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segunda-feira, 30 de setembro de 2019

"Macau" no "Atlante della Cina"

Macau representado na foz do Rio das Pérolas. Da autoria de Miguel Ruggieri (entre 1580 e 1588). O topónimo que surge é, curiosamente, igual ao actual, Macau. In "Atlante della Cina", Archivio de Stato di Roma, 1993.
"Della cittá di Quam Ceu[Cantão; Guangzhou Fu 廣州府]della Provintia di Quantum
Este "Atlas da China" foi produzido no final o século 16/início do século 17 sendo considerado a mais completa obra sobre a China na época.

domingo, 29 de setembro de 2019

Praia da Areia Preta

O forte de Mong Ha em cima à esquerda e à direita, em baixo a então Praia da Areia Preta
“Um dos sítios outrora mais procurados pelos chineses pela razão da sua beleza era a magnífica praia da Areia Preta. Incrustada numa pequena angra era ali que nas tardes de Verão os habitantes desta cidade concorriam em grande número para se divertirem, quer nadando quer gozando a fresca aragem vinda do mar. Frente à enseada, as escalvadas Nove Ilhas e a Lêng-Têng quebravam a monotonia do extenso horizonte com as suas recortadas silhuetas, disfrutando-se assim da praia um admirável e inspirador cenário.
Enterradas na praia, os recifes e os penhascos, brunidos e exalviçados pela ressaca das vagas, forneciam outra nota de graciosidade ao local já de si tão aprazivelmente encantador.” 
Luís Gonzaga Gomes in Curiosidades de Macau Antiga

sábado, 28 de setembro de 2019

Macao portuguese government (1849)

Em cima a lista dos elementos que faziam parte do Governo de Macau em 1849; uma lista no sentido mais abrangente do termo "governo" já que inclui, por exemplo, para além dos cargos executivos (João Maria Ferreira do Amaral era o governador), o nome do bispo (Jerónimo Pereira de Matta), juiz (J. A. de Moraes Carneiro), procurador (João Damasceno dos Santos), comandante militar (Bernardo de Araújo Roza), capitão dos portos (P. J. da Silva Loureiro), chefe dos correios (D. J. Barradas). Menciona-se ainda que o Boletim do Governo é publicado à quarta-feira.
Em baixo está uma lista dos principais "comerciantes" de Macau onde sobressaem nomes como Jozé Vicente Jorge, Lourenço Marques, John Smith ou George Chinnery, o pintor.
in An Anglo-Chinese Calendar, 1849

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

VIII congresso nacional agências de viagem e turismo: 1982

A propósito do Dia Mundial do Turismo que se celebra neste 27 de Setembro desde 1980, recordo a realização em Macau do VIII Congresso Nacional Agências de Viagem e Turismo em 1982. Um evento imortalizado nesta medalha de bronze.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

Episódio sobre a 'ocupação' japonesa

Entre 1937 e 1945 Macau viveu sob "Os Anos da Guerra". Apesar da neutralidade de Portugal face à Segunda Guerra Mundial, os japoneses instalaram-se no território. Diamantino Correia, antigo militar em Macau uns anos mais tarde, recorda-se de algumas histórias (que lhe contaram) sobre esses anos e pedi-lhe para as recordar. Aqui vai mais uma episódio - dos muitos que ocorreram - sobre a 'ocupação' japonesa em Macau.
"Durante alguns meses fui comensal na casa de um guarda de 1ª classe da PSP, sita na Avenida Coronel Mesquita. Este sr. chamava-se António Rodrigues e tinha como alcunha " O Fantasma". Julgo que foi para aquele território nos anos 30, já que à data em que o conheci tinha 7 filhos e o mais velho (António Rodrigues Jr.), já falecido, teria os seus 18 anos. Preparava-se então para prosseguir os estudos superiores em Portugal, o que aconteceu. Não sei qual a sua formatura. Pois o pai "Fantasma" foi chamado a chefiar uma equipa de agentes solicitada pelo hotel Central, uma vez que, alguns militares japoneses, já bem bebidos, se dedicavam à destruição de bens no salão de dança. Chegado lá, pediu a presença do mais graduado. Houve risos de mofa, já que a autoridade portuguesa era periodicamente posta em causa. Mas o "nosso" homem não se intimidou e através do intérpete, fez-lhe saber que o imperador Hiroito não lhes tinha mandado fazer aquilo. Ouvido que foi o nome do imperador, não só abandonaram o local bem como pagaram todos os estragos. 
P.S. António Rodrigues era alentejano (área de Portalegre) e então fazia serviço para o Dr. Pedro Lobo nas instalações da Vila Verde. Vivia, como disse na Avª Coronel Mesquita, numa excelente vivenda cedida pelo "patrão" Pedro Lobo."
Mais uma vez agradeço ao Diamantino Correia - prestou serviço militar em Macau entre 1951 e 1959 - o seu depoimento. A sua história pode ser vista aqui http://macauantigo.blogspot.com/2010/02/memorias-de-diamantino-correia-81-anos.html

