João Casimiro Namorado de Aguiar, nascido a 28 de Outubro de 1943, em Moçambique, escreveu mais de duas dezenas de romances e criou duas séries de televisão destinadas ao público mais jovem - Sebastião e os Mundos Secretos” e o “Bando dos Quatro”, no qual ele próprio figura na personagem do Tio João. É considerado o escritor português que mais divulgou Macau, através de uma trilogia ambientada na cidade – “Os Comedores de Pérolas” (1992), “O Dragão de Fumo” (1998) e “A Catedral Verde” (2000). Morreu ontem, em Lisboa, aos 66 anos, vítima de cancro.
Viveu a infância entre Lisboa, a cidade natal, e a Beira, em Moçambique. A mãe ensinou-o a ler para mantê-lo sossegado na cama, durante um longo período de doença, e de leitor interessado passou rapidamente a aspirante a escritor. Aos oito anos, tentou ditar um livro de aventuras à irmã Maria João mas o sentido crítico dela arrasou-lhe as pretensões.
Insistiu com novas obras que foi deitando para o lixo e teve mesmo um “primeiro” livro que só não viu a luz do dia porque a editora faliu antes. Só depois dos 40 anos publicou o primeiro romance, na Perspectivas & Realidades de João Soares: “A Voz dos Deuses”, uma ficção histórica centrada na figura de Viriato.
Depois das tentativas de infância, o que o motivou a voltar a escrever foi o chefe de vendas de uma a onde trabalhou que esteve a chateá-lo permanentemente durante dois anos. “Como não era rico, nem casado, fui cedendo. Mas depois não aguentei e tive de arranjar tempo para o público e assim passei a viver da escrita”. Quando começou a escrever, impôs a si próprio duas regras – não chatear o leitor e usar uma certa subversão.
Seguiram-se duas dezenas de romances que o levaram a estudar a história mais remota de Portugal - regressou aos primórdios para falar de Sertório e publicou até um trabalho não ficcionado sobre o menino do Lapedo.
Viajou para Macau para lançar mãos a três ficções. Escreveu 11 romances que foram traduzidos e publicados na Bulgária, Itália, França e Espanha. Pelo meio, João Aguiar criou duas séries destinadas ao público mais jovem - “Sebastião e os Mundos Secretos” e o “Bando dos Quatro” e fez também o libreto para a ópera “A Orquídea Branca” de Jorge Salgueiro, estreada em 2008.
Rogério Beltrão Coelho, da editora Livros do Oriente, que lançou duas obras do autor, considera que João Aguiar tem um percurso literário que fica irremediavelmente ligado a Macau. “Estamos a falar de livros que além de inúmeras edições foram traduzidos para várias línguas”, sublinhou. Além de uma edição local de “O Dragão de Fumo”, a Livros do Oriente editou outro livro de João Aguiar sobre Macau: “O Tigre Sentado”, que nasceu em fascículos semanais nas páginas do jornal Ponto Final ao longo de 2004, quando se assinalaram os cinco anos da transferência de poderes de Portugal para a China.
Beltrão Coelho, amigo de João Aguiar e um dos “responsáveis” pela primeira visita do autor a Macau no final dos anos de 1980, recorda que “O Tigre Sentado” foi depois editado em Fevereiro de 2005, uma ocasião para João Aguiar regressar ao território, que visitou diversas vezes.
João Aguiar frequentou em Lisboa os cursos superiores de Direito e Filosofia mas foi em Bruxelas que se licenciou em Jornalismo, profissão que entretanto tinha começado a exercer. Na Bélgica, fez um pouco de tudo, desde lavar escadas a trabalhar no Turismo de Portugal. De regresso a Portugal, fez o serviço militar e uma comissão em Angola no sector da acção psicológica, produzindo rádio para as tropas. Considerou-se sempre jornalista, mesmo passados largos anos desde que abandonara a actividade profissional. Começou pela RTP - onde também coordenou uma série da “Rua Sésamo” - e passou depois
por jornais como “Diário de Notícias”, “A Luta”, “O País”. Fez rádio no Canadá, onde trabalhou com Henrique Mendes. Dizia-se um “monárquico não tradicionalista”, justificava-o “por uma questão pragmática”. O último romance que publicou - “O Priorado do Cifrão” - era uma “charge” ao mundo criado por Dan Brown.
Numa autobiografia irónica que escreveu para o “Jornal de Letras” em 2005, João Aguiar concluía: “A minha vida não dava um livro, e ainda bem. Em compensação, o facto de os meus livros darem uma vida - boa ou má, não importa para o caso - , esse facto devo-o, em grande parte, aos momentos de não-glória que acabo de relatar. E estou-lhes muito grato.”
A notícia da sua morte deixou o mundo da literatura portuguesa consternado. Isabel Alçada, ministra da Educação e também escritora, diz estar “muito consternada, porque o João Aguiar era um amigo pessoal, um companheiro da escrita para crianças”. “É um autor muito querido das nossas crianças e jovens, porque tinha livros para várias idades, recomendados pelo Plano Nacional de Leitura. E a perda de uma figura que tem um relevo enorme no nosso panorama da literatura infantil deixa-nos a todos, autores de literatura para crianças, muito consternados”, sublinha Isabel Alçada.
A notícia da sua morte deixou o mundo da literatura portuguesa consternado. Isabel Alçada, ministra da Educação e também escritora, diz estar “muito consternada, porque o João Aguiar era um amigo pessoal, um companheiro da escrita para crianças”. “É um autor muito querido das nossas crianças e jovens, porque tinha livros para várias idades, recomendados pelo Plano Nacional de Leitura. E a perda de uma figura que tem um relevo enorme no nosso panorama da literatura infantil deixa-nos a todos, autores de literatura para crianças, muito consternados”, sublinha Isabel Alçada.
Também Ana Maria Magalhães foi apanhada de surpresa pela notícia da morte do Tio João da série juvenil “O Bando dos Quatro”. A escritora diz que é uma perda enorme e destaca o romance histórico do autor, publicado em 1984. “Não convivemos muito, mas conheci-o quando publicou a ‘Voz dos Deuses’, que gostei imensíssimo”, relembra Ana Maria Magalhães. O último livro foi publicado em 2008, com o título “O Priorado do Cifrão”. Estava agora a preparar um livro sobre a revolta popular de 1383, que colocou no poder o Mestre de Avis, obra que não chegou a ser concluída.
in Hoje Macau, 4 de Junho de 2010
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