“For the People’s Republic of China (PRC), its political importance lay not only in the retrocession of the oldest and ultimate foreign influenced enclave on Chinese soil. For Portugal, it was primarily a matter of honourable departure and lasting legacy imbued with symbolic meaning. In the Portuguese consciousness, Macau still occupied an eccentric “space of memory”, as trading outpost and “door of the Missions” of its erstwhile maritime empire simultaneously. In practice, it meant negotiating a smooth transition to maintain remaining Portuguese economic, political and cultural interests, and to guarantee Macau’s legal-judicial framework, external autonomy and international profile”.
Thomas Chung and Hendrik TiebeMacau: Ten Years after the Handover
Thomas Chung and Hendrik TiebeMacau: Ten Years after the Handover
A chegada das primeiras caravelas comandadas por Jorge Álvares em 1513, ao litoral da China – Macau e Cantão, tornaram possível o estabelecimento de uma feitoria ou entreposto no território em 1557. Ao contrário das teses que defendem a conquista, negociação, autorização das autoridades cantonenses a um pedido efectuado previamente ou da cedência pelo imperador chinês “Chi-Tsung”, recompensando os portugueses pela luta contra os piratas japoneses, como sendo a clássica.
Todavia, parece predominar a da ocupação aparentemente consagrada no preâmbulo da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) da República Popular da China (RPC). A fixação dos portugueses em Macau nunca deixou de ser rodeada de uma patente obscuridade, pese o facto das inúmeras interpretações históricas, todas convincentes e suportadas por não menos documentação, comprovativa do mérito ou desmérito das teses em presença e que enchem bibliotecas.
Sendo incerta a fixação dos portugueses e não existindo hermenêutica que consiga chegar à verdade absoluta, parece resultar que após períodos conturbados do império chinês na época, existia uma relativa complacência na fixação dos portugueses que combatiam os piratas japoneses que infestavam os mares do Sul da China e o interesse em comerciar.
Uma plataforma fixa nas costas do mar do Sul da China, servia aos portugueses como meio de entrada ao intercâmbio comercial com o Império do Meio e ao papel de intermediários no comércio entre aquele, e o Império do Sol Nascente.
Os iniciais dezasseis quilómetros quadrados, converteram-se numa ponte de comércio com o distante Oriente. Os portugueses aceitam o nome definitivo ao povoado, que primeiramente se chamava de “A-Ma”, deusa venerada pelos marinheiros e pescadores, num templo da dinastia “Ming”, tendo-lhe sido acrescentado o nome do local “Gau” (baía), passando a ser “A-Ma-Gau”, donde deriva Macau.
Durante as guerras do ópio no século XIX, a situação deteriora-se pelo refúgio dos ingleses e Macau entra em conflito com a China e a Inglaterra. Não podia intervir, dado os seus conflitos internos e os fracos recursos de subsistência e militares.
Mantém-se perante as investidas de ocupação da Inglaterra, graças a uma disfarçada aliança com a China. Pela ocupação inglesa de Hong Kong em 1841, Macau tornou-se o seu irmão pobre e cujo crescimento manteve o território subordinado a Goa, desde 1557 a 1844, na obscuridade.
Macau passa a ser considerada por Portugal, província ultramarina entre 1844 e 1883; província ultramarina conjunta com Timor - Oriental em relação a Goa de 1883 a 1951; província ultramarina de 1951 a 1975.
Mesmo vivendo nas trevas por longo e imenso período, houve situações que mudaram e outras permaneceram. Entre as que continuam, contam-se os preços exorbitantes dos arrendamentos praticados em Hong Kong, fazendo os imigrantes menos endinheirados escolherem Macau para residir e eram totalmente dependentes da China para acender a luz, abrir a torneira de água ou aquecer a casa e de todos os comestíveis.
São completamente erradas as teses plasmadas em inúmeros escritos fundamentalmente internacionais, de que Portugal não entregou Macau à RPC, dado o particular interesse em o fazer, depois da transferência da colónia inglesa de Hong Kong, não apenas para diferenciar os processos, baseado no simples mote de que teriam sido os primeiros a chegar e por consequência deviam ser os últimos a partir, e que se devia a todo o custo cumprir os 500 anos de permanência, que na realidade foram 442 anos.