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

Ainda a "Memória sobre Macao" de 1828

José de Aquino Guimarães e Freitas escreveu em 1828, em Coimbra, "Memória sobre Macau". O livro surge referenciado no Bibliographie annamite (Bibliografia anamita), uma bibliografia de livros, artigos de jornais, manuscritos e mapas de ou sobre o Vietname, que remonta à chegada do primeiro sacerdote francês ao país no século XVII. Neste livro publicado em 1867 surgem listados 470 items, incluindo obras em francês, inglês, alemão, português, espanhol e italiano. A bibliografia está organizada em cinco partes. A obra foi compilada por Victor-Amédée Barbié du Bocage (de 1832 a 1890), um arquivista e bibliotecário da Sociedade Geográfica de Paris.
"Memória sobre Macao" é da autoria de José de Aquino Guimarães e Freitas, "natural da Província de Minas Geraes, Coronel de Artilheria, ex-Procurador da mesma Cidade, actualmente Governador da de Coimbra. Coimbra, na Real Imprensa da Universidade. 1828." - capa do livro de 94 páginas.
Inocêncio XII, 240 e IV, 249: “O Sr. A. Marques Pereira ocupou-se deste autor n'uma serie de artigos biobibliográficos publicada no Ta ssi yang kuo, de 1864, e aí leio: «Chegou (o coronel José de Aquino) a Macau pelos anos de 1815, e serviu no batalhão do príncipe regente, sob as ordens do brigadeiro Francisco de Mello da Gama Araujo, que mais tarde foi governador de Diu. Recebida em Macau, em 1822, a noticia do regresso de D. João VI a Portugal, o governador e capitão geral desta cidade, que então era José Osório de Castro Cabral e Albuquerque, nomeou o coronel José de Aquino Guimarães e Freitas para passar a Lisboa com a comissão de felicitar a sua majestade e sua real família pela sua feliz chegada a seu país natal, e ao soberano congresso pela sua instalação e progressivo empenho pelo bem nacional, devendo ao mesmo tempo dar conta da «maneira satisfatória com que se tinha recebido e solenizado em Macau o novo sistema constitucional.»
A esta nomeação se uniu o leal senado, conferindo a José de Aquino os poderes de seu deputado.
Memoria sobre Macau: Coimbra, na Imp. da Universidade 1828. 8.º gr. de 94 pag. Tratando-se desta possessão portuguesa, não devem deixar de comemorar-se aqui os importantes artigos e memorias, que a seu respeito se encontram nos Annaes Maritimos e Coloniaes”.
Parte do índice do livro composto por 31 capítulos
Ilustração de Macau no século XIX (não faz parte do livro referido)
O jornal O Panorama refere este livro numa edição de 1840 (nº 163):
"Demos a pag 38 do l volume noticia da origem e estado do nosso estabelecimento de Macau fundado e consentido por beneplácito dos chins ampliaremos e rectificaremos as que ali exarámos agora que temos á vista dois modernos escriptos portugueses sobre o assumpto: Memória acerca do Macau por José de Guimarães e Freitas e o appendice sobre os estabelecimentos portugueses a leste do Cabo de Boa Esperança escriptas pelo nosso digno sócio o Sr Conselheiro Manuel José Gomes Loureiro; destas obras extrahiremos o mais importante ."

terça-feira, 24 de setembro de 2019

Thomas Cook

A propósito da falência do operador turístico/agência de viagens Thomas Cook, empresa fundada no Reino Unido em 1841, escolhi para este post algumas referências relacionadas com Macau. A empresa tinha escritório em Hong Kong e incluía regularmente Macau como destino turístico nos seus roteiros/folhetos.
Na década de 1910/20 destaco três títulos: "How to See Hong Kong, Canton & Macao"; "A Fall Tour to The Far East" (8 páginas - inclui China e Japão); "Information for Travellers Landing at Hong Kong" (1911). Em todos, e não obstante o título, surgiam referências turísticas a cidades vizinhas como Cantão, Macau, Swatow, Amoy e Foochow.
Numa época em que os governos ainda não davam a devida atenção ao turismo eram as agências turísticas que providenciavam informações aos turistas. Logo no século 19 a Thomas Cook tinha delegações não só em Hong Kong como também em Pequim e Shangai.

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Chan Kai Chon

Dois postais de uma colecção de desenhos de Chan Kai chon editados em 1995 pela DSEJ.

Chan Kai Chon, nasceu na cidade de Zhongshan da província de Guangdong em 1966. Formou-se na Escola Secundária Hou Kong, licenciado em Economia Empresarial pela Universidade de Jinan tendo ainda estudado na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Portugal. 
Terminou o Mestrado em Arte na Faculdade de Belas Artes da Universidade Normal de Nanjing, e o doutoramento em História da Arte na Academia Central de Belas Artes sob a orientação do Professor Jin Wei Nuo. Desde o início da década de 1990, Chan tem praticado esboços em vários países e territórios europeus, americanos e asiáticos, e a sua pesquisa na história da pintura chinesa e macaense. Pinturas e tese de Chan foram publicadas em Macau, China Continental, Hong Kong e Singapura, e publicados vários livros de arte e monografia em Macau, Hong Kong e na China Continental.

A sua passagem por Portugal foi passada para postais numa edição do IPOR em 1994: Recordações de Portugal : Coimbra e outros lugares.

Sugestão de leitura: Macau no traço de Chan Kai Chon / Wai Hang Chan; desenho Chan Kai Chon. Fundação Macau, 1999.

Gruta de Camões: lápis sobre papel. 1999

domingo, 22 de setembro de 2019

Henry Kissinger e a questão de Macau discutida em Pequim

Henry Kissinger receive his honorable degree at University of East Asia 1987
澳門東亞大學 頒受榮譽學位比 基辛格
Kissinger doutor honoris causa pela Univ. Ásia Oriental (Macau) 1987



Henry Alfred Kissinger foi o 56º Secretário de Estado dos Estados Unidos, cargo que ocupou de 1973 a 1977. Foi, também, Assistente do Presidente para os Assuntos de Segurança Nacional de 1969 a 1975. Durante este período foi responsável pela normalização das relações entre Pequim e Washington.
A primeira viagem a Pequim ocorreu em Julho de 1971. Uma célebre visita - secreta à época - que abriria caminho à histórica viagem do Presidente Nixon à China, meses depois.

