O canídromo de Macau, a única pista de corridas de galgos na Ásia, teve a sua 'época dourada' nos anos 1960 e 1970, quando a cidade "não tinha nada", mas "deixou de se justificar", defendem antigos frequentadores.
A seis meses do fim da licença do canídromo, decorre uma intensa campanha internacional para encerrar o espaço, que associações de direitos dos animais de vários países dizem ser o "pior do mundo", não só por abater centenas de animais por ano, mas também por os submeter a treinos cruéis e acondicionamento inadequado.
"Os tempos mudaram, o canídromo deixou de se justificar. Já não faz lucro, não faz sentido. Ganhámos outro tipo de sensibilidade, custa-nos ver os maus tratos dos animais. Há que desmantelar aquilo", diz à Lusa Miguel Senna Fernandes. No entanto, o presidente da Associação dos Macaenses recorda que, apesar de ter "deixado de ser 'in'", a pista já foi muito popular, antes de Macau se tornar a capital mundial do jogo. "Era o entretenimento do povo, da gente de economia mais humilde. O chinês sempre foi um jogador afoito", lembra. Até aos anos 1980, "muita gente corria ao canídromo, até de Hong Kong. Não era uma coisa de família, mas era para a malta", conta. Senna Fernandes recorda como emocionante a primeira vez que assistiu a uma corrida, aos 14 anos -- a entrada não era permitida a menores "mas arranjava-se maneira". Depois disso voltou algumas vezes, mas com pouco regularidade -- a última vez foi nos anos 1990, quando o espaço "já não tinha casa cheia". O macaense compara a discussão em torno do canídromo com a das touradas em Portugal: "Por mais sensíveis que sejamos para com os animais, há sempre uma nostalgia".
A licença do canídromo, com cerca de 50 anos, terminou no final do ano passado, mas o Governo optou por renovar a concessão por mais um ano.
A associação local Anima, de proteção dos animais, liderou a campanha pelo encerramento do canídromo e tem sido seguida por instituições de todo o mundo. Fizeram-se manifestações, petições e até boicotes ao fornecimento e transporte dos animais.
Para José Luís Sales Marques, as corridas de cães são hoje "uma atividade totalmente extemporânea", que prejudica "a imagem de Macau". "Não acho que deve ser mantido aberto", afirma o economista.
Não tendo sido grande frequentador -- chegou a ir, "em miúdo", nos anos 1960, para acompanhar o pai --, Sales Marques admite que o bem-estar dos galgos não era uma questão. "Não se falava dessas coisas, não havia essa consciência", diz. Na altura, "era uma novidade, Macau não tinha nada, só cinemas. Mas não uma coisa madura, para homens feitos, que queriam apostar numa corrida em que a sorte os bafejasse".
Era também um espaço onde os funcionários públicos podiam apostar, como fazia o seu pai, trabalhador dos correios. As corridas, recorda, dominavam as conversas de café, onde se faziam "palpites" e "trocavam informações" sobre os cães.
Para o macaense Jorge Fão, o grande motivo para encerrar o canídromo é económico. "Já deu o que tinha a dar. Devem utilizar aquele espaço para outras finalidades", diz.
"Os tempos mudaram, o canídromo deixou de se justificar. Já não faz lucro, não faz sentido. Ganhámos outro tipo de sensibilidade, custa-nos ver os maus tratos dos animais. Há que desmantelar aquilo", diz à Lusa Miguel Senna Fernandes. No entanto, o presidente da Associação dos Macaenses recorda que, apesar de ter "deixado de ser 'in'", a pista já foi muito popular, antes de Macau se tornar a capital mundial do jogo. "Era o entretenimento do povo, da gente de economia mais humilde. O chinês sempre foi um jogador afoito", lembra. Até aos anos 1980, "muita gente corria ao canídromo, até de Hong Kong. Não era uma coisa de família, mas era para a malta", conta. Senna Fernandes recorda como emocionante a primeira vez que assistiu a uma corrida, aos 14 anos -- a entrada não era permitida a menores "mas arranjava-se maneira". Depois disso voltou algumas vezes, mas com pouco regularidade -- a última vez foi nos anos 1990, quando o espaço "já não tinha casa cheia". O macaense compara a discussão em torno do canídromo com a das touradas em Portugal: "Por mais sensíveis que sejamos para com os animais, há sempre uma nostalgia".
A licença do canídromo, com cerca de 50 anos, terminou no final do ano passado, mas o Governo optou por renovar a concessão por mais um ano.
A associação local Anima, de proteção dos animais, liderou a campanha pelo encerramento do canídromo e tem sido seguida por instituições de todo o mundo. Fizeram-se manifestações, petições e até boicotes ao fornecimento e transporte dos animais.
Para José Luís Sales Marques, as corridas de cães são hoje "uma atividade totalmente extemporânea", que prejudica "a imagem de Macau". "Não acho que deve ser mantido aberto", afirma o economista.
