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terça-feira, 30 de junho de 2020

"Viaje de la China" do padre Adriano de las Cortes

Adriano de las Cortes, foi um jesuíta espanhol (1578-1629) que chegou às Filipinas em 1605 tendo a partir de então desempenhando várias funções missionárias no arquipélago que estava a ser  ocupado por Espanha. 
A 25 de Janeiro de 1625 largou de Manila a bordo da Nuestra Señora de Guia com destino a Macau onde iria resolver questões de âmbito económico. A viagem seria interrompida por uma violenta tempestade que provocou o naufrágio da nau espanhola ao largo da província de Guangdong. Entre os sobreviventes estava o padre jesuíta. Seriam aprisionados pelas autoridades chinesas durante um ano e 4 meses até serem libertados a 21 de Fevereiro de 1626. Seguiram para Macau e cerca de dois meses mais tarde embarcaram rumo a Manila onde chegaram a 20 de Maio. Cortes morreu 3 anos mais tarde, a 6 de Maio de 1629, em Manila.
Durante a estadia na China conseguiu redigir um manuscrito de 174 folhas (frente e verso) onde fez um relato do sucedido bem como uma descrição pormenorizada de como era o Celeste Império no início do século 17, incluindo dezenas de ilustrações (desenhos) feitos pelo padre Cortes
O manuscrito está divido em duas partes: Primera parte de la Relación que escribe el P. Adriano de las Cortes de la Compañía de Jesús del viaje, naufragio y cautiverio que con otras personas padeció en Chauceo, Reino de la Gran China con lo demás que vio en lo que de ella anduvo e Segunda parte de la relación, en la cual se ponen en pinturas y en plantas las cosas más notables que se han dicho en la primera parte, citándose a los capítulos de ella y añadiendo algunos nuevos puntos y declaraciones sobre cada una de las pinturas.
Na época a obra foi de circulação restrita e durante séculos permaneceu nos arquivos espanhóis até à publicação de uma edição comentada em 1991 com o título "Viaje de la China" de Beatriz Moncó Rebollo. Em 2001 surgiu uma edição em francês.
Curiosidade: "Macan" é como o padre Cortes se refere a Macau.
Excertos:
Aos vinte e três do mês de Junho [de 1625], foi Nosso Senhor servido de nos consolar com segundas novas e cartas, depois da de cinco de Março, a que já acima fizemos referência, sendo esta recebi-da em três de Maio, escritas em Cantão, e a seis do mesmo mês de Junho. Entre elas vinham duas para mim, do padre procurador do Japão, o padre João Rodrigues, e do padre procurador da China, Simão da Cunha, membros da Companhia (de Jesus), os quais nos enviavam, a mim e ao padre Miguel Matsuda, pelos chineses portadores (das referidas cartas), algum vestuário, para socorrer a necessidade que neste particular aspecto sofríamos, e também 20 pesos para outras necessidades, e para repartir pelos demais, juntamente com uma esmola de 14 pesos, recolhida entre alguns dos mercadores portugueses que estavam na cidade de Cantão. Ainda que o dinheiro destes socorros, um e outro, fosse pouco, tanto pelo risco em enviá-lo, como por se esperar que muito em breve se alcançaria licença do tutão para nos libertarem com tudo o que fosse necessário para o caminho, os chineses que o traziam apropriaram-se da metade, ou mesmo mais, com mentiras e embustes, como se lhes importasse mais esta paga do que o bem que mais tarde lhes poderíamos fazer.
É curioso como não conseguem soltar da mão a prata que recebem por qualquer meio, ficando to-dos os chineses verdadeiramente ofuscados com a vista da mesma, de uma forma que não se encontra em nenhuma outra nação. A um dos nossos portugueses, perguntou um dos mandarins se era verdade que nos haviam trazido prata de Macau, porque os soldados que nos dão de comer tinham dito aos mandarins de Chauchiufu que nô-la tinham trazido; e caso a tivéssemos, deveria-mos comer dela e avisá-los, para que deixassem de nos sustentar. Respondeu-lhe o nosso português que sim, (prata), mas que era pouca para tantos, pois o portador chinês tinha ficado com grande parte dela. Retorquiu o mandarim: "Até me espanta terem-vos dado alguma (refere-se a prata), pois entre nós dificilmente conseguimos recuperar a prata que tivermos de passar para as mãos de outro chinês, ainda que tenha de fugir e de desaparecer para sempre; e isto ainda que seja de filho para pai. Pois se este vos deu alguma, não deveria ser senão chinês cristão de Macau".
Avisaram-me (seria de Macau) que tinham recebido algumas cartas, minhas e de outros dos meus companheiros, depois de terem sido levantadas as barreiras que havia pelos caminhos, que serviam a outros intentos do tutão e para negócios que com certos mercadores chincheus tinha, mas que também impediam a passagem das nossas cartas para Macau e de Macau para nós.
Soube-se também, com algum pesar, que a sobredita (envio e recebimento de cartas) tinha sido impedida por a cidade de Macau ter estado cercada por mar e por terra, para que nela não entrassem mantimentos, e muito apertada pelo tutão e pelos seus chineses. As coisas tinham-se finalmente acalmado, estabelecendo-se de novo um clima de paz e de harmonia com os chineses, depois da cidade ter derrubado o lanço de muro que caía para a parte da terra, cumprindo assim ordens do rei da China, que havia recebido acusações antigas, e muito falsas, contra a cidade de Macau. Sucedeu isto na mesma altura da nossa perdição, quando dela se veio a saber em Cantão e em Macau.
Em seguida, o acima citado padre João Rodrigues e uns fidalgos cidadãos da cidade de Macau estavam em Cantão, de caminho para a cidade de Chao-ching, chamados pelo tutão para assinarem as pazes e saudarem o dito tutão em nome de Sua Majestade e da cidade de Macau. Pretendiam ainda obter dele uma chapa, que logo nos enviariam, com autorização para que fôssemos libertados do reino de Chauchiufu e levados a Cantão.
Transporte do Mandarim - imagem da edição espanhola de 1991