Já nos EUA e no cargo de secretário de Estado, depois de ter sido antes conselheiro de segurança nacional, Kissinger escreveu um memorando ao Presidente Nixon onde explica o teor das conversas tidas em Pequim. “Mao sugeriu energicamente que não usará a força contra Taiwan, lembrando a serenidade com que trata as questões de Macau e Hong Kong”, escreveu Kissinger no documento actualmente desclassificado e aberto a consulta pública.
Excerto da acta da conversa que Kissinger manteve em Pequim com Mao Zedong e Zhou Enlai, sobre as questões relativas a Taiwan, Hong Kong e Macau:
Kissinger e Zhou Enlai em Julho de 1971
Secretário Kissinger: Do nosso ponto de vista, queremos relações diplomáticas com a República Popular da China. A única dificuldade é que não podemos esfriar as relações com Taiwan imediatamente, por várias razões, todas elas relacionadas com a nossa situação interna. Disse ao Primeiro Ministro (Chou En Lai) que esperamos completar o processo durante 1976. Portanto, a questão é saber se conseguimos encontrar uma fórmula que nos permita ter relações diplomáticas, cuja utilidade seria um reforço simbólico dos nossos laços, porque, de um ponto de vista técnico, o Gabinete de Ligação já funciona de uma forma muito útil.
Presidente Mao: Pode ser.
Secretário Kissinger: O que é que pode ser?
Presidente Mao: Podemos continuar como estamos, porque vocês ainda precisam de Taiwan.
Secretário Kissinger: Não é uma questão de precisarmos; é uma questão de possibilidades práticas.
Presidente Mao: O que é a mesma coisa (risos). Também não temos pressa em relação a Hong Kong (risos). E nem sequer tocamos em Macau. Se quiséssemos tocar em Macau, bastar-nos-ia um toque muito ligeiro. Porque esse é um entreposto estabelecido por Portugal no tempo da Dinastia Ming (risos). O Khrushchev procurou embaraçar-nos, perguntando-nos por que não queríamos Hong Kong e Macau de volta. E eu não apenas disse ao Japão que concordamos com as suas reivindicações sobre as quatro ilhas do norte, como a União Soviética ao longo da história se apropriou de um milhão e meio de quilómetros quadrados da China.
Secretário Kissinger: Tal como vejo o problema das relações diplomáticas, Sr. Presidente, é assim. Na questão de Taiwan, julgo que temos um bom entendimento, que devíamos procurar manter. E o Gabinete de Ligação está a fazer um bom trabalho. Portanto, a única questão está em saber se a uma determinada altura, um de nós, ou ambos, sentirá a necessidade de demonstrar que a nossa relação é normal em todos os aspectos. Nesse caso, devíamos encontrar uma fórmula para o tornar possível, mas não é uma necessidade.
Presidente Mao: Estabelecemos relações diplomáticas com a Índia e com a União Soviética, mas não são muito boas. Não são sequer tão boas como as nossas relações convosco. Por isso, este não é um problema importante. Problema importante é a situação internacional.
Secretário Kissinger: Concordo completamente com o Presidente e acho que esta é uma questão em que devemos estar de acordo, e estamos de facto de acordo (…)”
Entre os inúmeros prémios que Kissinger recebeu contam-se o Prémio Nobel da Paz, em 1973; a Medalha Presidencial da Liberdade (maior condecoração civil dos Estados Unidos), em 1977; e a Medalha da Liberdade (atribuída apenas a 10 líderes norte-americanos nascidos no estrangeiro), em 1986.

sábado, 21 de setembro de 2019

Excellent hostelry


Excerto do livro The Land of the Boxers (1903) do capitão Gordon Casserly que ficou hospedado no hotel Boa Vista.
(...) Seated in a ricksha, pulled and pushed by two coolies up steep streets, I was finally deposited at the door of the Boa Vista Hotel. This excellent hostelry—which the French endeavoured to secure for a naval hospital, and which has since been purchased by the Portuguese Government—was picturesquely situated on a low hill overlooking the town. The ground on one side fell sharply down to thfe sea which lapped the rugged rocks and sandy beach two or three hundred feet below. On the other, from the foot of the hill, a pretty bay with a tree-shaded esplanade—called the Praia Grande —stretched away to a high cape about a mile distant. The bay was bordered by a line of houses, prominent among which was the Governor's Palace.
Behind them the city, built on rising ground, rose in terraces. The buildings were all of the Southern European type, with tiled roofs, Venetian-shuttered windows, and walls painted pink, white, blue, or yellow. Away in the heart of the town the gaunt, shattered fagade of a ruined church stood on a slight eminence. Here and there small hills crowned with the crumbling walls of ancient forts rose up around the city.
Eager for a closer acquaintance with Macao, I drove out that afternoon in a ricksha. I was
whirled first along the Praia Grande, which runs around the curving bay below the hotel. On the right-hand side lay a strongly built sea-wall. On the tree-shaded promenade between it and the roadway groups of the inhabitants of the city were enjoying the cool evening breeze. (...)

sexta-feira, 20 de setembro de 2019

Rua da Felicidade: red-light district

A Rua da Felicidade era a zona de prostituição de Macau. Ladeada por bordéis, pensões, restaurantes, casas de jogo e casinos, casas de ópio, etc. O centro nevrálgico dos prazeres que remete para a expressão inglesa "red light district", bar da zona vermelha, precisamente a cor que na cultura chinesa simboliza a felicidade.
Início do século XX
Rua da Felicidade used to be the former centre of Macau's red light district; the street was lined with brothels and the lower section was full of inns, restaurants, gambling houses and casinos, opium dens, etc. In short, it was a paradise for nocturnal pleasure-seekers... It's suitably named Happiness Street in english.
Início do Século XXI
Vasco Ibanez descreveu assim a rua que visitou em Janeiro de 1924 :

