Já muito foi dito e escrito sobre o Clube Lusitano de Hong Kong. No entanto não gostaria que passasse despercebido o 150º aniversário desta instituição - em 2016 - que cala fundo no coração dos macaenses e tem uma marca indelével na história de Hong Kong. Por isso mesmo resolvi fazê-lo com recurso a uma breve resenha histórica - que não esgota o tema - juntamente com algumas curiosidades e várias imagens.
Hong Kong ‘nasce’ da derrota chinesa na chamada primeira guerra do ópio (1839-1842) sendo a ilha uma das concessões feitas pela China ao império britânico por via da derrota no conflito. A primeira grande vaga de emigração macaense para o outro lado do Delta do Rio das Pérolas começa por esta altura acentuando-se após o assassinato do governador Ferreira do Amaral em 1849. Serão pois os portugueses/macaenses oriundos de Macau os primeiros habitantes do território a uma distância de pouco mais de 60 quilómetros e cedo forma uma das comunidades estrangeiras mais importantes.
Hong Kong ‘nasce’ da derrota chinesa na chamada primeira guerra do ópio (1839-1842) sendo a ilha uma das concessões feitas pela China ao império britânico por via da derrota no conflito. A primeira grande vaga de emigração macaense para o outro lado do Delta do Rio das Pérolas começa por esta altura acentuando-se após o assassinato do governador Ferreira do Amaral em 1849. Serão pois os portugueses/macaenses oriundos de Macau os primeiros habitantes do território a uma distância de pouco mais de 60 quilómetros e cedo forma uma das comunidades estrangeiras mais importantes.
Fundado a 17 de Dezembro de 1866, o Clube Lusitano nasceu da vontade de um grupo de portugueses e macaenses que trabalhavam para a administração pública de Hong Kong, então colónia britânica forjada após a Guerra do ópio, vizinha de Macau, de onde eram oriundos. Desse grupo, tiveram destacaram-se as iniciativas de J. A. Barretto e Delfino Noronha de quem partiu a ideia de criar uma agremiação que representasse a comunidade. Na altura já estavam em actividade outras duas associações com fins semelhantes: o Clube Venatório e o Club de Recreio. A ideia de criar uma nova colectividade seria apadrinhada em Macau pelo governador Coelho do Amaral, que no dia 17 de Dezembro de 1866 o inaugura na companhia de um representante do seu homólogo de Hong Kong.
A 1 de Janeiro de 1866 no Boletim Oficial do Governo de Macau podia ler-se: "No dia 26 de dezembro ultimo foi S Exa o Governador a Hong kong presidir á festa solemne da collocação da primeira pedra do edificio que ali se vae erigir para um club portuguez com o titulo de Club Lusitano. Sua Exa o governador foi de Macau acompanhado pelo seu estado maior e foi recebido em Hongkong pelos cavalheiros da commissão directora do referido club estando no caes para o mesmo fim o general das forças britannicas em Hongkong e uma guarda de honra de infantaria salvando se ao desembarque de S Exa com a salva que lhe competia. A festa a que assistiram todos os principaes funcionários ingle zes e a maioria dos portuguezes residentes na colónia correu sumptuosa e brilhante. S Exa o governador partiu de Hongkong penhorado por tantas attenções de consideração como as que recebeu na curta demora que teve n aquella cidade. Depois da ceremonia que correu com as devidas formalidades serviu se um esplendido lunch no qual se fizeram vários brindes todos com enthusiasmo recebidos. Os primeiros foram a SM a Rainha Victoria e a SM El Rei o sr D Luiz Damos sinceros parabéns aos sócios do novo club pelo bem que correu esta festa de muito alcance e pela dignidade com que se houveram em acto tão solemne."
Até à década de 1930 o Club Lusitano floresceu tendo as actividades praticamente terminado em virtude da invasão japonesa em Dezembro de 1941. A segunda guerra mundial iria provocar um êxodo da comunidade, sobretudo para Macau. Regressariam no final da guerra mas já não em tão grande número. Uma outra vaga migratória sucedeu já na década de 1960 durante a revolução cultura chinesa tendo muitos partido para a Austrália, Brasil, Portugal, EUA e Canadá. Já em 1997, com a transferência de soberania de Hong Kong para a China, e em 1999, com a transferência de soberania de Macau para a China, muitos macaenses voltariam a partir para a diáspora. Actualmente ainda existem vários milhares de cidadãos com nacionalidade portuguesa a viver em Hong Kong, a maioria com origens em Macau.