Sugestões de leitura: 
- Historia de la Provincia de Philipinas de la Compañia de Jesus, Segunda parte (1616-1716), de Pedro Murillo Velarde, 1749.
- Voyage en Chine du père Adriano de las Cortes s.j. (1625), Traducteur: Pascale Girard , Juliette Monbeig, 2001

segunda-feira, 29 de junho de 2020

Travessa do Armazém Velho


Conhecida em chinês por Lán Kuai Lau (Hong) -爛鬼樓巷 - a Travessa do Armazém Velho fica entre a Rua da Tercena e a Travessa do Pagode. Tem pouco mais de 4 metros de extensão e é muito provavelmente a placa toponímica com o maior número de caracteres chineses do território.
Segundo Luís Gonzaga Gomes a designação em chinês significa “ruínas da casa em estilo estrangeiro”, numa referência a um edifício de dois pisos que ali existiu em que foi destruído no incêndio que destruiu o colégio de S. Paulo a 26 de Janeiro de 1835.
Nota: Também existiu na toponímia local o Beco do Armazém Velho.

domingo, 28 de junho de 2020

A colecção de postais de Adolf Feller

Adolf Feller (1879-1931), conhecido empresário suíço, iniciou uma colecção de postais em 1899. Ao saberem do hobby, amigos e familiares passaram a enviar-lhe alguns. Após a morte de Adolf, a filha Elizabeth (1910-1973) continuou a colecção que reúne um total de 54 mil exemplares de 140 países, sobretudo do período entre 1894 e 1970. 
Actualmente a colecção faz parte do Arquivo de Imagens da Escola Politécnica Federal de Zurique (ETH Zurich). Entre os postais de Macau nesta colecção estão os que publico neste post.



