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sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

A "Carreira do Oriente" da CNN

O Plano de Renovação da Marinha de Comércio, vulgo Despacho nº 100 do Governo de Portugal, com data de 10 de Agosto de 1945, assinado pelo Ministro da Marinha, Américo Thomaz, preconizava a construção de 70 novos navios em 10 anos, incluindo 9 paquetes. No final viriam a ser construídos 58. O Niassa foi o último a ser entregue a 10 de Agosto de 1955.
Entre esses estavam dois navios de passageiros e carga para uma nova linha que começou a ser operada em 1952 destinada a ligar Lisboa a Mormugão, Macau e Dili, a Carreira do Oriente, que a partir de 1962 passou a ser a linha do Extremo Oriente. Foram eles os então denominados navios 'gémeos', o "Índia" e o "Timor", construídos em Sunderland e entregues à CNN em 1951.
Acima imagens do Índia em 1951

Anúncio de 1925

Anúncio publicado no Diário de Lisboa em 1952

Criada em 1918, a CNN perdeu o monopólio das rotas para as colónias em 1922, após a criação da empresa concorrente, a Companhia Colonial de Navegação, com sede em Angola. 
Operada pela Companhia Nacional de Navegação a chamada "Carreira do Oriente" existiu entre 1952 e 1974. Foi sempre deficitária sendo os prejuízos cobertos parcialmente por subsídios do Estado. 


Anúncio de 1955: na imagem o "Moçambique"

O "Índia" e o "Timor"

O Índia foi vendido em 1971 e o Timor em 1974, ambos para a companhia Guan Guan Shipping de Singapura, tendo passado a chamar-se Kim Ann e Kim Hoch. A CNN seria extinta em 1985.

Anúncio publicado no Diário de Lisboa em Dezembro de 1957

A CNN chegou a ter maior frota de marinha mercante do país com nove unidades: o "N/T Príncipe Perfeito" (1961), o navio-almirante da frota, "Angola" (1948), "Moçambique" (1949), "Niassa" (1955), "Índia" (1951), "Timor" (1951), "Quanza" (1929), "Lúrio" (1950) e o "Zambézia" (1949).

Referência à "Carreira do Oriente" num folheto turístico da década 1950
Estes navios, bem como os da CCN, seriam várias vezes requisitados pelo Estado para transportar contingentes (e material) militares, para os antigos territórios portugueses em África e Extremo-Oriente. Isto, claro, para além do facto de muitos dos passageiros serem funcionários públicos cujas viagens eram custeadas pelo Estado português.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

Agência Nova China: Relatório Secreto da CIA

Actualmente denominada Agência de Notícias Xinhua/Agência de Notícia Nova China, as origens desta agência oficial do governo chinês remontam à década de 1930.
Num relatório secreto da CIA (Agência Central de Inteligência do governo dos Estados Unidos criada em 1947) - recentemente desclassificado - datado de 26 de Janeiro de 1952, fica-se a saber da abertura em Macau de uma delegação da agência noticiosa Nova China em Novembro de 1951. 
Tendo por base uma notícia de um jornal de Hong Kong o relatório informa que a delegação macaense ficava no terceiro andar do nº 1 da Calçada da Barra; dá ainda conta de quem eram os responsáveis da delegação bem como dos jornalistas, estes últimos já trabalhavam para outros jornais locais como o Ta Qung Pao.
Diz-se ainda que quem custeou as despesas da criação da agência - 20 mil dólares de Hong Kong - foi Ma Man-chi (Ma Man Kei) e que os custos mensais são na ordem dos dois mil dólares.
Ma Man Kei, morreu em 2014, aos 95 anos. Foi Presidente da Associação Comercial de Macau durante muitos anos e o representante oficioso de Pequim em Macau. Foi ainda vice-presidente no 8.º, 9.º, 10.º e 11.º Comité Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

"Lai Si Tao Loi"

"Lai Si Tao Loi" é a expressão usada por quem recebe de oferta um Lai Si.  A tradicional entrega do envelope vermelho (‘lai si’, em cantonense) contendo dinheiro é uma das tradições associadas ao ano novo lunar. O envelope de cor vermelha simboliza a felicidade, a boa sorte. Normalmente são os pais que dão aos filhos, os casados aos solteiros, os patrões aos empregados...
Na imagem um Lai Si timbrado com o símbolo do BNU de Macau.

terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Anúncios curiosos: 1863/64

 Assina este 'desmentido' o Barão de Senna Fernandes
José da Silva fazia trabalhos de tipografia. A Rua do Tarrafeiro - perto do jardim Luís de Camões - viria a ser criada em 1869. O termo “tarrafeiro” significa pescador que utiliza uma “tarrafa” (rede de pesca circular, de malha fina, com pesos na periferia e um cabo fino no centro, pelo qual é puxada) muito popular em Macau. 

segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

"Cities of Sin": 1933

Num livro editado em 1933 da autoria de Hendrik de Leeuw (1891-1977) intitulado "Cities of Sin", o autor expõe os 'pecados' de várias cidades do mundo, incluindo do extremo oriente: Yokohama, Hongkong, Shanghai, Macau, Port Said, e Singapore.

