Revista ACP - Dez. 1954: o artigo da revista e algumas das imagens ali publicadas.
Agradecimentos: Centro de Documentação do ACP - Portugal
Agradecimentos: Centro de Documentação do ACP - Portugal
Fernando Macedo Pinto |
No início da década de 1950 Macau tinha cerca de 200 mil habitantes e circulavam nas ruas cerca de 600 viaturas motorizadas (ligeiros, pesados e motos). Entre a população mais jovem havia muito interesse pelo desporto motorizado. A 18 de Outubro de 1953, por exemplo, teve lugar no Campo Desportivo 28 de Maio (Canídromo), um festival desportivo promovido pelo Benfica e Sporting locais, com o patrocínio de Laurinda Marques Esparteiro, mulher do Governador. As receitas obtidas com a venda de bilhetes reverteram a favor do fundo do “Natal dos Pobres de Macau”. O evento consistiu em provas de ciclismo e uma gincana de automóveis, dentro do campo, e segundo a imprensa da época, “realizada por um grupo dos melhores automobilistas da terra. Ganhou o concurso o par formado pelo Dr. Adelino Barbosa da Conceição e Maria Leopoldina Pinto Ribeiro que fez o percurso com o tempo final (já acrescido de duas faltas) de 7 m. 25s. e 4/10 ; e em 2.º e 3.º lugares classificaram-se respectivamente o Dr. António Nolasco da Silva e sua esposa com o tempo final de 7m. 56s. e 2/10, e o Capitão Júlio Augusto da Cruz e sua esposa com 9m. e 7s.. Coube ao Sr. José Alves e sua parceira Maria Helena Neves da Silva, o prémio de consolação. ”
É curioso notar que neste lote de nomes está António Nolasco, ilustre advogado, e um dos ‘fundadores’ do GPM, juntamente com Carlos Humberto da Silva, Fernando de Macedo Pinto, João Pires Antas, Júlio Augusto da Cruz e Paul Eric du Toit.
Foram eles que nos primeiros meses de 1954 tiveram a ideia de organizar uma gincana por várias zonas da cidade. Na sequência de uma visita a Macau de um suíço radicado em Hong Kong, para dar um parecer técnico sobre o percurso da gincana, depressa se concluiu estarem reunidas as condições para se realizar algo mais grandioso… um grande prémio! E assim foi. Entre os múltiplos contactos que tiveram de efectuar surgiu um com o Automóvel Clube de Portugal (ACP), uma instituição criada em Portugal em 1903 e com pergaminhos na organização de provas desportivas motorizadas.
Os fundadores
Antes do último fim-de-semana de Outubro de 1954, data do primeiro GPM (dias 30 e 31), foi preciso um trabalho árduo por parte de quem teve a ideia, e depois, da Comissão Organizadora da prova.
“Uma tarde, em conversa no café, lembrámo-nos de organizar uma gincana, mas uma gincana com foros de coisa invulgar. O Carlos Silva recordou-se, então, de escrever para Hong-Kong, para o clube de automóveis local pedindo informações sobre a forma de organizar a prova, que não queríamos circunscrita a um local fechado, que, na nossa ideia, devia envolver toda a cidade”. As palavras são de Fernando Macedo Pinto, um dos fundadores da prova.
A conversa teve lugar no café do hotel Riviera – “o centro das reuniões de Macau”, segundo a publicidade da época – e quem responde à carta, enviada em meados de Maio é Paul Du Toit, um suíço radicado em Hong Kong. Du Toi, em vez de escrever, apanhou o ferry e foi até Macau. “Fomos recebê-lo e ele, indivíduo de um dinamismo fantástico, foi directo ao assunto e perguntou-nos o que queríamos fazer“, recordaria Macedo Pinto anos mais tarde, acrescentando que Du Toit concluiu: “Isto não é uma gincana. O que vocês têm é o circuito para um Grande Prémio!”. E assim foi…
A 17 de Julho de 1954 era anunciado publicamente numa conferência de imprensa que teve lugar no hotel Riviera o programa de uma corrida de quatro horas (Grande Prémio) e uma prova de regularidade-velocidade. Ainda sem data definitiva marcada – avançava-se apenas com o mês de Outubro – havia no entanto uma ideia muito clara do percurso das provas: partida do Porto Exterior frente à ponte 2 da Capitania dos Portos em direcção à Estrada de S. Francisco, Estrada dos Parses, Cacilhas, Ramal dos Mouros. D. Maria, Rua dos Pescadores e acabando na Av. Dr. Oliveira Salazar – o que é hoje a Av. da Amizade – num total de 3.9 milhas (6.27 Km).