sábado, 27 de junho de 2020

Postal "The Fountain" Avenida Vasco da Gama Macao

Ainda a propósito da derrota dos holandeses na tentativa de invasão de Macau em 1622, recordo este postal ilustrado publicado cerca de 1900. Nele pode ver-se o Monumento da Vitória e uma fonte - que mais tarde foi transferida para o Jardim da Flora - na então denominada Avenida Vasco da Gama (inaugurada em 1898 nas celebrações do Quarto Centenário do Descobrimento do Caminho Marítimo para a Índia por Vasco da Gama)
O monumento está actualmente no Jardim denominado Vitória. É do final do século 19 mas antes houve um outro conhecido como "Monumento de S. João", alusão à data de 24 de Junho.
"The Fountain", Avenida Vasco da Gama Macao
Sold by Graça & Co, Hong Kong, China

sexta-feira, 26 de junho de 2020

Macau em 1978 por Keith Macgregor




Keith Macgregor has been photographing Hong Kong for nearly 50 years. He comes from a family with long term connections to Hong Kong and China, his great grandfather having arrived in Shanghai in the late 1850s where set up Caldbeck Macgregor Ltd, a wine & spirits importing business which eventually opened offices all over Asia, China & Hong Kong (1884). Keith was educated in England from 1954, finishing up at Oxford University in 1964. In 1970 he returned to Hong Kong to set up as a portrait and later a commercial photographer which led to the creation of his publishing business, Cameraman Limited. 
The books, calendars and postcards published were very successful. “An Eye on Hong Kong”, first published in 1997, sold out 6 editions. His 2nd book: “Neon City, Hong Kong, at Night ” also sold out and became a collector’s item. A "50th Anniversary of photographing Hong Kong” edition is in the pipeline, as well as a book of his Panoramic images. Despite having lived in London for the past 26 years he returns frequently to take photographs of Hong Kong's ever changing landscape.
Note: Info from Keith's website; this photos were taken in 1978.

quinta-feira, 25 de junho de 2020

quarta-feira, 24 de junho de 2020

A última bandeira da porta do Cerco

Esta foi a última bandeira de portugal a ser hasteada na Porto do Cerco, fronteira terrestre com a China, em Dezembro de 1999. 

Dimensões: 128 cm x 204 cm. Faz parte do espólio do Museu de Macau. 
Seria substituída pela bandeira da República Popular da China e pela bandeira da RAEM. 

terça-feira, 23 de junho de 2020

A Derrota dos Holandeses em Macau no ano de 1622

A Derrota dos Holandeses em Macau no ano de 1622. Subsídios inéditos, pontos contorversos, informações novas. 
Livro de 43 páginas da autoria de C. R. Boxer, publicado em Macau pela Escola Tipográfica de Orfanato em 1938.
A versão holandesa dos acontecimentos confirma a versão portuguesa e é contada pelo padre Manuel Teixeira...
"O mar chegava até ao sopé da Colina da Guia, formando uma baía, chamada a Praia de Cacilhas. Foi nesta praia que desembarcaram, em 24 de Junho de 1622, os holandeses. O governador de Manila, D. Fernando da Silva, escrevendo em 1624, disse que «los Holandeses com mas de 800 hombres saltaron em tierra para tomar por fuerza de armas aquella ciudade, y matar todos los varones de 20 anos arriba y casarse com las mujeres, y hacer de aquella ciudad su Metropoli, y ellos hacerse Senhores de todo el Oriente
Mas saiu-lhes o gado mosqueiro, segundo relata o próprio almirante Reijersen, comandante dos holandeses: «No batalhão do comandante Ruffijn, deu-se a explosão dum barril de pólvora que feriu alguns dos nossos homens. O inimigo, ao ver isto, carregou com grande bravura, e não possuindo a nossa gente reserva de munições, debandou correndo para a praia, onde muitos foram mortos ou se afogaram. Pela fuga das duas companhias da retaguarda, mais de 70 dos nossos foram mortos, quando bastaria que 20 ou 30 mosqueteiros se mantivessem firmes para que facilmente se tivesse feito a retirada para bordo. O que é, porém, certo é que perdemos muita gente e um canhão, tendo também muitos feridos. Todas as nossas baixas nesse desembarque foram de 136 mortos e 120 feridos gravemente. Também perdemos 10 bandeiras, 7 capitães, 4 tenentes, 7 alferes, 7 sargentos, e 9 tamboreiros … de maneira que a nossa gente voltou para bordo muito desalentada».
Jaime do Inso, em Macau, a mais antiga Colónia portuguesa no Extremo Oriente, p. 23, nota: «Em 1926, uma companhia holandesa, ao proceder às dragagens no porto exterior, encontrou em frente da antiga praia de Cacilhas, que os aterros fizeram desaparecer, vários projécteis de artilharia que deviam ser restos daquela batalha».

