“Não é raro que venham a Macau homens de ciência, geralmente comissionados por associações literárias ou científicas, no intuito de colher aqui elementos para estudos históricos ou de crítica. Os japoneses, os ingleses, os franceses, os americanos principalmente são os que se interessam mais por esses estudos.
É natural que Macau, que foi por muitos anos o único porto na China aberto aos estrangeiros, seja considerado como uma excelente fonte de informações para a história dos tempos mais antigos dos europeus no Extremo Oriente. Era por Macau que penetravam na China os embaixadores, os missionários, os negociantes, os exploradores. Em Macau foram impressos grande número de livros sobre a língua e a literatura chinesas, sobre os trabalhos das missões religiosas e políticas, sobre o movimento comercial, etc.
A igreja de S. Paulo ou o que resta dela, os conventos de Santa Clara e S. Francisco, as muralhas, as fortalezas, a Horta da Companhia e tantos outros edifícios religiosos, ou de importância militar, comercial e social no Extremo Oriente. Tudo o que eram relações de europeus ou americanos com a China, com o Japão, com as Filipinas, com Timor, com Sião e ainda em parte com a península de Malaca e com a Índia, partia de Macau ou aqui vinha ter.
Deve-se afigurar, pois, a todos os estudiosos de coisas antigas, Macau como uma mina em que os materiais desejados sejam porventura de extracção difícil, mas abundantes e ricos. É aqui terra de conventos, de frades e de freiras, terra de muitos homens e poucas mulheres, terra de aventureiros e de piratas, que inexaurível mina para romancistas! Pois, meus senhores, podia Dante ter escrito à entrada de Macau o ‘voi che entrate, lasciate ogni speranza’ – porque do muito, do muitíssimo que podia e devia haver, não há quase nada! Desapareceu quase tudo, e o que resta, está para aí abandonado.
Documentos escritos houve inúmeros; mas nunca se coligiram, nunca se seleccionaram, nunca se imprimiram, nunca se catalogaram, nunca se fez o devido caso deles. Andaram de armário para armário, de repartição para repartição, de mão para mão como coisas velhas, bolorentas, inúteis. Outros, o maior número, foram queimados ou comeram-nos os vermes ou levaram-nos os tufões. E hoje, se se quiser fazer a história de Macau em face dos documentos, é isso impossível, porque não existem.
Parece incrível, mas é verdade; uma colónia como Macau não tem história escrita – uma história completa. O Sr. Montalto de Jesus publicou há anos um volume em inglês que intitulou Historic Macao; esta obra, porém, conquanto útil e de merecimento, está longe de poder ser considerada como uma história desta colónia.
É natural que Macau, que foi por muitos anos o único porto na China aberto aos estrangeiros, seja considerado como uma excelente fonte de informações para a história dos tempos mais antigos dos europeus no Extremo Oriente. Era por Macau que penetravam na China os embaixadores, os missionários, os negociantes, os exploradores. Em Macau foram impressos grande número de livros sobre a língua e a literatura chinesas, sobre os trabalhos das missões religiosas e políticas, sobre o movimento comercial, etc.
A igreja de S. Paulo ou o que resta dela, os conventos de Santa Clara e S. Francisco, as muralhas, as fortalezas, a Horta da Companhia e tantos outros edifícios religiosos, ou de importância militar, comercial e social no Extremo Oriente. Tudo o que eram relações de europeus ou americanos com a China, com o Japão, com as Filipinas, com Timor, com Sião e ainda em parte com a península de Malaca e com a Índia, partia de Macau ou aqui vinha ter.
Deve-se afigurar, pois, a todos os estudiosos de coisas antigas, Macau como uma mina em que os materiais desejados sejam porventura de extracção difícil, mas abundantes e ricos. É aqui terra de conventos, de frades e de freiras, terra de muitos homens e poucas mulheres, terra de aventureiros e de piratas, que inexaurível mina para romancistas! Pois, meus senhores, podia Dante ter escrito à entrada de Macau o ‘voi che entrate, lasciate ogni speranza’ – porque do muito, do muitíssimo que podia e devia haver, não há quase nada! Desapareceu quase tudo, e o que resta, está para aí abandonado.
Documentos escritos houve inúmeros; mas nunca se coligiram, nunca se seleccionaram, nunca se imprimiram, nunca se catalogaram, nunca se fez o devido caso deles. Andaram de armário para armário, de repartição para repartição, de mão para mão como coisas velhas, bolorentas, inúteis. Outros, o maior número, foram queimados ou comeram-nos os vermes ou levaram-nos os tufões. E hoje, se se quiser fazer a história de Macau em face dos documentos, é isso impossível, porque não existem.