Neste evento estiveram presentes, Carlos Humberto da Silva, Capitão Júlio Augusto da Cruz, Capitão-Tenente Manuel Pires Antes, Agente técnico Fernando Macedo Pinto e o Dr. António Nolasco da Silva. Foram estes cinco homens os responsáveis pela criação em Macau de uma delegação do ACP.
No dia seguinte, o jornal O Clarim noticiava: “Sob a superior orientação de Sua Exa. o Governador da Província, vai funcionar em Macau, uma delegação do Automóvel Club de Portugal”. Carlos Humberto da Silva será nomeado como primeiro delegado, uma função que ao longo dos anos também foi desempenhada por António Nolasco da Silva.
Ainda de acordo com O Clarim para esta iniciativa contribuiu de forma decisiva o Governador Joaquim Marques Esparteiro que “prometeu todo o apoio e prontificou-se a dar à delegação a sua superior e competente orientação, por forma a poder contar-se, no futuro, com um organismo fundado em bases sólidas e de grandes benefícios para a Província, tanto do ponto de vista turístico e desportivo, como sob o aspecto económico”.
Estava dado o passo decisivo para o arranque da comissão organizadora do Grande Prémio de Macau que ficaria a cargo da delegação local do ACP. Na edição de 25 de Julho de 1954 O Clarim noticiava as datas definitivas a realização da prova: no sábado, 30 de Outubro, às 13 horas (treinos de hora e meia às 8 da manhã), a prova de regularidade e velocidade, e no dia seguinte, o Grande Prémio.
Os preparativos
Definido o programa da prova, a 15 de Agosto de 1954, a imprensa local dava conta da abertura das inscrições para uma prova que seria regida pelo Código Internacional da Federação Internacional do Automóvel e pelo regulamento definido pela organização.
“Encontra-se aberta a inscrição para as provas de automobilismo organizadas pela Delegação de Macau do Automóvel Clube de Portugal. a qual encerrar-se-á no próximo dia 1 de Setembro.
As provas que vão ser levadas a efeito são o Grande Prémio de Macau e a Prova de regularidade, estando já inscritos no Grande Prémio duas dezenas de automobilistas de Hong Kong, entre os quais duas senhoras. Até à presente data, Macau conta apenas com um inscrito no Grande Prémio, Fernando Macedo Pinto.
Na prova de regularidade e velocidade à qual poderão concorrer quaisquer condutores de automóveis, com carros de turismo, espera-se grande concorrência dado o elevado número de entusiastas que existe entre nós.
A inscrição para o Grande Prémio é grátis, até à data de encerramento, sendo de $20,00 a inscrição para a Prova de regularidade e velocidade. Findo o prazo estipulado, haverá um novo período de inscrição, durante o qual cada inscrito pagará, para o Grande Prémio $50,00 e para a segunda prova $30,00.”
No dia 15 de Setembro de 1954 dava-se a conhecer o resultado das inscrições.“Encerradas as inscrições para o Grande Prémio de Macau e prova de regularidade-velocidades, verificou-se estarem inscritos 25 concorrentes para primeiro e 24 para a última. No Grande Prémio, há só três concorrentes de Macau, sendo os restantes de Hong Kong; na prova de regularidade-velocidade, 14 concorrentes são de Macau. Estas provas terão lugar nos dias 30 e 31 de Outubro próximo. No passado dia 9, o Sr. Carlos Humberto da Silva, um dos organizadores das provas de automobilismo, proferiu, na reunião-jantar do Rotary Clube de Macau, uma interessante palestra sobre o «Grande Prémio de Macau»”.
No final de Setembro de 1954 começam-se a sentir os primeiros efeitos de um evento que iria transformar por completo a pacatez da vida na cidade. Os poucos hotéis, pensões e pousadas que existiam (Bela Vista, Riviera, Central, Grand Hotel, etc…) depressa ficaram com a lotação esgotada a ponto de terem sido publicados anúncios nos jornais a solicitar aos particulares que se mostrassem disponíveis para arrendar quartos para os dias da prova.
É curioso notar que neste lote de nomes está António Nolasco, ilustre advogado, e um dos ‘fundadores’ do GPM, juntamente com Carlos Humberto da Silva, Fernando de Macedo Pinto, João Pires Antas, Júlio Augusto da Cruz e Paul Eric du Toit.
Foram eles que nos primeiros meses de 1954 tiveram a ideia de organizar uma gincana por várias zonas da cidade. Na sequência de uma visita a Macau de um suíço radicado em Hong Kong, para dar um parecer técnico sobre o percurso da gincana, depressa se concluiu estarem reunidas as condições para se realizar algo mais grandioso… um grande prémio! E assim foi. Entre os múltiplos contactos que tiveram de efectuar surgiu um com o Automóvel Clube de Portugal (ACP), uma instituição criada em Portugal em 1903 e com pergaminhos na organização de provas desportivas motorizadas.