segunda-feira, 22 de junho de 2020

Visita ao estúdio de George Chinnery

Ainda neste ano de 2020 foram leiloadas duas pinturas de George Chinnery (1774-1852) cujo preço base de licitação rondava as 100 mil libras. Um dos quadros é uma vista sobre o que viria a ser o Jardim Camões (com o Porto Interior ao fundo) - imagem abaixo - e o outro retrata a gruta de Camões.
Chinnery chegou a Macau em 1825. Tornou-se amigo de Christopher Fearon e terá sido na casa deste - no jardim - que foi criado o primeiro estúdio de pintura, até se mudar para uma casa própria no númeo 8 da rua Inácio Batista onde montou o seu atelier. A amizade com o casal Fearon (a mulher chama-se Elisabeth) fez com que Chinnery fosse o padrinho de um dos filhos, Robert, e ensinasse pintura aos três filhos.
Ser alvo de uma pintura de Chinnery era um ritual pelo qual os mais abastados não abdicavam. Os oficiais ingleses não perdiam essa oportunidade. Outro caso foi o de Harriet Low que em 1833, pouco tempo antes de sair de Macau foi pintada por Chinnery.
Sugestão de leitura: 
George Chinnery: no bicentenario de seu nascimento 1774-1974, Manuel Teixeira, Macau.
Autoretrato de Chinnery feito a lápis. Data de 1832 e portanto feito em Macau.


(...) let us leave it and pay a visit to Mr Chinnery an old gentleman upwards of seventy years of who has resided many years in China and devoted himself to painting. By his labours many people at Macao posses some exquisite pictures of Chinese grouped in various combinations and situations and valuable as well for their intrinsic merit as paintings as for the subjects they delineate. A visit to Mr Chinnery's studio is well repaid by an inspection of his numerous sketches by his explanations of the scenes they represent by his ancedotes but more particularly by his enthusiastic expressions of admiration of the beautiful curve in Chinese pigs backs Hogarth's famous line of beauty was but a faint copy of it.
This admiration is evinced in all Mr Chinnery's pictures which are as uniformly distinguished by the presence of a Chinese pig as Wouvermann's are by a white horse Mr Chinnery however does not confine his talents to figures and pigs backs only he has also sketched many curious and peculiar styles of architecture among the Chinese and it was by his recommendation that I visited a temple near the southern end ot Macao looking on the inner harbour. 
This temple or joss a corruption of the Portuguese word Dios God house is placed on the steep and rough side of a hill and is an excellent specimen of the fantastic and artificially picturesque style of building and situation that the Chinese so much delight in. The large building or main body of the the temple to which we gain access through a richly carved and gateway is situated on the level ground at the foot of the hill and is with much gilding carving and many grotesque figures while flights of steps winding paths ornamented altars terraces large circular arches and other etceteras are scattered up the hill side intermingled in confusion with imasses of rock shrubs and trees. (...)
To the various places I have mentioned an occasional walk is taken but the general promenade of foreign residents is in a different direction. At about half past five or six o clock in the afternoon numerous groups of persons on horseback and foot every pedestrian being provided with a stout walking cane are to be sceu bending their steps along the Praya Grande to its northern end where two ways that afterwards again unite lie before them.
One of these only is used by equestrians, who turning somewhat to the left, pass out of the city gate, and through a valley called the Campo, along an ill made road or path which is nevertheless the great thoroughfare to the barrier and the interior while pedestrians either take the same route or proceed along the Quay to the Point already more than once mentioned were under the walls of Fort Saint Antonio at the same time that the eye is gratified by a view of the open sea with the shipping at anchor in the roads and the health refreshed by the deliciously cool sea breeze arc discussed the news of the day whence this spot is in Macaocse parlance denominated Scandal Corner.
A path runs from it gradually ascending on the side of the cliffs that shut out the Campo from the sea an coininanding a most extensive and interesting view of the islands scattered along the coast and through the waters and of the innumerable and various vessels that arc at anchor or moving about in all directions. A few yards up this path from Scandal Corner is a i stone bench that would seem to be the unquestioned property of nursery maids and children who are every fine cvening assembled here in considerable numbers and present as pretty healthy rosy und merry a set of faces as any country town in England can boast of here also the mammas srcquently stop and chat always followed by the sedan chairs without which they never leave the house.
Excerto do jornal The Anglo American (Nova Iorque, EUA), edição de 2.3.1844
Nota: o autor do texto acima faz ainda uma referência a um outro pintor, Lam Qua, discípulo de Chinnery, e que também teve um estúdio de pintura em Macau:
"One day at Macao I asked Lanqua, a well known and deservedly sainous portrait painter, why he did not move over to Hong Kong where he would get so much employment. His answer was: "No proper that all bad Chinamen there".