O autor nasceu na Holanda mas foi cedo para os EUA. Esta obra foi escrita quando Hendrik estava a trabalhar na Ásia tendo visitado as cidades que refere. Trata do problema da prostituição e do tráfico de seres humanos, em especial de mulheres e crianças. Um tema para o qual o mundo começava na altura a despertar.
Macau surge no capítulo 4 (p.146-189) - "Brown Girls and Fantan": "There is no question that it harbors in its hidden places the riffraff of the world, the drunken ship masters,the flotsam of the sea, the derelicts, and mora shameless, beautifull, savage woman than any part in the world. It is hell. But to those who whirl in its unending play, it is one haven where there is never a hand raised or a word said against the play of the beastliest emotions that ever blacken the human heart."
Excertos:

The procession of women and girls in the Orient rolls to its dark fate under the heavy hand of tradition and custom. As the Yoshiwara is a part of Japan, so is the Purple Mansion a true part of China. Rice and women: those are the staples of the two kingdoms. Turn now to Macao. It is Chinese, too, as may be seen if you will run your eye along the map a few miles from Hongkong. And yet it is a place apart. Its evil is of itself. Its perversions, its strange lusts, its fever of gaming, all those deeds that slay and break thousands of girls in those shadowy dens — all these rise out of the soul of a bastard people, a lascivious creature that runs riot with all the bloods of the East and the West. By some it is regarded as the potent power behind the white slave traffic of the East. There is no question that it harbors in its hidden places the riffraff of the world, the drunken ship masters, the flotsam of the sea, the derelicts, and more shameless, beautiful, savage women than any port in the world. It is a hell. But to those who whirl in its unending play it is the one haven where there is never a hand. raised or a word said against the play of the beastliest emotions that ever blackened the human heart. I went there after Shanghai And as our steamship ap- proached that small peninsula of granite hills and sandy flats on which Macao has been built, I thought of Luis de Camdes, the most renowned of the Portuguese poets, and of the poem that he wrote during his exile, enforced upon him because he exchanged too eager glances with a girl. I thought, too, of the strange fate that may befall a city, how it may pass, as Macao has passed, from a high place in the immense Asiatic world to this nothingness: the last remains of Portugal’s former greatness.

There are, perhaps, 160,000 people there, of which 4,000 are Portuguese and the remainder, except for 500 of other foreign nationality, are Chinese. Once there were thousands more, but the rise of Hongkong stopped the growth of Macao. An enchanting scene. The Praia Grande, a beautiful bay, the graceful sweep of sea wall and rows of houses, of many colors, rising upon the slopes. Ancient forts and modern public buildings stand together. And behind all rise the summits of the Mountains of Lappa. Now frail sampans move near our ship; rusty-sided steamers, with Lascars gazing from their ports move down the bay; a cruiser flying an outlandish flag hauls up its anchor with a deep rattle. I go ashore, A swarm of beggars and ricksha coolies im portune. There is a babel of voices, flashes of color — in dress, in buildings, and in bright eyes — and that mingled odor of humanity and strange foodstuffs, found always where many live together in the Orient. I beckon to a coolie and he pulls me quickly through a part of old Portugal, where, for hundreds of years, merchants and Jesuits have striven for their successes. 

What names of streets! Travessa do Bom Jesus, Pateo da Eterno Felicidade, Odd sensations flicker through the heart as the eye takes in the pink, mauve, gray and sapphire colors of the houses, the gables and the shutters. It is Iberian. There is no sign of Dutchmen here, although, since 1514, the Dutch have taken a major part in the making of the city. I go to the Hotel Boa Vista where life runs smoothly and comfortably for me. Hard to believe that outside of this smart hostelry, with its liveries and its servility, there burns the plague spot that so many have described to me. I take my seat for dinner in a hall cooled by punkas and I look out on the ocean, a gigantic chocolate-colored space on which hundreds of junks are floating. There are scores of other men at the tables — Chinese, Englishmen, Americans, and swarthy, bearded men of a mixture of races. I had in my pocket a letter to a certain man who was to supply me with the proof of what had been said of Macao. I started toward his house in a twilight that seemed to be flickering out, as if the sun were a fading lamp. Darkness came and seemed as heavy as a shroud as it enveloped the mountains. I shrank back in my seat and looked half-heartedly out at the changing thoroughfares. I had passed away from neatness and glitter. Here was filth again. There were mud-houses, squat, black things, and bamboo shacks, straggling in uneven rows and clusters. They choked the Rua Comercio between them, these patterns of ugliness. (...)
He puffed a bit and spat a bit. He then asked me if I Had not wondered, when I came in, why he received visitors in such squalid surroundings. I admitted that it puzzled me. “Opium,” he said. “From this place much opium and many women are bought and sold and transported. There are some persons who might like to stop in here. Investigate, you know. Under this shabby front, oiu: business is hidden. We avoid suspicion.” By exchanging glances with him as we chatted, I came to the correct conclusion that this man was a user of opium, a great betrayer of women, and, of course, crafty, vicious, cruel, and intelligent. He was a killer, too, or I miss my guess. He smelled of blood, of lives taken for the sake of gold. He then began his melodrama. He seemed to take pleasure in my confusion and his next act was one calculated to increase my perplexity. I said: “Yes, I am rather curious to know the purpose of the switchboard and the telephones. Where do they lead and how does it come that you ply your trade from this filthy place?” He put his finger on a button. He said: “No! I am going to tell you nothing. What is there to tell you? This is China. Yes, we buy and sell women. But what of that? You have seen it on the mainland. It is the same here. The women are needed. I get them. However, you may look around if you wish.” He pressed a button, he sat back and looked at me. Presently a door — hardly more than a panel in the streaked wall of the room — opened, and a Chinese stepped forth. (...)
The social significance of Macao, insofar as the traffic in prostitutes is concerned, lies in the fact that here, in this city, the systems of the East and the systems of the West, that is to say, Portugal, exist side by side and may be Compared, Also, for the first time in this account of prostitution, we approach what is known as the licensed house in Europe and American countries. True, the Yoshiwara and the Chinese systems have an aspect of licensing, but that formality of registration is more directly concerned with the contract for the sale of the body than with the personality itself. I suppose that it is generally accepted by sociological students that recognizing and licensing brothels is the best answer that a government can give to the question: How shall sexual intercourse be made available cheaply and safely to the male population?
The government of Portugal has made some attempt to solve the problem. The attempt can hardly be called a sin cere or a successful one. And what is true of Portugal is also true of Macao. The history of the legislation begins in 1900 when laws were laid down providing for the registration of licensed prostitutes. However, there was no law made against the procurement of women and the flourishing traffic in children was not at all impeded by the action of the government. One article did refer to persons who incite, promote or facilitate the corruption of children, but it was a law that had no strength in it and did not, by any means, include all those who are in the business of procuring women. Then, as now, there were no laws barring a woman over the age of twenty-one from becoming a prostitute. These few measures were all that existed in Portugal at the time of the International Convention of May 4, 1910, which Portugal at once signed. In article three of this convention, the high contracting parties bound themselves to take the necessary steps in their respective countries to give full application to the convention. In Portugal and in Macao, where the law was as much needed as in any other centers of vice in the world, the convention did not receive the support of new laws and enforcement. There is without question in Portugal a complete lack of interest in the attempt to abate the traffic in women and children or to pass laws that make prostitution or procurement a punishable offense. In Macao I found that the registration of these professionals had become obligatory. That is, they were compelled to enter their names on the police registers when, after re- peated warnings, they were again found plying their trade. In the event that a girl is actually forced by economic circumstances to live by prostitution and later obtains a situation which enables her to earn a living, she may have her name removed from the register when she submits proof that her future conduct will be respectable. 
The police of Macao adopted, in 1925, a set of laws which were regarded as being especially severe. They would have been severe, indeed, had there been any inclination to scurry about with both eyes open and see that the law was carried out. As usual, however, the police scurried about with their eyes shut and their capacious pockets open for whatever little gifts, no matter how tainted, might fall therein. I give here some of the provisions of the laws that were designed to protect very young girls against the rapacity of their parents or the subtle devices of the manicured, jeweled hands of procurers that are always reaching into that land for the lively, bright-eyed children who give signs that they may be beautiful. One paragraph of the decree states that minors, that is to say those under the age of sixteen years, may not frequent licensed houses, or Maisons de Passe, or houses where prohibited gambling is carried on, or clubs, taverns, or hotels. They are also barred from the cinema where the entertainment may harm their moral well-being and the same law applies to the theater. 
The Portuguese lawmakers, in sending the statutes to Macao, revealed legalistic quirks that are a bit difficult to fathom. One of the paragraphs, for instance, states that a certain type of young girl, a minor, may be deemed morally corrupt if she for any valid reason frequents or resides in a licensed house of prostitution. I have pondered on the word “valid” and it, somehow, amused me. I suppose that the lawmakers meant to say that if the young person re- sides in such a house for the fun of it she is all right, but that if the reason for residence is that she wishes to become a professional then the reason is valid and she is corrupt.