Os fundadores
Antes do último fim-de-semana de Outubro de 1954, data do primeiro GPM (dias 30 e 31), foi preciso um trabalho árduo por parte de quem teve a ideia, e depois, da Comissão Organizadora da prova.
Eduardo de Carvalho |
A conversa teve lugar no café do hotel Riviera – “o centro das reuniões de Macau”, segundo a publicidade da época – e quem responde à carta, enviada em meados de Maio é Paul Du Toit, um suíço radicado em Hong Kong. Du Toi, em vez de escrever, apanhou o ferry e foi até Macau. “Fomos recebê-lo e ele, indivíduo de um dinamismo fantástico, foi directo ao assunto e perguntou-nos o que queríamos fazer“, recordaria Macedo Pinto anos mais tarde, acrescentando que Du Toit concluiu: “Isto não é uma gincana. O que vocês têm é o circuito para um Grande Prémio!”. E assim foi…
A 17 de Julho de 1954 era anunciado publicamente numa conferência de imprensa que teve lugar no hotel Riviera o programa de uma corrida de quatro horas (Grande Prémio) e uma prova de regularidade-velocidade. Ainda sem data definitiva marcada – avançava-se apenas com o mês de Outubro – havia no entanto uma ideia muito clara do percurso das provas: partida do Porto Exterior frente à ponte 2 da Capitania dos Portos em direcção à Estrada de S. Francisco, Estrada dos Parses, Cacilhas, Ramal dos Mouros. D. Maria, Rua dos Pescadores e acabando na Av. Dr. Oliveira Salazar – o que é hoje a Av. da Amizade – num total de 3.9 milhas (6.27 Km).
Neste evento estiveram presentes, Carlos Humberto da Silva, Capitão Júlio Augusto da Cruz, Capitão-Tenente Manuel Pires Antes, Agente técnico Fernando Macedo Pinto e o Dr. António Nolasco da Silva. Foram estes cinco homens os responsáveis pela criação em Macau de uma delegação do ACP.
No dia seguinte, o jornal O Clarim noticiava: “Sob a superior orientação de Sua Exa. o Governador da Província, vai funcionar em Macau, uma delegação do Automóvel Club de Portugal”. Carlos Humberto da Silva será nomeado como primeiro delegado, uma função que ao longo dos anos também foi desempenhada por António Nolasco da Silva.
Ainda de acordo com O Clarim para esta iniciativa contribuiu de forma decisiva o Governador Joaquim Marques Esparteiro que “prometeu todo o apoio e prontificou-se a dar à delegação a sua superior e competente orientação, por forma a poder contar-se, no futuro, com um organismo fundado em bases sólidas e de grandes benefícios para a Província, tanto do ponto de vista turístico e desportivo, como sob o aspecto económico”.
Estava dado o passo decisivo para o arranque da comissão organizadora do Grande Prémio de Macau que ficaria a cargo da delegação local do ACP. Na edição de 25 de Julho de 1954 O Clarim noticiava as datas definitivas a realização da prova: no sábado, 30 de Outubro, às 13 horas (treinos de hora e meia às 8 da manhã), a prova de regularidade e velocidade, e no dia seguinte, o Grande Prémio.
Os preparativos
Definido o programa da prova, a 15 de Agosto de 1954, a imprensa local dava conta da abertura das inscrições para uma prova que seria regida pelo Código Internacional da Federação Internacional do Automóvel e pelo regulamento definido pela organização.
“Encontra-se aberta a inscrição para as provas de automobilismo organizadas pela Delegação de Macau do Automóvel Clube de Portugal. a qual encerrar-se-á no próximo dia 1 de Setembro.
As provas que vão ser levadas a efeito são o Grande Prémio de Macau e a Prova de regularidade, estando já inscritos no Grande Prémio duas dezenas de automobilistas de Hong Kong, entre os quais duas senhoras. Até à presente data, Macau conta apenas com um inscrito no Grande Prémio, Fernando Macedo Pinto.
Na prova de regularidade e velocidade à qual poderão concorrer quaisquer condutores de automóveis, com carros de turismo, espera-se grande concorrência dado o elevado número de entusiastas que existe entre nós.
A inscrição para o Grande Prémio é grátis, até à data de encerramento, sendo de $20,00 a inscrição para a Prova de regularidade e velocidade. Findo o prazo estipulado, haverá um novo período de inscrição, durante o qual cada inscrito pagará, para o Grande Prémio $50,00 e para a segunda prova $30,00.”