A 1 de Janeiro de 1866 no Boletim Oficial do Governo de Macau podia ler-se: "No dia 26 de dezembro ultimo foi S Exa o Governador a Hong kong presidir á festa solemne da collocação da primeira pedra do edificio que ali se vae erigir para um club portuguez com o titulo de Club Lusitano. Sua Exa o governador foi de Macau acompanhado pelo seu estado maior e foi recebido em Hongkong pelos cavalheiros da commissão directora do referido club estando no caes para o mesmo fim o general das forças britannicas em Hongkong e uma guarda de honra de infantaria salvando se ao desembarque de S Exa com a salva que lhe competia. A festa a que assistiram todos os principaes funcionários ingle zes e a maioria dos portuguezes residentes na colónia correu sumptuosa e brilhante. S Exa o governador partiu de Hongkong penhorado por tantas attenções de consideração como as que recebeu na curta demora que teve n aquella cidade. Depois da ceremonia que correu com as devidas formalidades serviu se um esplendido lunch no qual se fizeram vários brindes todos com enthusiasmo recebidos. Os primeiros foram a SM a Rainha Victoria e a SM El Rei o sr D Luiz Damos sinceros parabéns aos sócios do novo club pelo bem que correu esta festa de muito alcance e pela dignidade com que se houveram em acto tão solemne."
Até à década de 1930 o Club Lusitano floresceu tendo as actividades praticamente terminado em virtude da invasão japonesa em Dezembro de 1941. A segunda guerra mundial iria provocar um êxodo da comunidade, sobretudo para Macau. Regressariam no final da guerra mas já não em tão grande número. Uma outra vaga migratória sucedeu já na década de 1960 durante a revolução cultura chinesa tendo muitos partido para a Austrália, Brasil, Portugal, EUA e Canadá. Já em 1997, com a transferência de soberania de Hong Kong para a China, e em 1999, com a transferência de soberania de Macau para a China, muitos macaenses voltariam a partir para a diáspora. Actualmente ainda existem vários milhares de cidadãos com nacionalidade portuguesa a viver em Hong Kong, a maioria com origens em Macau.
Camões em 1880
Em 1880 no tricentenário de Camões foi 'inaugurada' a Gruta de Camões em Macau e em Honk Kong o Club Lusitano assinalou a efeméride com uma publicação especial. Excerto: “À Exma Commissao Promotora da festa do tricentenário de Luiz de Camões no Club Lusitano em Hong Kong. J. J. da Silva e Souza signed the first text explaining that Mr. Lourenço Marques has, in it's garden, the cave where Camões, literary and legendary figure of portuguese culture and history, used to go when in need of inspiration and solitude. The monument that was erected in the cave was launched in order to celebrate the author of the portuguese epic Lusíadas and is considered has the first monument to Camões (built in 1840). The owner of the garden and the cave had assembled an album with literary contributions from several authors and, for this number, selected some poems by Mary Midleton, dr. Bowring, Francisco Bordalo, José Baptista de Miranda e Lima, J. F. Davis. D. Hiriberto Garcias de Quevedo, Manoel de Castro Sampaio, Fonseca, D. Sinibaldo de Mas, Sibasinda, Pedro Feliciano d'Oliveira Figueiredo, Visconde de Almeida Garret, Antónjio Luiz de Carvalho and Jules Zanole.”
Em 1880 no tricentenário de Camões foi 'inaugurada' a Gruta de Camões em Macau e em Honk Kong o Club Lusitano assinalou a efeméride com uma publicação especial. Excerto: “À Exma Commissao Promotora da festa do tricentenário de Luiz de Camões no Club Lusitano em Hong Kong. J. J. da Silva e Souza signed the first text explaining that Mr. Lourenço Marques has, in it's garden, the cave where Camões, literary and legendary figure of portuguese culture and history, used to go when in need of inspiration and solitude. The monument that was erected in the cave was launched in order to celebrate the author of the portuguese epic Lusíadas and is considered has the first monument to Camões (built in 1840). The owner of the garden and the cave had assembled an album with literary contributions from several authors and, for this number, selected some poems by Mary Midleton, dr. Bowring, Francisco Bordalo, José Baptista de Miranda e Lima, J. F. Davis. D. Hiriberto Garcias de Quevedo, Manoel de Castro Sampaio, Fonseca, D. Sinibaldo de Mas, Sibasinda, Pedro Feliciano d'Oliveira Figueiredo, Visconde de Almeida Garret, Antónjio Luiz de Carvalho and Jules Zanole.”
Personalidades
Ao longo de 150 anos várias personalidades assumiram a direcção do Club Lusitano (só há registos a partir de 1892). Entre eles, destaca-se Arnaldo Oliveira Sales, que presidiu durante mais de 30 anos (eleito a primeira vez em 1967), além dos cargos acumulados no 'Urban Coucil' e Comité Olímpico do território. Francisco José Vicente Jorge e J. A. dos Remédios foram outros dos presidentes marcantes no final do século XIX e início do século XX. Isto, claro está, para além dos fundadores J. A. Barreto e Delfino Noronha.