domingo, 26 de janeiro de 2020

Pedido de protecção para o cônsul inglês em Macau

Do Arquivo de Salazar na Torre do Tombo consta este manuscrito com a data de 5 de Fevereiro de 1945 e trata de um "Pedido de Protecção para o Cônsul Inglês em Macau".

"O Ministro de Inglaterra, que como se sabe é um especialista do Extremo Oriente, veio aqui (...) que espera (...) telegrama urgente para o governador de Macau a fim de proteger a vida do cônsul de Inglaterra contra o qual receiam muito que agentes japoneses exerçam represálias, isto também de o liquidar (...)


O Cõnsul britânico em Macau era John P. Reeves. O embaixador de Inglaterra em Portugal era Ronald Hugh Campbell que está na foto acima em 1945 com Salazar, que era chefe de Governo e também assumiu durante cerca de 20 anos a chefia da diplomacia portuguesa e um acérrimo defensor da antiga aliança como Reino Unido.


sábado, 25 de janeiro de 2020

Mesas de jogo de "Clú Clú": ano novo chinês 1895

By the end of 19th century Cussec (Clu-Clu) which is a variation of what the West knows as Sic bo (骰寶) and is also known as Tai Sai (大細) and Dai Siu (大小) became one of the most popular games played in the streets.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Ano do Rato: Gong Xi Fa Cai - Kung Hei Fat Choi

O novo ano lunar começa este sábado, 25 de Janeiro, sob o signo do Rato do zoodíaco chinês. Na tradição chinesa e calendário lunar, o Rato é o primeiro de 12 signos e representa a agilidade, a inteligência e a acumulação de riqueza. Este ciclo é determinado pelo calendário lunar e não pelo gregoriano, o que leva a data a mudar de ano para ano e as festividades a estenderem-se por vários dias.
Sendo Macau um território onde a população chinesa foi sempre maioritária, as tradições dos ano novo lunar estão fortemente enraizadas.
Na China não seguem o calendário gregoriano do Ocidente, mas o calendário lunissolar (recorre-se ao Sol e à Lua). Cada ano possui doze lunações num total de 354 dias. Para não se perder a sincronia com o ciclo solar (365,25 dias), são acrescentados a cada oito anos noventa dias ao calendário, ou, aproximadamente duas lunações. Desta forma não se perde a sincronia nem com o ciclo solar, nem com o lunar. 
Como o ciclo lunar é formado por 12 animais, significa que de 12 em 12 anos o mesmo animal se repete. São muitos os rituais associados a esta festividade - a mais importante para o povo chinês - que evoca a renovação da natureza (início da Primavera). Queimam-se panchões, oferecem-se presentes aos deuses que protegem o lar, realizam-se as danças do Leão e do Dragão e, claro, os jogadores, procuram a sorte nos casinos

quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

Farmácia Chong Sai - Rua das Estalagens, 80



Fachada e corte. Plantas do ICM

Sun Yat-sen, oriundo do distrito de Xiangshan, na província de Guangdong, era originalmente conhecido por Wen e só mais tarde adoptou o nome Yat Sen. No Japão, durante as suas actividades revolucionárias, utilizou o nome de “Zhongshan Qiao” (Nakayama Sho), mas os chineses conheciam-no pelo nome de Sun Zhongshan. No decurso da sua estadia em Macau, abriu a Farmácia Chong Sai, na Rua das Estalagens, em 1892 e também um consultório, situado num edifício do Largo do Senado. Segundo o jornal chinês “Ching-Hai Tsung-Pao”, Sun dava consultas entre as 13 e as 15 horas. Em 1893 Sun deixou Macau, tendo criado a Sociedade para o Renascimento da China em 1894, que em 1905 se transformaria na Aliança Revolucionária Chinesa (Tongmenghui), defendendo como valores cruciais na construção da nova China os “Três Princípios do Povo”, ou seja, independência nacional, democracia e bem-estar das massas populares. No dia 10 de Outubro de 1911, a insurreição Wuchang foi, finalmente, bem sucedida e Sun Yat-sen tornou-se, em 1912, o primeiro presidente provisório da recém-criada República da China.
Em 2011 o Governo de Macau comprou o edifício situado no nº 80 da rua das Estalagens por 36 milhões de patacas.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