No dia 15 de Setembro de 1954 dava-se a conhecer o resultado das inscrições.“Encerradas as inscrições para o Grande Prémio de Macau e prova de regularidade-velocidades, verificou-se estarem inscritos 25 concorrentes para primeiro e 24 para a última. No Grande Prémio, há só três concorrentes de Macau, sendo os restantes de Hong Kong; na prova de regularidade-velocidade, 14 concorrentes são de Macau. Estas provas terão lugar nos dias 30 e 31 de Outubro próximo. No passado dia 9, o Sr. Carlos Humberto da Silva, um dos organizadores das provas de automobilismo, proferiu, na reunião-jantar do Rotary Clube de Macau, uma interessante palestra sobre o «Grande Prémio de Macau»”.
No final de Setembro de 1954 começam-se a sentir os primeiros efeitos de um evento que iria transformar por completo a pacatez da vida na cidade. Os poucos hotéis, pensões e pousadas que existiam (Bela Vista, Riviera, Central, Grand Hotel, etc…) depressa ficaram com a lotação esgotada a ponto de terem sido publicados anúncios nos jornais a solicitar aos particulares que se mostrassem disponíveis para arrendar quartos para os dias da prova.
Regulamentos e bancadas
No início de Outubro a organização dava a conhecer os regulamentos da prova de regularidade e velocidade e do Grande Prémio propriamente dito. Nesta podia participar qualquer “carro de turismo de fabrico corrente ou qualquer carro de desporto com ou sem modificações introduzidas” quer fosse pela fábrica quer fosse por outrem, com o objectivo de melhorar o desempenho. Aos condutores (podiam ser dois pilotos por carro) era informado que só poderiam utilizar gasolina de 85/90 octanas e não podiam ter qualquer auxílio de estranhos, sob pena de serem desclassificados.
Os regulamentos abrangiam ainda os espectadores que estavam proibidos de atravessar a pista do circuito durante o período dos treinos e das corridas. Para assegurar o acesso ao interior do perímetro do circuito havia apenas uma entrada. Ficava junto à Calçada de S. Francisco local onde estavam localizadas as bilheteiras (embora existissem outros locais onde podiam ser adquiridos bilhetes). Nessa zona existia uma ponte superior para os peões acederem ao circuito – através da Av. Dr. Rodrigo Rodrigues – sem atravessar a estrada. Este tipo de pontes estavam ainda junto ao Ramal dos Mouros e na recta da meta (designada por Posto Central), neste caso para uso exclusivo dos comissários, director da corrida e jornalistas.
Embora em muitas zonas do circuito não abundassem equipamentos que permitissem a melhor salvaguarda de pilotos e espectadores (eram outros tempos…) as questões de segurança e socorro não foram descuradas pela organização. Ao longo do circuito foram instalados quatro postos de ambulância, dez postos sinaleiros, nove postos de remoções, quatro postos de socorro a incêndios e treze postos de telecomunicações com ligação directa ao posto central na recta da meta. Nessa zona foram reservados lugares para os órgãos de comunicação social devidamente credenciados e foi ainda montado um posto de locução que informava o público sobre o andamento das corridas. Neste local de maior azáfama em todo o circuito estava ainda instalado um grande quadro onde era escrita a classificação das corridas.
Para proporcionar as melhores vistas sobre o circuito aos espectadores foram montadas quatro bancadas com capacidade para albergar duas mil pessoas.
Para além das bilheteiras existentes junto ao circuito, os bilhetes começaram a ser vendidos no dia 25 de Outubro no Hotel Riviera (cruzamento do BNU), na Pousada Macau (no nº 1 da Travessa do Padre Narciso, ao lado do Palácio do Governo) e na Firma H. Nolasco & Ca., na rua da Praia Grande.
Os preços variavam entre as 7,50 patacas para a bancada central e as cinco patacas para a bancada lateral. Fora das bancadas havia lugares para peões a 50 avos por pessoa.
Havia ainda a particularidade dos preços praticados pelo Clube Náutico por este se situar numa zona privilegiada do circuito (na zona da recta da meta). Aqui, por acordo com a comissão da prova, as cadeiras custavam 2,5 patacas cada uma, dando também acesso a uma mesa. Sem mesa, o bilhete ficava por uma pataca e meia.
“Entusiasticamente disputado”
Com tudo pronto para a primeira edição do Grande Prémio de Macau, no dia 28 de Outubro de 1954 chegaram a Macau provenientes de Hong Kong os primeiros cinco carros que iriam participar nas corridas. No dia seguinte chegariam os restantes e com os que já estavam em Macau conseguia-se um total de 25 viaturas.