domingo, 21 de junho de 2020

Pousada de Macau ***

Pousada de Macau *** Travessa do Padre Narciso. 
A charming, authentic Portuguese Inn with just four twin rooms decorated in traditional style. One of the most famous dining rooms in the Far East plus bar. 
Rates: M$60.00 Cards: AE, DC. 
Telephone 3637. 
Cables. POUSADA
O texto acima é de um folheto turístico feito para o mercado de Hong Kong em meados da década de 1970. 
A "Pousada Macau" também conhecida por "Pousada Macau Inn" ficava no nº 1 da Travessa do Padre Narciso, ao lado do Palácio do Governo
Tinha apenas 4 quartos duplos e um dos principais atractivos, para além da vista e da localização, era o restaurante onde o chefe Ângelo ganhou fama com a "galinha africana", um prato com um molho especial que, segundo consta, era feito com 52 ingredientes.
Década 1960 (acima) e década 1980 (abaixo)

sábado, 20 de junho de 2020

Macau no "Archivo Popular" de 9 Janeiro 1841

“A Cidade do Nome de Deus de Macau está situada em uma península, ou estreita língua de terra, unida por um istmo de cinquenta braças de largura à ilha de Hiam-San, dependente da província de Cantão. A extensão desta península é de uma légua e a sua largura de menos de uma milha. Toda ela é montanhosa, ou antes é um só monte de pedras; porém os portugueses construindo em umas eminências as suas fortalezas, em outras diversas igrejas e ermidas, e nos vales os edifícios públicos e habitações particulares, fizeram deste monte de pedras uma bela cidade, cuja perspectiva pode comparar-se com a de muitas e boas cidades da Europa”.
Artigo não assinado, de página e meia, publicado na edição nº 2 do "Archivo Popular semanário pintoresco", 9 de janeiro de 1841. Segue-se um excerto.