"Supression of Gambling in Macao"


"Supression of Gambling in Macao" é o título da notícia da página 3 do jornal The Singapore Free Press, de 7 de Outubro de 1947.
O fim do jogo em Macau era de facto notícia, se fosse verdade. 
Trata-se no entanto de uma confusão. Nesta altura o que estava em causa era o fim do ópio em Macau.
Aliás, lendo-se a notícia até ao fim percebe-se que as declarações do cônsul de Portugal em Cantão, José Calvet de Magalhães, à agência noticiosa Associated Press, referem-se ao "opium" e não ao "gambling".
Durante quase dois séculos o processamento, embalagem, consumo e venda do ópio, a par dos exclusivos do jogo, foram as principais fontes de rendimento do Governo de Macau.
O território importava o ópio cru (da índia) e preparava-o para a exportação (ópio cozido).
No início do século 20, devido à crescente pressão e condenação internacional, (a maior parte dos países já o tinham ilegalizado na primeira década do século 20) o comércio do ópio acabou por ser ilegalizado e declarado oficialmente "extinto" pelas autoridades de Macau por decreto-lei nº 933 de 28 de Maio de 1946. De acordo com a legislação até 30 de Junho de 1947 todos os fumatórios de ópio existentes em Macau deveriam ser encerrados. De acordo com a notícia foi um pouco mais tarde. Perante a ilegalização do ópio outra fonte de receita pública já estava no activo... o comércio do ouro.

terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Principal places of interest: Fantan Houses or Gambling Dens

Na década de 1930 Macau ainda não era a "Las Vegas da Ásia" mas já era, e há muito tempo, o "Monte Carlo" do Oriente.
"Gambling House" em Macau. Foto de Arquivo
Para além das publicações da época é o próprio Governo de Macau que o assume numa publicação oficial intitulada "Directório de Macau". Veja-se o caso da publicação de 1934...
"Macao has excellent modern roads and avenues, many converging towards the hinterland (...) Of the principal places of interest, mention should be made of Government House, the Fantan Houses or Gambling Dens, the Cathedral, the Porta do Cerco, the Club, San domingo's church, the Leal Senado, flora, Camões Gardens and Grotto (...)
Worth seeing, as also is the noble facade of the ancient Jesuit church of San Panlo, burnt in 1835, and the Avenida Vasco da Gama (...) information will be gladly given and the best possible arrangements made for what cannot fail to prove an enjoyable and healthful trip. (...)"
No nº 57 da revista "Travel", de 1931, pode ler-se: "The Gambling Houses of Macao: No guide is needed to find the gambling houses of Macao. They begin near the steamer landing and line many of the city's streets."
Na "Geographic School Bulletins" de 1936 (publicação semanal da National Geographic), escreve-se: "The city of fish, firecrackers, and fan-tan may become even more famous as the port of happy landings (...) Bright colored, stucco houses climb the terraced hillsides, and a wide marine boulevard, shaded by banyan trees (...) Gambling Is a Thriving Industry. At present, fish, firecrackers, incense, wine, opium, and gambling provide the city (...) There are ordinarily at least three lottery drawings a day in Macau. (...)

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

"Loja de Relogeiro": 1844

"D. Remi - de Londres e Genova faz saber ao Público , que elle acaba de abrir huma Loja de Relogeiro, onde concerta e alimpa Chronometros, Relogios, Caixas de Musica etc, e espera por meio de huma assidua attenção aos seos encargos, merecer a proteção do Publico. 
Macao, Rua do Hospital* 4 de Julho de 1844"
* esta rua corresponde à actual Rua Pedro Nolasco da Silva, onde ficava localizado o Hospital da Misericórdia (depois S. Rafael), actual Consulado de Portugal em Macau e Hong Kong.

domingo, 19 de janeiro de 2020

Fairey III D - "Santa Cruz"

O Fairey III D - "Santa Cruz" é uma das peças emblemáticas do Museu de Marinha em Lisboa e a sua história tem ligações a Macau.
Construído em Inglaterra em 1921 pela Fairey Aviation Company Limited, um ano depois completou a travessia do Atlântico Sul.
Em 1927 foi enviado para Macau com outros dois aviões Fairey, para o Centro de Aviação Naval. Em 1930 regressou a Lisboa como "relíquia aeronáutica", sendo nessa altura restaurado e passando a constituir património do Museu de Marinha. 
Em 1935 participou na Exposição Internacional de Aeronáutica; em 1940 na Exposição do Mundo Português; em 1959 na celebração do 37.º aniversário da Travessia Aérea do Atlântico Sul e em 1959 esteve exposto na Avenida da Liberdade, em Lisboa, no dia da Marinha.
Um marco da história da aviação este Fairey - hidroavião biplano monomotor - estava equipado com Motor Rolls Royce "Eagle" VIII com 350 cavalos e 12 cilindros em V, resfriado por água. Atingia a velocidade\máxima de 176 km/h, uma autonomia de 5h30m e um raio de acção de 980 km. Tem 10,97 metros de comprimentos e envergadura de asas de 14,05 metros.