Vicissitudes várias, incluindo alguns despistes em treinos (todos os pilotos tinham de completar pelo menos uma volta ao circuito durante os treinos), fizeram com que apenas 15 alinhassem na grelha de partida onde o Governador envergou a bandeira portuguesa ordenando a partida. A largada foi feita ao género de “Le Mans”, ou seja, com os carros ordenados por categoria, virados para o mar e com os pilotos fora das viaturas.
“Ao sinal de largar, correram todos para os carros, uns saltando para dentro destes, outros, abrindo rapidamente a portinhola ao mesmo tempo que punham o motor a funcionar”. O relato foi feito pelo jornalista de O Clarim na edição de 4 de Novembro e o piloto mais rápido na partida foi Gordon “Dinga” Bell que viria a estabelecer a volta mais rápida desse ano com 4 minutos e 12 segundos tripulando um Morgan.
Ao fim de 51 voltas ao Circuito da Guia (cada volta tinha 6,2 km) num total de quase 320 quilómetros, em 4 horas, 3 minutos e mais alguns segundos, foi exibida a bandeira de xadrez ao Triumph TR2, carro nº 5 de cor vermelha, conduzido pelo português Eduardo de Carvalho. Vencedor do primeiro GPM deu uma volta de consagração ao circuito onde foi aplaudido por milhares de pessoas recebendo depois das mãos do Governador a taça feita especialmente para o efeito em Lisboa. A “Omega”, empresa que fornecera os cronómetros para as corridas, ofereceu um relógio de mesa.
Chegavam assim ao fim dois dias plenos de emoção onde um carro se destacou na prova do GP ao arrebatar os três primeiros lugares, o Triumph TR2.
Na edição nº 31 do Boletim Informativo de Macau (1954) resumia-se o que de mais significativo se passou.
“A Delegação de Macau do Automóvel Clube de Portugal levou a efeito, nos dias 30 e 31 de Outubro de 1954, um certame de automobilismo, que reuniu dezenas de volantes nacionais e estrangeiros de Macau e Hong Kong e milhares de espectadores, muitos dos quais vindos, propositadamente, da vizinha colónia britânica. O programa (…) constou de duas provas distintas, ambas entusiasticamente disputadas e acompanhadas com muito interesse. No primeiro dia realizou-se uma prova de velocidade-regularidade, com o concurso de 20 automóveis, dos quais 9 de Macau. No dia seguinte, teve lugar o Grande Prémio de Macau, ao qual concorreram 15 volantes, dos quais um apenas de Macau. Três outros caros vindos de Hong Kong não puderam participar nesta prova devido a acidentes sofridos na véspera, durante os treinos…(…) Ambas as provas se realizaram no «Circuito da Guia» que mede, aproximadamente, 6,27 quilómetros, ou sejam 3,9 milhas…(…) Este circuito, que mereceu as mais elogiosas referências de todos os concorrentes, só se conseguiu após intenso trabalho de preparação, nele intervindo não só os organizadores como também o pessoal das Obras Públicas…(…)
Sua Ex.ª o Governador ofereceu a artística e linda taça destinada ao vencedor, a qual custou cerca de mil e duzentas patacas, tendo sido feita expressamente em Lisboa. Sua Ex.ma Esposa de Sua Ex.ª o Governador, Sr.ª Dr.ª D.ª Laurinda Marques Esparteiro, a convite da Comissão Organizadora, cortou a fita simbólica colocada para a inauguração do circuito, acto que foi sublinhado por uma salva de palmas. Seguidamente, a mesma Ex.ma Senhora declarou aberto o circuito.
Felizmente, e não obstante os justificados receios de todos, não houve desastres graves a lamentar, durante a realização das provas salvo pequenos acidentes de que resultaram apenas ligeiros ferimentos em alguns condutores, com algum dano material.
Ganhou brilhantemente o Grande Prémio, no qual se classificou vencedor absoluto, o hábil volante português Eduardo de Carvalho, que conduziu na prova um «Triumph TR2», de 1991 cm3. A prova de velocidade-regularidade foi ganha, também brilhantemente, pelo cabo da R.F.A. Robert Ritchie, que conduziu um «Fiat 1100».
Teve brilhante actuação o único concorrente de Macau, Fernando Macedo Pinto, que, num «MG Special» se classificou em 4.º lugar, revelando-se, em perícia e regularidade, tão bom como os melhores.”
Na edição de Nov./Dez. de 1954 (nºs 11 e 12 – Ano XXIV) a revista do ACP (Portugal) dava grande destaque ao evento rotulado de “enorme êxito” e intitulava “O I Grande Prémio de Macau foi entusiasticamente disputado perante mais de 20 mil pessoas”. Para além das referências ao empenho na organização do Sr. Carlos Humberto da Silva, “prestimoso delegado do ACP” o artigo evidenciava o facto de ter sido “a primeira corrida de velocidade pura realizada em Macau” e a primeira do género realizada “em toda a extensa costa da China”.
