Dias 1 e 8 de Junho, às 18h30, no CCCM, Rua da Junqueira, 30 Lisboa. Entrada livre.
terça-feira, 31 de maio de 2011
segunda-feira, 30 de maio de 2011
sábado, 28 de maio de 2011
Vista panorâmica: década de 1970
Vista de Macau a partir do Monte da Guia: início da década 1970. Destaca-se o hotel Matsuya, o edifício residencial dos CTT, o hotel Lisboa, o hospital s. Januário, etc...
sexta-feira, 27 de maio de 2011
Grémio/Clube Militar: 141 anos
Uma imagem do início do século XX quando a baía da Praia Grande ia junto ao então denominado Grémio Militar (só passou a chamar-se Clube em 1954). Está nesta altura a comemorar os 141 anos de existência. Foi fundado em 1870. No blog existem diversos post's relacionados com esta instituição. Como este, por exemplo:
http://macauantigo.blogspot.com/2009/03/clube-militar-desde-1870.htmlEsta última imagem, também do início do século XX, é de Mam Took e faz parte do arquivo do IICT.
quinta-feira, 26 de maio de 2011
Ilha verde: convento
Postal do início da década de 1930
Foto do jornal Hoje Macau |
O convento da Ilha Verde, com cerca de 180 anos de história, é um edifício de estilo típico do sul da Europa. Está há vários anos abandonado e há planos para a sua recuperação. A colina da Ilha Verde está incluída na lista dos sítios classificados da RAEM.
Vista da ilha Verde a partir da Fortaleza da Monte cerca da década de 1930/40
Nesta época já ligada por istmo o que aconteceu nos primeiros anos do século XX
informações adicionais sobre a história da ilha Verde neste link
Também conhecida por Ilha dos Diabos a Ilha Verde (que no início do século XX passou a ser uma uma península) tem uma história pouco conhecida. À semelhança do convento que ali existe há quase 200 anos. Ou do quartel militar que ali existiu. Terá sido erguido pelos jesuítas. Depois da sua expulsão do território (nos tempos do Marquês de Pombal), foi ocupado por privados e pela Igreja Católica. O edifício, actualmente ao abandono, é considerado “monumento de interesse cultural”. Segue-se o artigo da autoria de Gonçalo Lobo Pinheiro publicado no HM de 23-02-2011.
(...) De acordo com o arquitecto Francisco Vizeu Pinheiro, em declarações ao jornal Hoje Macau o monumento em causa “pode ser o que resta da presença jesuíta na Ilha Verde”.
Se assim for, este convento terá muito mais que 180 anos. “A existência daquele património tem de ser mais antiga do que a data avançada pela DSSOPT”, disse o arquitecto.
A 18 de Setembro de 1883, o escritor Adolfo Loureiro descreveu, aparentemente, o monumento: “A Ilha Verde, pequeno cone que emerge das águas, e onde existe uma casa pertencente ao seminário ou à mitra, é um soberbo bloco de granito onde no entanto a árvore do pagode conseguiu introduzir as suas raízes pelas fendas da rocha, vestindo a penedia de um manto de verdura”, escreveu no seu documento “No Oriente, de Nápoles à China”.
Os anais da história descrevem que os jesuítas, comandados por Alessandro Valignano, ocuparam a Ilha dos Diabos – como era conhecida naquele tempo -, no início do século XVII, quando esta era habitada por “malfeitores e gente fugida” por forma a não ser, entre várias justificações, ocupada pela China. “Era lugar de pouca segurança quando o Colégio de São Paulo decidiu ali se instalar para local de veraneio e retiro. Há quem defenda que foi uma forma de garantir que os chineses não a ocupassem”, referiu Vizeu Pinheiro.
Depois de muito negociado, em 1624 os Jesuítas começaram a erguer capelas, conventos e casas no sentido de ter uma alternativa ao Colégio de São Paulo que estava sediado em Macau. O livro “A Pedra de Afinidade Conjugal” de Luís Gonzaga Gomes relata que “a Ilha Verde fora, primitivamente, escolhida pelos jesuítas para lhes servir bem como aos estudantes do seu Colégio de São Paulo, de estância de repouso e de recreio, durante a estação calmosa, tendo esta ilha sido, em diversas épocas, causa de vários distúrbios políticos, alguns de certa gravidade, e de complicadas questões judiciais, que são do conhecimento de todos aqueles que andam familiarizados com a acidentada história desta Colónia”.
Com a expulsão dos jesuítas em 1762, baseada no quadro político português encetado pelo Marquês de Pombal durante o século XVIII, a supressão da Companhia de Jesus fez com que todos os edifícios por si erguidos ficassem ao abandono, como foi o caso do Colégio de São Paulo ou da Igreja da Madre de Deus. Nesse momento todos os edifícios acabaram ocupados pelas autoridades portuguesas, muitos tendo sido utilizados como quartéis militares.
Depois disto, a história dilui-se um pouco. Alguns documentos referem que, na década de 50 do século passado, o convento agora degradado seria propriedade do Seminário de São José que o arrendava, em parte, ao Governo da Colónia. “Sabe-se que passou por mãos privadas até chegar a ser um seminário diocesano da Igreja Católica”, explicou o arquitecto Vizeu Pinheiro.
quarta-feira, 25 de maio de 2011
terça-feira, 24 de maio de 2011
Barbearia Kac Lan
Aos poucos Macau vai perdendo elementos que a distinguem e que fazem da cidade um local único. É imperativo preservar as memórias, materiais e imateriais, individuais e colectivas... o património natural e edificado... É esse código genético irrepetível que torna Macau um caso ímpar. Não salvaguardá-lo ou deixá-lo contaminar-se é deitar tudo a perder. O cluster do turismo local, qual rio, da nascente até à foz, tem múltiplas valências e velocidades. Se por vezes a corrente forte, por outras, assoreia junto às margens. Esquecer a essência da história do território é diluí-lo enquanto produto e destino turístico. Esta minha pequena reflexão (que já tem mais de 20 anos) vem a propósito de uma notícia recente do JTM e que vos convido a ler num pequeno excerto.
«Arranjar e pintar as unhas já é uma modernice trazida pelo galopar da evolução. Quando a Barbearia Kac Lan abriu as portas na Avenida Almeida Ribeiro, em Outubro de 1960, “fazer a barba e cortar cabeças” eram as especialidades da casa. Lá fora os ventos sopravam mais devagar e raros eram os apitos de carros. “Até jogar à bola se podia”, recorda o senhor Cheah, um dos fundadores. Meio século corrido, as fechaduras da barbearia selaram-se ao final do dia cinzento de sábado. Acompanhámos as últimas horas de um lugar onde as palavras foram quase sempre (bem) substituídas por gestos.
