domingo, 10 de janeiro de 2021

Canhão de Macau em Omã

Os leitores assíduos deste blogue já sabem que existem canhões fundidos em Macau em várias partes do mundo. Desta vez escolhi um em particular entre os muitos canhões portugueses que estão actualmente em Omã, um Sultanato localizado na Península Arábica,  região outrora ocupada pelas cores da monarquia de Portugal.
O canhão em questão está exposto no Museu Nacional do país, em Muscate, e está classificado como falconete, uma peça de artilharia muito eficaz contra a infantaria. Foi fabricado em 1643 na fundição de Manuel Tavares Bocarro, um dos mais conceituados fabricantes da época a nível mundial.
Numa das inscrições pode ler-se " Viva el rei do João 4º". Foi aclamado rei a 15 de Dezembro de 1640 terminando assim a dinastia filipina, que durante 60 anos governara Portugal) seguido de "Macao en Caza da Polvra - 1643" Ou seja, fundido na Casa da Pólvora em Macau. A notícia da aclamação do novo rei português só chegaria a Macau em Maio de 1642,* embora em 1641 tenham surgido rumores do facto no território através de uma embarcação britânica.
Este espaço estava localizado muito provavelmente na zona que hoje se conhece por Chunambeiro próximo da então Fortaleza do Bom Parto (no sopé da actual residência do Cônsul de Portugal em Macau.
Xinamo, Chuname, ou Chunambo é o nome cal obtida pela calcinação de conchas de mariscos usada no processo de fundição. O motivo de admissão do termo indiano é que a cal da Ásia se faz de outro material. O étimo é o maliana Chuunambra, relacionado com o neo-arco chunã. É de Chuuambo que deriva a palavra Chunambeiro. Nesse local havia antigamente fornos de cal do ostras, e também foi o local da antiga fundição de artilharia e casa da pólvora criada por Manuel Tavares Bocarro. 
Curiosidade: o nome chinês do local - Sio Fui Lu Cai - significa Rua do Forno de Cal.
O suporte do falconete foi feito recorrendo à figura de dois leões em estilo chinês.
Da ornamentação do cano e culatra fazem ainda parte folhas de acanto, uma planta espinhosa de folhas longas, verdes e recortadas.
O Falconete era uma boca de fogo leve montado sobre uma carreta era amovível. Pesava entre 80 a 200 kg e tinha cerca de 1,5 metros de comprimento. Utilizava meia libra (0,23 kg) de pólvora para disparar um projéctil de uma libra (0,5 kg) e mesmo essa pequena quantidade de pólvora fazia um efeito de ricochete obrigado o falconete a retroceder até três metros e meio após um disparo.
* A notícia oficial da aclamação do novo rei em Macau ocorreu a 31 de Maio de 1642 quando chegou ao território oriundo de Lisboa o macaense António Fialho Ferreira, Fidalgo da Casa Real, Cavaleiro da Ordem de Cristo e Capitão-Mor nos Mares da Índia. O Senado, reunido em conselho geral do povo a 22 de Junho, lavrou termo de aceitação e obediência ao novo soberano, seguindo-se inúmeras formas de comemoração e tendo sido decidido enviar não só uma quantia em dinheiro para o novo soberano como também 200 peças de artilharia em em bronze (incluindo canhões) fundidas no território por Manuel Tavares Bocarro.
As comemorações prolongaram-se por vários anos tendo em 1643 - ano da fundição do falconete aqui referido - sido publicado um importante opúsculo com o título "Relaçam do que socedeo na Cidade de Goa, e em todas as mais cidades & fortalezas do estado da India, na felice aclamação del Rey Do João IIII de Portugal Nosso Senhor. (…)”. Por Manoel Jacome de Misquita morador na Cidade de Goa (Armas do Reino). Impresso no Collegio de S. Paulo Novo (Goa) Anno de 1643. 
A imagem acima é uma reprodução fac-simile do opúsculo original que pertenceu à biblioteca de Charles Boxer.

1 comentário:

  1. muito interessante! apesar de ser uma peça de guerra, é bastante bela
    relembro que li que em Portugal durante a união ibérica, Portugal atrasou-se muito em termos de fabricação de material bélico
    porque deixaram de produzir e de inovar
    simplesmente para evitar que esse material fosse requisitado pelos espanhóis…
    não sei muito mais sobre isto, foi um artigo há já bastante tempo!

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