terça-feira, 3 de novembro de 2020

Arthur Tamagnini de Souza Barbosa

Arthur Tamagnini de Souza Barbosa - na antiga grafia - nasceu em Lisboa em 1880 e foi por três vezes Governador de Macau. A primeira nomeação ocorreu em Março de 1918 desembarcando no território a 12 de Outubro desse ano. Em Julho do ano seguinte muda o ministro das Colónias em Portugal e Barbosa sai do cargo. Seria novamente nomeado Governador em Julho de 1926, chegou ao território a 8 de Dezembro, permanecendo no cargo até 19 de Novembro de 1930. Em Novembro de 1936, Tamagnini Barbosa é nomeado pela terceira vez Governador de Macau, chegando ao território a 11 de Abril de 1937. 
Do que conhecia até agora dizia-se que tinha morrido no palacete de Santa Sancha, a 10 de Julho de 1940, vítima de anemia cerebral, com 59 anos.
Mas numa notícia da época (The China Monthly Review) escreve-se que morreu em Hong Kong quando se preparava para regressar a Portugal, via EUA, num clipper: "Senhor Artur Tamagnini de Souza Barbosa , Governor of Macao, Portugese Colony on the South China coast near Hongkong, died in Hongkong on Wednesday, July 10. Dr. Barbosa had planned to return home by Clipper plane via the United States, but the illness become more critical."


Ao lado está uma fotografia  - tirada em 1968 por Nunes da Silva, antigo mlitar - do busto do Governador Artur Tamagnini de Souza Barbosa.

O busto foi fundido em bronze, com pedestal de mármore foi produzido pelo escultor Oséo Acconci
Custou 2.750 patacas subscritas pelo publicamente e ficou pronto em Dezembro de 1940 - poucos meses depois da morte do governador - sendo colocado à entrada do Asilo de Mendicidade Maria Anna Accioili Tamagnini Barbosa, mulher do governador.
Quando a asilo foi encerrado, o busto foi guardado pelo Leal Senado até ser colocado no Jardim da Flora onde esteve durante muitos anos. 
Por iniciativa do filho, Mariano Tamagnini Barbosa, o busto seria transferido em 1997 para o átrio da Secção Pré-primária da Escola Primária Luso-chinesa de Tamagnini Barbosa (extinta em 2011) na Rua Marginal do Canal das Hortas. 

A revista Ilustração Portuguesa na edição n.º 679, de 24 de Fevereiro de 1919, dá conta da chegada a Macau do governador num artigo - apenas com o título "Macau" - ilustrado de três páginas e que aqui é reproduzido. Aires Pires assina o texto e os "clichés", leia-se fotografias, são do "amador" Carlos Cabral.

