quinta-feira, 20 de junho de 2019

Geographia e Estatistica Geral de Portugal e Colonias com um Atlas

"Geographia e estatistica geral de Portugal e Colonias com um Atlas" é um livro de 457 páginas da autoria de Gerardo Augusto Pery, editado em 1875 pela Imprensa Nacional, Lisboa. Militar de carreira, Gerardo Augusto Pery de Linde (1835 - 1893) pertenceu à Sociedade de Estatística de Paris e à Academia das Ciências de Lisboa. 
Este livro é a sua principal obra.  Seguem-se alguns excertos:

(...) O trabalho que emprehendemos, e que hoje damos a publico, tem por fim preencher uma importante lacuna de ha muito reconhecida: a de uma descripção exacta e completa de Portugal, que facilite e esclareça o ensino de sua geographia, e sirva de auxiliar nos assumptos de administração publica. (...)
Na parte relativa ás ilhas adjacentes e províncias ultramarinas, compilámos o que havia de melhor e mais recente, fornecendo-nos um valioso auxilio os relatórios das diversas auctoridades; sem os quaes fora impossível descrever o estado actual dos vastos domínios portuguezes. Para não excedermos o quadro que nos impozemos, foi forçoso empregar uma concisão extrema, procurando ao mesmo tempo expor os factos com a maior clareza. Podemos assim, reunir em um só volume quasi tudo quanto se pôde apurar hoje da nossa estatística. Foram grandes as dificuldades com que lutámos, mas por bem pagos nos daremos do nosso trabalho, se tivermos conseguido fazer uma obra útil e necessária. Lisboa — setembro de 1875. (...)"
"À sua vantajosa posição geographica, no extremo Occidental da Europa e em face da immensidade dos mares, deve Portugal o ter podido exercer a sua enérgica actividade de outras eras até ás mais remotas paragens do globo, alargando os seus domínios pela immensa área de cerca de 10.000:000 de kilometros quadrados, dividida pelas cinco partes do mundo. Tendo porém perdido bom numero de possessões na Africa, Ásia e Oceania durante o dominio hespanhol, e declarando-se o Brazil independente em 1825, ficou Portugal possuindo 2.011:640 kilometros quadrados, que é a superfície que actualmente constitue o reino e possessões, cuja divisão geral é a seguinte:
Europa: Portugal, formado pelas províncias de Entre Douro e Minho, Traz os Montes, Beira (Alta e Baixa), Extremadura, Alemtejo e Algarve. Ilhas Adjacentes, que comprehendem os dois archipelagos dos Açores e Madeira. Superfície 92:772 kilometros quadrados. 
Africa: Província de Cabo Verde, que consta do archipelago de Cabo Verde, e do districto de Bissau e Cacheu, na Senegambia; superfície 11:329 kilometros quadrados. Província de S. Thomé e Príncipe, que abrange as ilhas do mesmo nome e o território de Ajuda no golpho de Benim; superfície 1:025 kilometros quadrados. Província de Angola, na costa occidental; superfície 600:000 kilometros quadrados. Província de Moçambique, na costa oriental e ilhas de Cabo Delgado, Angoche, Bazaruto; superfície 1.284:000 kilometros quadrados. 
Ásia: Província de Goa, e districtos de Damão e Diu, no golpho de Cambava; superfície 5:510 kilometros quadrados. Província de Macau e Timor, composta da península de Macau na costa do império chinez, e do districto de Timor na Oceania, o qual é formado por metade da ilha de Timor e pela pequena ilha de Pulo-Cambing; superfície 17:004 kilometros quadrados. (...)
O capítulo sobre Macau (pág. 387 a 397) abrange os seguintes temas: "Geographia physica, Situação. Dimensões. Orographia. Hydrographia, Clima.  Estatística. Descoberta da China e primeiro estabelecimento portuguez. Cidade de Macau. População,  Commercio, Movimento commercial. Principaes géneros da importação e exportação. Emigração de colonos chins. Rendimento. Receita e despeza. Instrucçâo. Força militar."
Província de Macau e Timor:
"Comprehende esta província a península de Macau e suas dependências, e o governo subalterno de Timor. Situada no extremo sul-oriental do vasto império da China, a provincia de Macau faz parte da ilha de Hiang-Chan, pertencente á provincia de Cantão, na entrada do grande rio d'Este nome. Tem 4,5 k de comprimento, no sentido NS., desde o forte de S. Thiago da Barra até á muralha que corta o isthmo, separando o território português do império chinez; na máxima largura, na parte media da península, tem 1:800 metros; para o S. diminue muito de largura, a qual não passa de 600 metros em um espaço de 1:500 metros. 
Mapa de Macau e Ilhas: um dos 10 do livro