"Esta Rua da Felicidade é pelo seu tráfico semelhante às que existem em todos os portos de mar, mas aqui oferece o interesse de serem unicamente chineses os que a frequentam, impelidos pelo estímulo da lascívia. Compõe-se de casas estreitas, cujo piso baixo é ocupado inteiramente pela porta. Através da sua abertura vê-se uma espécie de vestíbulo com o renque da escada que conduz às habitações superiores, e alguns assentos chineses, ocupados pelas donas e suas amigas. São mulheres de cabeça volumosa, membros delgados e tronco grosso, com um nariz tão achatado que apenas se torna visível quando mostram de perfil o seu largo rosto, amarelo como a cera. Estas fêmeas maduras, retiradas das pelejas sexuais, fumam grossos cigarros enquanto conversam lentamente. Outras penteiam-se entre elas à luz duma lâmpada colocada diante dos seus ídolos predilectos.
As pensionistas das ditas casas jogam no meio da rua como um colégio em férias. É, na verdade, a função que lhes corresponde, jogar pelos seus poucos anos. Todas elas são chinitas apenas entradas na puberdade. Perseguem-se como gatas travessas, soltando gritinhos de regozijo. Algumas acercam-se de nós depois de colocar uma máscara de aspecto monstruoso, uma máscara espantosa de dragão ou de génio, como unicamente sabem imaginar os artistas chineses e as pobrezinhas rugem para nos infundir pavor, rindo após a sua travessura.
Fixamo-nos nos diversos altares das casas. Todos eles ostentam num painel imagens de papel, doiradas e multicores: deuses ou deusas das Águas, do Vento, da Felicidade, etc. Nalgumas dessas vivendas as hóspedes não têm dinheiro para adquirir divindades protectoras, mas nem por isso carecem de altar. Colocaram na parede, sob dosseis de cores, um anúncio da Companhia Transatlântica Japonesa, com um vapor de quatro chaminés e um mar de grandes ondas, e acendem-lhe todas as noites uma lâmpada, tal qual como nas casas vizinhas. Tais improvisações não espantam nenhum chinês.
Tornamos a atravessar a grande rua de Macau, que reveste nas primeiras horas da noite um aspecto de capital de província. Passeiam pelos seus passeios numerosos sacerdotes e oficiais vestidos à paisana; jovens duma elegância marcial, com grande chapéu de feltro à mosqueteiro e casaco branco."

quinta-feira, 19 de setembro de 2019

A Ginjinha "medalha de ouro"


"A Ginjinha" fica no nº8 do Largo de S. Domingos. Foi aberta ao público por um galego em 1840 e desde então a pergunta que mais se ouve no estabelecimento é: "Com ou sem Elas?" A ginjinha, claro, feits tendo por base a receita de um monge: ginjas fermentadas dentro de aguardente, juntamente com açúcar, água e canela.

Logo no balcão pode ver-se a referência a Macau: "(...) premiada com a Medalha de Ouro nas Exposições Internacionais do Rio de Janeiro de 1923 e Macau de 1926", no âmbito da primeira edição da Feira Industrial.

quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Envelope: 1978

Carta enviada para a Noruega por correio aéreo. O envelope está praticamente todo preenchido por selos de baixo valor (avos: num total de ca. 4 patacas) e um selo de uma pataca.

terça-feira, 17 de setembro de 2019

Regulamento da Emigração Chineza

Entre 1851 e 1874 - período em que decorreu o tráfico de cules chineses em Macau - 210.054 cules chineses emigraram através de Macau para vários destinos, como Cuba (a maioria), Peru, Guiana Britânica, Suriname, Costa Rica, Ásia do Sudeste, Moçambique, Califórnia e Austrália.
O último Regulamento do Governo de Macau sobre Cules foi promulgado a 28 de Maio de 1872. Chamou-se Regulamento da Emigração Chineza e como novidade estabelecia a liberdade de emigrar e de ser repatriado no caso de mudar de intenções. Trata-se de um regulamento extenso com um total de 83 artigos.

 Excerto de Regulamento da Emigração Chineza
Tabela dos custos dos mantimentos (preço/dia) e distância em dias dos portos de destino

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

Cruz da Esperança



Ainda hoje se pode ver junto no adro da Igreja de S. Lázaro uma pedra gravada no cruzeiro de granito com a inscrição "Cruz da Esperança Ano 1637". A explicação é simples. O primeiro edifício erguido no local foi a Ermida de Nossa Senhora de Esperança.
Aspecto actual da igreja com o cruzeiro do lado direito
Igreja de S. Lázaro (e o cruzeiro) por George Chinnery (1832)

domingo, 15 de setembro de 2019

A festa do bate-pau ou das lanternas

Celebra-se por estes dias em Macau uma festividade conhecida por vários nomes: desde Chong Chao, Festa da Lua, Festa das Lanternas e Bate Pau. 
Já aqui abordei o tema por diversas vezes. Desta feita recorro a um texto do século XIX.