As gargalhadas de Cheah, 71 anos, vão continuar na Rua Camilo Pessanha, mas a história fica para sempre atrás dos azulejos azuis, a meio caminho entre os Correios de Macau e o Banco Nacional Ultramarino. “Andei por aqui durante 50 anos e seis meses”, contabiliza, acentuando as sílabas finais de cada palavra. A deambular pelos mosaicos brancos, muito pequeninos, Cheah deixa escapar recordações. “Todas as mulheres dos governadores foram nossas clientes”, afiança.
As cadeiras antigas – cobiçadas “até pelo Instituto Cultural, que já nos pediu uma” – dão lugar a um rodopio de clientes. “Aquelas de couro castanho e ferro nos pormenores são só para os homens”, descreve. Um cliente português, com os seus trinta anos, ajeita-se no assento antigo, enquanto vai perdendo umas camadas de cabelo. “Gosto da disponibilidade, simpatia e experiência” que os barbeiros da casa revelam, justifica, despreocupado com o rumo do penteado. “Quando cheguei, há treze anos, toda a gente me falava nos ‘velhos’, não num tom pejorativo mas carinhoso, por isso decidi experimentar”. Ficou fiel aos modos e às tesouras da Barbearia Kac Lan, mesmo com alguns problemas de expressão pelo meio. “Começam a falar em chinês e não param”, conta, em maré de boa disposição.»
Excerto de artigo da autoria de Raquel Carvalho de 16-05-2011 do JTM; fotos JTM.
sábado, 21 de maio de 2011
Memórias de Luís Marrucho (1949-51): a entrevista
O 1º Cabo Luís Amadeu Marrucho desembarcou em Macau a 24 de Agosto de 1949 depois de uma viagem a bordo do ‘Niassa’ que durou 40 dias. Fez parte do grupo de homens que constitui a ‘Bataria Independente de Artilharia Anti-Aérea 4 cm Expedicionária’, uma das várias unidades criadas na altura para proteger o Território da situação conturbada que se vivia na China. Aos 83 anos recorda momentos únicos da sua vida de militar e só tem pena de nunca ter regressado ao Macau.
Marrucho: à esquerda na imagem |
Luís Amadeu Marrucho nasceu a 27 de Maio de 1927 na aldeia de São Gregório, freguesia de Cristóval, concelho de Melgaço, no Norte de Portugal colado a Espanha. Aos 21 anos deixou a sua aldeia natal para cumprir o serviço militar. “A 4 de Abril de 1948, pelas 14 horas, junto com outros companheiros entrei no Quartel Militar de Penafiel (Grupo de Artilharia Contra Aeronaves nº 3). Logo de seguida, um cabo indicou-me o meu número, 463/48, dizendo-me para me dirigir ao Depósito de Fardamento, onde me entregaram o respectivo fardamento. Seguidamente, um furriel deu-me um papel para me dirigir à Caserna da 1ª Bateria para me distribuírem a cama e cacifo. Nesse dia não nos forneceram qualquer refeição, valeu-nos o que tínhamos comido antes pois também não nos foi permitido sair.”
Na manhã seguinte, logo cedo, tocou o clarim e toca a levantar, fazer a cama e arranjar-se rapidamente. Novo toque para formatura dos recrutas das 1ª,2ª e 3ª baterias. “Não tardou, um Tenente passou revista às baterias e ordenou ao Sargento para nos encaminhar para o refeitório, a fim de tomarmos o pequeno-almoço. No final, de novo para a caserna substituir a farda pelo fato de ginástica. Toque de clarim para a ginástica.” Tudo tinha que ser feito rapidamente pois quem chegasse atrasado, no final da instrução iria descascar batatas ou lavar pratos. A seguir à ginástica, toca a marchar… “Passados dias tive instrução de manejo de espingardas e de peças de artilharia.”
Assim decorreram 4 meses, no fim dos quais se realizou o sorteio e juramento de bandeira. “No sorteio saiu-me o número 7 o que significava permanecer 16 meses como militar. Todos os que tinham a 4ª classe iam tirar o curso de 1º Cabo, o que foi o meu caso. Como tinha tirado o nº 7 no sorteio permaneci no quartel até nova recruta se apresentar, já no ano de 1949. Feito o curso da Escola de Cabos, fui promovido e realizei as tarefas que me foram atribuídas, até ao dia 3 de Junho de 1949.”
Certo dia, de finais de Outubro ou inícios de Novembro, da parte da tarde, tocou a formatura geral. O Comandante mandou ligar os “Matadores”, camiões fortes onde eram atreladas peças de artilharia e tomou-se a estrada em direcção ao farol da Guia para tomar posição de fogo. “Perguntámos o motivo de tal acção e o comandante disse-nos para verificarmos, pelo binóculo, o que se estava a passar no porto interior, no meio do rio. Ali, encontravam-se vários barcos e barcaças cheias de gente.”
Por esta altura Luís Amadeu Marrucho foi mobilizado pela nota 3/3º do Ministério da Guerra nº 543/MT de 3/06/1949, e destacado para a colónia de Macau, fazendo parte da 2ª Bateria Expedicionária do Regimento de Artilharia Antiaérea Fixa localizada em Queluz. “O Comandante do quartel de Penafiel reuniu todos os cabos e soldados que iam para Macau e lamentou que, a poucos dias de irmos para casa, tivéssemos sido mobilizados, mas as ordens eram para cumprir.”
Cinco ou seis dias depois receberam as guias de marcha para se apresentarem no Regimento de Artilharia Antiaérea Fixa de Queluz, onde permaneceram dois dias. Daí foram transportados para um quartel em Paços Brandão, pertencente ao dito Regimento e que estava praticamente desactivado. Este quartel ficava na outra margem do rio Tejo, em frente ao Palácio de Belém. O Comandante da Bateria informou-os de que não precisavam de estar no quartel. Os de Lisboa podiam ir para casa e os restantes podiam andar pela cidade, ou ir onde quisessem, até ao dia do embarque. Marrucho decidiu ir passear. “Deixei Paços Brandão e fui ter com um amigo e vizinho da terra que estava no Regimento de Cavalaria 7 na Calçada da Ajuda. Aí passei o tempo, a visitar Lisboa.” E assim fez durante vários dias. De dia vagueava por Lisboa e à noite regressava ao quartel. Até que uma noite ... “cheguei atrasado, não pude entrar e tive que dormir num banco de jardim, em frente ao Palácio de Belém. Fui interpelado por um polícia que me disse que não podia dormir ali. Respondi-lhe que estava mobilizado e que me deixasse em paz. Foi-se embora. “
Chegou o dia 15 de Julho de 1949 e reuniram-se todos os que tinha guia de marcha rumo a Macau no quartel de Paços Brandão como lhes tinha sido dito pelo Capitão. Com ele estavam 3 tenentes, um alferes, sargentos e furriéis. Pelas 13horas chegou a lancha da Marinha para os iria transportar até ao cais de Alcântara. “Quando lá chegamos já lá se encontravam uma Companhia de Engenharia, duas de Infantaria, uma de Sapadores Amadores, telegrafistas, etc. …Formámos no cais à espera da chegada do Sr. Ministro da Guerra para a revista das tropas. Após cumprimento das formalidades foi-nos dada a ordem de embarque. “
No cais a multidão era imensa. Familiares e amigos vinham para a derradeira despedida. “Entrámos no navio, O Niassa, dirigimo-nos aos porões à procura do nosso número de cama e lá colocámos a nossa bagagem. À medida que o navio afastava, a nossa tristeza aumentava com as saudades dos nossos familiares e amigos. Tínhamos jurado amor ao nosso Portugal e à nossa Bandeira mas era doloroso deixar o solo Pátrio. Passando a barra recolhi ao porão onde me deitei e nem sequer fui jantar.”