A cidade do Nome de Deos de Macáo está situada em huma peninsula ou estreita lingua de terra unida por hum isthmo de cincoenta braças de largura á ilha Hiam San, dependente da provincia de Cantão. A extensão desta peninsula he de huma legua e a sua largura de menos de huma milha. Toda ella he montanhosa, ou antes, he hum só monte de pedras, porém os portuguezes, construindo em humas eminencias as suas fortalezas, em outras diversas igrejas e ermidas, e nos valles os edificios públicos e habitações particulares, fizeram deste monte de pedras huma bella cidade cuja perspetiva póde comparar-se com a de muitas e boas da Europa.
Não tem a cidade de Macáo mais de humas mil braças de comprido sobre tresentas de largo e compõe se de 1200 fogos com 3500 moradores portuguezes e 1300 escravos, afora a população chineza que monta a mais  20 mil almas e vivem de mistura com os portuguezes, mas sugeitos sómente aos seus mandarins.
He cabeça de bispado e tem um cabido, três freguezias, casa de Misericordia com dois hospitaes, hum recolhimento de meninas, hum seminario de padres da congregação, além de tres conventos de frades e varias ermidas Tem boa casa de camara, espaçosa alfãndega e  palacio do governo. (...)
Tendo este primeiro estabelecimento crescido em commercio e riqueza e sendo já o número de casas no anno de 1585 o erigírão portuguezes em cidade intitulando a do Nome de depois de terem conseguido do vice rei de Cantão a de se governarem a si e administrarem aos seus pelas suas proprias leis Durante o governo dos Filippes em Portugal hollandezes inimigos de Castella tendo roubado todas as nossas possessões da Asia tentárão tambem varias vezes apoderar-se de Macáo por surpreza até em 24 de junho de 1622 resolvêrão dar hum ataque á cidade para o que desembarcárão 800 homens sitio de Cacilhas porém forão pelos nossos atacados valor tal que apezar da inferioridade do número os conseguindo sobre elles huma completa vitoria. (...)

sexta-feira, 19 de junho de 2020

Panchões da "Po Sing"

A fábrica de panchões Po Sing Firecracker Factory foi fundada na China (Cantão) em 1894. Na década de 1960 instalou-se na Taipa (terá sido a última a fazê-lo), junto à Estrada Nova para o Matadouro. 
Na península de Macau tinha escritório na Rua da Ribeira do Patane, 50-52. Tinha sucursais em Cantão e Hong Kong, sendo a partir da vizinha colónia britânica que efectuava os negócios, fruto das melhores condições para as exportações, em especial para os EUA. A marca Peacock, por exemplo, foi registada nos EUA em 1947.

Abaixo detalhe de um dos raros rótulos escritos em português (com gralha): 
"Fábrica de Pauchões" - "Po Sing" Marca "Peacock"
Actualmente a Po Sing Fireworks Limited. existe apenas na China continental - em LiuYang - trabalhando em associação com várias fábricas em Hunan e Guangdong e com representação em Hong Kong.
Entre as muitas marcas produzidas pela Po Sing as mais conhecidas foram a Peacock e a Lion Globe. Mas existiram mais:  Sky Ship, Apollo, Companion, Double Voice, Sky Ship, Companion, etc...


quinta-feira, 18 de junho de 2020

"Ninho das Pombas Brancas" ou "Ninho dos Cem Pássaros"?

Gruta de Camões por George Chinnery

Na toponímia macaense existe a expressão chinesa Pak Kap Chao, 白鴿巢 que significa “Jardim do Ninho das Pombas Brancas”, numa alusão ao Jardim de Camões. Habitualmente a origem do topónimo é explicada pela alegada paixão do antigo proprietário da quinta, Lourenço Marques, por pombos. A verdade é que até hoje não encontrei nenhum documento que ateste esta explicação.
Na tradição oral há referência a uma outra origem para o topónimo. Será uma referência a um antigo jardim botânico e zoológico existente na mansão de um homem rico e que era referido pelos locais chineses como "Pak Liu Chao", ou seja, “Ninho dos Cem Pássaros”.
Estando mais inclinado para esta explicação, atente-se neste excerto de um artigo publicado em 1844 e que refere um imenso aviário com centenas de aves das mais diversas espécies:
"Another most interesting thing at Macao is an aviary now belonging to Mr. Dent but collected by the late Mr. Beale who had resided fifty years in China and in December last was found dead on the beach without any clue having been yet discovered as to the manner in which he lost his life. Among a great number of splendid silver golden medallion and other pheasants canaries, loris, pigeons, jungle birds, etc... is the great attraction of all the bird of Paradise from the Moluccas."
Zona do "Ninho das Pombas Brancas" ou "Ninho dos Cem Pássaros"
com a ilha Verde ao fundo.

