Na edição de 2 de Março de 1837 do jornal O Macaista Imparcial surge esta pequena notícia: "Acha-se em Macao o china retratista Lamqua. Qualquer Senhor ou Senhora que quizer aproveitar-se do seu préstimo dirija-se à Loja do mesmo a Santo Agostinho, em cuja porta se acha inscripto o seu nome".
Lamqua (1801-1860), também conhecido por Lin Gua ou Guan Qiao Chang terá sido um dos pupilos de George Chinnery (1774-1852) - embora este o negue* - durante vários anos em Macau até se ter afastado do mestre e montado negócios por conta própria em Cantão onde instalou um atelier na 13ª rua da feitoria.
Entre 1836 a 1855 Lam Qua fez uma série de retratos de pacientes chineses a receber tratamento do médico missionário dos EUA, Peter Parker (1804-1888). Foram essas pinturas que o tornaram o primeiro chinês a ter obras expostas no ocidente.
* vários autores o referem e até notícias de jornais de Cantão, por exemplo, em 1835...
Peter Parker retratado num quadro de Lam Qua |
Peter Parker chegou a Cantão em 1834 para levar a cabo a sua missão missionária na China e onde fundou um hospital de oftalmologia. Também em Macau o médico Parker estabeleceu um hospital entre Julho e Outubro de 1838 tratando muitos pacientes chineses com cataratas e tumores. Com o início da primeira guerra do ópio e a expulsão dos estrangeiros de Cantão o hospital de Cantão foi encerrado e Parker regressou aos Estados Unidos. Tratou cerca de 9 mil pacientes segundo relatos da época.
Antes de Parker, um outro médico do ocidente, Thomas R. Colledge (1797-1879) fizera trabalho semelhante. Em 1827 fundou em Macau um hospital oftalmológico que funcionou até por volta de 1832. Colledge saiu de Macau em Maio de 1838 rumo a Inglaterra. Desta sua experiência em Macau existem vários quadros pintados por... George chinnery.
Conhecem-se dois auto-retratos de Lam Qua; o primeiro data de meados da década de 1840 (acima); o segundo (abaixo) tem no verso uma inscrição em inglês onde se lê "Lamqua, aos 52 anos, por ele próprio, Cantão, 1853". E ainda uma inscrição em chinês com a data de 1854.
No livro Illustrations of China and its people publicado em Inglaterra em 1873/4, o fotógrafo John Thomson, que andou pela pela China, Macau e Hong Kong entre 1862 e 1872, inclui uma fotografia de Lamqua, na altura com atelier em Hong Kong.
Lamqua no atelier em Hong Kong fotografado por Thomson em 1871 |
Nesse livro Thomson afirma que "Lamqua foi um aluno chinês de Chinnery, notável artista estrangeiro falecido em Macau em 1852. Lamqua produziu um bom número de excelentes trabalhos a óleo, ainda hoje copiados pelos pintores de Hong-Kong e Cantão. Tivesse ele acaso vivido em outro país, e seria o criador de uma escola de pintura. Na China, seus seguidores não lograram captar o espírito de sua arte. Limitam-se a fabricar imitações servis, copiando obras de Lamqua ou de Chinnery, ou de outro qualquer, ou seja o que for, só porque tais imitações têm de ser concluídas e pagas num prazo determinado, a tanto por pé quadrado.
Há em Hong-Kong um número de pintores estabelecidos, mas fazem todos o mesmo tipo de trabalho com a mesma tabela de preços que variam de acordo com as dimensões da tela.
Ocupam-se essencialmente da cópia para tela de fotografias. Cada atelier tem um autor de esboços que começa por cativar clientes como os marinheiros estrangeiros. Tais marinheiros encomendam o retrato de Mary ou de Susan, tão grande e tão barato quanto possível, e que deve estar pronto, emoldurado e embalado para seguir viagem em 24 horas. Os vários pintores do atelier dividem as tarefas do seguinte modo: um aprendiz dedica-se a pintar corpos e mãos, enquanto o mestre executa a fisionomia. Assim o trabalho é feito com inacreditável rapidez."
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