40 dias a bordo do Niassa
A viagem seguiu em direcção a Porto Said. Mais ou menos a meio da viagem um dos três capelões que seguia a bordo faleceu. Foi depositado durante 24h no Salão Nobre do navio. Um dos seus colegas disse uma missa e, de seguida, a urna foi levada para a proa. O navio parou, lentamente, a urna desceu à água onde se afundou. “Visto na época não existirem câmaras frigoríficas, não foi possível levá-lo até Porto Said onde o esperava um irmão. Foi um momento muito triste.“
Chegado a Porto Said, o navio Niassa não pôde atracar junto ao cais. Fundeou ao largo e as tropas foram transportadas a terra em baleeiras. “Deram-nos 200$00 e dirigimo-nos ao banco onde trocamos os escudos por rupias ou piastras, não sem antes os funcionários nos dizerem que o nosso dinheiro era muito bom. As ruas da cidade eram muito sujas e algumas não podíamos visitar, já que a polícia não o permitia. Apenas bebi uma cerveja porque estava lacrada, não comi nada porque tudo me pareceu impróprio. No dia seguinte, após o navio ter sido abastecido com carvão e água, partimos.”
O Canal do Suez foi atravessado sob escolta de aviões ingleses e foi necessário ligar na proa do navio holofotes que iluminavam o Canal de margem a margem. Seguiam sete ou oito navios, uns atrás dos outros. O Niassa era o último uma vez que transportava explosivos. “Entrámos no Mar Vermelho e fomos visitar a cidade de Adem (Golfo de Adem). Fomos em grupo pois era perigoso ir só. Nesta cidade as mulheres usavam a cara tapada. Durante este passeio fomos abordados por um homem que se abraçou a nós a chorar. Era um português que nos pediu para o trazermos para Portugal pois tinha ido num barco que ali atracara, perdeu-se na cidade e quando regressou ao cais já o navio tinha partido. Informámo-lo que nos dirigíamos para Macau. Este conterrâneo acompanhou-nos durante a visita à cidade. Em frente à cidade de Adem vê-se uma colina escarpada, o Monte Sinai. Os Padres informaram-nos que tinha sido ali que Jesus entregara a Moisés as Tábuas da Lei. “
A viagem prosseguiu pelo Mar Arábico com destino a Colombo. Poucas horas navegadas e surgiu uma tempestade de areia. “Era como se chovesse. Muito engraçado e diferente. Dizia a tripulação que a areia devia vir do Deserto do Sara.” Chegados a Colombo nova visita a terra para visitar a cidade. “Num jardim bem cuidado encontramos uma pedra, de enormes proporções, onde estava gravado o Escudo Português com a coroa do Rei. Era uma cidade limpa e muito bonita.” De volta ao Niassa a viagem prosseguiu para a última etapa rumo a Singapura. Novo porto de escala, nova cidade. “Visitámos a cidade, suja e velha. No porto de mar viam-se os mastros dos navios afundados durante a 2ª Guerra Mundial.”
Junto à 'pedra' gravada que asinala olocal o foi assassinado o gov. Ferreira do Amaral (perto de Mong Há e do templo de Lin Fong) |
De Singapura o Niassa partiu rumo a Macau onde chegou a 24 de Agosto de 1949 ao fim de 40 dias de viagem. “Chegados à barra, na foz com o rio Cantão, o navio fundeou ao largo pois a maré estava baixa. Fomos transportados, através do rio Cantão, em grandes barcaças até ao porto. Avistava-se uma grande avenida, a Avenida da Praia com árvores frondosas. No alto da colina, o Farol da Guia. Sentimos muito calor que era amenizado pela brisa do mar, mas em terra o calor abrasava. No porto encontravam-se dois navios de guerra portugueses, o Pedro Nunes e João de Lisboa.”
Os homens foram então transportados para o quartel em Mong Ha. Este aquartelamento ficava situado junto à estrada da Areia Preta, que se juntava, numa bifurcação, da Avenida Almirante Lacerda, que por sua vez ia directa às Portas do Cerco. “No quartel encontravam-se 5 ou 6 soldados duma Companhia, dita das Beiras. Fui dos primeiros a chegar e esperei pelos restantes. Fomos para a formatura, munidos com um copo, cantil e marmitas. Pelas 14h30m, em fila, fomos receber a 1ª refeição do dia: uma concha de arroz, meio frango grelhado, sopa, vinho e fruta à escolha. Perguntei se era sempre assim e disseram-me que ainda era melhor já que aquilo tinha sido à pressa. Nesse quartel não havia refeitório e no dia seguinte foi necessário improvisar um, e à pressa. Estas instalações improvisadas só duraram aproximadamente dois meses pois entretanto foi construído o quartel e ficamos bem instalados. Já tínhamos casa de banho, mosquiteiros e ventoinhas.” Guerra civil chinesa chega a Macau
Marrucho - é o segundo da dta. para a esq. - no novo aquartelamento |
A China sofria uma guerra civil. Combatiam Nacionalistas contra Comunistas e vice-versa. “Como chefes comunistas Mao Tse Tung e Ling Chiu, e do lado dos nacionalistas Chian Kai-Shek. Os nacionalistas foram perdendo terreno e recuando até ao rio Cantão, também chamado dos Piratas. Aí não tiveram outra solução senão meterem-se nos barcos (soldados, oficiais, mulheres, crianças, material de guerra etc.) e atravessarem para o meio do rio.” As tropas de Mao queriam que se rendessem; eles não queriam pois sabiam que morreriam, mas também não queriam entregar-se às tropas portuguesas. “Entretanto nós enchíamos sacos de areia para proteger as peças de artilharia. Aproximou-se a noite, levaram-nos de comer e capotes por causa do frio. Como já era escuro, cada um pegou um capote; de manhã foi uma farta de rir porque estavam todos trocados, (soldados com capotes de furriéis e vice-versa, etc.).”