Ao longo de 150 anos várias personalidades assumiram a direcção do Club Lusitano (só há registos a partir de 1892). Entre eles, destaca-se Arnaldo Oliveira Sales, que presidiu durante mais de 30 anos (eleito a primeira vez em 1967), além dos cargos acumulados no 'Urban Coucil' e Comité Olímpico do território. Francisco José Vicente Jorge e J. A. dos Remédios foram outros dos presidentes marcantes no final do século XIX e início do século XX. Isto, claro está, para além dos fundadores J. A. Barreto e Delfino Noronha.
Sócios
Para além dos negócios que criaram por conta própria, muitos dos macaenses acabaram por trabalhar na função pública e em empresas privadas como a Jardine Mathison ou o Hong Kong and Shanghai Banking Corporation, que num determinado momento chegou a ter mais de 700 funcionários macaenses/portugueses. Muitos foram sócios do Clube Lusitano.
Para além dos negócios que criaram por conta própria, muitos dos macaenses acabaram por trabalhar na função pública e em empresas privadas como a Jardine Mathison ou o Hong Kong and Shanghai Banking Corporation, que num determinado momento chegou a ter mais de 700 funcionários macaenses/portugueses. Muitos foram sócios do Clube Lusitano.
Almoçar sem pagar
Durante várias décadas, era promovida, no dia 10 de Junho, Dia de Portugal, uma corrida de cavalos no Hong Kong Jockey Club patrocinda pelo Club Lusitano. No 27º andar do Lusitano Club Building está à disposição dos sócios um “Salão Nobre” denominado “Salão Luís de Camões” para realização de actividades culturais e recreativas; no 24º piso os associados têm acesso a uma sala onde podem organizar almoços e jantares em ocasiões especiais. Durante muitos anos todos dos dias os sócios podiam almoçar no clube sem pagar.
Durante várias décadas, era promovida, no dia 10 de Junho, Dia de Portugal, uma corrida de cavalos no Hong Kong Jockey Club patrocinda pelo Club Lusitano. No 27º andar do Lusitano Club Building está à disposição dos sócios um “Salão Nobre” denominado “Salão Luís de Camões” para realização de actividades culturais e recreativas; no 24º piso os associados têm acesso a uma sala onde podem organizar almoços e jantares em ocasiões especiais. Durante muitos anos todos dos dias os sócios podiam almoçar no clube sem pagar.
Edifício sede
A actual e imponente sede do Club Lusitano é o testemunho visível da importância da instituição na história de Hong Kong. Localizado no distrito financeiro da 'central', tem vista para a casa do governador (hoje do chefe do Executivo) e Banco da China, entre outros.
A primeira sede do Club Lusitano funcionou entre 1866 e 1920 num edifício de três pisos na Shelley/Shelly Street onde antes estivera o Cosmopolitan Hotel. No final do século XIX a direcção decide procurar um espaço mais central e acaba por comprar um terreno, na Ice House Street, a um dos seus membros, A.M. L. Soares, em 1892. As dificuldades económicas e a primeira guerra mundial iriam atrasar o início da construção da nova sede que só teria início final de 1920, no 54º aniversário do Lusitano. Com a presença dos governadores de Hong Kong e de Macau, Reginald Stubbs e Capitão-Tenente Henrique Monteiro Correia da Silva, no dia 7 de Dezembro de 1920, foi lançada a pedra fundamental para a construção da nova sede. Numa edição da época do jornal O Liberal, pode ler-se: “(...) by 3:45pm there was already a large crowd of people who had gathered early to choose a good place for watching the ceremony which had been set to start at 4:00pm. In effect, a few minutes later, their Excellencies (…) arrived (...) and after their speeches the foundation stone was laid in the formal style that could be expected of his Excellençy with the trowel and hammer in his hands (...)”
Em 1964 o edifício da Ice House Street foi demolido e no seu lugar seria construído um novo edifício de 12 andares com projecto de Alfredo Álvares. Enquanto as obras decorrerem o clube teve instalações provisórias mudando-se para a nova sede em 1967. O Lusitano ocupa apenas 5 pisos fazendo render os restantes com recurso ao arrendamento do espaço a mais importante fonte de receita.
Ao fim de quase 20 anos o edifício seria demolido. Em 1996 o arquitecto Gustavo da Roza ficaria responsável pela nova construção que passa a ter um total de 27 andares onde se destaca no topo a Cruz de Cristo, símbolo da instituição.
A actual e imponente sede do Club Lusitano é o testemunho visível da importância da instituição na história de Hong Kong. Localizado no distrito financeiro da 'central', tem vista para a casa do governador (hoje do chefe do Executivo) e Banco da China, entre outros.