A superfície da península é de 375 hectares. A O. de Macau fica a montanhosa ilha da Lapa, da qual é separada por um braço do rio de Cantão, com 600 a 800 metros de largura. Entre as ilhas que ficam ao S. da península notaremos a pequena ilha da Taipa, onde ha um forte portuguez, e as ilhas de Macarira e Kai-Kong, alinhadas no rumo de OSO. A distancia de Macau a Timor é de 1:980 milhas; a Goa 3:540; a Lisboa pelo isthmo de Suez 9:050, e pelo cabo da Boa Esperança 12:250. 
Orographia
A península é accidentada por alguns montes graníticos que se levantam sobre a costa de E. O mais elevado é o da Guia, a NE. da cidade; tem 106 metros de altitude e no cimo está edificada a fortaleza e pharol da Guia. A ilha da Taipa tem uma montanha de 102 metros de altura, e a ilha de Kai-Kong eleva-se a 170 metros. 
Hydrographia
A E. da península fica a bahia de Macau, a que ali chamam Rada de Macau, desabrigada dos ventos de N. a ESE., onde fundam os navios de maior lotação em fundo de 6 a 7 metros, á distancia de 2,5 milhas da cidade. Do lado de O. fica o porto interior, formado pelo canal que communica com o rio de Cantão, e que apresenta profundidades de 4 a 7 metros. A entrada para o porto nao tem mais de 3 a 3,5 m de fundo. 
O estabelecimento do porto é às 10 horas. A máxima amplitude da maré é de 6,5m. Em marés vivas a velocidade da corrente de maré chega a 6 milhas por hora. 
É considerado como muito saudável o clima de Macau. A estatística medica mostra, porém, pela predominância das febres intermittentes e remittentes, que é grande a influencia das emanações paludosas dos extensos lodaçaes que as marés deixam a descoberto nas margens do rio. As doenças que ordinariamente produzem maior numero de óbitos são: as febres remittentes biliosas, as perniciosas, a tisica, a diarrhéa, as bronchites, etc. 
A península pouco produz; quasi todos os géneros que se consomem na cidade sao importados do território chinez que é muito fértil. 
História e Formação:
Parece ter sido Perestrello o primeiro portuguez que visitou a China, depois da conquista de Malaca em 1511. Em 1542 já os portuguezes tinham conseguido estabelecer uma grande feitoria em Xing-Po, que o commercio com o Japão, também descoberto pelos portuguezes, tinha feito florescer. Tendo sido destruída a feitoria pelos chins, passaram os portuguezes para Ting-Tcheu no anno de 1549, e finalmente em 1557 obtiveram do imperador da China a concessão da península de Macau, em reconhecimento do haverem os portuguezes destruído os piratas que infestavam as costas do império. 
À cidade, edificada na parte meridional da península, tem actualmente mais de 3 kilometros de extensão, contando com os arrabaldes chins de Patane e da Barra. Os edifícios mais notaveis são a Sé e o palácio do governador. Tem 3 freguesias: Sé, S. Lourenço e Santo António, e 3 hospitais; é defendida pelas fortalezas do Monte e da Guia, e pelos fortes de S. Francisco e Nossa Senhora do Bom Parto. Na ponta de Cacilhas ha o pequeno forte de D. Maria II, e no; extremo S. da península o forte de S. Thiago da Barra. 
População
A população de Macau compõe-se de europeus, descendentes ou macaistas, mouros, parses e chins. A população tanto da cidade, como das aldeias chins, tem augmentado muito desde 1849 (...)