Esperavam-se novos acontecimentos em relação com os chineses... “Uma lancha da nossa Marinha dirigiu-se aos chineses para se entregarem, eles recusaram, mas de quando em vez, as forças contrárias atiravam algumas rajadas de metralhadora.”
Quem mantinha contacto com o Governo de Portugal era o comandante do navio Pedro Nunes, da Marinha Portuguesa, que transmitia todas as informações recebidas ao governador de Macau, Albano Rodrigues de Oliveira e ao Comandante Militar, Cota de Morais. “O nosso governo aconselhava calma. Após algumas tentativas da nossa marinha, os chineses resolveram entregar-se. Como tudo se resolveu, não foi necessário abrir fogo.”
Todos aqueles militares e familiares, bem como o material, à excepção dos explosivos, foram encaminhados para o campo de futebol 28 de Maio (Canídromo). Aí dormiam debaixo das bancadas do campo e as refeições eram-lhes ministradas por chineses credenciados, bem como sabão e tabaco. “Nunca soube, ao certo, quem ordenava estas coisas, mas talvez o Governador. Ninguém podia entrar ou sair sem ser pela porta principal, guardada pelas tropas portuguesas. Também lá fiz serviço. Passado algum tempo foram autorizados a sair do Campo para a cidade. No início voltavam mas por fim desapareceram. Alguns ainda foram vistos pelas redondezas do quartel a pedir comida.”
Na inauguração da gruta em Outubro de 1949. Marrucho é o primeiro à direita na imagem |
“Quando saímos de Lisboa dizia o 'jornal da caserna' que o Sr. Bispo de Leiria tinha oferecido uma imagem de Nossa Senhora de Fátima. Éramos muitos e de armas diferentes, a imagem, por questões de segurança, não podia andar de Companhia em Companhia.” Após um sorteio recaiu na unidade de Marrucho a responsabilidade de construir uma gruta para a colocação da dita imagem. “Para a inauguração da mesma foi efectuada uma missa campal com guarda de honra, da qual fiz parte.” A porta do quartel foi aberta para apresentação de todas as guarnições militares, para chineses e macaenses. A esta cerimónia, além dos comandos militares, também assistiu o Governador, Albano Rodrigues de Oliveira, natural de Viana do Castelo.
Durante o tempo que esteve em Macau a cumprir o serviço militar Luís Amadeu Marrucho foi ainda monitor das aulas regimentais para ensinar a ler e escrever os soldados que não sabiam, “acompanhando o professor da classe civil que lá ia dar as aulas.”
(NA: após esta entrevista a filha de um antigo aluno de Marrucho pediu-me os seus contactos para reavivar memórias do seu falecido pai; ver post sobre António de Matos Oliveira)
Passados dois dias da chegada Amadeu Marrucho dirigiu-se ao edifício dos Correios para enviar uma carta e, ao mesmo tempo, conhecer a cidade. “Cheguei ao centro “Largo do Leal Senado”e Câmara e lá encontrei a estátua de Vicente Nicolau de Mesquita, um tenente macaísta que com alguns soldados se dirigiu para a China, passando num local denominado Passaleão onde estavam entrincheirados alguns soldados chineses. Travou uma luta com eles e saiu vencedor. Foi promovido a Coronel.”
Percorreu avenidas, ruas e ruelas e tudo apreciou com curiosidade. “Junto às Portas do Cerco passei alguns momentos a ver a passagem dos chineses que entravam na cidade trazendo tudo o que fosse comestível: legumes, galinhas, patos, porcos e até serpentes aprisionadas numas redes finas. Tudo isto era destinado aos restaurantes.”
Certo domingo Marrucho passava em frente à igreja de S. Domingos, próxima do mercado, e resolveu entrar. “Pela porta aberta vi que havia missa, entrei no momento em que o padre começava a falar. Apercebi-me que falava chinês e que a missa era dirigida a chineses. O Padre olhava para mim admirado, bem como os chineses; eu, com a insistência dos olhares, acabei por sair.”
Durante o tempo em que Marrucho permaneceu em Macau surgiram dois tufões. “O 1º foi fraco mas o 2º foi horrível e causou muitos danos (queda de árvores, postes de electricidade no chão, casas desmoronadas, etc.). Nas ruas só podia andar a polícia para evitar os roubos. Os chineses sabiam o que ia acontecer: dias antes colocaram no Alto da Guia um aparelho através do qual avisavam a população para se preparar comprando géneros alimentícios, pois não se sabia a duração e intensidade do tufão.”
Um dia, junto com outros colegas, Marrucho pagou a uns chineses para os levarem de barco até à praia da Ilha de Coloane. “Lá encontravam-se algumas chinesas. Como fazia muito calor, rapidamente nos dirigimos para a água. De repente começou a chover e as chinesas abriram os guarda-sóis e foram para a água. Nós, admirados, rimos imenso, pois para nós era estranha aquela situação.”
Como apenas estava de serviço quatro dias por mês, dois dias de cabo de dia ao quartel, e dois dias juntamente com seis soldados para velar pela segurança dos paióis do material bélico, Marrucho tinha muito tempo livre que aproveitou para conhecer toda a cidade de Macau, desde as Portas do Cerco até ao Pagode da Barra dedicado à Deusa A-MA, e da Ilha Verde até à Baía da Praia Grande. “Percorri avenidas e ruas, lindos jardins, visitei a Gruta de Camões, o hipódromo onde regularmente se realizavam corridas de cavalos, igrejas, pagodes chineses, cinemas e casinos. Nestes era-nos proibido entrar mas, como nos podíamos vestir à civil, de vez em quando lá entrávamos, no meio dos outros. Todas as noites saía para passear,” recorda.
Voltando ao dia-a-dia da vida militar, Marrucho recorda ainda a alimentação que classifica de boa e “bem confeccionada por cozinheiros chineses. Todos os dias ao pequeno-almoço tomávamos um comprimido, chamado quinino para evitar doenças por causa da picada dos mosquitos. A roupa, marcada com o número de cada um, lavada e passada a ferro na lavandaria, era colocada sobre cada cama. Não faltava nada, era como se tivéssemos ido passar férias.”
Umas ‘férias’ que duraram três anos e que estiveram para ser prolongados. “Poucos dias antes do regresso a Portugal, alguns polícias foram ao quartel convidar-nos para ficar naquela corporação em Macau. Ninguém respondeu. Passadas umas horas, o 1º Sargento David Coelho Araújo, oriundo do Cartaxo, disse-nos que quem quisesse aceitar ficar na polícia podia fazê-lo, mas quem o fizesse podia dizer adeus à família. Enquanto militares, a viagem para Macau e o regresso eram gratuitos mas, caso ficássemos, nunca mais ganharíamos dinheiro para regressar.”