Ao lado das fotografias dos protagonistas do primeiro GPM – Fernando Macedo Pinto (4º), Reginaldo Rocha (3º), Paul du Toit (2º) e Eduardo de Carvalho (1º) – a reportagem classificava o Circuito da Guia como “cenário maravilhoso” e “extremamente difícil” o que explicava as médias atingidas de 80 km/hora. Acrescente-se a isso o facto de parte do percurso, entre a Casa Branca e o Ramal dos Mouros, ser em terra batida.
Numa das imagens que ilustram o artigo está o momento da entrega dos prémios, a 31 de Outubro de 1954, num jantar de gala no salão do Clube de Macau, a que presidiu o Governador Marques Esparteiro. Na ocasião, foi feita a entrega da taça do «Grande Prémio» a Eduardo de Carvalho pela mulher do Governador, Laurinda Marques Esparteiro.
Vencedores do GPM
Carros de desporto ou especiais
1º: Eduardo de Carvalho (Triumph TR2) com 51 voltas, 319,77 km, em 4 horas 3 minutos e 19,1 segundos.
2º: Paul du Toit, (Triumph TR 2), com 51 voltas em 4 h., 4m., 46 s., à velocidade média horária de 48,8 milhas, gastando mais 1 minuto e 27 segundos que o vencedor.
3º: Reginaldo da Rocha, (Triumph TR 2), com 50 voltas em 4 h. 1m. 55,5 segundos.
4º: Fernando Macedo Pinto, num MG Special de 1100 c.c., com 48 voltas em 4h. 3,4 segundos.
Carros de Turismo
Classe B (cilindrada entre 750 a 1100 cc.): Robert Ritchie em Fiat 1100, com 48 voltas, em 4h. 1m., 57,6 s.
Classe D (1501 a 2000 cc): D. N. Steane, num Hillman, com 46 voltas, em 4h. 1m. 29s.
Classe E (2001 a 3000 cc), K. O. Mak num Ford Zodiac, com 45 voltas em 4h. 01m. 56s.
Apesar da projecção mundial que o GPM tem hoje em dia, nos primeiros anos o evento que viria a mudar a faceta do território pouca relevância teve ao nível do tratamento noticioso, nomeadamente em Portugal. O “Diário de Lisboa” não escreveu nem uma linha nos dias que se seguiram à primeira edição em 1954. O desporto motorizado era um parente pobre face ao que estava na moda: o futebol, o hóquei em patins, o ciclismo e o ténis de mesa. Mas muito depressa tudo isto iria mudar e em 1955 (dias 5 e 6 de Novembro) as corridas estariam de volta ao Circuito da Guia. Tem sido assim, todos os anos, até hoje…
No início de Outubro a organização dava a conhecer os regulamentos da prova de regularidade e velocidade e do Grande Prémio propriamente dito. Nesta podia participar qualquer “carro de turismo de fabrico corrente ou qualquer carro de desporto com ou sem modificações introduzidas” quer fosse pela fábrica quer fosse por outrem, com o objectivo de melhorar o desempenho. Aos condutores (podiam ser dois pilotos por carro) era informado que só poderiam utilizar gasolina de 85/90 octanas e não podiam ter qualquer auxílio de estranhos, sob pena de serem desclassificados.
Os regulamentos abrangiam ainda os espectadores que estavam proibidos de atravessar a pista do circuito durante o período dos treinos e das corridas. Para assegurar o acesso ao interior do perímetro do circuito havia apenas uma entrada. Ficava junto à Calçada de S. Francisco local onde estavam localizadas as bilheteiras (embora existissem outros locais onde podiam ser adquiridos bilhetes). Nessa zona existia uma ponte superior para os peões acederem ao circuito – através da Av. Dr. Rodrigo Rodrigues – sem atravessar a estrada. Este tipo de pontes estavam ainda junto ao Ramal dos Mouros e na recta da meta (designada por Posto Central), neste caso para uso exclusivo dos comissários, director da corrida e jornalistas.
Embora em muitas zonas do circuito não abundassem equipamentos que permitissem a melhor salvaguarda de pilotos e espectadores (eram outros tempos…) as questões de segurança e socorro não foram descuradas pela organização. Ao longo do circuito foram instalados quatro postos de ambulância, dez postos sinaleiros, nove postos de remoções, quatro postos de socorro a incêndios e treze postos de telecomunicações com ligação directa ao posto central na recta da meta. Nessa zona foram reservados lugares para os órgãos de comunicação social devidamente credenciados e foi ainda montado um posto de locução que informava o público sobre o andamento das corridas. Neste local de maior azáfama em todo o circuito estava ainda instalado um grande quadro onde era escrita a classificação das corridas.