A lua correspondente ao mez de setembro é consagrada pelos chins à festa do bate-pau ou das lanternas a que eles chamam Chung – chau e os inglezes Mid Autumn festival, por coincidir com a quadra outomnal.
Dá-se o nome de bate-pau a um bolo que os chins preparam n´esta ocasião, que é arredondado e parecido com um pastelinho com crosta de farinha, recheado de doces. Há varias espécies de bolos de bate-pau: uns que que só entra feijão; outros o mungo; outros a semente de trate; e outros o gergelim, amêndoa e toucinho.
Só durante esta lua ou pouco antes é que os chins preparam estes bolos para venda e exportação.
Tambem por este tempo os chins vendem caramelos em forma de castello, embarcação, jarro, etc.; pães de farinha figurando um porco de tamanho de trez e quatro polegadas, metido n'um cesto de bambú de feitio conico; bolos de massa de farinha muito dura coma configuração de um prato com pintura a côres, representando paisagens e figuras humanas, postos n´uma caixinha de papelão de forma circular, polygonal ou oblonga, segundo o feitio do bolo, com uma rede muito fina e transparente de cassa. Este bolo só é feito para ornato e presente às creanças.
O bolo de bate-pau é o symbolo da lua, e os chins chamam-no em dialecto mandarim Yué-ping 月餅 e em cantonense Yut-peang. Geralmente o seu peso nao atinge meia libra.
Os macaístas conhecem-n´o pelo nome de bate-pau, por ser preparado com um pau em forma de ferula, com um orifício no centro onde se mettem a massa de farinha e os recheios, carregando com a palma da mão para comprimilo bem; e em seguida batem o pau com força, por duas ou tres vezes sobre a meza, para fazer expellir o bolo que é levado acto contínuo ao forno, a assar.
in Ta-Ssi-Yang-Kuo, Archivos e annaes do Extremo-Oriente Português. 1899-1900 de João Feliciano Marques Pereira.

sábado, 14 de setembro de 2019

A Visit to Old Macao, Where East Meets West (1964)

Edição do The New York Times de 6 Dezembro 1964 com um artigo dedicado a Macau intitulado "A Visit To Old Macau, Where East Meets West" / "Visita a Macau Antigo, onde o Oriente se encontra como Ocidente". O artigo faz um bom resumo do que era o território no início da década de 1960 e é ilustrado com duas fotos: uma da Rua de S. Paulo vendo-se ao fundo a fachada da igreja Mater Dei (Ruínas de S. Paulo) e outra da zona da Penha com destaque para o Palácio de Santa Sancha.

Macao - Just 15 minutes by air from Hong Kong, perched on the edge of Red China is Macao, the oldest European settlement in the Far East. For historians, its very name conjures up vivid pictures of opium smugglers, South China Sea pirates, gamblers and viceridden dens of iniquity. Today, although it calls itself “The Monte Carlo of the Orient,” Macao is a peaceful, rather sleepy little city with a charming Old World atmosphere and a fascinating past.No international airlines or worldwide shipping services call at Macao. The Portuguese colony must be approached through Hong Kong, where most tourists get so involved in shopping that there is little time for sightseeing, But Macao has a great deal to offer those who can tear themselves away.
Macao Bargains
Some of the bargains one sees in Hong Kong, like lacquered chests, carved furniture and old wood carvings, are available in Macao at a cheaper price. Many Hong Kong merchants buy goods and “antiques” from dealers in Macao. The methods of reaching Macao from Hong Kong are varied. Those in a hurry can make the trip by seaplane in 15 minutes or skim across the South China Sea in a new hydrofoil in 75 minutes.
The leisurely traveler can board one of three ferryboats, and relax for three hours over dinner and drinks. Cabins are provided for anyone wishing to catch a few winks. However, most of the passengers spend the time on deck, enjoying the changing scenery as the ferry sails out of Hong Kong Harbor and past ocean liners, freighters and water tankers. Also on view are the countless sampans and houseboats that are home to the floating population of Tanka and Haklo fishermen. They eat, sleep, cook, get married, give birth and die aboard their boats. As the ferryboat traverses a labyrinth of picturesque islands, fleets of bat‐winged junks, with their patched, multicolored sails, dip and pitch on the changing waters.
Approaching the Pearl River estuary, the exotic skyline of Macao emerges. It is a skyline of two cities - old and new Macao, East and West - for East and West have lived here together for more than 400 years.
Established in 1557
The colony was formally established in 1557, when the Emperor of China issued a decree -granting Portugal the right to form a community in Macao and to establish trade through the Emperor's viceroy in Canton. The Portuguese, in turn, agreed to help fight the ferocious pirates terrorizing the South Sea coast with armed junks. On arrival, one's first impression is the striking change of pace from the urgency of Hong Kong. Macao's main thoroughfare, the banyan‐fringed Praya Grande, stretches lazily along the waterfront. The tempo of the city is about the same speed as the pedieabs that wheel leisurely along the Praya Grande, between the brightly painted, Mediterranean‐style villas and courtyards. Lofty old churches grace the hilltops. At dawn and dusk, the city echoes with the pealing of church bells, while across the bay, in clear view, is Communist China.
Many Refugees
The population of more than 250,000 is swollen by the legal and illegal refugees who pour in from the Chinese mainland. The legal are the old and the ill—”useless mouths” that are encouraged by the Communists to leave China. They are allowed to come through the Barrier Gate at the border. The illegal refugees come by night. Some swim the wide West River, which separates Macao from China; others make a desperate dash across narrow Duck Channel, dodging Communist bullets fired from the pillboxes that guard the frontier stream; others run the Communist gunboat gantlet in sampans or anything that will float.
More than 800 such refugees come to Macao each month. Centers for them have been set up, and none is turned away.
Accent oa Atmosphere
Hotels in Macao are not luxurious. They are comfortable with an appealing atmosphere, and are reasonably priced. The food, both Chinese and European, can be good. Some of the specialties of Macao are sole, pigeons, crab and succulent rice birds. Delicate Portuguese wines are cheap and plentiful.
Gambling Popular
Gambling is still one of. the biggest attractions of Macao. On weekends the hotels are bursting with people from Hong Kong, many of whom seek to make the “killing” that lurks just beyond the next turn of a roulette wheel or the flip of a card. The gambling houses are crowded by noon, and the wheels spin until the late hours. There are many ways to win or lose a pataca - worth about 21 cents - but fan‐tan seems to be the fastest and most popular. It is also the simplest It consists of putting a cup over a pile of buttons and betting on how many, from one to four, will remain when they are counted off by fours. Greyhound racing also is popular with the Chinese, especially the ex‐Shanghai Chinese from Hong Kong. The most bizarre type of gambling in Macao is the old Chinese sport of cricket fighting. The matches are controlled by a syndicate called “The Voice of Autumn Club”. The strongest and most ferocious crickets seem to come from an old cemetery, where they are trapped at night in the crumbling graves. If the cricket survives the season he is returned to the cemetery to breed more champions.
Investment Program
The bulk of money from the gambling franchise is being reinvested in Macao through a 20 million development program. Eventually, this will produce a new air‐conditioned hotel on an artificial lake, a large glittering casino and new shops. Macao is full of interesting places for the sightseer. Tours with English speaking guides are organized by the various hotels. As the area within the city limits is only two square miles, it does not take more than a couple of hours to get a general idea of Macao. One should spend another hour going down the small streets in a pedicab. Some of the pedicab boys speak english, and will give one all sorts of inside information.
But the real way to see Macao is to walk. Many of the narrow, cobblestone streets are too rough for pedicabs and too narrow for cars. And many of them end in steep stairways leading to green terraces and tree‐lined paths. For an over‐all view of the maze of streets, villas, terraces, courtyards and slums that make up the city, one should climb one of the Seven Hills up to the century old Guia Lighthouse. Or, he should go to the picturesque Monte Fort, with its cannon protruding from the ancient imposing ramparts.
On many perilous occasions in the past, these cannon have protected the little settlement. In 1622, a lucky gunner achieved what might be called a “hole‐in one” for a cannonball landed in a barrel of the enemy's gun powder. The resulting explosion caused so much damage and confusion that the attacking Dutch soldiers were forced to retreat. The Cantonese, on hearing of the incident, were so amused that they sent gifts to the Monte Fort garrison.
Free Port
Over the years Macao has survived wars, revolutions and natural catastrophies. It is a free port, and exists on fishing, gambling, the mysterious gold traffic, tourism and small industries, like the manufacture of firecrackers, matches and incense. Including two small islands, Taipa and Colowan, and the area that lies within the city limits, Macao covers only six square miles. The population is approximately 235,000 Chinese, 1,080 Portuguese and 20,000 native Macanese.”

sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Relazione della preziosa morte dell'eminentiss... Carlo Tomaso


Relazione della preziosa morte dell'eminentiss e reverendiss Carlo Tomaso Maillard di Tournon. Commissario, e Visitatore Apostolico Generale, con le facoltà di Legato a latere nell'Impero della Cina, e Regni dell'Indie Orientali, seguita nella Città di Macao li 8 del mese di giugno dell'anno 1710. E di ciae, che gli avenne negli ultimi cinque mesi della sua vita. Roma, per Francesco Gonzaga, 1711.
First edition (1711) of a biographical study comprising three works of cardinal Maillard de Tournon who was the first papal legate sent to the Imperial court of China, on behalf of the Pope Clement XI.
He was born in Turin in 1668 of a noble family of Savoy. Tournon and his party sailed by way of Pondicherry, Manila and Canton, arriving at Beijing in December 1705. At first Emperor Kangxi received him kindly, but upon realising that he had come to abolish the Chinese rites among the native Christians he had Tournon imprisoned at Macau where he later died, shortly after being informed that he had been created cardinal on August 1, 1707. 
Maillard de Tournon's mission is considered one of the crucial turning points in the modern history of the Chinese church.

Na imagem a capa da primeira edição (1711) de um estudo biográfico composto por três obras do cardeal Maillard de Tournon, que foi o primeiro legado papal enviado à corte imperial da China, em nome do Papa Clemente XI. 
Maillard nasceu em Turim em 1668 de uma família nobre de Savoy. Na viagem passou por Manila e Cantão chegando a Pequim em Dezembro de 1705. Inicialmente, o imperador Kangxi recebeu-o mas ao perceber que ele havia abolido os ritos chineses entre os cristãos nativos, acabou por expulsá-lo da China.
No dia 25 de Janeiro de 1707, Tournon  - nomeado cardeal neste ano - emitiu um decreto em Nanquim que obrigava os missionários, sob pena de excomunhão latae sententiae, de proibir os ritos chineses.
Tournon chegou a Macau em meados de 1707 e entrou em conflito com o bispo de Macau, D. João de Casal, que foi ordenado pelas autoridades portuguesas para não obedecer nem autorizar qualquer acto jurisdicional por parte de Tournon, cuja estadia em Macau não estava autorizada pelo Padroado. D. João de Casal chegou mesmo a proibir o clero local de obedecer a Tournon, mas tanto os agostinhos como os dominicanos decidiram apoiar Tournon, gerando um clima de instabilidade em Macau. Tournon acabaria aprisionado ou pelo menos vigiado com liberdade condicionada por vontade de Kangxi e acabou por morrer em Macau no dia 8 de Junho de 1710.
A missão de Maillard de Tournon é considerada um dos pontos de viragem cruciais na história moderna da igreja católica na China. Recorde-se que o imperador Kangxi assinou em 1692 o Édito da Tolerância (1692) que concedia a liberdade religiosa.
A controvérsia dos ritos na China foi uma longa disputa no seio da Igreja Católica sobre a decisão a tomar quanto aos ritos chineses constituírem ou não formas de idolatria ou superstição. Este conflito, que opôs os jesuítas - que defendiam a continuação da prática dos ritos pelos católicos chineses - e as outras ordens religiosas, entre os quais os dominicanos - que alegavam que os ritos eram incompatíveis com o catolicismo -, começou na década de 1630 e só terminou no século XVIII, quando o Papa Clemente XI, em 1715*, e o Papa Bento XIV, em 1742, decidiram contra os jesuítas, o que reduziu drasticamente a actividade missionária católica na China. 
Só em 1939 o Papa Pio XII viria a revogar parcialmente a decisão dos seus predecessores e em 1943 o governo da República da China estabeleceu relações diplomáticas com o Vaticano. Após a Segunda Guerra Mundial já cerca de quatro milhões de chineses eram católicos. 