Marrucho decidiu regressar a casa mas antes “pedi a um médico amigo que me facilitasse a realização de alguns exames médicos, pelo que estive internado 4 dias no Hospital de S. Januário.” O embarque rumo a Portugal aconteceu a 23 de Outubro de 1951 no navio “Timor” que passou por Macau proveniente da Província de Timor na sua viagem inaugural. “Chegámos a Lisboa a 23 de Novembro de 1951. Custou muito partir e deixar a família. Foram muitas as saudades. No entanto, não fosse a tropa, nunca teria conhecido estas longínquas paragens. Hoje sinto alguma nostalgia daqueles tempos e muito gostaria de voltar a rever aqueles locais que, sendo maravilhosos então, agora ainda estarão mais bonitos.”
Luís Amadeu Marrucho tem hoje 83 anos (à data da entrevista) e nunca regressou a Macau.
Entrevista publicada no Jornal Tribuna de Macau em 9 de Abril de 2010http://www.jtm.com.mo/view.asp?dT=342801001
NA: Esta é mais uma forma que encontrei para agradecer ao Sr. Marrucho por ter partilhado as suas memórias.
quinta-feira, 19 de maio de 2011
Memórias de Luís Marrucho 1949-51: introdução
Eu não conhecia Luís Marrucho. Macau juntou-nos, ainda que várias décadas depois. Ele viveu lá nos anos 40 e eu nos 80. Foi o seu neto que me contou a sua história em 2009, salvo erro. Falámos ao telefone, trocámos impressões e, passado pouco tempo o Sr. Marrucho (já vai a caminho dos 90 anos) e eu parecíamos amigos de longa data. Prometi-lhe que logo que pudesse, faria questão de o ir visitar a S. Gregório (Melgaço), a sua terra natal e, como ele costuma dizer, "aqui é que começa Portugal". De facto, é a fronteira mais a Norte.
Assim, em Abril de 2001 cumpri a 'promessa'. Percorri mais de 500 quilómetros e foi com grande satisfação que conheci pessoalmente o Sr. Marrucho. Falámos mais de seis horas consecutivas...
Foi militar entre 1947 e 1951. Já quase no final do serviço militar obrigatório , em 1949, foi mobilizado para Macau como 'cabo'. A 3 de Junho estava em Penafiel quando recebeu as "guias de marcha" para a a anti-aérea de Queluz
Conta muitas histórias do seu tempo de Macau. Como se tivessem acontecido ainda ontem. "Um dia houve uma formatura geral por causa de um problema com um militar. O capitão (João Teixeira Bragança, casado com uma macaense) ficou muito irritado por ter havido um roubo a um comerciante chinês. Certo é que enquanto os produtos roubados não apareceram toda a companhia ficou de castigo."
Nunca regressou a Macau. Num próximo post vou publicar a entrevista que lhe fiz via carta e e-mail em finais de 2009 e publicada no Jornal Tribuna de Macau em Abril de 2010. Publico ainda fotografias tiradas por L. Marrucho e tornadas públicas pela primeira vez.
É a minha homenagem por ser quem foi e por ser quem é. Obrigado por partilhar as suas memórias de Macau, Luís.
Nesta fotografia, mais uma tirada pela tal máquina fotográfica comprada pelos três camaradas de armas, um jipe norte-americano, memória da Guerra do Pacífico terminada anos antes. Este era propriedade de um rent-a-car. Era prática habitual os militares portugueses passearem nele aos fins-de-semana e dias de folga.
Para aguçar a curiosidade para a entrevista aqui ficam algumas 'notas soltas' da conversa que tivemos em Abril último.
- a partida foi do cais de Santa Apolónia com a presença do ministro da Guerra, Santos Costa, onde embarcaram no Niassa a 15 de Julho de 1949;
- uma enorme multidão no cais de embarque despediu-se dos mais de mil militares que seguiram a bordo;
- dezenas de pessoas tentaram arremessar presentes para bordo, volumes de cigarros e outros produtos, e muitos caíram ao Tejo;
- ao fim de 4 dias de viagem um dos padres que seguia a bordo morreu e depois das cerimónias fúnebres foi lançado ao mar;
- em Port-Said o Niassa ficou bastante afastado do cais por transportar material de guerra;
- neste porto fizeram o reabastecimento (na imagem) de carvão, água e alimentos e os militares puderam ir a terra;
- a passagem pelo canal do Suez foi feita num 'comboio' de navios;
- em Haden foram mais uma vez a terra e com dinheiro providenciado pelo exército podiam comprar alguns presentes;
- nesta cidade encontraram um português que perdera os documentos e a ligação de um barco e deambulava pela cidade;
- em Colombo viram e sentiram uma tempestade de areia com o convés do Niassa a encher-se de areia...
- nesta cidade Marrucho recorda os bonitos jardins onde estava um escudo e a imagem de Vasco da Gama;
- Ultrapassada Singapura, o tempo piorou e o Niassa teve de ultrapassar 'redemoinhos de água';
- a bordo "café com leite e pão muito branquinho ao pequeno almoço, ao almoço carne de camelo e à tarde chá e bolachas";
- à chegada a Macau, a 24 de Agosto de 1949, a primeira refeição foi frango assado, arroz e vinho no quartel de Mong Há;
- foram acolhidos pela companhia das Beiras;
- Marrucho recorda, por exemplo, que num dos exercícios com as tropas expedicionárias era preciso formar a frase "nós não somos demais para defender Portugal", mas nem sempre a frase saía correcta...
Marrucho, 1º da direita, com camaradas de armas na estrada da penha |
- perto da Melco havia uma nascente onde iam buscar água para o cantil;
- no Verão de 1949, por causa da situação de guerra civil na China, receberam um aviso para se apresentarem nos seus postos e ficarem em "estado de prontidão";
- em 1950 L. Marrucho foi nomeado professor de 1ª classe das Escolas Regimentais (para militares);
- em 1951 regressou a Portugal, e com ele o "Macau", um cão que tinha ido de Portugal com a sua companhia;
- um dos últimos ordenados (pré) rondava as 110 patacas (cerca de 600 escudos);
- nos dias de folga passeavam pela cidade, iam às ilhas...
- Marrucho fez parte de um grupo de militares portugueses escolhidos para fazer uma visita ao aeroporto de Kai Tak (Hong Kong) a convite do exército britânico que os presentearam com uma pequena viagem pelos céus da região;
- a companhia de que Marrucho fez parte fez as honras (e ele também) militares na inauguração da gruta de N. Sra. de Fátima;
- filho de um antigo guarda fiscal, Marrucho podia ter seguido a carreira militar, mas seguiu as pisadas do pai, e foi guarda fiscal desde 1952 até se reformar;
- Luis Marrucho nasceu em 1927 e nunca regressou a Macau...