O artigo 2.º da Lei Constitucional n.º 7/74, de 27 de Julho, da República Portuguesa, determinava o reconhecimento do direito à autodeterminação, com todas as suas consequências, incluía a aceitação da independência dos territórios ultramarinos e a derrogação da parte correspondente do artigo 1.º da Constituição Portuguesa de 1933.
O Presidente da República Portuguesa tinha competências após a audição de outros órgãos institucionais de assinar acordos relacionados com o exercício daquele direito, pelo que se havia razões de inquietação pela RPC, foram desvanecidas. Face a tal argumento, o governo português, numa nota do emanada do Ministério dos Negócios Estrangeiros, datada de 6 de Janeiro de 1975, reconheceu a RPC e a legítima integração da Ilha Formosa ou Taiwan, como parte integrante da China.
Quanto à questão de Macau, o governo português considerou que o Território podia ser objecto de negociações na ocasião que fosse mais conveniente para Portugal e para a RPC. O governo chinês recebeu tal manifestação com contentamento, abrindo espaço ao entendimento e cooperação mútuas tão necessárias à resolução de forma harmoniosa da questão de Macau.
A Lei Constitucional n.º 1/76, de 17 de Fevereiro da República Portuguesa, definiu o Estatuto Orgânico de Macau e a Constituição Portuguesa de 1976, aceitaram a solução referida ao declarar no n. º 4, do artigo 5.º que Macau era um território sob administração portuguesa que se regia por um estatuto adequado à sua situação especial, e o artigo 292.º refere-se ao Estatuto de Macau.
Portugal reata as relações diplomáticas com a RPC, a 8 de Fevereiro de 1979, tornando possível a assinatura de uma declaração de intenções, e não tanto com as características de acordo, que foi considerado como contendo matéria misteriosa e realizado sem observância dos princípios do direito internacional público. Tal documento, foi conservado secreto por ambos os países durante cerca de oito anos e vem reiterar o definido no n.º 4 do artigo 5.º da Constituição Portuguesa de 1976, e que os trâmites e a determinação da data de transferência do exercício da soberania de Macau para a RPC eram adiados, para a oportunidade que se considerasse como mais favorável.
A China no final da década de 1970, inicia a caminhada nas políticas da reforma económica, traçadas por Deng Xiaoping, que contém vastas transformações, fundamentalmente no sistema económico, através do programa das quatro modernizações, na agricultura, indústria, defesa nacional e tecnologia e nas relações com o exterior. É abandonado o modelo rígido de economia socialista planificada, e redireccionado à implementação de uma economia de mercado com especificidades de carácter socialistas e alcançar o crescimento económico, atraindo investimento directo estrangeiro (IDE).
O epílogo da questão de Macau inseriu-se num quadro mais alargado, ou seja, o da reunificação e prendia-se com os propósitos para Hong-Kong. O plano escolhido para permitir a reunificação de Hong Kong e da Ilha Formosa, foi possível graças à adopção do princípio de "um país, dois sistemas", que consente a existência de uma só China, com dois sistemas, o de economia socialista planificado e o capitalista nas regiões administrativas especiais com ampla autonomia, por força das suas heranças históricas. Este modelo de conciliação prova o aspecto prático da política externa da China, com a virtude de tirar benefícios das capacidades e poder económico legados, sem entrar em conflito com a ideologia oficial do Partido Comunista e apresentar-se de forma tentadora e irresistível.
Nessa sequência, a Constituição da RPC de 1982, na revisão de 1994, que introduziu o artigo 31.º determina que o Estado podia criar Regiões Administrativas Especiais. Além de proporcionar a necessária garantia constitucional à aplicação do princípio “um país, dois sistemas”, esta norma é o pilar sobre o qual assenta o amparo à constituição das Leis Básicas de Hong Kong e de Macau. Os sistemas a vigorar nas Regiões Administrativas Especiais seriam definidos por leis da Assembleia Popular Nacional, segundo a real situação de cada uma.
No seguimento da I Guerra do Ópio, os Ingleses, através do Tratado de Nanquim, adquirem a cedência da ilha de Hong-Kong, e na segunda derrota dos chineses na II Guerra do Ópio, mais cedências são feitas como “Kowloon” em 1860. A Inglaterra em 1898 obtém o arrendamento dos “Novos Territórios”, por um período de 99 anos. Acercando-se o término do arrendamento, a China decidiu retomar a soberania sobre Hong Kong, “Kowloon” e os “Novos Territórios”, iniciando negociações em 1982 que terminam com a assinatura da Declaração Conjunta Sino-Britânica, de 19 de Dezembro de 1984. No decorrer do processo de negociação é sugerido pela China a Portugal, que a questão de Macau fosse resolvida em termos e prazos idênticos.