*A 19 de Março de 1715, o Papa Clemente XI, um apoiante de Tournon, emitiu a bula papal "Ex illa die", que condenava os ritos chineses:
I. O
Ocidente chama Deus o Criador do Céu, da Terra e de todas as coisas do universo. Como a palavra Deus não soa bem na língua chinesa, os ocidentais na China e os convertidos chineses ao catolicismo usaram o termo "Senhor Celestial" (Tianzhu) por muitos anos. A partir de agora, termos como "Céu" e "Shangdi" não devem ser utilizados: Deus deve ser tratado como o Senhor do Céu, da Terra e de todas as coisas do universo. A tabuleta que tem as palavras chinesas "Reverência para o Céu" não deve ser permitida de ser pendurada dentro de uma igreja católica e deve ser imediatamente tirada, se já está lá.
II. O culto de
Confúcio na Primavera e no Outono, juntamente com o culto dos antepassados
, não é permitido entre os convertidos católicos. Não é permitido mesmo que os convertidos apareçam no ritual como espectadores, porque ao ser um espectador nesse ritual é tão pagão como participar activamente nele.
III. Os funcionários públicos chineses e os candidatos aprovados nos
exames metropolitanos, provinciais ou prefeiturais, caso tenham sido convertidos ao catolicismo romano, não são permitidos de cultuar nos templos confucianos no primeiro dia e no décimo-quinto dia de cada mês. A mesma proibição se aplica a todos os católicos chineses, que, como funcionários públicos, chegaram recentemente em seus postos, ou que, como estudantes, foram recentemente aprovados nos exames
metropolitanos, provinciais ou prefeiturais.
IV. Não há católicos chineses que estão autorizados a
cultuar os antepassados
nos seus templos familiares.
V. Seja em casa, no
cemitério, ou durante um funeral, um católico chinês não tem permissão para realizar o ritual do culto dos antepassados. Ele não está autorizado a fazê-lo mesmo se ele estivesse acompanhado por não-cristãos. Esse é um ritual pagão
, independentemente das circunstâncias.
Apesar das decisões supra-mencionadas, clarifico que os outros costumes e tradições chinesas que não podem, de forma alguma, ser interpretados como pagãos devem ser permitidos de continuar entre os convertidos chineses. A forma como os chineses administram os seus lares ou governam o seu país não deve ser de modo algum interferido. Quanto exactamente aos costumes que devem ou não ser autorizados a continuar, o
legado papal na China vai tomar as decisões necessárias. Na ausência do legado papal, a responsabilidade de tomar tais decisões caberá ao chefe da missão da China e do Bispo da China. Em suma, costumes e tradições que não são contraditórios ao catolicismo romano serão permitidos, enquanto que aqueles que são claramente contraditórios a ele não serão tolerados sob nenhuma circunstância."
Na resposta o imperador Kangxi emitiu um decreto imperial em 1717 que determinava a proibição da prática do cristianismo na China e a expulsão de todos os missionários. Porém, este decreto não foi posto imediatamente em execução.
O novo legado papal, monsenhor Mezzabarba, que foi enviado à China para notificar oficialmente o Imperador sobre a bula Ex illa die só chegou a Macau no dia 26 de Setembro de 1720. No encontro em Pequim com o Imperador não se chegou a acordo e o Imperador decidiu em 1721 proibir de vez a difusão do cristianismo e a actividade evangelizadora dos missionários europeus na China:
"Após a leitura deste Decreto, apenas posso dizer que os europeus são de acanhada inteligência. Como é que podem eles falar dos princípios morais da China quando nada sabem dos costumes, livros ou língua Chinesa que os poderiam habilitar a entendê-los? Muito daquilo que dizem e discutem faz rir uma pessoa. Hoje vi o legado pontifício e o decreto. Ele é realmente como um bonzo budista ou taoista ignorante, ao passo que as superstições mencionadas são de religiões sem importância. Este modo de falar à toa não podia ser pior. Para o futuro não é permitido aos europeus pregar na China. Deve-lhes ser isto proibido para evitar desordens."

Face à oposição imperial, monsenhor Mezzabarba abandonou Pequim e regressou a Macau. Ali, em Novembro de 1721, publicou várias instruções que obrigavam os missionários a acatar as ordens da Santa Sé, que proibia a prática dos ritos chineses. Mas, "a fim de aliviar a consciência dos cristãos chineses que, perante a exigência de centenários costumes, se debatiam entre sérios escrúpulos, Mezzabarba explanou em oito concessões ou faculdades, o caminho a seguir". Ao abandonar Macau, levou consigo os restos mortais do Cardeal Charles de Tournon.