Para proporcionar as melhores vistas sobre o circuito aos espectadores foram montadas quatro bancadas com capacidade para albergar duas mil pessoas.
Para além das bilheteiras existentes junto ao circuito, os bilhetes começaram a ser vendidos no dia 25 de Outubro no Hotel Riviera (cruzamento do BNU), na Pousada Macau (no nº 1 da Travessa do Padre Narciso, ao lado do Palácio do Governo) e na Firma H. Nolasco & Ca., na rua da Praia Grande.
Os preços variavam entre as 7,50 patacas para a bancada central e as cinco patacas para a bancada lateral. Fora das bancadas havia lugares para peões a 50 avos por pessoa.
Havia ainda a particularidade dos preços praticados pelo Clube Náutico por este se situar numa zona privilegiada do circuito (na zona da recta da meta). Aqui, por acordo com a comissão da prova, as cadeiras custavam 2,5 patacas cada uma, dando também acesso a uma mesa. Sem mesa, o bilhete ficava por uma pataca e meia.
“Entusiasticamente disputado”
Com tudo pronto para a primeira edição do Grande Prémio de Macau, no dia 28 de Outubro de 1954 chegaram a Macau provenientes de Hong Kong os primeiros cinco carros que iriam participar nas corridas. No dia seguinte chegariam os restantes e com os que já estavam em Macau conseguia-se um total de 25 viaturas.
Vicissitudes várias, incluindo alguns despistes em treinos (todos os pilotos tinham de completar pelo menos uma volta ao circuito durante os treinos), fizeram com que apenas 15 alinhassem na grelha de partida onde o Governador envergou a bandeira portuguesa ordenando a partida. A largada foi feita ao género de “Le Mans”, ou seja, com os carros ordenados por categoria, virados para o mar e com os pilotos fora das viaturas.
“Ao sinal de largar, correram todos para os carros, uns saltando para dentro destes, outros, abrindo rapidamente a portinhola ao mesmo tempo que punham o motor a funcionar”. O relato foi feito pelo jornalista de O Clarim na edição de 4 de Novembro e o piloto mais rápido na partida foi Gordon “Dinga” Bell que viria a estabelecer a volta mais rápida desse ano com 4 minutos e 12 segundos tripulando um Morgan.
Ao fim de 51 voltas ao Circuito da Guia (cada volta tinha 6,2 km) num total de quase 320 quilómetros, em 4 horas, 3 minutos e mais alguns segundos, foi exibida a bandeira de xadrez ao Triumph TR2, carro nº 5 de cor vermelha, conduzido pelo português Eduardo de Carvalho. Vencedor do primeiro GPM deu uma volta de consagração ao circuito onde foi aplaudido por milhares de pessoas recebendo depois das mãos do Governador a taça feita especialmente para o efeito em Lisboa. A “Omega”, empresa que fornecera os cronómetros para as corridas, ofereceu um relógio de mesa.
Chegavam assim ao fim dois dias plenos de emoção onde um carro se destacou na prova do GP ao arrebatar os três primeiros lugares, o Triumph TR2.
Na edição nº 31 do Boletim Informativo de Macau (1954) resumia-se o que de mais significativo se passou.
“A Delegação de Macau do Automóvel Clube de Portugal levou a efeito, nos dias 30 e 31 de Outubro de 1954, um certame de automobilismo, que reuniu dezenas de volantes nacionais e estrangeiros de Macau e Hong Kong e milhares de espectadores, muitos dos quais vindos, propositadamente, da vizinha colónia britânica. O programa (…) constou de duas provas distintas, ambas entusiasticamente disputadas e acompanhadas com muito interesse. No primeiro dia realizou-se uma prova de velocidade-regularidade, com o concurso de 20 automóveis, dos quais 9 de Macau. No dia seguinte, teve lugar o Grande Prémio de Macau, ao qual concorreram 15 volantes, dos quais um apenas de Macau. Três outros caros vindos de Hong Kong não puderam participar nesta prova devido a acidentes sofridos na véspera, durante os treinos…(…) Ambas as provas se realizaram no «Circuito da Guia» que mede, aproximadamente, 6,27 quilómetros, ou sejam 3,9 milhas…(…) Este circuito, que mereceu as mais elogiosas referências de todos os concorrentes, só se conseguiu após intenso trabalho de preparação, nele intervindo não só os organizadores como também o pessoal das Obras Públicas…(…)
Sua Ex.ª o Governador ofereceu a artística e linda taça destinada ao vencedor, a qual custou cerca de mil e duzentas patacas, tendo sido feita expressamente em Lisboa. Sua Ex.ma Esposa de Sua Ex.ª o Governador, Sr.ª Dr.ª D.ª Laurinda Marques Esparteiro, a convite da Comissão Organizadora, cortou a fita simbólica colocada para a inauguração do circuito, acto que foi sublinhado por uma salva de palmas. Seguidamente, a mesma Ex.ma Senhora declarou aberto o circuito.
