segunda-feira, 30 de maio de 2016

"A Mãe", de Rodrigo Leal de Carvalho

A propósito da recente passagem do autor pela Feira do Livro de Lisboa (vive nos Açores desde 1999), seleccionei para este post o romance A Mãe", a sexta obra da autoria de Rodrigo Leal de Carvalho (RLC), magistrado que começou por residir em Macau a partir de 1959. Aqui, tal como noutras romances do autor, a história baseia-se em factos verídicos contados por "Gabi Andrade Borges" e diz respeito ao período post guerra do Pacífico.
Em "A Mãe" RLC conta a história de Natasha Korbachenko, nascida na Sibéria mas que por causa da revolução bolchevique (1917) refugia-se em Xangai (imagem acima no final da década de 1930). Com o eclodir da 2ª guerra sino-japonesa e a invasão nipónica da "Paris do Oriente", Natasha e a família voltam a ter de fugir. Desta vez rumo a Macau, território que entre 1937 e 1945 acolheu milhares de refugiados da china e de Hong Kong.
"O Hisaku Maru ficou ancorado na Rada, ao largo do Porto Exterior, porque o assoreamento do porto Interior não permitia a entrada de navios daquele calado.  Os refugiados debruçavam-se na amurada, as parcas bagagens à sua volta, e fitavam entre curiosos e atemorizados, o distante perfil do porto de paz e da esperança, as verdes colinas da guia com o seu farol - o que primeiro brilhou nas costas da China - recortado a branco no azul de um céu límpido e frio, a do Monte encimada pela mole escura da fortaleza seiscentista, e, na extremidade da península, a da Penha/Barra coroada por uma deliciosa igrejinha banca mais peninsular que oriental, ligadas por uma grande enseada, baixa, fimbriada de banyan trees, velhas e frondosas, por onde espreitavam as casas apalaçadas da gente bem da Colónia."
 
A foto é real e da década de 1940 em Macau mas não retrata Natasha

RLC formou-se em Direito na Universidade de Lisboa, entre 1951-1956, após o que foi para a Ilha do Pico como delegado-interino. Posteriormente foi para S. Tomé e Príncipe. Depois de África seguiu-se o Oriente, tendo passado a residir em Macau a partir de 1959. Pouco tempo depois, em 1963, foi promovido a juiz e retornou a África. Foi a vez da Guiné. Voltou a Macau em 1966, para de novo abalar rumo a África, desta vez em 1971, primeiro para Angola e depois para Moçambique. Voltou a Lisboa e, em 1976, de novo faz as malas e ruma a Macau, para desta vez se fixar até hoje (1997). Neste Território foi procurador da República, posteriormente com a designação de procurador geral adjunto. Em 1995 foi nomeado juiz conselheiro do supremo tribunal de justiça. E encontra-se em comissão de serviço como presidente do Tribunal de Contas de Macau desde 1996.
Rodrigo Leal de Carvalho fez a sua estreia literária apenas na década de noventa, tendo sido, a partir daí, muito frutuoso o seu labor literário. No seu primeiro romance, intitulado Requiem por Irina Ostrakoff (1993), mostra, desde logo, as suas potencialidades como escritor. Tendo como pano de fundo Macau, tece uma narrativa de grande intensidade dramática, tendo como personagem principal uma cidadã russa, de origens fidalgas, que se havia refugiado em Macau no princípio deste século. Seguiu-se o romance Os Construtores do Império (1994), texto que veio a confirmar as suas qualidades de ficcionista. Paralelamente à trama romanesca, configuram-se neste seu romance um conjunto de quadros sociais, políticos e humanos que, de forma expressiva, nos apresentam situações que se ligam à diáspora portuguesa dos anos 50 e 60 do nosso século. Seguiram-se mais dois títulos: A IV Cruzada (1996) e Ao Serviço de Sua Majestade (1996). Em ambos o escritor evidencia o que já havia marcado os seus primeiros textos. Trata-se da sua capacidade narrativa e do seu vigor criativo, cujo discurso é caracterizado por uma grande frescura e no qual perpassa uma fina ironia.
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. VI, Lisboa, 1999

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