Carta demográfica do Império Colonial Português.
Gravada e impressa no Instituto Geographico e Cadastral, em 1946.
Ministério das Colónias, Junta das Missões Geográficas e de Investigações Coloniais
De acordo com os dados apresentados, no censo de 1927 a população de Macau era de 157.175 habitantes passando para 374.000 no censo de 1940. Ou seja, mais do que duplicou. Um facto que se ficou a dever à invasão da China pelo Japão em 1937 e depois ao alastrar da segunda guerra mundial à Ásia, tornando-se o território um porto de abrigo para milhares de refugiados de várias nacionalidades. O conflito iria durar até 1945 o que fez com que a população de Macau crescesse ainda mais face aos valores apresentados para 1940.
Excerto de "Macau 1937-1945: os anos da guerra" de João F. O. Botas, de onde também extraí o gráfico:
"Ponto minúsculo de exclamação ocidental no Extremo Oriente Macau foi desde a chegada dos portugueses um milagre de sobrevivência. Nos “anos da guerra” o milagre voltou a acontecer. No Natal de 1941 quando a 2ª Grande Guerra ganhou dimensão mundial e se estendeu à região da Ásia-Pacífico já a então colónia portuguesa – a primeira e a última possessão europeia na Ásia – vivia a braços com a guerra sino-japonesa iniciada anos antes e consumada face aos aliados com a invasão de Hong Kong. “Maus dias se vislumbravam para Macau, dias de luto e miséria, dias de amargura e cativeiro...”
O território escapou às agruras dos combates mas não aos efeitos nefastos do conflito graças a uma neutralidade “colaborante” (im)possível e esteve muitas vezes na eminência de ser invadida pelas tropas nipónicas que do outro lado da Porta do Cerco combatiam os chineses. No entanto, a invasão surgiria de onde menos se esperava com o ataque de aviões norte-americanos no início de 1945. De Lisboa vão instruções para não hostilizar as forças beligerantes, assegurar a neutralidade e sobreviver. Encurralada e isolada do mundo durante
quase 10 anos, Macau viveu um dos períodos mais conturbados da sua história e então, como nos primórdios da sua fundação no século XVI, tornou-se porto de abrigo para milhares de refugiados que ali encontraram “um fugaz mas sublime parêntesis de paz num mundo em guerra”.
A população de pouco mais de 200 mil almas passou, de repente, para mais de meio milhão. Quase triplicou. Num ínfimo espaço habitado por um mosaico de povos os contrários foram sendo conciliados numa diplomacia quotidiana marcada pela fome e pela morte mas também pela solidariedade e esperança de melhores dias. Diversos relatos falam de pessoas que entre as fezes procuravam os alimentos que não tivessem sido digeridos para lhes saciar a
fome. Na luta pela sobrevivência nem todos foram bem-sucedidos mas o ‘milagre’ de Macau salvou a vida a milhares de pessoas e encerra em si o ‘segredo’ de uma história secular onde a cidade foi não só “um oásis de paz” mas também um “teatro de guerra”.
“Ao anoitecer eram colocados cavalos de frisa e arame farpado em todas as artérias que davam acesso aos quartéis e esquadras policiais. As ruas eram vigiadas por sentinelas que no silêncio da noite gritavam de 15 em 15 minutos: Sentinela alerta! Resposta: Alerta está!”. Escreveu Leonel Barros, militar em Macau na época.
Nesta viagem de regresso ao passado e à história recente de Macau faz-se um relato factual dos principais acontecimentos, ocorridos dia-a-dia, hora a hora, entre 1937 e 1946 e revelam-se dezenas de testemunhos, alguns deles inéditos. Relatos de fome, crueldade, doença, violência e morte mas também de solidariedade e esperança vividos durante “os anos da guerra”."
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