sábado, 18 de janeiro de 2020

A morte do cônsul japonês no Inverno de 1945

"Pearl Harbor, Lisboa, Tóquio” (ed. portuguesa de 2017 - a edição original em japonês é de 1950), inclui as memórias do diplomata Morishima Morito, embaixador do Japão em Lisboa durante a Segunda Guerra Mundial. Neste excerto que aqui se reproduz o diplomata descreve o assassinato do cônsul japonês em Macau no Inverno (2 de Fevereiro) de 1945.
Apesar de não ter sido investigado, na época a opinião generalizada foi a de que o crime fora executado por dois chineses a mando do coronel Sawa, oficialmente adido militar, mas na prática, chefe dos serviços secretos militares japoneses em Macau e responsável pela polícia nipónica de Guangdong.
"Em 1945, no início do Inverno, o cônsul Yasumitsu Fukui, acreditado em Macau, um território português na costa meridional da China, foi assassinado a tiro por um gangue chinês. Recebi um telegrama do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Japão com ordens para reclamar os seguintes pontos:
1)Emissão de um pedido formal de desculpas por parte do governo português a propósito deste incidente.
2)Mobilizar todos os meios possíveis de busca e detenção dos autores e das pessoas responsáveis pelo ataque e puni-los quando forem presos.
3)Restaurar a segurança da ordem pública e garanti-la no futuro.
4)Exigir uma indemnização.
Por aquilo que foi apurado posteriormente, Fukui tinha o hábito de participar todos os dias numa sessão matinal de ginástica organizada pela comunidade nipónica. Nesse dia, ao regressar da sessão, foi assassinado por chineses que o atacaram e balearam. Enquanto estive a trabalhar em Mukden (Manchúria), cruzei-me durante dois ou três anos com Fukui, que era o responsável pelo Consulado-Geral de Mukden em Xinmin Tuen («Nova Colónia»). Era uma pessoa cordial e leal que se dava muito bem não só com os colegas e residentes japoneses, mas também com a população chinesa em geral. Não era possível que alguém tivesse qualquer tipo de rancor contra ele. Do meu ponto de vista, não consigo deixar de pensar que por detrás deste incidente deve ter existido um motivo político bastante forte.
Negociações com as autoridades portuguesas
No que respeita às instruções que recebi do governo japonês, nada tive a opor quanto aos três primeiros pontos. No entanto, o último ponto, acerca da exigência de indemnização, fez-me pensar. Para uma nação onde são frequentes os movimentos políticos e agitações com objectivos revolucionários, presume-se que há uma falta de condições normais de governação e de capacidade para manter a segurança nacional. Por isso, segundo as normas internacionais, é habitual não atribuir a responsabilidade ao governo e raramente exigir-lhe uma indemnização para este tipo de incidentes. A China é um exemplo disto. Nos países civilizados, e desde que não haja intenção ou negligência por parte das autoridades, o normal é que incidentes deste género sejam tratados como casos de polícia comuns.
De acordo com a minha análise, cheguei à conclusão de que neste caso não se deveria exigir uma indemnização ao governo português porque haveria fortes probabilidades de tal exigência o levar a apresentar pedidos de indemnização pelos actos de violência cometidos pelas tropas nipónicas em Timor. Considerei acrescentar apenas, como se se tratasse de uma sugestão minha, que seria tomado em elevada consideração o facto de as autoridades lusas estarem dispostas a oferecer espontaneamente uma compensação monetária.
Como as autoridades japonesas acabaram por aceitar o meu parecer, solicitei uma audiência ao secretário-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros (Teixeira de Sampaio) para dar início ao diálogo. Logo após este acontecimento, o governador de Macau expressou diligentemente os seus sentimentos a nível oficial. Além disso, no início da audiência, o secretário-geral apresentou sentidas condolências em nome do governo português. Portanto, no que respeita ao ponto 1, concluí que tivemos o desfecho esperado. Agora, relativamente aos pontos 2 e 3, não era necessário esperar pelo pedido do governo japonês: Portugal, como administrador da região, tomou providências por iniciativa própria. Assim, não houve qualquer divergência entre nós. Quanto ao assunto da indemnização, apesar de dar mostras de concordar por uma questão de princípio, como eu calculara, o secretário-geral referiu-se à questão da eventual assumpção de responsabilidades pelo governo português nos seguintes termos:
«De acordo com o relatório elaborado pelo governo de Macau, o incidente, ou seja, o assassinato do cônsul japonês Fukui, aconteceu quando este estava a caminhar durante um trajecto da sua vida particular. Num caso destes, a responsabilidade das autoridades só pode ser invocada por negligência; por exemplo, se o cônsul tivesse sido ameaçado e prevenido as autoridades, pedindo-lhes expressamente protecção, e estas tivessem decidido não tomar quaisquer medidas de vigilância. Porém, não foi este o caso. Por este motivo, consideramos que devemos tratar o incidente como um crime comum. No entanto, atendendo ao facto de o cônsul Fukui ter sido uma pessoa muito estimada por todos, que tinha muito boas ligações com o governo de Macau, e devido ao estado actual das relações sensíveis entre as duas nações, no que diz respeito à sua sugestão sobre uma eventual indemnização tomo nota dessa proposta, que poderá ser extremamente útil e que merece ser estudada em termos de valor, da maneira como se poderá proceder à transacção financeira e outros pormenores.»
Mais tarde, enquanto trocávamos opiniões a nível não oficial a respeito da indemnização, inclusive quanto ao montante e ao modo de proceder ao pagamento, a guerra chegou ao fim. No entanto, e tal como eu calculara, o governo português estava inclinado a propor que a indemnização fosse abatida nas indemnizações devidas pelo Japão a propósito dos actos que os seus militares tinham cometido em Timor.
Plano do Exército japonês para ocupar Macau
Enquanto decorriam estes diálogos a propósito da ordem pública em Macau, o secretário-geral solicitou muito discretamente a atenção das autoridades nipónicas nos seguintes termos:
«Em Macau, as forças japonesas não avisaram o governador do território e destacaram o coronel Sawa (chefe dos serviços secretos do Exército), que está a formar pessoal. É do conhecimento público que o coronel Sawa tem andado a prender e a executar chineses sem ter poderes para tal. Trata-se, obviamente, de uma violação da soberania do Estado português. No entanto, tendo em conta a situação actual das relações bilaterais entre as duas nações, o governo de Macau está a dar um consentimento tácito a estes incidentes frequentes.»
Quando ouvi estas palavras do secretário-geral, percebi pela primeira vez que estava desvendado o mistério do assassinato do cônsul Fukui. De acordo com informações transmitidas telegraficamente pelo consulado do Japão em Macau, após este atentado contra Yasumitsu Fukui seguiram-se mais incidentes: disparos contra as instalações do Consulado-geral do Japão, trocas de tiros entre japoneses e chineses e outros confrontos.
Por outro lado, começava a ser discutida com mais insistência a possibilidade do envio de um destacamento militar para Macau cujo objectivo seria a protecção dos cidadãos japoneses residentes, pois não se podia contar apenas com o governo de Macau para manter a segurança pública na eventualidade de uma ofensiva militar norte-americana em Hong Kong. As altas patentes do Exército japonês estacionado em Nanquim apresentaram uma proposta agressiva de envio de soldados para Macau e contaram com o apoio do cônsul japonês Eiichi Iwai.
Em seguida, as Forças Armadas japonesas decidiram repetir a medida que haviam aplicado à concessão britânica de Tientsin no Verão de 1939 e impuseram um bloqueio semelhante a Macau. Esta acção provocou um grande sofrimento a cerca de 300 000 chineses, cuja vida quotidiana se tornou bastante difícil devido ao aumento dos preços, sobretudo dos produtos alimentares, e à escassez de alimentos no mercado.
No sentido de terem um pretexto para o envio de tropas, as Forças Armadas utilizaram as tácticas do costume como, por exemplo, «bombardear com a menor intensidade possível para não ameaçar nem a população nem o gado». Tratou-se do mesmo estratagema clássico utilizado com bastante frequência contra a China, tal como tive oportunidade de referir no meu livro Conspiração, Assassinato, Sabre – Memórias de Um Diplomata(陰謀 – 暗殺 – 軍刀 – 一外交官の回想). A série de incidentes em Macau também fez parte deste género de manobras das Forças Armadas. Ao relembrar tudo isto, lamento profundamente a morte de Fukui, que foi vítima desta conspiração.
Perante as circunstâncias, poder-se-ia concluir que a crise diplomática entre o Japão e Portugal não era tanto a questão de Timor mas centrava-se sobretudo nos problemas em torno de Macau. Se assim fosse, não havia qualquer dúvida de que a situação teria de ser acompanhada com muita atenção. Por isso, apresentei uma proposta aos ministros dos Negócios Estrangeiros, Mamoru Shigemitsu e Togo, na qual dei especial atenção aos seguintes pontos, que expus num tom bastante contundente:
1)Encerramento imediato da agência do coronel Sawa.
2)Deportação de todos os Tairiku-Ronin (indivíduos que viviam ou circulavam pela China ou pela península da Coreia para promoverem actividades políticas).
3)Nomeação imediata de um cônsul em Macau.
4)Levantamento imediato do bloqueio a Macau.
No seguimento da minha exposição, o bloqueio foi levantado no espaço de alguns dias e Masaki Yodogawa enviado como novo cônsul. Dominava bem a língua portuguesa e acompanhara o observador português a Timor pouco tempo antes. Graças a estas competências, contribuiu para melhorar a situação. A título de mera informação, o coronel Sawa foi acusado de crimes de guerra e executado pelas autoridades chinesas após o final do conflito."
Sugestão de leitura: "Macau 1937-1945:os anos da guerra", João Botas, IIM, 2012

