sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Abrigos subterrâneos da Colina da Guia


A Fortaleza do Monte da Guia tem um formato trapezoidal e fica a cerca de 90 metros acima do nível do mar (o ponto mais elevado do Território). A sua construção foi concluída em 1622 tendo sido ampliada em 1638. Ocupa uma área de 800 metros quadrados e no seu interior tinha, em termos militares: quartel, paiol, torre de vigia e cisterna… e ainda a Capela de Nossa Senhora da Guia, erguida por volta de 1622, e o Farol da Guia, o primeiro farol do Extremo Oriente, construído em 1865. No monte onde está implantada a fortaleza existe uma rede de três túneis subterrâneos que, à época da Segunda Guerra Mundial, tinham a função de proteger a guarnição dos ataques aéreos. Serviam também de instalações militares com os seus próprios geradores de energia eléctrica, salas de descanso e depósitos de combustíveis e de mantimentos. O túnel mais comprido (complexo C) tem 456 metros e o mais curto (complexo A) cerca de 50 metros, atravessando a colina de Sul a Norte. O Complexo B tem 207 metros de extensão servia de armazém e tinha vigias viradas para o mar.
 

Foto de Carlos Garcia. década 1980
Desde 1975 (ano da partida da guarnição militar portuguesa) parte destes túneis foram abertos ao público, uma vez que a área deixou de ser classificada como zona de reserva militar. Até então, só no dia 25 de Agosto (dia de "Dedicação da Basílica de Santa Maria Maior") e no dia do Culto dos Antepassados (ou também chamada, em chinês, de "Chong Yeong") é que era permitido a entrada de fiéis para a Capela, dedicada a Nossa Senhora da Guia. Na Cronologia da História de Macau (de Beatriz Basto da Silva) informa-se (com base num livro de A. Cação) que a 6 de Janeiro de 1913 teve início a "construção de um abrigo e bateria na Colina da Guia. Já antes tinha havido e depois voltaram a ser construídos abrigos, subterrâneos e baterias . Às duas primeiras foi dado o nome de «5 de Outubro» que depois passou a «Almirante Gago Coutinho e Sacadura Cabral» sem perder o nome inicial, por ocasião da viagem aérea ao Brasil." O facto é assinalado pela revista “Illustração Portuguesa” na edição de 12 de Janeiro de 1914 onde é publicada uma imagem com a seguinte legenda: “A companhia europeia de artilharia depois do transporte d´um canhão do Fortim da Bahia para o abrigo da colina da «Guia» sob a direcção do tenente d´artilharia sr. Farinha e Relvas no que foram empregados apenas 37 homens.”
Este fortim da Bahia era nada mais nada menos que o fortim de S. Pedro (ficava junto ao Palácio do Governo e foi demolido em 1934). A peça de artilharia foi pois transferida para a Guia onde tinham sido construídas duas posições para a artilharia que constituíram a “Bateria 5 de Outubro”, na época do início da República e em virtude da grande agitação que passava pela China. Esta bateria ficava na parte superior da colina mais próxima do Hoi-fu, tendo um pequeno túnel de ligação (que poderá ser de data posterior). 
Voltando aos túneis ou abrigos subterrâneos importa referir que se estendem em várias direcções e apesar de não estabeleceram uma ligação entre si, estão dispostos de forma a darem acesso às baterias, à fortaleza e ao então quartel.  Dos três subterrâneos, o situado por baixo do farol é o mais fácil de encontrar. É também o menos extenso e de menor desnível, atravessando a colina de Sul a Norte. À entrada, está (ainda) gravado na parede de cimento a inscrição “1931”, ano da sua construção que foi coordenada por um militar (alferes) português de apelido Cunha. Na Cronologia da História de Macau pode ler-se: “Em 1931, sob a supervisão do alferes militar português, de apelido Cunha, foram realizadas as construções de subterrâneos de grande envergadura no sopé da colina da Guia e da colina da Penha. Após o termo das obras, foram colocadas nos subterrâneos canhões de 12 e 15.5 polegadas”. Existiram ainda três canhões costeiros, com calibre de 6 polegadas e outros dois, com um calibre 4,7 polegadas. Os abrigos antiaéreos eram equipados com gerador, sala de descanso, tanque de combustível, orifícios para armas de fogo virados ao mar, bem com um elevador que dá para a bateria próxima do farol.
Na altura, a zona circundante aos subterrâneos era considerada área militar de acesso restrito existindo ao seu redor vedações de arame com a inscrição “Zona de restrição militar”. Em 1962, as tropas retiraram-se dos subterrâneos e nos meados da década de oitenta as vedações de arame foram retiradas, permitindo o acesso aos visitantes. 
O cimento necessário para a construção deve ter sido fornecido pela “Fábrica de cimento da Ilha Verde” (criada em 1887).
Vem tudo isto a propósito do facto dos túneis, cuja salvaguarda está a cargo do IACM, poderem ser visitados. O Complexo A, todos os dias (excepto à segunda-feira) entre as 10 e as 17 horas e o Complexo B, apenas ao fim de semana, entre as 15 e as 17 horas.
  
PS: Existiram túneis subterrâneos/abrigos semelhantes a estes junto às Portas do Cerco e na Colina da Penha.

5 comentários:

  1. Muito interessante.
    Desconhecia completamente.
    Obrigado João por nos estares sempre a dar informação de qualidade.

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  2. Já tinha lido alguma coisa sobre os subterrâneos,mas sem estes pormenores interessantes. Gostei.

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  3. Já agora aproveito para colocar uma questão. Tens conhecimento da existência de trincheiras à volta da Fortaleza do Monte (penso que é esse o nome, a fortaleza perto (?) das Ruínas de S.Paulo). Sei que agora está tudo ajardinado.

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  4. Tenho de pesquisar, mas admito que sim, tendo em conta que a Fortaleza do Monte foi construída com fins militares. O que tinha de certeza era túneis lá dentro...

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