sexta-feira, 31 de maio de 2019

Macau no nº 16 da Avenida Ressano Garcia

Já por aqui me referi às múltiplas 'marcas' de Macau que existem em Portugal, nomeadamente em Lisboa e na toponímia. Para o post de hoje escolhi o prédio nº 16 da Avenida Ressano Garcia, nas chamadas Avenidas Novas que foi mandado construir por José Maria Nolasco da Silva, tendo sido inaugurado em 1935.

José Maria Nolasco da Silva nasceu em Macau a 22.01.1878 e morreu em Lisboa, Benfica, a 11.02.1960. Era filho de Pedro Nolasco da Silva (1842-1912) e de Edith Maria Engier (n. 1850). Desenvolveu a sua vida profissional como funcionário das alfândegas marítimas chinesas (Chinese Maritime Customs) cuja liderança e quadros superiores era assegurada por ocidentais, principalmente ingleses.

Aos 51 anos, em 1929, quando decidiu terminar a vida profissional mudou-se para Lisboa com a família e investiu em dois prédios de rendimento no Bairro Azul indo viver para uma moradia que adquiriu em Benfica.
O projecto do prédio da Avenida Ressano Garcia 16 é da autoria do arquitecto Norte Júnior, de quem José Maria se tornou amigo, vindo também a projectar a casa de férias em São Martinho do Porto.
Ao longo dos mais de 50 anos que viveu em Macau José Maria ficou profundamente marcado pela cultura oriental, nomeadamente a chinesa e a japonesa, esta última fruto da estadia prolongada que por lá teve pouco antes de se mudar para Portugal.
Como era habitual na época trouxe consigo várias peças de mobiliário chinês mas consta que foi em Portugal que mandou fazer um serviço de jantar ilustrado com com o caractere chinês 諾 que correspondente ao seu nome e que se pronuncia "Nô", de Nolasco. Consta também que entre os hábitos orientais que adquiriu em Macau, José Maria Nolasco da Silva tinha por hábito lacrar os envelopes com um sinete com o seu nome em chinês.
Essas influências orientais ficariam para sempre marcadas no prédio que mandou fazer de raiz. A começar pela estrutura da porta de entrada inspirada num torii japonês, o pórtico de entrada dos templos xintoístas. De cada lado porta destacam-se dois dragões em baixo relevo. Na cultura chinesa o dragão é um símbolo de força, poder e boa sorte.
Ainda na fachada principal, mas por cima da porta, estão representadas três moedas chinesas redondas, com um orifício quadrado no centro, que em Macau eram designadas por sapecas.
Estas moedas eram habitualmente cunhadas com quatro caracteres chineses que identificam a época da sua criação. Quando caíram em desuso as sapecas tornaram-se símbolo de fortuna e José Maria Nolasco da Silva inscreveu na maior das três, ao centro, quatro caracteres 諾 樂 師 古 cujo som a pronunciarem-se remetem para o apelido Nolasco: Nô, Le, Si, Cu.
O arquiteco Manuel Joaquim Norte Júnior (1878-1962) estudou em Lisboa e Paris e fez ainda viagens de estudo a Espanha, França e Bélgica. A sua primeira obra foi a Casa Malhoa em 1905, actual Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves, valeu-lhe o Prémio Valmor, o primeiro dos sete que iria arrecadar, além de duas menções honrosas.
"Detentor de uma estética eclética, oscilante entre o geometrismo, o luxo e elementos decorativos ostensivos e orgânicos, inspirados na Arte Nova", Norte Júnior projectou dezenas de edifícios pela cidade, entre os quais moradias na Avenida da República, o Café Nicola, no Rossio, o Royal Cine, na Graça, e a Pensão Tivoli, na Avenida da Liberdade.

2 comentários:

  1. Caro João Botas

    Felicito-o pelo post sobre o edifício mandado construir pelo meu Avô José Maria Nolasco da Silva, baseado numa nota que escrevi para o projeto "Memória para todos" e disponível no seguinte link:
    https://memoriaparatodos.pt/portfolio/avenida-ressano-garcia-n-o-16/

    O post ficou interessante, enriquecido com fotografias adicionais do prédio e referências ao seu projetista, o arquiteto Norte Junior.

    Parabéns pela iniciativa.

    Luís Nolasco Lamas

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  2. Obgdo Luís. Ainda bem que gostou.Cumprimentos

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