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Empresa Cinematográfica Macaense

A 8 de Fevereiro de 1924 Lucrécia Maria Borges, Gerente da Empresa Cinematográfica Macaense (ECM), solicita ao governo para lhe ser concedido "o exclusivo da exploração da indústria cinematográfica nesta colónia”.
O pedido acabaria por ser aceite e pelo “exclusivo dessa exploração no território da Colónia pelo prazo de dez anos” a ECM ficou encarregue de realizar documentários sobre Macau, “onde serão apanhados todos os assuntos mais notáveis da vida da colónia”. 
Era uma pedra no charco mas não era a primeira vez que viriam a ser feitos filmes em Macau. Já em 1922 o Cinematógrafo Macau exibira “uma fita sobre Macau, destinada à Exposição do Rio de Janeiro” (...) “inteiramente feita por um amador, Sr. Antunes Amor.”
Ainda assim, dois anos depois de ser criada, a ECM viria a ter oportunidade de exibir os seus filmes. Foi em 1926 durante a primeira Feira e Exposição Industrial do território onde a ECM também rodou um filme em jeito de reportagem. Para que a rodagem decorresse da melhor forma, a ECM convidou o público a aparecer no recinto no dia 11 de Dezembro, penúltimo dia do certame, pelas 15 horas, “para que o filme possa ficar o mais movimentado possível”.
Esse filme seria visto apenas anos depois. Mas no evento seriam exibidos inúmeros filmes. Segundo o jornal A Pátria a 11 de Dezembro foi projectado - pela segunda vez no território - o filme "Os Fidalgos da Casa Mourisca", do romance de Júlio Dinis.
No dia seguinte, o último do evento, foram exibidos outros filmes numa sessão dedicada ao Governador Tamagnini Barbosa e ao Almirante Hugo de Lacerda.
O Almirante Hugo de Lacerda Castel-Branco foi Governador interino de Macau de 29 de Julho de 1926 até à chegada de Artur Tamagnini de Sousa Barbosa, o que ocorreu somente a 8 Dezembro. Por isso a exposição foi prolongada até à meia-noite de domingo dia 12. Proveniente de Hong Kong o novo governador desembarcou com a mulher e os cinco filhos no cais provisório do novo porto exterior, sendo recebido pelas autoridades civis, militares e eclesiásticas da cidade. Seguiu-se uma visita às obras do novo porto e só depois aconteceu a tomada de posse no salão nobre do Leal Senado onde foi feita a “simbólica entrega da chave de ouro por parte do Presidente da Câmara” Damião Rodrigues. Depois, seguiu para o Palácio do Governo. À noite deu-se a visita ao certame.
Ali a ECM teve oportunidade de mostrar as suas produções.
Entre os títulos apresentados estava “O Vôo Audaz das Águias Portuguesas”, sobre a chegada a Macau dos aviadores, Major Brito Pais, Capitão-tenente Sarmento Beires e o mecânico Alferes Manuel Gouveia. Partiram de Vila Nova de Mil Fontes no dia 7 de Abril de 1924 e depois de uma viagem atribulada chegaram a Macau a 25 de Junho (um dia depois do dia do território), onde foram recebidos em grande festa pela população.
O segundo filme intitulava-se “Os Funerais de um Capitalista” e o terceiro, “Comemoração do Quarto Centenário de Vasco da Gama”, uma reportagem que inclui o desfile de um cortejo na Praia Grande, na Avenida de Vasco da Gama, junto do busto do navegador, com homenagens da Colónia, das comunidades holandesa e chinesa e dos portugueses de Hong Kong, no Leal Senado, uma missa campal e vários aspectos da iluminação na cidade e no porto.
O quarto filme era sobre “O Casamento de Mr. & Mrs. Francis Young Po Nam” e o quinto, uma produção recente, “O Voo Madrid-Manila” filmado em Maio de 1926, aquando da passagem por Macau dos aviadores espanhóis Capitão Gallarza e Loriga. 

O sexto filme da ECM a ser exibido foi “O Concílio Episcopal em Xangai”. O sétimo seria o documentário de propaganda sobre “As Obras do Porto de Macau”, uma reportagem sobre da cerimónia da dragagem do último metro cúbico de lodo do canal de acesso do novo Porto da Rada, ocorrida a 26 de Agosto de 1926 no Porto Exterior.
Vários selos da emissão ‘Ceres’ com sobrecarga local (Exposição/Industrial/1926)

Nota: No início do século XX existiam várias salas de cinema no território mas poucos exibiam filmes portugueses. O teatro D. Pedro V era um deles. Em Fevereiro de 1926, por exemplo, foram exibidos os filmes mudos portugueses “O Soldado desconhecido” e “A Rosa do Adro”.

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Diccionario geographico das provincias e possessões portuguezas no Ultramar

"Diccionario geographico das provincias e possessões portuguezas no Ultramar em que se descrevem as ilhas e pontos continentaes que actualmente possue a corôa portugueza e se dão muitas outras notícias dos habitantes, sua historia, costumes, religião e commercio” é o longo título de uma obra publicada em Lisboa pela Typographia Lisbonense no ano de 1850.
O autor foi Joze Maria de Sousa Monteiro (1810-1881), "Cavalleiro da Ordem de Nossa Senhora da Conceição, e Secretário Geral Honorário da Provéncia de Cabo-Verde, etc, etc". Ao todo a obra tem 550 páginas. Macau surge na página 343 e tem duas 'entradas': uma com informação genérica sobre as origens do território e a história até meados do século 19; outra 'entrada', mais sucinta, é sobre a "Província de Macau".
(Clicar nas imagens para ver em tamanho maior)