Albertino Dias de Almeida recorda no texto que se segue as origens da estátua de Jorge Álvares que existe em Macau.
"Como nós sabemos, encontram-se por esse mundo fora estátuas de grandes homens que levaram até às mais longínquas paragens os conhecimentos de outras civilizações, os benefícios das suas artes e ciências e a fé cristã, com o fim altruísta de fazer com que partilhassem desses bens temporais e espirituais, num admirável espírito de abnegação, que tantos e tantos portugueses levaram através do Mundo, onde ainda hoje o nome português é relembrado e respeitado. Faltava, assim, nestas paragens, pagar uma dívida de gratidão a um grande português – o primeiro a demandar a China no princípio do século XVI.
«Antes tarde do que nunca!» e, talvez por isso, o Governo da Metrópole achou que era tempo de prestar uma homenagem a Jorge Álvares, encarregando um escultor português de grande mérito, Euclides Vaz – irmão do meu antigo professor do Liceu de Macau, Cândido Vaz – de fazer a estátua do navegador.
Construída em mármore de lioz, com um pedestal em azulino de Sintra, a estátua chegou a Macau em Junho de 1954, a bordo do paquete português «Índia», propriedade da Companhia Nacional de Navegação. A fim de escolher o local mais apropriado para a sua colocação, o então governador de Macau, almirante Joaquim Marques Esparteiro, nomeou uma comissão para se pronunciar sobre o assunto.
A comissão apreciou a opinião do conhecido historiador e investigador, Jack Braga, o qual sugeriu que a estátua devia ser colocada no Miradouro da Estrada D. Maria II, voltada para o mar, pois ficaria de frente para a ilha Lin Tin, onde Jorge Álvares pisara pela primeira vez terra da China. Esta opinião, com muito peso histórico, foi, porém, desvalorizada por dois membros da comissão, nomeadamente, pelo director das Obras Públicas, José dos Santos Baptista e pelo reitor do Liceu de Macau, Pedro Guimarães Lobato, com o argumento de que o local não era o mais apropriado, não só por estar afastado do centro da cidade, como pelo facto da estátua ter sido construída em mármore de lioz e, naquele ponto, estar mais exposta às inclemências do tempo e a brincadeiras de mau gosto. Para ambos, a estátua devia ser erguida numa das praças da cidade. Falou-se também no Jardim de São Francisco, mas, examinados alguns esboços, chegaram à conclusão de que, devido à sua disposição, não se prestava para o fim em vista, sem grande prejuízo da sua estética, tornando-se oneroso o seu arranjo, pois seria necessário demolir a biblioteca chinesa que lá se encontra e construir outra no mesmo jardim.
Finalmente, Luís Gonzaga Gomes, conhecido historiador e escritor macaense, também membro da comissão, disse que, como as estátuas se destinam a ornamentar as praças de uma cidade, portanto, os centros, achava que um dos pontos mais centrais – passagem obrigatória de todas as pessoas que vivem ou visitam a cidade – era em frente do Palácio das Repartições Públicas, à Praia Grande, no começo da então Avenida Salazar.
A comissão submeteu à apreciação do governador os resultados a que chegou, tendo o mesmo dado o seguinte despacho: «Examinando as três hipóteses consideradas, reconhece-se que:
a) o Miradouro de D.Maria II, se bem que haja razões históricas a seu favor, tem o inconveniente de deixar a estátua à acção do tempo e dos homens, como friza a comissão;
b) o Jardim de S.Francisco, a ser usado, implicaria a mudança da biblioteca chinesa, com grande aumento de despesas;
c) na Praia Grande, em frente do Palácio das Repartições Públicas, evitam-se os inconvenientes apontados.
Por estas razões escolho este último local.»
Em cumprimento desse despacho, a estátua de Jorge Álvares foi erguida no local escolhido pelo governador, onde hoje, felizmente, ainda podemos contemplá-la, toda inteirinha, muito embora, em tempos idos, tivesse sido «abusada» – deceparam-lhe um braço – pelas diabruras importadas da Revolução Cultural da China, no ano de 1966. E onde está o problema?"
Junto ao Hotel Metrópole e o Solmar no início da década de 1980 |
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