Não tendo sido grande frequentador -- chegou a ir, "em miúdo", nos anos 1960, para acompanhar o pai --, Sales Marques admite que o bem-estar dos galgos não era uma questão. "Não se falava dessas coisas, não havia essa consciência", diz. Na altura, "era uma novidade, Macau não tinha nada, só cinemas. Mas não uma coisa madura, para homens feitos, que queriam apostar numa corrida em que a sorte os bafejasse".
Era também um espaço onde os funcionários públicos podiam apostar, como fazia o seu pai, trabalhador dos correios. As corridas, recorda, dominavam as conversas de café, onde se faziam "palpites" e "trocavam informações" sobre os cães.
Para o macaense Jorge Fão, o grande motivo para encerrar o canídromo é económico. "Já deu o que tinha a dar. Devem utilizar aquele espaço para outras finalidades", diz.
As receitas do canídromo, localizado numa zona de elevada densidade populacional, têm vindo a cair há vários anos. Em 2015 cifraram-se em 125 milhões de patacas (13,7 milhões de euros, ao câmbio atual), menos 13,7% em que 2014, e menos 63% que em 2010. As corridas de cães representaram no ano passado 0,05% do total arrecadado por todo o setor do jogo.
"Era muito divertido, era uma novidade para as pessoas que viviam cá. Apostar nos galgos é como apostar no futebol, é preciso estudar os cães, o peso, o comportamento, o treinador", recorda. Fão afasta qualquer tipo de preocupações, à época, com o bem-estar dos animais: "Qual quê! A gente até comia os cães. Era tradição e hábito".
Dos quatro macaenses entrevistados pela agência Lusa, Francisco Manhão é o único que gostaria de manter o canídromo de portas abertas, desde que fizesse obras de melhoramento. "Acho que fechar é uma pena, ainda há um grande número de entusiastas. Naquela altura, as pessoas não estavam preocupadas [com os cães], queriam passar um bom bocado ao fim de semana. Mas naturalmente que também acho que devia ter melhores condições, aquilo é lastimável, os galgos devem ser mais bem tratados", defende. "Sempre gostei de ir às corridas, desde novo. Em 1963, a aposta mínima era de duas patacas (22 cêntimos, ao câmbio atual). De vez em quando ainda dou lá uma saltada. Se fechar fico um bocado magoado", diz.
A Companhia de Corridas de Galgos Macau (Yat Yuen), que faz parte do universo da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM), fundada por Stanley Ho, tem hoje cerca de 700 animais. Segundo a Anima, entre 260 e 280 cães morreram no ano passado, alguns apenas um mês depois de chegarem à pista. Não havendo um programa de adoções, os animais são abatidos quando começam a piorar a sua prestação, sendo necessário adquirir novos regularmente.
De acordo com a Anima, cerca de 30 animais eram abatidos mensalmente, ainda jovens, por já não serem rentáveis. No entanto, em maio, a Anima indicou que desde que a campanha internacional conseguiu suspender a vinda de animais da Austrália, o maior fornecedor, em dezembro de 2015, apenas nove cães tinham chegado a Macau, vindos da Irlanda. As organizações esperam conseguir 'secar' totalmente a fonte de galgos, de modo a obrigar o espaço a fechar.
"Era muito divertido, era uma novidade para as pessoas que viviam cá. Apostar nos galgos é como apostar no futebol, é preciso estudar os cães, o peso, o comportamento, o treinador", recorda. Fão afasta qualquer tipo de preocupações, à época, com o bem-estar dos animais: "Qual quê! A gente até comia os cães. Era tradição e hábito".
Dos quatro macaenses entrevistados pela agência Lusa, Francisco Manhão é o único que gostaria de manter o canídromo de portas abertas, desde que fizesse obras de melhoramento. "Acho que fechar é uma pena, ainda há um grande número de entusiastas. Naquela altura, as pessoas não estavam preocupadas [com os cães], queriam passar um bom bocado ao fim de semana. Mas naturalmente que também acho que devia ter melhores condições, aquilo é lastimável, os galgos devem ser mais bem tratados", defende. "Sempre gostei de ir às corridas, desde novo. Em 1963, a aposta mínima era de duas patacas (22 cêntimos, ao câmbio atual). De vez em quando ainda dou lá uma saltada. Se fechar fico um bocado magoado", diz.
A Companhia de Corridas de Galgos Macau (Yat Yuen), que faz parte do universo da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM), fundada por Stanley Ho, tem hoje cerca de 700 animais. Segundo a Anima, entre 260 e 280 cães morreram no ano passado, alguns apenas um mês depois de chegarem à pista. Não havendo um programa de adoções, os animais são abatidos quando começam a piorar a sua prestação, sendo necessário adquirir novos regularmente.
De acordo com a Anima, cerca de 30 animais eram abatidos mensalmente, ainda jovens, por já não serem rentáveis. No entanto, em maio, a Anima indicou que desde que a campanha internacional conseguiu suspender a vinda de animais da Austrália, o maior fornecedor, em dezembro de 2015, apenas nove cães tinham chegado a Macau, vindos da Irlanda. As organizações esperam conseguir 'secar' totalmente a fonte de galgos, de modo a obrigar o espaço a fechar.
Artigo Agência Lusa - 12.6.2016
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