- Quem tiver conhecimento de camaradas de armas da comissão militar em Macau pode entrar em contacto com o macauantigo@gmail.com
- Eu sei que ele ia gostar!
quarta-feira, 18 de maio de 2011
Tertúlia: mulheres na toponímia de Macau
28 de Maio, 16 horas, Centro de Documentação - Fundação Casa de Macau
Praça do Príncipe Real, nº 25 - 1º - Lisboa
terça-feira, 17 de maio de 2011
Rua do Campo
(...) Aproximação diferente, para os chineses se revela no entanto na designação dada à Rua do Campo, que para os portugueses significava a via que conduzia à porta norte das muralhas da cidade que se abria para os campos de cultivo que se estendiam até Mong Há (terras actualmente ocupadas por edifícios e avenidas rectilíneas mas que constituíram no início do século zona inculta a desbravar). Segundo as crónicas da época, os campos que se estendiam naquela direcção, eram áreas pantanosas e insalubres que urgia sanear. A peste de 1894, cujo foco se situou, exactamente naquela área foi o argumento final que fez com que as autoridades locais decidissem intervir levando a que todo o casario disperso, ali existente, fosse arrasado e em seu lugar se abrissem vias dignas de uma verdadeira capital e se plantassem jardins e árvores de grande porte sobre os antigos lamaçais.
Mas, não se pode esquecer que nesses tempos, Macau estava longe da autonomia capaz de permitir a um autarca (ainda que governador) abrir sequer uma bica, ou substituir uma frontaria decadente, sem ter de submeter o caso ao Terreiro do Paço. A complicar a situação acrescia o facto de o ministro da Marinha (responsável pelas colónias) ser um homem chamado Ferreira de Almeida que não era um ministro qualquer. É que esta personalidade era de temperamento irascível tendo chegado ao ponto de agredir, em pleno parlamento de Lisboa (1887) o seu antecessor na pasta, facto que lhe custou quatro meses de prisão, mas que, mesmo assim não invalidou a sua posterior nomeação para dirigir o ministério das colónias em 1895. Chegado à pasta, não hesitou também, este político singular, em propor à “Assembleia Nacional” a venda de Macau juntamente com as restantes colónias, negócio que acabou por não ir avante face ao embaraço dos seus pares do governo, à indignação manifestada pela oposição e às caricaturas contundentes de Bordalo Pinheiro no seu “António Maria” semanário crítico que publicitava o ridículo nacional e possuía tiragem suficiente para fazer cair governos.
Fosse como fosse, o certo é que o responsável da pasta da Marinha e Ultramar não era para brincadeiras e já que o saneamento da zona do Tap Seac, devido à urgência, tinha sido feito sem o seu conhecimento, o melhor seria às autoridades de Macau aplacar eventuais iras dando o seu nome à rua que isolara em forma de “macadame” os focos de infecção do campos infectos e Mong Há.
Dos documentos não consta também se o ministro soube ou não das obras não autorizadas e muito menos se tomou conhecimento do facto de passar a figurar na toponímia local, mas a verdade é que o seu nome, um século depois, continua a fazer parte do cadastro da cidade com a dignidade de avenida. Os chineses no entanto, como se disse já, nunca souberam quem fosse tal conselheiro, preferindo manter a recordação do episódio de 1622, quando, os marinheiros holandeses, depois de terem desembarcado na praia de Cacilhas (bastante mais a norte) avançaram sem oposição através da trilha pantanosa que hoje constitui a avenida do tal conselheiro, até às proximidades das muralhas, sendo subitamente batidos pela artilharia do forte do Monte, sabiamente dirigida pelo padre jesuíta Jerónimo Ró.
É assim, que parte da rua que, oficialmente se chama Ferreira de Almeida, continua a ser para a tradição portuguesa Rua do Campo e, para a chinesa Ho Lan Yun, ou via dos Holandeses, caminho que na realidade, os invasores vindos da Europa Central trilharam apenas em parte, até serem dizimados pelos tiros certeiros do padre artilheiro do século XVII. Refira-se neste ponto, também, que ainda que cientificamente perfeitos os cálculos do padre Ró apenas serviram para demonstrar que um petardo não constitui crédito suficiente nos anais da toponímia, ou então alguém temeu que a consagração do matemático o catapultasse para voos mais largos, tanto mais que a matemática era na época assunto tão temível que desafiava os próprios Evangelhos provando, por exemplo, que a Terra se movia e não o Sol. Coincidentemente estava no auge em Roma o processo de Galileu. Por isso o Padre Ró (Jerónimo Burro) não consta da toponíma de Macau e é pena.
Dos documentos não consta também se o ministro soube ou não das obras não autorizadas e muito menos se tomou conhecimento do facto de passar a figurar na toponímia local, mas a verdade é que o seu nome, um século depois, continua a fazer parte do cadastro da cidade com a dignidade de avenida. Os chineses no entanto, como se disse já, nunca souberam quem fosse tal conselheiro, preferindo manter a recordação do episódio de 1622, quando, os marinheiros holandeses, depois de terem desembarcado na praia de Cacilhas (bastante mais a norte) avançaram sem oposição através da trilha pantanosa que hoje constitui a avenida do tal conselheiro, até às proximidades das muralhas, sendo subitamente batidos pela artilharia do forte do Monte, sabiamente dirigida pelo padre jesuíta Jerónimo Ró.
É assim, que parte da rua que, oficialmente se chama Ferreira de Almeida, continua a ser para a tradição portuguesa Rua do Campo e, para a chinesa Ho Lan Yun, ou via dos Holandeses, caminho que na realidade, os invasores vindos da Europa Central trilharam apenas em parte, até serem dizimados pelos tiros certeiros do padre artilheiro do século XVII. Refira-se neste ponto, também, que ainda que cientificamente perfeitos os cálculos do padre Ró apenas serviram para demonstrar que um petardo não constitui crédito suficiente nos anais da toponímia, ou então alguém temeu que a consagração do matemático o catapultasse para voos mais largos, tanto mais que a matemática era na época assunto tão temível que desafiava os próprios Evangelhos provando, por exemplo, que a Terra se movia e não o Sol. Coincidentemente estava no auge em Roma o processo de Galileu. Por isso o Padre Ró (Jerónimo Burro) não consta da toponíma de Macau e é pena.
Excerto de artigo de João Guedes publicado no JTM de 17-5-2011
segunda-feira, 16 de maio de 2011
Centro Cultural de Macau na Califórnia (EUA)
Foi inaugurado em Fremont, nos subúrbios de São Francisco, o novo Centro Cultural de Macau. Instalado num edifício histórico de três pisos, o novo complexo é gerido, sob a presidência de Maria Roliz, por um Conselho Directivo constituído por membros das três principais associações macaenses nos EUA: União Macaense Americana (UMA), Lusitano Club da California e Casa de Macau (USA).