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Large populous and wealthy city seated upon a fine river

(...) We stopped at the Portuguese settlement Macao situated at the southern point of an island separated only by rivers from the main land stay here was short so that I had but little for remark.
The most curious thing I was a wall built of very large oyster shells many of these are divided into thin laminae when polished are used instead of glass for both here and in the southern parts of the empire. This place was formerly a commercial station great importance as appears from the many noble buildings both public and private some of them much out of repair though now its consequence is diminished.
My friend at Ummerapoora had taken the precaution of furnishing me with a letter of recommendation to the viceroy of Canton whither I proceeded. It is a large populous and wealthy city seated upon a fine river and is the grand emporium of European trade. It consists of three towns divided by high walls each containing besides private houses temples palaces and courts.

The European factories extend along the banks of the river each distinguished by the flag of the nation to which it belongs. In front of the British factory is a very elegant verandah raised on pillars and flagged with marble commanding a prospect of great extent and variety.
Being an Englishman I was invited to dine at the Company's table in the long room where amidst a profusion of dainties. I was regaled with swallows nests and fins of sharks stewed into the richest soups. In the part of the town inhabited by Europeans are few buildings except shops amply furnished with the various articles in which the owners deal such as silks porcelain lacquered ware and tea. It is astonishing to see with what readiness the Chinese who are ignorant of our mode of calculation reckon up the amount of the articles they sell by the assistance of a machine called a swan pan in which balls are strung upon wires in different columns representing units tens hundreds thousands &c in decimal progression. They count every thing by tens. An ounce of silver is divided into ten chen the chen is again divided into ten fen and the fen into ten lee which greatly facilitates their intercourse with each other .
Tea like beer in England is sold in public houses. In these a single cup may be purchased for a very small coin the thousandth part of a leang nor is it unusual for a burdened and weary traveller to lay down his load refresh himself with a cup of warm tea and then pursue his journey. (...)
Excerto da obra "The Traveller in Asia Or a Visit to the most Celebrated Parts of East Indies and China (...)" da autoria de Priscilla Wakefield publicado em Londres em 1817.
A autora recorre aos diários de Arthur Middleton que foi quem de facto fez as viagens e tomou as notas do que viu e sentiu. Em cima uma ilustração da época mas que não faz parte do livro referido.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

