez disticos de Luiz de Rienzi, de 30 de Março de 1827.
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