No dia 7 de Maio de 2011, na presença do cônsul da R. P. China para a cultura, em São Francisco, decorreu a inauguração, realizando-se o corte de fita simbólico, seguido de um tradicional chá gordo, com a participação de uma centena de membros das citadas associações e convidados. Entre estes, contavam-se Joe Chan, presidente do Macau Club (Toronto); José Cordeiro, presidente da Amigu di Macau (Toronto); Micky da Roza, vice-presidente da Casa de Macau (Vancouver); Arthur Britto, presidente da Macau Arts, Culture & Heritage Institute, dos EUA; e Rufino Ramos, Secretário-Geral do IIM.
A cerimónia incluiu também uma parte religiosa, com a bênção do edifício que foi realizada pelo Pe. Daniel Nascimento, ele também macaense, a exercer o seu prelado em São Francisco.
Além de dois espaços comerciais sitos no andar térreo cujas rendas irão aliviar os custos da manutenção, o Centro Cultural dispõe ainda de um amplo salão multi-funcional no primeiro piso e de uma sala para actividades, de menor dimensão, no último andar, além de um espaço que pode servir de sala de reuniões e de biblioteca, com colecções de livros e revistas oferecidas por Macau, muitas pelo IIM.
A abertura do complexo culmina um demorado período de instalação e de remodelação do edifício, cuja traça arquitectónica, por se encontrar classificada, foi sujeita a extensas obras de preservação, cumprindo-se as leis estaduais americanas, após a sua aquisição ter sido efectivada com fundos facultados às três instituições em causa pela ex-Administração do Governo de Macau, através da uma das Fundações.
The Macau Cultural Center has two retail spaces on the street level; a ballroom, kitchen and restrooms on the second level; and an office/library, a restroom, and a conference room on the third level.
Address: 37695 Niles Boulevard - Fremont, CA 94536-2947, USA
José Vicente Jorge (1872-1948), Macaense Ilustre
Originário de uma família conhecida em Macau desde o século XVII, José Vicente Jorge foi tradutor-intérprete de língua chinesa e secretário da delegação de Portugal em Pequim. Professor de língua e literatura chinesa, amigo de Camilo Pessanha, foi considerado por este último seu Mestre no que respeita à cultura do Extremo Oriente. Tido como o melhor coleccionador de Arte chinesa, a sua casa em Macau era visitada como o único museu da cidade da sua época. Esta figura, estes temas e a Macau que o sinólogo conheceu são o objecto de estudo da palestra proferida pelo seu neto Pedro Barreiros, organizada pela Associação Wenceslau de Moraes, pelo CETAPS e pelo CHAM (FCSH-UNL Uaç).
Conferência 23 Maio 2011 - 18h. UNL - FCSH - Edifício I&D (Sala multiusos 2, piso 4)- Lisboa
http://macauantigo.blogspot.com/2010/07/coleccionismo-em-macau.html
http://macauantigo.blogspot.com/2010/07/coleccionismo-em-macau.html
sábado, 14 de maio de 2011
Memórias de Vitalina sobre seu pai António de Matos Oliveira - 2ª parte
António de Matos Oliveira nasceu a 18 de Novembro de 1927 em Vale de Besteiros no concelho de Tondela e faleceu a 23 de Abril de 2010. Cumpriu o serviço militar na então denominada Colónia de Macau entre 1949 e 1951. A sua passagem por Macau foi breve mas marcante. Tudo começou no antigo Cais de Santa Apolónia. Era aí que os soldados 'apanhavam' os navios que os levavam para "Ultramar".
A 15 de Julho de 1949 foi a vez de A. Matos de Oliveira subir a bordo do "Niassa" rumo a Macau. Desembarcou no Território 40 dias depois, a 24 de Agosto. Fez parte do grupo de homens que constitui a ‘Bataria Independente de Artilharia Anti-Aérea 4 cm Expedicionária’, uma das várias unidades criadas na altura para proteger o Território da situação conturbada que se vivia na China.
O regresso a Portugal aconteceu a 23 de Outubro de 1951 no navio 'Timor' que passou por Macau proveniente da Província de Timor na sua viagem inaugural“. A chegada a Lisboa ocorreu a 23 de Novembro de 1951. Um das suas filhas, Vitalina, recorda a memória do seu pai... um testemunho na primeira pessoa em exclusivo para o blog Macau Antigo.
Sou filha de um antigo soldado em Macau. Meu pai embarcou para Macau no vapor “Niassa”, no dia de Julho de 1949, tendo ficado aquartelado em Mong Há. Regressou à Metrópole em 26 de Outubro de 1951 no vapor “Timor”. Deixou a escola aos 10 anos e foi trabalhar com os irmãos mais velhos. Trabalho sazonal no Ribatejo, Alentejo... onde quer houvesse trabalho... não gostava de falar desse tempo. Só me lembro de o ter feito há uns anos quando víamos juntos um programa sobre as comemorações do fim da 2ª Guerra Mundial. Falou do sofrimento desse tempo e disse... "tempos de escravidão, não gosto de me lembrar"...
Dessas viagens e dos tempos em que por lá esteve, muitas histórias nos foram contadas na infância e Macau,era como uma terra de conto de encantar. Chamávamos a essa História em jeito de brincadeira e algum enfado “ A Rota de Ceilão”…Esta história era acompanhada por muitas imagens guardadas num velho álbum. Anos mais tarde, era aos netos que a história era contada, mas já sem imagens. Perdemos o rasto ao seu álbum. Meu pai deixou-nos há poucos dias. Tivemos que abrir as gavetas da sua velha secretária onde nem filhos, nem netos, estavam autorizados a mexer.
No meio das suas muitas recordações, caíram nas minhas mãos as velhas fotos que tanto me fizeram sonhar na infância e a “Rota de Ceilão” acordou na minha memória.
Tive curiosidade em saber se Macau também deixou saudades em outros antigos combatentes e foi assim que descobri o seu blog.
Foi "alistado" em 1947. Para Macau acho que foi porque lhe "calhou nas sortes"... Não foi militar de carreira, mas creio que adoraria ter sido. Admirava o Exército e lá em casa a disciplina era "militar"... também deveria ter sido um bom economista, contas era com ele e administrar finanças melhor ainda...
António de Matos Oliveira frente à gruta dedicada a N. S. de Fátima |
Casou três anos depois do regresso de Macau, mas o namoro já era antigo. No ano seguinte nasceu a primeira filha. Para fugir à vida do campo que detestava, foi como "guarda" para uma exploração mineira no lugar de Várzea dos Cavaleiros, na Sertã, no ano de 1956. Ai nasce a 2º filha, eu. Em 1960 já tinha quatro filhos.
Folha da Caderneta Militar de A. Matos de Oliveira
Nesse ano passa a "capataz" da "lavaria" da mina. Vai a Espanha fazer formação e passamos a residir na "mina". Somos quatro crianças num mundo de adultos. É nesse tempo que a "história da rota de Ceilão" encanta a nossa infância. Não há televisão...apenas telefonia...e o álbum do meu pai é o único livro lá de casa. Quando abria aquele livro de capa castanha, com um "pagode" chinês estampado e nos falava do Canal do Suez, mar Vermelho, Colombo, Rio das Pérolas, Portas do Cerco, Gruta de Camões, a areia da praia de Coloane, os templos chineses, era tudo uma magia. Descrevia cada uma das fotografias e muito ficava na nossa fantasia.
