Aproximou os pincéis da “vida de Macau”. Das pessoas que espreitam pelo fio de uma janela entreaberta. Nas telas de Nuno Barreto encontra-se o movimento da Rua dos Mercadores em acrílico ou os “Sinais de Macau (2)” em aguarela, perpetuando a imagem e o tempo de uma cidade. Mas não são apenas os quadros que desenham o ritmo dos cerca de 20 anos que viveu no território. Na verdade, os seus traços ficaram marcados em muitos percursos artísticos. Para recordar o pintor e fundador da Academia de Artes Visuais de Macau é inaugurada amanhã uma exposição, com 52 das suas obras (datadas de 1981 a 2008), na galeria do edifício do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), que organiza o evento.
A mostra, que surge dois anos depois de Nuno Barreto ter desaparecido, é uma “homenagem a um ilustre artista português que se dedicou ao desenvolvimento artístico de Macau”, referiu o responsável pelos Serviços Culturais e Recreativos do IACM, Choi Chi Hong, e também um dos alunos que teve como mestre aquele que diz ser “um dos importantes pintores de gravura”.
A ideia de realizar um evento que prestasse homenagem a Nuno Barreto e aproximasse as novas gerações das suas telas teve origem na sensibilidade de Ernesto Jorge e Jorge Maneiras, curadores da exposição cuja imagem de apresentação remete já para uma característica da sua obra - a temática luso-chinesa. “Depois do desaparecimento de Nuno Barreto penso que não se fez mais do que um evento [no Clube Militar] para homenagear o artista. É um dos maiores artistas plásticos de Macau, por isso considerámos que seria uma boa altura para realizar uma mostra”, explicou Ernesto Jorge.
As obras que serão expostas pertencem a vários coleccionadores privados individuais, como Gonçalo Torres ou Neto Valente, e a instituições como a Autoridade Monetária de Macau, o Instituto Português do Oriente e o Clube Militar. Dado a diversidade de quadros houve alguns obstáculos na organização da exposição, que segundo o IACM, está orçada em 240 mil patacas, sobretudo ao nível do transporte. Um esforço que, reitera o organismo, “vale a pena” pelo contributo artístico para Macau.
A mostra é o resultado de uma escolha que permitia traçar o “retrato” artístico do pintor. “Fizemos uma selecção adequada e equilibrada para que as pessoas tenham essa percepção [da sua obra], sobretudo os mais novos. Todos os artistas plásticos de Macau estão ligados a Nuno Barreto”, enfatizou ainda Ernesto Jorge, acrescentando que desde o início houve apoio dos coleccionadores, mas não foi conseguida uma adesão total.
Nuno Barreto produziu com vivacidade anos a fio, apreciadores e compradores nunca faltaram para as suas obras e nem tudo cabe nas paredes da galeria de exposições temporárias do IACM. Por isso, os curadores da mostra falam na possibilidade de se realizarem outras acções para dar a conhecer um homem que tanto contribuiu para a evolução artística de Macau. O primeiro passo já foi dado.
“O grosso das pessoas em Macau reconheceu a obra de Nuno Barreto. Esta é uma pequena mostra, mas fica lançado o repto para que se façam outras sessões”, referiu Ernesto Jorge notando que poderão ser contemplados espaços maiores para novas exibições dentro e fora de Macau. “Não está fora de questão [uma exposição no Museu de Arte de Macau]. Porque há certamente [outros] interessados em fazer exposições sobre Nuno Barreto em Macau e em Portugal, por exemplo através da Fundação Oriente”, exemplificou. Segundo Ernesto Jorge, mesmo a “própria família de Nuno Barreto está a ponderar expor o seu espólio, com obras que não são ainda conhecidas do grande público”.
Há na verdade muito espólio por mostrar e as acções para aproximar das pessoas a obra de Nuno Barreto “não vão acabar quando esta exposição terminar”, a 20 de Novembro. Até porque como lembra Ernesto Jorge não há um coleccionador que se preze em Macau ou Portugal que não tenha um quadro de Nuno Barreto, homem com coerência que não se sujeitou a modas artísticas passageiras, mas antes segurava firme nas telas as suas impressões.
Homem de talento, que dele já foi dito ser o melhor pintor português das últimas décadas em Macau, entristeceram-no as cópias dos seus quadros que do outro lado da fronteira iam sendo reproduzidas. Na última década não terá havido nenhuma exposição de sua autoria no território, contudo, a sua obra de 1966 a 2006 foi editada em livro pela Fundação Oriente.
O pintor faleceu a 24 de Junho no Porto, a cidade onde nasceu e também iniciou a sua formação artística. Por vários cantos do mundo deixou telas e uma forte impressão artística.
Artigo da autoria de Fátima Almeida publicado no JTM de 20-10-2011
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