quarta-feira, 17 de junho de 2020

terça-feira, 16 de junho de 2020

O pântano da Macau rural do século 19

Nesta vista parcial de um mapa de Macau de origem chinesa de ca. 1870 pode ver-se a zona que vai da Porta do Campo (ou de S. Lázaro) até à Porta do Cerco. Da Porta do Campo para a direita ficava a chamada cidade cristã e para a esquerda a denominada zona chinesa composta essencialmente por pequenas povoações (Mong Há, San Kiu,  Patane, etc...) cujos habitantes dedicavam-se à pesca e à agricultura.
Clicar na imagem para ver em tamanho maior
Ao centro assinalei o que era na época uma vasta zona de pântanos e que corresponde ao que é hoje o Tap Seac e zonas adjacentes compostas também por várzeas, cemitérios chineses e vários cursos de água (Ribeira do Patane, Canal de San Kiu, etc...)
Esta vasta zona pantanosa era foco de infecções e de doenças como o paludismo ou a cólera e seria aterrada no tempo do governador Horta e Costa (1894-1897). As terras vieram das colinas em redor e do denominado Campo da Vitória (com o monumento com o mesmo nome). 
Com a terraplanagem foi possível criar logo em 1898 a Avenida Vasco da Gama (topónimo que já não existe). O início deste longa avenida ficava onde hoje está a estátua do navegador e prolongava-se pelo actual percurso da Av. Sidónio Pais. 
No topo da Avenida Vasco da Gama existia um coreto - numa primeira fase sem cobertura - que foi demolido na segunda metade da década de 1930.

segunda-feira, 15 de junho de 2020

domingo, 14 de junho de 2020

terça-feira, 9 de junho de 2020

A expropriação do hotel Boa Vista




A 1 de Julho de 1890 o comandante Clarke abre o Hotel Bela Vista. mas o negócio não corre de feição. Clarke vê-se obrigado a hipotecar, a 11 de Novembro de 1899. Paga a hipoteca, a 21 de Novembro de 1901 (…) as perspectivas continuam a não ser as melhores. (…) Mas por esta altura, o hotel vai ser usado como um meio para a tentativa de penetração francesa em Macau. Em 1902 os franceses escolhem o hotel como possível sanatório e casa de repouso para os seus cidadãos residentes na Indochina e propõem-se comprá-lo. Por trás desta proposta, aparentemente inofensiva, descobrem os ingleses um complot para a absorção de Macau por Paris. Uma grave ameaça à estabilidade e prosperidade de Hong-Kong, na leitura dos súbditos de Sua Majestade que não compreendem porque tendo já os franceses um sanatório em Hong-Kong pretendiam novo estabelecimento em Macau. (…)
A questão da possível venda do Boa Vista chega à imprensa de Lisboa e de Londres e aos parlamentos português e inglês. Em Macau, o cônsul francês em Cantão, Hardouin, tenta tudo por tudo junto do governador para que o negócio seja efectuado. (…)
Horta e Costa, aparentemente favorável à ideia do sanatório francês no Boa Vista, remete para o Governo de Lisboa uma decisão final sobre o assunto. Mas as pressões inglesas têm sucesso junto de Lisboa e o Governador Horta e Costa expropria o Hotel (…); venda do hotel à Santa Casa da Misericórdia para instalação de um sanatório para cidadãos nacionais e estrangeiros. (…) Pouco tempo depois (…), sem dinheiro, o Provedor é obrigado a pedir um empréstimo sem juros à companhia que explorava a lotaria. A instituição abandona o projecto de de erguer um hospital (…), e decide explorar directamente o Hotel, através de Delfino José Ribeiro mantendo quase todos os empregados que tinham trabalhado para o capitão Clarke (…). Uma banda a tocar aos sábados no salão de jantar, um campo de ténis e os quartos de turistas e ou convalescentes. (…)

