“Melhor homenagem era ser lido pelos alunos”
Professor, advogado, mas sobretudo um contador de histórias, um retratista de Macau através das palavras. Um ano depois de Henrique de Senna Fernandes ter falecido permanece a obra, a memória de um homem simples e ainda tantos episódios por contar. A intenção do Instituto Cultural de editar contos inéditos e reeditar algumas obras do escritor macaense é “um grande passo”, considera o filho Miguel de Senna Fernandes.
Desde pequeno que sabe que as gavetas guardam partes de Macau, algumas ainda escritas à mão. Nas memórias de infância há até “um livro completo”num baú que talvez tenha desaparecido durante “as mudanças de escritório”. O pai falava-lhe sempre desse conto e de outros que guarda e também ainda não são conhecidos do público. Mais páginas com recantos (desconhecidos) que Henrique de Senna Fernandes descreveu com palavras que às vezes são mais imagens, que às vezes são mais as pessoas do que as personagens, que existem. A obra de Henrique de Senna Fernandes não acaba nos livros publicados. Aliás, quem se recorda de o ouvir contar histórias sabe que está a ler uma narrativa aberta.
Nas gavetas ficaram mesmo romances completos, ou talvez inacabados para o autor, pequenos contos pitorescos que falam da essência de Macau. Dado o peso desta obra para a comunidade, o Instituto Cultural (IC) já manifestou o interesse de reeditar alguns romances, como “Amor e Dedinhos de Pé” ou “A Trança Feiticeira” e publicar os inéditos, mencionou Miguel de Senna Fernandes. “Há muita coisa escrita, incompleta, texto disperso, há que pensar num plano para recuperar a obra. Ainda bem que o IC manifestou vontade de reeditar e publicar os livros”, já no ano passado, frisou na terça-feira, dia em que família e amigos recordaram o contador de histórias, um ano depois do seu falecimento.
Ciente de que as obras do pai “são importantes” para compreender a alma desta terra, Miguel de Senna Fernandes concorda com este projecto, que reconhece entretanto ainda não ter avançado por falta de tempo. Além de ser necessário dactilografar vários manuscritos, terá ainda de se pensar como recuperar a obra, dado que alguns contos estão inacabados, explicou, ao sublinhar que será um projecto muito significativo. “Julgo que este iniciativa é importante. O meu pai queria que as obras fossem editadas. Ainda em vida soube que havia uma movimentação para que tal fosse feito e mostrava-se satisfeito”, recordou ao JTM.
HSF na sala de aulas da Escola Comercial em 1966 |
“Vamos precisar de ajuda. Ainda bem que o IC mostrou este interesse. É já um grande passo”, acrescentou Miguel de Senna Fernandes, que neste momento se encontra a preparar as comemorações do 15º aniversário da Associação dos Macaenses e a candidatura do Teatro em Patuá a Património Cultural Intangível da RAEM.
O que está por publicar contém também excertos de uma Macau que Henrique de Senna Fernandes parecia desenhar nas suas mãos, todos os dias. “São pequenos contos, pitorescos. Sem querer exagerar, já que dizem que há essa tendência por parte dos filhos, o certo é que ele tinha uma capacidade para recriar situações e muitas experiências vividas, numa rua, num beco. Pinta com grande mestria o ambiente de Macau. O meu pai era muito apaixonado pelos acasos, e inspirava-se muito em episódios espontâneos”, frisou.
Um ano depois do falecimento de Henrique de Senna Fernandes, que estava prestes a completar 87 anos, seria também “interessante” ver a sua obra mais perto das escolas. Até porque, “a melhor homenagem a Henrique de Senna Fernandes era ser lido pelos alunos”, reconhece o filho do “homem simples”, que além de advogado também foi um professor capaz de cativar os estudantes com as histórias que só ele lhes sabia contar.
Artigo da autoria de Fátima Almeida publicado no JTM de 6-10-2011
Nota: HSF morreu a 4 de Outubro de 2010. Antes do final do ano deverá ser publicado um dos seus últimos trabalhos, o romance "A noite caíu em Dezembro".
HSF no Clube de Macau. Foto de AJM Nunes da Silva |
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