As negociações iniciam-se em Junho de 1986, e é assinada a Declaração Conjunta Sino-Portuguesa, a 13 de Abril de 1987, fixando a transferência do exercício de soberania sobre Macau, incluindo a ilha da Taipa e de Coloane, para 20 de Dezembro de 1999.
A Declaração Conjunta Sino-Portuguesa, contém quatro etapas quanto à questão de Macau. A primeira foi até 19 de Dezembro de 1999, da responsabilidade de Portugal que tinha por fim adaptar o então Território para a transferência do exercício da soberania para a RPC.
A segunda etapa deu-se a 20 de Dezembro de 1999, com a criação da RAEM da RPC e entrada em vigor da Lei Básica que repetiu as grandes directivas da Declaração Conjunta.
A terceira etapa, tem um período de 50 anos, ou seja, até 19 de Dezembro de 2049. A responsabilidade pertence única e exclusivamente à RPC, que terá de manter a equilíbrio e continuação, adaptando gradualmente a RAEM com vista à reintegração futura que constitui a quarta e última etapa do processo. A Portugal cabe a responsabilidade de teoricamente, dadas as excelentes e únicas relações de amizade existentes entre os dois países de verificar, nesse período dos 40 anos que restam de reintegração, a actividade no decurso do exercício da soberania, no respeito pelos compromissos assumidos pela RPC perante Portugal e a comunidade internacional, da Declaração Conjunta Sino-Portuguesa, nas normas contidas na Lei Básica.
A quarta e última etapa, dar-se-á a 20 de Dezembro de 2049.
Passados 1/5 da terceira etapa, ou seja, cumpridos os primeiros 10 anos de existência da RAEM, as felicitações vão indubitavelmente para a RPC, que soube de forma pragmática respeitar os compromissos assumidos e gerir de forma consensual, harmoniosa e sensata, retirando o melhor rendimento das potencialidades e das características próprias a nível histórico, económico e social por meio do governo da RAEM, mesmo no decurso de situações sensíveis quer a nível interno, quer fazendo face às crises provenientes do exterior, tendo respeitado, conservado, promovido e estimulado a inestimável contribuição portuguesa e a riqueza de um herança multi-étnica e cultural, com individualidade e particularidades singulares, num encontro raro entre o Oriente e o Ocidente.
As felicitações cabem em segundo plano, ao governo da RAEM e ao seu Chefe, Dr. Edmundo Ho, que pôs em prática a gestão com êxito do primeiro e mais difícil período desta etapa de 50 anos.
Em terceiro plano as felicitações são devidas a Portugal por ter criado com a RPC as melhores soluções para a RAEM, salvaguardando a continuidade do estatuto de Macau e o futuro das suas gentes, o que constitui exemplo único para o mundo.
Esta década de exercício de soberania da RAEM, por parte da RPC veio provar a capacidade de aquela ser governada pelas suas gentes, conforme o estipulado no artigo 3.º da Lei Básica.
Mais que chegar à mesquinhez de conclusões de que o desenvolvimento e investimentos que mudaram a face da RAEM nesta década que se comemora, com ciclos baixos e altos de permeio, ser uma sequência do planeado pelo governo português de Macau ou pelo governo da RAEM, torna-se necessário deixar a mentalidade passadista, porque a etapa de administração portuguesa teve o seu fim a 19 de Dezembro de 1999. Após essa data, é da responsabilidade do Governo Popular Central da RPC, através do governo da RAEM.
A continuidade da língua portuguesa não está dependente da existência ou não do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa, uma vez que faz parte de todo o legado cultural, património de Macau e que a Declaração Conjunta Sino-Portuguesa, no seu ponto 2.5, determina que além da língua chinesa, poder-se-á usar também a língua portuguesa nos organismos de Governo, no órgão legislativo e nos Tribunais da RAEM. A Lei Básica veio consagrar o mesmo princípio no artigo 9.º
Texto de Jorge Rodrigues Simão, in HojeMacau, 18.12.2009
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