Lá em casa só havia conversas com homens, mas muitos assuntos eram proibidos. Ouviam uma estação de rádio de que não podíamos falar... e contavam muitas histórias de bruxas, lobisomens e outros feitiços de encruzilhadas...e claro a rota de Ceilão deixava aqueles mineiros sem palavras... Em 1965 aquela exploração mineira foi encerrada. Com a mesma empresa mudamos para Castelo de Paiva, para as minas de Terramonte.
Casa de Sun Yat Sen: década 1950 |
Pela primeira vez vivíamos na aldeia. Meu pai tinha mais responsabilidades e mais trabalho e nós passávamos o dia na rua, se não havia escola. A" vida social" era intensa: televisão na "venda" ( taberna, mercearia e salão social e cultural da aldeia... visitas a todos os colegas de meu pai, festas e romarias, e até livros da Biblioteca Itinerante da F.C. Gulbenkian. Assim a rota de Ceilão perdeu interesse.
Entre 1967 e 1970 nasceram mais três crianças e a preocupação de meu pai era ter uma casa sua para toda a família. trabalhava muito, andava cansado, não havia mais tempo para histórias. Em 1975, a empresa fechou e lançou no desemprego todos os seus trabalhadores. Mas naquele tempo ninguém ligou. Portugal vivia tempos de História e a história destes mineiros não interessava. Cansado o meu pai não aceitou voltar a acompanhar a empresa em mais uma mudança. Aceitou a indemnização, reformou-se por doença e voltou para a sua aldeia. Toda a família protestou. Era uma aldeia pobre sem escola e sem estradas, habitada por mulheres, crianças e velhos e todos os meus irmãos estavam em idade escolar.
Foi convidado para a lista da autarquia que dava os primeiros passos em tempos de Liberdade. Conseguiu a escola, abriu-se a estrada, chegaram os transportes. Esteve sempre disponível e atento aos problemas da sua aldeia e das suas gentes. Os meus irmãos mais novos já não tiveram direito a ouvir as histórias da rota de Ceilão e o álbum castanho apareceu destruído pelos mais pequenos. Sempre pensamos que as fotos também tivessem sido destruídas.
Sempre lúcido, atento e disponível era escutado em todas as decisões da aldeia e sempre lutou por ela, mesmo contra a opinião dos seus filhos que nunca sentiram aquela aldeia como sua. Começaram a aparecer os genros, os netos a novamente a "rota de Ceilão" era história. Macau era para ele um sonho que não compreendíamos ( só após a sua morte o compreendo), mas dizia que não queria voltar, nem mesmo quis visitar o Pavilhão de Macau na Expo 98 quando o convidamos. Com o neto admirou todas as fotos que tiramos.
Quando encontrei as suas fotos e caderneta militar, aceitei o desafio do meu filho em construir uma "história" para oferecer a todos os meus irmãos, mas para isso precisava descobrir porque Macau fora tão importante para ele. Vou-o conseguindo e o "Macau Antigo" tem sido uma surpresa. No Portugal pobre, analfabeto, e fechado do final da guerra, Macau deve ter sido uma magia para ele. Deixou-nos essa magia e uma família com muitos filhos e netos.
Vitalina Matos de Oliveira, Coimbra, Abril/Maio de 2010
NA: a primeira parte destas memórias pode ser consultada neste post
http://macauantigo.blogspot.com/2010/05/memorias-de-vitalina-sobre-o-seu-pai.html
NA: a primeira parte destas memórias pode ser consultada neste post
http://macauantigo.blogspot.com/2010/05/memorias-de-vitalina-sobre-o-seu-pai.html
sexta-feira, 13 de maio de 2011
Macau em... Almeirim
É inaugurada este sábado, pelas 15 horas, a exposição “Macau Património da Humanidade”, patente no átrio da Biblioteca Municipal Biblioteca Municipal Marquesa de Cadaval até dia 1 de Junho. Trata-se de uma mostra cedida pelo Centro de Promoção e Informação Turística de Macau em Portugal.
Entretanto no próximo dia 21 a Câmara Municipal de Almeirim acolhe a palestra “Sentir Macau – Encontro de Comunidades”, pelas 16h no Salão Nobre dos Paços do Concelho. A entrada é livre. A palestra será seguida de um intercâmbio gastronómico entre a Confraria da Gastronomia Macaense e a Confraria Gastronómica de Almeirim, no refeitório municipal – Zona Industrial, pelas 19h.
quarta-feira, 11 de maio de 2011
Exposição fotográfica em Brasília
A exposição “Macau é um espectáculo” que o Instituto Internacional de macau (IIM) organizou em colaboração com a Associação Fotográfica de Macau, prossegue o seu programa de itinerância pelo Brasil. O conjunto de 51 fotografias está agora patente ao público, e até 6 de Junho próximo, na Biblioteca Nacional de Brasília.
Antes, passou por S. Paulo, Rio de Janeiro e Recife onde tem registado uma enorme adesão do público. Recorde-se que uma outra exposição, idêntica, está a também a ser mostrada em diversos locais de Portugal.
terça-feira, 10 de maio de 2011
A short handbook/Pequena monografia
Este livro está repleto de curiosidades. Eis algumas que passo a partilhar connvosco...
- foi escrito pela primeira vez em 1963 (esta versão tinha 64 páginas), em inglês, por Jack Braga;
- foi inédito ou traduziu para inglês um texto enviado de Portugal? tudo indica tratar-se de material inédito da autoria de Jack Braga;
- teve uma segunda edição, ainda em inglês, em 1965, com mais dados, e outras em 1968 e 1970;
- a edição é do Information and Tourism Department e o livro impresso na Imprensa Nacional de Macau;
- com base nesta edição a Agência Geral do Ultramar faz uma versão portuguesa (faz o mesmo para as então demais colónias) sem que o autor seja mencionado;
- nas demais edições para as outras colónias, há edições com (Angola) e sem autor (Guiné), por exemplo;
- graficamente as duas capas são iguais, só mudam as cores;
- as imagens que os ilustram não são as mesmas, sendo que a edição em inglês tem mais variedade;
- os dois livros incluem um pequeno mapa de Macau e ilhas (um é desdobrável, o outro não);
- os conteúdos são muito similares, variando os dados estatísticos apresentados, ora de 1963, 1964 ou mesmo 1965;
- a bibliografia indicada na versão feita em Macau (a inglesa) é mais exaustiva;
- o formato é igual em ambas as versões que têm 72 (inglesa) e 71 páginas (portuguesa);
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