A primeira sede do Club Lusitano funcionou entre 1866 e 1920 num edifício de três pisos na Shelley/Shelly Street onde antes estivera o Cosmopolitan Hotel. No final do século XIX a direcção decide procurar um espaço mais central e acaba por comprar um terreno, na Ice House Street, a um dos seus membros, A.M. L. Soares, em 1892. As dificuldades económicas e a primeira guerra mundial iriam atrasar o início da construção da nova sede que só teria início final de 1920, no 54º aniversário do Lusitano. Com a presença dos governadores de Hong Kong e de Macau, Reginald Stubbs e Capitão-Tenente Henrique Monteiro Correia da Silva, no dia 7 de Dezembro de 1920, foi lançada a pedra fundamental para a construção da nova sede. Numa edição da época do jornal O Liberal, pode ler-se: “(...) by 3:45pm there was already a large crowd of people who had gathered early to choose a good place for watching the ceremony which had been set to start at 4:00pm. In effect, a few minutes later, their Excellencies (…) arrived (...) and after their speeches the foundation stone was laid in the formal style that could be expected of his Excellençy with the trowel and hammer in his hands (...)”
Em 1964 o edifício da Ice House Street foi demolido e no seu lugar seria construído um novo edifício de 12 andares com projecto de Alfredo Álvares. Enquanto as obras decorrerem o clube teve instalações provisórias mudando-se para a nova sede em 1967. O Lusitano ocupa apenas 5 pisos fazendo render os restantes com recurso ao arrendamento do espaço a mais importante fonte de receita.
Ao fim de quase 20 anos o edifício seria demolido. Em 1996 o arquitecto Gustavo da Roza ficaria responsável pela nova construção que passa a ter um total de 27 andares onde se destaca no topo a Cruz de Cristo, símbolo da instituição.
Desporto
Como era típico destas instituições as actividades desportivas foram uma das imagens de marca do Lusitano: desde o bilhar ao futebol passando pelo hóquei em campo, entre outras modalidades.
Regras rígidas
Apesar do emblema original representar uma mulher num acto de protecção a duas crianças, só mais de cem anos passados sobre a criação do Lusitano, já no início do século 21, é que desapareceu uma das “regras de ouro” do clube que interditava o acesso de mulheres a boa parte das suas instalações. O mesmo aconteceu em relação a pessoas de outras nacionalidades que não a portuguesa. Outros dos aspectos em que a rigidez da instituição se destacava era na exigência ao nível dos códigos de conduta e apresentação, o chamado dress code.
Os voluntários
Um dos momentos mais nobres do Lusitano foi a sua transformação em sede das companhias portuguesas de Voluntários, perante a ameaça de invasão japonesa de Hong Kong no final da década de 1930. Quando a invasão se concretizou no dia de Natal de 1941 o clube transformou-se em centro de acolhimento de refugiados portugueses, antes da sua evacuação para Macau, um dos raros locais na Ásia que escapou aos movimentos do exército nipónico.
Um dos momentos mais nobres do Lusitano foi a sua transformação em sede das companhias portuguesas de Voluntários, perante a ameaça de invasão japonesa de Hong Kong no final da década de 1930. Quando a invasão se concretizou no dia de Natal de 1941 o clube transformou-se em centro de acolhimento de refugiados portugueses, antes da sua evacuação para Macau, um dos raros locais na Ásia que escapou aos movimentos do exército nipónico.
Referências
Num anuário de 1912 pode ler-se: “This Club, the membership of which is confined to the Portuguese, was founded some forty years ago, and is consequently one of the oldest social institutions in the Colony. A limited number of debentures ($75 each) are held by the members, who have to pay an entrance fee of $5, and a monthly subscription of $3. The Club passed through various vicissitudes, but now, largely owing to the efforts of Mr. F. J. V. Jorge and other friends and supporters of the institution, it is in a sound condition. The premises in Shelley Street were specially erected to serve the purposes of a club, and are, therefore, very conveniently arranged. The billiard room contains four tables, and the library, the "Bibliotheca Lusitana," stocked with some ten thousand volumes, chiefly Portuguese literature, is one of the most extensive in the Far East. A spacious ballroom is often used for the presentation of amateur theatricals, for which the Club members have gained quite a high reputation, and there are also several rooms for residential purposes. Mr. F. J. V. Jorge is president of the Club, which is managed by a committee of six directors and a salaried secretary.”
PS: utilize o motor de pesquisa do blogue para ler outros posts sobre a história do Clube Lusitano de Hong Kong. Este artigo foi ainda publicado na edição de junho de 2017 da publicação da ADM, A Voz.
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