quinta-feira, 19 de março de 2015

"Vendilhões": Fotografias de Carlos Alberto dos Santos Nunes (2ª parte)

(...) Não faltam os vendedores dos diversos lèong-tch´á (chás refrigerantes e diuréticos), dos tái-tch´ói-kou (gelatinas), uns encarnados feitos com essências de rosas outros amarelados feitos com açucar-cândi, todos triangularmente cortados.
Porém, para o gosto dos Chineses, nada rivaliza ao seu lèong-fán, de cor negra e que se apresenta em grande bloco por ter tomado o feitio do alguidar em que foi preparado. (...)
Como a população duma cidade não necessita somente de comestíveis, circulam também pelas ruas da cidade os mái-fá-pou com vários cortes de fazendas e de garridos estampados, nos seus enormes e chatos cestos; os mái-tch´áu que levam ao ombro grandes fardos de vários rolos de seda, embrulhados em forte pano cru; as bibliotecas volantes com esfarrapadas novelas e livros de canções, para alugar, etc.
Entretanto, porque as donas de casa precisam sempre de adquirir peças isoladas de baixela que, por serem feitas de frágil porcelana, se partem constantemente, à hora certa, passará pelas suas portas o pó-lêi-pui com completo sortimento de copinhos, taças de porcelana, pires, colherinhas e tudo quanto é possível fazer-se em cerâmica.
Em Macau, porém, chamam impropriamente de pó-lêi-pui aos homens que vendem botões, linhas de coser, sabonetes, rede para o cabelo, molas para a roupa, baralhos de cartas, naftalinas e a mais disparatada mistura de objectos (...).
Temos assim, os vendedores de fogões e de panelas de barro; os homens dos iáu-tchi-sin (leques de papel oleado) e k´uâi-sin (leques feitos de folhas de palmeira, isto é, se for no Verão); os im-máu-lou (castradores de gatos); os vendedores de ovos; de galinhas, com os papos cheios de areia para ganharem mais peso; de achares e de diversas gulodices.
No entanto, os pregões mais familiares são dos que vociferam incomodamente sáu-tchêng t´áng-i (consertam-se cadeiras de verga) e (...) sâu-tchên-kuâi-só, tchên-t´óng-kau (consertam-se fechos e arranjam-se visagras de cobre); pôu-uók (remendam-se caçarolas); mó káu tchín (amolam-se tesouras e facas); hón-t´ông, hón-sèak (soldam-se objectos de cobre), etc. (...)
Os tin-tins passam, então, a toda a hora, batendo desalmadamente com um prego os discos de metal (...).
Juntam-se a estes pregoeiros, os cegos que agitam «slacslacqueando» várias varetas, num cilindro de bambu, e que por insignificante quantia, se prestam a revelar, por meio da sua rabdomântica ciência, os segredos daqueles que vivem inquietos com o futuro.
De vez em quando aparece também quem venda o môk-sât-kuân (pauzinhos para percevejos), (...) ao anoitecer, aparecem diversos vendilhões com as suas canastras carregadas de ostras, camarões, caranguejos frescos e peixes para os gatos, bem como os que vendem petróleo e azeite. 
Mas o pregão mais característico é sem dúvida o do siu-áp-lou (homem que vende pato assado) (...).
As mulheres chinesas não desgostam de se entreter jogando o má-tchèok (...) e, como este passatempo costuma estender-se até altas horas da noite, lá aparece o homem de mou-ü tch´á kai-Tán (chá mou-ü com ovo cozido); háng ián-tch´á (chá de amêndoas) e os empregados das casas de pasto a apregoarem a ementa da noite para receberem as encomendas da ceia.
Os residentes mais modestos satisfazem-se com o uán-t ´ân-min, a conhecida sopa de fitas, cujo segredo de preparação Marco Polo não descurou de levar para a Europa (...), foi assim que o min veio originar os macarrões (...). Os uán-t´ân, ou sejam os camarões embrulhados com a mesma massa do min, gozaram também de grande popularidade em Veneza e, com o tempo, foram transformados nos deliciosos ravióis. 
in Chinesices de Luís Gonzaga Gomes

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