Felizmente, e não obstante os justificados receios de todos, não houve desastres graves a lamentar, durante a realização das provas salvo pequenos acidentes de que resultaram apenas ligeiros ferimentos em alguns condutores, com algum dano material.
Ganhou brilhantemente o Grande Prémio, no qual se classificou vencedor absoluto, o hábil volante português Eduardo de Carvalho, que conduziu na prova um «Triumph TR2», de 1991 cm3. A prova de velocidade-regularidade foi ganha, também brilhantemente, pelo cabo da R.F.A. Robert Ritchie, que conduziu um «Fiat 1100».
Teve brilhante actuação o único concorrente de Macau, Fernando Macedo Pinto, que, num «MG Special» se classificou em 4.º lugar, revelando-se, em perícia e regularidade, tão bom como os melhores.”
Na edição de Nov./Dez. de 1954 (nºs 11 e 12 – Ano XXIV) a revista do ACP (Portugal) dava grande destaque ao evento rotulado de “enorme êxito” e intitulava “O I Grande Prémio de Macau foi entusiasticamente disputado perante mais de 20 mil pessoas”. Para além das referências ao empenho na organização do Sr. Carlos Humberto da Silva, “prestimoso delegado do ACP” o artigo evidenciava o facto de ter sido “a primeira corrida de velocidade pura realizada em Macau” e a primeira do género realizada “em toda a extensa costa da China”.
Ao lado das fotografias dos protagonistas do primeiro GPM – Fernando Macedo Pinto (4º), Reginaldo Rocha (3º), Paul du Toit (2º) e Eduardo de Carvalho (1º) – a reportagem classificava o Circuito da Guia como “cenário maravilhoso” e “extremamente difícil” o que explicava as médias atingidas de 80 km/hora. Acrescente-se a isso o facto de parte do percurso, entre a Casa Branca e o Ramal dos Mouros, ser em terra batida.
Numa das imagens que ilustram o artigo está o momento da entrega dos prémios, a 31 de Outubro de 1954, num jantar de gala no salão do Clube de Macau, a que presidiu o Governador Marques Esparteiro. Na ocasião, foi feita a entrega da taça do «Grande Prémio» a Eduardo de Carvalho pela mulher do Governador, Laurinda Marques Esparteiro.
Vencedores do GPM
Carros de desporto ou especiais
1º: Eduardo de Carvalho (Triumph TR2) com 51 voltas, 319,77 km, em 4 horas 3 minutos e 19,1 segundos.
2º: Paul du Toit, (Triumph TR 2), com 51 voltas em 4 h., 4m., 46 s., à velocidade média horária de 48,8 milhas, gastando mais 1 minuto e 27 segundos que o vencedor.
3º: Reginaldo da Rocha, (Triumph TR 2), com 50 voltas em 4 h. 1m. 55,5 segundos.
4º: Fernando Macedo Pinto, num MG Special de 1100 c.c., com 48 voltas em 4h. 3,4 segundos.
Carros de Turismo
Classe B (cilindrada entre 750 a 1100 cc.): Robert Ritchie em Fiat 1100, com 48 voltas, em 4h. 1m., 57,6 s.
Classe D (1501 a 2000 cc): D. N. Steane, num Hillman, com 46 voltas, em 4h. 1m. 29s.
Classe E (2001 a 3000 cc), K. O. Mak num Ford Zodiac, com 45 voltas em 4h. 01m. 56s.
Apesar da projecção mundial que o GPM tem hoje em dia, nos primeiros anos o evento que viria a mudar a faceta do território pouca relevância teve ao nível do tratamento noticioso, nomeadamente em Portugal. O “Diário de Lisboa” não escreveu nem uma linha nos dias que se seguiram à primeira edição em 1954. O desporto motorizado era um parente pobre face ao que estava na moda: o futebol, o hóquei em patins, o ciclismo e o ténis de mesa. Mas muito depressa tudo isto iria mudar e em 1955 (dias 5 e 6 de Novembro) as corridas estariam de volta ao Circuito da Guia. Tem sido assim, todos os anos, até hoje…
Artigo da autoria de João Botas publicado no JTM (suplemento GPM) de 16.11.2015
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