Parece incrível, mas é verdade; uma colónia como Macau não tem história escrita – uma história completa. O Sr. Montalto de Jesus publicou há anos um volume em inglês que intitulou Historic Macao; esta obra, porém, conquanto útil e de merecimento, está longe de poder ser considerada como uma história desta colónia.
O Leal Senado de Macau, instituição quase tão antiga como a colónia, e que tem sempre exercido um papel preponderante na vida local, nunca se lembrou de a mandar escrever. O facto não se justifica por falta de dinheiro, porque o Leal Senado tem-no tido bastante para isso. Não há muitos anos dispendeu alguns milhares de patacas para ocupar os lazeres de dois oficiais do exército sob o pretexto de levantarem uma (levantada) carta de Macau…
A Santa Casa da Misericórdia, outra instituição com séculos de existência, também não tem história escrita. Existem no seu cartório uns livros velhos de quase nenhuma importância; os que tinham valor desapareceram. Não consta, de resto, que alguma vez tentasse pôr em letra redonda o que tem sido e o que tem feito durante a sua longa existência esta instituição.
O Seminário, outra velha instituição, e o Bispado, não menos antigo, estão nas mesmas condições. Alguns documentos existem, velhos, poeirentos, meio comidos, por gavetas e armários; e é tudo. É uma pena; a desorganização entrou connosco e não vemos sinais de ressurgimento. E é ao mesmo tempo uma vergonha que estrangeiros venham aqui frequentemente em viagem de estudo e tenham de partir desapontados. Ainda há poucos dias isso aconteceu com um americano que aqui veio comissionado por uma associação científica de Washington.
Ainda se poderia fazer alguma coisa. Restam dos muitos que houve, vários maços de documentos no Leal Senado, na Santa Casa da Misericórdia, no Seminário, na Sé e em algumas repartições do Estado, que deveriam ser estudados, seleccionados, catalogados e imprimidos. Porque se não faz ao menos isso?
Dever-se-ia ir muito mais longe. Além desses manuscritos, há livros, opúsculos, revistas e outras publicações com notas interessantes para a história de Macau. Dever-se-iam coligir e, ao mesmo tempo, dever-se-ia organizar um índice desenvolvido com referência a tudo quanto a colecção contivesse sobre o assunto e merecesse interesse ou importância.
Era assim que um dia, juntos que fossem todos estes elementos, alguém poderia abalançar-se a escrever a história de Macau. Não é de esperar que a iniciativa particular se lance em semelhante empresa; tudo isso exige muito tempo, muito estudo, muito trabalho, muitas despesas. Deverá o Estado, sendo como é o assunto de interesse público, empreendê-lo, incumbindo pessoa ou pessoas competentes de o levar a termo; e só assim julgamos que é possível dar-lhe boa solução.”
A Santa Casa da Misericórdia, outra instituição com séculos de existência, também não tem história escrita. Existem no seu cartório uns livros velhos de quase nenhuma importância; os que tinham valor desapareceram. Não consta, de resto, que alguma vez tentasse pôr em letra redonda o que tem sido e o que tem feito durante a sua longa existência esta instituição.
O Seminário, outra velha instituição, e o Bispado, não menos antigo, estão nas mesmas condições. Alguns documentos existem, velhos, poeirentos, meio comidos, por gavetas e armários; e é tudo. É uma pena; a desorganização entrou connosco e não vemos sinais de ressurgimento. E é ao mesmo tempo uma vergonha que estrangeiros venham aqui frequentemente em viagem de estudo e tenham de partir desapontados. Ainda há poucos dias isso aconteceu com um americano que aqui veio comissionado por uma associação científica de Washington.
Ainda se poderia fazer alguma coisa. Restam dos muitos que houve, vários maços de documentos no Leal Senado, na Santa Casa da Misericórdia, no Seminário, na Sé e em algumas repartições do Estado, que deveriam ser estudados, seleccionados, catalogados e imprimidos. Porque se não faz ao menos isso?
Dever-se-ia ir muito mais longe. Além desses manuscritos, há livros, opúsculos, revistas e outras publicações com notas interessantes para a história de Macau. Dever-se-iam coligir e, ao mesmo tempo, dever-se-ia organizar um índice desenvolvido com referência a tudo quanto a colecção contivesse sobre o assunto e merecesse interesse ou importância.
Era assim que um dia, juntos que fossem todos estes elementos, alguém poderia abalançar-se a escrever a história de Macau. Não é de esperar que a iniciativa particular se lance em semelhante empresa; tudo isso exige muito tempo, muito estudo, muito trabalho, muitas despesas. Deverá o Estado, sendo como é o assunto de interesse público, empreendê-lo, incumbindo pessoa ou pessoas competentes de o levar a termo; e só assim julgamos que é possível dar-lhe boa solução.”
Artigo da autoria de Manuel da Silva Mendes publicado no jornal O Progresso 6.6.1915
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