Commercio
Por muitos annos foi Portugal a única nação que podia commerciar com a China, sendo Macau o único porto aberto aos estrangeiros, adquirindo por essa rasão grande importância
commercial. Mais tarde estabeleceram-se os inglezes em Hong-Kong, e foi forçada a China a abrir ao commercio estrangeiro os portos de Shangai, Ning-Po, Fuchan e Emuy, perdendo assim os portuguezes o privilegio de que não tinham sabido tirar o partido possível; e o commercio de Macau ficou quasi aniquilado, não lhe valendo o tardio decreto de 1845 que franqueou o porto de Macau ao commercio geral. O commercio restabeleceu-se depois, senão nas mesmas proporções que attingira antigamente, pelo menos em uma escala relativamente florescente, apresentando esta colónia um movimento commercial superior ao das outras possessões portuguezas.
O movimento commercial foi o seguinte nos annos abaixo mencionados:
1864 11.177:000$000
1865 11.587:0000$000
1866 11.806:000$000
Vê-se, pois, que alem da elevada cifra a que ascendia o valor da importação e exportação, havia uma pronunciada tendência para augmentar o commercio de Macau, quando em 1868 começou de novo a declinar, em consequência do estabelecimento de postos fiscaes chinezes em frente do nosso porto.  A decadência durou pouco; em 1871 o movimento commercial era de 9.509:000$000 réis, e em 1372 subia já a réis 13.006:0000$000.
Os géneros principaes da importação e exportação são: o chá no valor de 2.000:000$000 réis, o ópio no de 2.500:0000$000 réis, o arroz, algodão fiado, seda, charões, moeda, etc.
O ópio importado da Índia é depurado na cidade, sendo depois exportado principalmente para a Califórnia. O chá é importado da China, e depois de beneficiado é exportado para a
Europa. O commercio de Macau é actualmente exercido pelos negociantes chins e por algumas casas estrangeiras.
Em 1856 começou a adquirir importância a emigração chinesa que se fazia por este porto, e que as leis do império prohibiam expressamente pelos seus portos. Em 1866 chegou a
emigração ao máximo de 24:401 colonos, e depois de ter decrescido muito, tinha em 1871 subido já a 16:618. Em 1873 foi prohibida pelo governo português a emigração chinesa pelo porto de Macau, em consequência dos abusos praticados pelos engajadores chins.
Esta especulação tinha substituído o antigo commercio de Macau, e contribuía para a receita do estado com uma das verbas mais avultadas.
Felizmente á custa da emigração augmentou e enriqueceu uma parte da população chinesa, e tendo sido creadas novas relações commerciaes, pôde pôr-se em vigor a citada prohibição, sem que a crise por ella determinada abalasse o estado financeiro de Macau.
À seguinte nota dos rendimentos em diversos annos mostra que, longe de diminuir, augmentou a receita publica, passado o primeiro anno da prohibiçao:
1864-1865 » 156:2390$000
1866-1867 » 227:4980$000
1870-1871 » 335:0180$000
1871-1872 » 347:6340$000
1872-1873 » 334:7360$000
1874-1875 » 374:2360$000

Receita e Despeza
O seguinte quadro mostra a receita e despeza da província de Macau e Timor para 1875-1876 :
Receita:
Impostos directos » 293:1060$300
Impostos indirectos » 26:9910$000
Próprios e diversos » 36:7340$000
                            Total: 356:8310$300
Despeza:
Administração geral » 94:9410$300
Administração da fazenda » 8:0930$100
Administração da justiça » 12:4540$400
Administração ecclesiastica » 9:7330$200
Administração militar » 74:1360$400
Administração da marinha » 32:9200800
Encargos geraes » 54:5120000
Diversas » 35:9110300
                 Total:  322:7020500
                                               Saldo 34:1280800
Instrucção
Há em Macau 1 seminário, 1 aula de pilotagem, 3 escolas primarias para o sexo masculino e 1 para o feminino. A frequência no seminário foi em 1873-1874 de 160 alumnos, a da escola de pilotagem de 9, e a de instrucção primaria de 127 alumnos e alumnas.
Força Militar
A guarnição de Macau consta de um batalhão de infanteria formado de praças europeas, cujo estado completo deve ser de 584 praças, mas tinha em 1874 o effectivo de 377. Alem d'este batalhão ha um corpo de policia com 200 praças e uma companhia de artilheria.

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