A propósito do ano novo chinês que se aproxima - dedicado ao dragão - recordo o Glossário do Dialecto Macaense – notas linguísticas, etnográficas e folclóricas (Macau, Instituto Cultural de Macau, 1988), de Graciete Nogueira e o termo "panchão".
Poderá tratar-se de um neologismo formado a partir do termo chinês Bianpao (cartucho de pólvora revestido por papel). No dicionário Houaiss a palavra "panchão" é definida como termo da pirotecnia e regionalismo de Macau, com o significado de «foguete chinês queimado nas festividades, esp. no Ano-Novo Lunar»; diz ainda que vem do «chinês» 'pau-tcheong'.
O referido dicionário atribui a primeira atestação do termo ao orientalista Monsenhor Sebastião Rodolfo Dalgado, que o incluiu no Glossário Luso-Asiático (1919-1921).
Em suma, um panchão é um cartucho de pólvora revestido por papel vermelho. Na China é tradicionalmente queimado para cumprir um dos rituais do Ano Novo chinês. De acordo com a lenda, a queima dos panchões, cujo rebentamento produz um ruído ensurdecedor, destina-se a afugentar um animal sobrenatural que mata pessoas e gado no fim do ano.
Uma particularidade pouco notada é o facto dos panchões serem acesos com um pivete / pau de incenso, idêntico aos que são queimados nos templos ou à porta das casas, e não com um isqueiro ou fósforo.
Antigamente a queima de panchões era permitida em qualquer parte da cidade de Macau. Houve no entanto excepções, como no período relacionado com os eventos do 1,2,3 em 1966. Há várias décadas que a situação se alterou. Nos primerios anos do século XX já existia regulamentação específica e, mesmo antes, na zona do bazar foi proíbida a sua queima devido aos inúmeros incêndios que ali deflagravam. Dado o forte enraízamento cutlural deste ritual, a proibição era a maior parte das vezes ignorada.
A falta de regras de segurança no fabrico deste tipo de material provocou inúmeros acidentes e explosões ao longo da história. Algumas das mais conhecidas, para além das ocorridas no século XIX, são as das décadas de 1930 e 1950. Os estandais de panchões a secar na rua são uma das marcas das fotografias de Macau de todo o século XX. Na Taipa, junto à Porta do Cerco ou no terreiro frente ao templo de A-Ma.
Só no final do séc. XX a situação melhorou substancialmente. As zonas de comércio e de rebentamento passaram a estar separadas, por exemplo. Tudo isto porque um dos grandes pilares da economia local foi, durante largas décadas, o fabrico de fósforos, pivetes, panchões, etc...
Na imagem a queima de uma panchão no final da década de 1960 no Largo do Senado.
Na imagem uma das marcas - pato - da mais conhecida fábrica de Macau que ficava na Taipa (ainda existe o edifício), a Yec Long na rua Miguel Aires, nº 14. Atente-se no alerta "Não conservar os panchões acesos na mão". Para a década de 1960 pode-se considerar uma inovação em termos de segurança e preocupação com os consumidores.
NA: clic nas imagens para ver em tamanho maior.
Sem comentários:
Enviar um comentário