"Atlas Universal", João Albernaz, 1643

O "Atlas Universal" com o título formal de "Livro Universal das Navegações feito em Lisboa por João Teixeira Cosmographo de Sua Magestade, Anno 1643" é constituído por oito cartas em folhas de pergaminho:
1.ª Atlântico Norte com a Europa ocidental, o Noroeste de África e a Terra Nova; 2.ª Atlântico Sul com as costas de África e do Brasil; 3.ª Sudoeste do Oceano Índico com a África Oriental, Madagáscar, o Sul da Índia, Ceilão e o Norte de Samatra; 4.ª Próximo e Médio Oriente com o Mediterrâneo Oriental e o Norte do Oceano Índico; 5ª carta Sudeste Asiático e Extremo Oriente, com as costas desde o golfo de Bengala até ao Japão; 6.ª Pacífico Norte desde a Nova Guiné e o Japão até ao México; 7.ª América do Sul com as terras para sul do Equador, sem a parte oriental da costa do Brasil; 8.ª Atlântico Norte com as costas americanas desde a Terra Nova até ao Brasil, para lá do Maranhão, com as ilhas e as costas ocidentais da América Central.
Entre os elementos iconográficos destaque para rosas do ventos, castelos com bandeiras, armas do rei de Portugal e de outros reis, a assinalar a posse de territórios, cruz junto da qual está um cristão a rezar, no Congo, e uma tenda a marcar o reino do Preste João, na Etiópia.
"Macao" surge representado na 5ª carta, imagem acima com a inscrição no canto superior direito "Tartaria Oriental".

Sabe-se muito pouco sobre a vida e obra de João Teixeira Albernaz. Nasceu em Lisboa provavelmente no início do último quartel do século XVI e morreu pouco depois de 1652. É também conhecido por João Teixeira Albernaz I, para se diferenciar do neto homónimo. Aprendeu a arte da cartografia com o pai, tendo recebido a 29 de Outubro de 1602 a carta de ofício de mestre em fazer "cartas de marear, astrolábios, agulhas e balestilhas". A partir de 1605 trabalhou no Armazém da Guiné e Índia, onde exerceu actividade até morrer.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

"Vista de Macao - China - Mirado por Mar"

"Vista de Macao China Mirado por Mar" é o título desta pintura (óleo sobre tela - 58x86cm) da chamada "escola chinesa". Uma das características destas pinturas do século 19 era não serem assinadas. Nas várias dezenas de representações de Macau são dois os motivos predominantes: representações do Porto Interior e da baía da Praia Grande (como é o caso desta). Nesta, para além de ser a única que encontrei até hoje como a legenda em espanhol, há uma outra particularidade que se destaca, ao contrário da maioria dos quadros, a Praia Grande é apresentada numa perspectiva de Sul para Norte.

terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Macau nos "Traços do Extremo Oriente": 1895


Esta obra marca a estreia de Wenceslau de Moraes na escrita. Foi elaborado em Macau (onde ele chegou em 1888 e viveu até 1897) e publicado em Lisboa em 1895 por A. M. Pereira. As primeiras imagens deste post são dessa edição que teve prefácio da autoria de Vicente Almeida d"Eça.
Feito em jeito de narrativa de viagem, "Traços do Extremo Oriente" descreve rotas, lugares e paisagens. Inclui uma carta dirigida à sua irmã e vários contos escritos e recolhidos pelo autor desde 1885, além de um post scriptum e de um conto sobre a Batávia (actual Jacarta), a capital holandesa da ilha de Java. O livro está divido em três partes: “Recordações do Sião”, “Lembranças da China” e “Saudades do Japão”.
“Pequenino”, “dia belo, montanhas doiradas pelo Sol”, “boa gente chinesa”, “existência fácil, clima salubre”, “viver modesto... ingénuo e bom”, são algumas das considerações sobre Macau.


"Traços do Extremo Oriente – Sião, China e Japão"

Venceslau José de Sousa de Morais (Lisboa, 30 de Maio de 1854 - Tokushima, 1 de Julho de 1929). Oficial da Marinha, completou o curso Escola Naval em 1875, tendo prestado serviço em Moçambique, Macau, Timor e Japão.
Segunda edição: 1946
Após ter frequentado a Escola Naval, serviu a bordo de diversos navios da Marinha de Guerra Portuguesa. Em 1887 viaja pela primeira vez até Macau, onde se estabelece. Foi imediato da capitania do Porto de Macau e professor do Liceu de Macau desde a sua fundação em 1894. Durante a sua estadia em Macau casou com Vong-Io-Chan (Atchan), mulher chinesa, de quem teve dois filhos, e estabeleceu laços de amizade com Camilo Pessanha.
Em 1889 viaja até ao Japão, país que o encanta, e onde regressará várias vezes nos anos que se seguem no exercício das suas funções. Em 1897 visita o Japão, na companhia do Governador de Macau, José Maria de Sousa Horta e Costa, sendo recebido pelo Imperador Meiji. No ano seguinte abandona Atchan e os seus dois filhos, e muda-se definitivamente para o Japão, como cônsul em Kobe.
Aí a sua vida é marcada pela sua actividade literária e jornalística, pelas suas relações amorosas com duas japonesas (Ó-Yoné Fukumoto e Ko-Haru).
Durante os trinta anos que se seguiram, Venceslau de Morais tornou-se a grande fonte de informação portuguesa sobre o Oriente, partilhando as suas experiências íntimas do quotidiano japonês com os leitores portugueses.
Amargurado com a morte, por doença, de Ó-Yoné, renunciou ao cargo consular em 1913 quando já era graduado em Tenente-coronel/Capitão de fragata. Muda-se para Tokushima, terra natal daquela e passa a viver com Ko-Haru, sobrinha de Ó-Yoné, que viria também a morrer por doença. Venceslau de Morais viria a falecer em Tokushima em 1 de Julho de 1929.
Fotografado em Macau em 1893
Venceslau de Morais foi autor de vários livros sobre assuntos ligados ao Oriente, em especial o Japão. Também se encontra colaboração literária da sua autoria no semanário Branco e Negro (1896-1898) e nas revistas Brasil-Portugal (1899-1914), Serões (1901-1911) e Tiro e Sport (1904-1913).

segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

A Rota (Marítima) da Seda

Quando se fala em "rota da seda" vem-nos de imediato à memória a figura do veneziano Marco Polo. Na verdade não era uma rota definida, mas sim um conjunto de vias terrestres de comunicação, que iam mudando com os anos, num percurso de 4000 quilómetros de desertos e cordilheiras percorridos por por caravanas de mercadores e peregrinos. Esse circuito serviria para intercâmbio de produtos, sedas e especiarias, mas também tecnologia, como a bússola, e cultura... e religião.

A expressão "Rota da Seda" só surgiu no final do século 19, pelo académico alemão Ferdinand von Richthofen (1833-1905), um perito em geografia e consultor em projectos que visavam explorar recursos minerais na China com a ajuda de caminho-de-ferro e de portos industriais. Seria na obra de cinco volumes publicada em 1877 que surgiria então o termo “Seidenstraße”... Rota da Seda... que se iria vulgarizar no século XX.
E qual foi o papel de Macau nesta rota? Crucial!
Tudo começa com a chegada dos portugueses à Índia em 1498 altura em que se dá o primeiro contacto com os chineses. Em 1508, quando o rei português envia uma armada a descobrir Malaca e ordena que se procure pelos “chins”. 
A conquista de Malaca por Afonso de Albuquerque, em 1511, teve mesmo o apoio dos mercadores chineses ali estabelecidos. Em 1513 chega o primeiro oficial da Coroa portuguesa a Cantão e inicia-se o comércio. Uma situação altamente lucrativa que durou até 1521 quando o poder naval dos portugueses assustou as autoridades chinesas. 
Em 1543 os mercadores portugueses chegam às praias de Tanegashima, no Japão. De relações cortadas, os chineses desejavam no entanto a prata nipónica, e os japoneses procuravam a seda da China. É aqui que entram os portugueses como elo de ligação e demonstram ainda ter poder militar para derrotar a pirataria que infestava o litoral chinês, nomeadamente em redor de Macau. 
Estavam criadas as condições para o surgimento do território - como escala da chamada Nau do Trato, uma escala de meses a aguardar pela monção e uma espera aproveitada para compras em Cantão - e o seu assentamento ocorre por volta de 1555.
Na obra "Macau Histórico", o historiador português C. A. Montalto de Jesus descreve assim: "O comércio entre a Europa e o Japão era monopolizado pelo nosso país. Todos os anos mandávamos para Lisboa frotas compostas de grandes veleiros e barcos carregados de produtos de lã, roupas, objectos de vidro, relógios da Inglaterra e da Flandres e vinho de Portugal, a fim de os trocar nos diversos portos. Os barcos partiam de Goa, carregavam especiarias e pedras preciosas em Cochim, especiarias em Malaca e sândalo na ilha de Samatra, que depois trocavam por produtos de seda em Macau, sendo esta novamente trocada por oiro e prata no Japão... Finalmente, faziam mais uma escala em Macau, de vários meses, para carregar produtos de seda, almíscar, pérolas, objectos de marfim e madeira finamente trabalhados, e objectos de laca, cerâmica e porcelana, para então voltarem para a Europa".
Faria e Sousa refere na "Ásia Portuguesa" que os portugueses recebiam anualmente de Macau 53 mil caixas de produtos de seda da China. Entre 1580 a 1590, por exemplo, a seda crua que anualmente era recebida em Goa oriunda de Macau, rondava os três mil picos, num valor de 240 mil taéis. Em 1635, o número sobe para 6 000 picos.
Em suma, na época dos Descobrimentos, após as viagens de Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral (1497-1501), o monarca D. Manuel I vai aplicar uma política imperialista nos mares de África e da Ásia dando início a uma nova rota das especiarias. É na chamada Carreira da Índia que serão transportados produtos como a seda, os lacados, os perfumes, as madeiras exóticas ou as porcelanas, que há séculos circulavam pela Rota da Seda.
Macau surge assim no início do século 16 como um porto de dimensão intercontinental. E os navios do império português passam a ser os novos protagonistas da milenar Rota da Seda.
A partir daqui o mundo passa a estar ligado por rotas transoceânicas permitindo o intercâmbio não só de produtos, mas também de animais, plantas, objectos, conhecimento, religião, cultura, etc... como nunca antes acontecera.
"Tabula Geodoborica Itinerum a Varijs in Cataium susceptorum rationem exhibens" da autoria de Athanasius Kircher publicado em Amesterdão em 1667 e onde pode ver-se a indicação da rota marítima.
PS: Peças deste tempo em que Macau se assumiu como o mais importante entreposto comercial internacional no Extremo Oriente podem-se ser vistas, por exemplo, no Museu do Centro Científico e Cultural de Macau, em Lisboa, e no Museu de Arte de Macau, em Macau: presentes tributários de emissários da corte imperial e dos estados com os quais possuía relações tributárias, presentes de missionários estrangeiros, tributos pagos por súbditos do império, itens adquiridos ou encomendados pela corte e produtos de oficinas imperiais ou locais, inspirados ou imitando produtos estrangeiros, etc...