segunda-feira, 8 de junho de 2020

Notícias da "Mala da Europa" em 1862

Notícias na parte não oficial do boletim do governo de 27 de Dezembro de 1862.
No dia 24 ao sahir da missa do recebemos a correspondência da mala da Europa de 10 Novembro vinda pelo vapor China. As noticias estrangeiras são de pouco interesse a não ser o que diz da interferência da Rússia e Inglaterra na guerra civil d America.
O Rei Otho e a Rainha fugiram para Munich e annuncia se que Assembleia nacional será convocada.
Não se espera que a França intervenha nos negócios da Grécia.
Um Capitão Americano insultou o Pavilhão Hespanhol e o Governo pedio satisfação.
Cerca de 9000 padres pediram ao Papa para abandonar o poder temporal.
Nada importante d America; prevalece a má politica e desapparece o dinheiro: espera-se uma crise financeira.
Relativamente a Portugal jornaes inglezes dão já abertas as Camaras, e ter sido nomeado Embaixador para Roma o Exmo Duque de Saldanha e annunciaram a morte do primeiro orador portuguez, o veterano soldado da liberdade, José Estevam de Magalhães, tendo morrido repentinamente.
As cartas e jornaes que recebemos de Lisboa só alcançam a 31 d Outubro e dizem apenas o seguinte: Suas Magestades e Alteza perfeita saúde e o Reino em completo socêgo. (...)

sábado, 6 de junho de 2020

Os "Hãos commerciaes"

As primeiras associações comerciais denominavam-se "hãos"... Havia os "hãos" de comércio, os "hãos" de penhores, etc...
Veja-se este excerto de um texto publicado no Boletim da Província de Macau e Timorde 23 de Setembro de 1867. Nesta altura a população chinesa de Macau rondavam os 56 mil. Existiam 40 hãos comerciais e 28 hãos de penhores.
Manuel de Castro Sampaio, chefe da Repartição de Estatística assina o texto.

“A chave do comércio de Macau está, por assim dizer, nas mãos dos chineses. Activos e inteligentes terão sabido conservar a posse desta fonte de riqueza.
Quando Macau era o único ponto intermédio do comércio da China com os outros povos, florescia por isso nesta cidade o comércio dos chineses e o comércio português. Este último, porém, depois do estabelecimento da colónia inglesa do Hongkong e da abertura dos portos do vizinho império, começou a desfalecer, caminhando para a decadência em que hoje se acha. Mas não teve semelhante sorte o comércio dos chineses, porque, com quanto por vários motivos o retirassem temporariamente de Macau para Cantão, eles o restabeleceram depois nesta cidade, e desde então o têm mantido sempre florescente e próspero.
Exploradores modestos desta mina, hão com habilidade e subtileza tirado dela valiosos resultados; e o mais é que, longe de enfraquecerem, têm multiplicado as suas casas comerciais, que aqui sustentam com crédito e riqueza. Os chineses, no que toca ao comércio, conduzem-se em geral com honra e probidade, porque, conhecendo o grande alcance destas qualidades quando se trata de tão rico manancial, são admiravelmente circunspectos em todas as suas contas.
O espírito de associação existe entre eles em supremo grau; e por isso, salvas raríssimas excepções, não comerceiam senão por meio de associação. Mesmo para empreender qualquer insignificante negócio, não dispensam este meio, porque bem justamente compreendem que é no concurso de inteligências e capitais que se estriba a verdadeira segurança de todos os negócios.”

sexta-feira, 5 de junho de 2020

Vapor Kwai Lum: 1898

O anúncio foi publicado no Boletim Official do Governo da Província de Macau e dá conta de um novo vapor - o Kwai Lum - para efectuar as ligações marítimas entre Macau e Hong Kong pela empresa Hong Kong & West River Steamboat Co.
Esta empresa foi criada em 1897 quando o "West River" foi aberto ao comércio (Junho 1897) por outras três: a Hong Kong, Canton & Macao Steamboat Company Limited” (1865) de Hong Kong, a China Navigation Company e a Indo-China, da “Jardine Matheson.