Em o dia 12, pelas 15 horas, desembarcou no caes da Praia Grande, em frente das Repartições Publicas, o governador Sr. Artur Tamagnini de Sousa Barbosa, vindo desde Hong-Kong na canhoneira «Patria». Do caes até ao palacio do governo, estava esse trecho da Praia Grande belamente ornamentado de arcos de folhagem e bandeirolas. Levantava-se em frente do mesmo caes uma torre de bambu para servir de sustentaculo a um extenso molho de panchões, que é de costume queimarem-se por estas paragens chinezas nos dias de grande gala. Escusado é dizer que todos os funcionarios como todo o povo esperou e, diga-se, não foi uma espera curiosa, mas uma esperança e prova de aféto que o Governo da Republica dava ao povo de Macau na pessoa do ilustre governador. Trocados rapidos cumprimentos entre o governador e as pessoas que d´ele se acercaram, seguiu o sr. Tamagnini Barbosa, no meio da multidão, para os Paços do Conselho do Leal Senado, onde deveria tomar posse do Governo da Provincia. 
Foi na sala do Leal Senado, após um breve discurso do governador interino, o sr. Fernando Vieira de Matos, que fazia entrega do Governo, assegurando a cooperação dos funcionarios, como o desejo d´uma administração feliz, que, o Sr. Artur Tamagnini, pronunciou um discurso ouvido com o maior respeito, afirmando que hesitára em aceitar o cargo de que se acha investido, por a falta dos seus recursos junta aos cuidados que lhe inspiram a governação publica e a politica em geral. Acima de tudo, porém, estava o consagrar-se á terra que embalára a sua meninice e dourára os sonhos da juventude, terra cheia de recordações, em que seu pae trabalhou longos anos para legar a si e aos irmãos um riquissimo tesouro: o seu nome. 
Felicitava-se pelo regosijo e pelas demonstrações que lhe prestava o povo de Macau, representando contudo uma homenagem que se reflectiu no primeiro magistrado de Portugal e no governo da Republica. Pediu o concurso dos que, pela ordem, progresso e legalidade, sempre pugnaram para o engrandecimento da linda colonia de Macau. E esses haviam de ser, talvez, os seus companheiros de outr´ora, alunos dos seus mestres mais dilétos que, pela experiencia dos anos e pelo saber, seriam imprescindiveis orientadores.
E razão tem para esperar esse concurso leal, porque ele, nunca negou na Metropole o seu apoio a medidas que interessavam esta terra. Que o confirmem Manuel Fratel, o benquisto diréctor geral de Finanças das colonias, Eduardo Marques e Carlos da Maia que tanto honraram o bom nome de Macau, Gonçalves Pereira e Velhinho Correa, seus antigos representantes no parlamento. Uma condição deseja impôr o novo governador aos que, juntos, hão-de colaborar: suplantar a politica dos interesses locaes e a politica dos faciosismos, porque o tempo nos tem demonstrado ser antagonica da aspiração nacional. A nossa raça parece cada vez menos preocupada com o seu destino, e a politica, entre nós, é apenas um factor de retrocesso, no conceito dos outros povos.
A nossa politica, deverá ser um programa de reconstrução, iniciado pelo Governo da Republica, estabelecendo mandatos que diréta ou indirétamente radiquem á CoIonia o nosso sangue, o nosso espirito e a nossa fé. Um programa de colonisação deve ser por nós traçado visando mais alto que a resignação de alguns centos de cidadãos que mourejam o pão amargurado d´uma existencia atribulada, e mais alto que a sofreguidão de algumas duzias de pessoas que, em meras transações e em interesses materiaes encontram a satisfação plena das suas ambições. 
Havemos de erquer o nosso peito acima do borbulhar repugnante d'essa vil politiquice, que só vive de interesses mesquinhos e se compraz em lesar os outros, e o nosso espirito ha de compreender quanto acima d´eles tem de pôr o ideal do bem comum. O Presidente da Republica no dia da sua proclamação afirmou que uma nova era de Liberdade surgia e que não seria preciso que o canhão falasse, que se disparassem as espinqardas e as espadas tinissem; bastava uma meticulosa administração, a liberdade de crenças e o respeito por todos. 
Disse, que em Macau, sempre viveu altivo o sentimento patriotico e sabe que não houve na nossa historia colonial outra tão distinta demonstração, como o titulo de Leal concedido ao Senado. Se os reis abençoaram o sentimento de nacionalidade do povo de Macau, não aconteceu outro tanto com os cuidados, de que eram merecedores os portuguezes que procuraram acreditar este encantador rincão do património portuguez. 
Atribue a decadencia do comercio ao açoreamento do pôrto e justifica a necessidade de que ele volte a ser o que era d´antes. É razão para crêr, pois, que o governo da Republica aceite a opinião de que as obras do porto devem ter desde já maior incremento, concedendo uma justa autonomia á Missão que foi encarregada de proseguir em taes obras. Disse mais o sr. Tamagnini que desejava apoiar por completo a solução do problema do abastecimento de agua, cuja iniciativa lhe agradava em extremo. É seu proposito minorar a precaria e lamentavel situação dos functonarios civis. À remodelação da instrução dará tambem o seu apoio. Desejará vêr sempre mantida a ordem publica e a maior disciplina em todos os ramos de serviço e punido quem delinquir.
Em seguida, disse, que manifestava a sua gratidão pelos Srs. governadores de S. Tomé e Angola, os Srs. João D. Ferreira, e Jaime Moraes, de quem recebeu, na sua passagem, demonstrações de apreço; e o mesmo diz do governador interino de Hong-Kong, sr. Claud Severn, que o recebeu com rara distinção n´aquela colonia. Lembrou com aféto todos os portuguezes heroicos, que teem sacrificado a vida pela Patria na Africa e na França. E, finalmente, exprimiu a sua mais alta consideração e apreço pelo povo de Macau e pela Patria. Falou, a seguir, o presidente do Leal Senado, entregando ao ilustre governador a chave da cidade e dirigindo-lhe palavras de estima e louvor, o que tudo ele agradeceu dizendo que o povo de Macau tinha n´ele um defensor acerrimo e um administrador honesto dos seus haveres e que essa afirmativa, não a fazia em vão: garantia-a com o seu nome e honra. Resoaram então vivas á Republica, ao seu presidente, ao nosso exercito e ao povo de Macau. Este acolhimento demonstrou bem o carinho e aféto que o novo governador inspira aos macaenses.
Grande parte das entidades da terra o conhecem pessoalmente, e tem n´esse sentido a influição diréta da sua presença, do seu porte tão gentil como insinuante, do seu trato cativante e singelo. Por isso n´aquele dia de recéção só houve sentimentos cordeaes para com S. Ex.ª que assumia a grande responsabilidade de superintender e dirigir os destinos de Macau. Pela nossa parte assinalamos esta data, pois que a escolha recaiu n´um cavalheiro de tão primoroso trato. 
Macau, 20-9-918. Aires Pires".


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