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terça-feira, 19 de novembro de 2013

Notícias de Macau e Deolinda da Conceição

O Instituto Internacional de Macau, por ocasião do centenário do nascimento de Deolinda da Conceição (1913-1957), promove ao final da tarde (18h30) do dia de hoje em Macau uma sessão de homenagem integrada no ciclo de tertúlias dos “Serões Macaenses”.
Terá como oradores Maria Antónia Espadinha, Fernando Sales Lopes e o filho da autora, António da Conceição Júnior. Fica feito o convite.

10-9-1953
Calçada do Tronco Velho: à esquerda a Escola Comercial e à dta. ao fundo a redacção do NM

Funcionários do jornal "Notícias de Macau" em confraternização na década de 1950. Na imagem podem ver-se Herman Machado Monteiro, Deolinda da Conceição e Luíz Gonzaga Gomes, entre outros.
"Deolinda da Conceição, escritora, nasce em Macau numa época conturbada pelas guerras mundiais e pela guerra sino-japonesa. É essa vivência que retrata em Cheong Sam (A Cabaia – obra que reúne vários contos), e nas crónicas, publicadas no jornal Notícias de Macau, onde trabalhou como jornalista e responsável da Página Feminina.
Nos contos, Macau é descrito como uma cidade onde os extremos se tocam num dualismo carregado de branco e preto. Macau é o “cantinho abençoado”, um “oásis de paz”, uma “terra privilegiada e de promissão”, um “cantinho onde se podia desfrutar de uma relativa paz”, de calma, sossego, beleza, encantamento e onde o silêncio das ruas é quebrado, de vez em quando, pela “buzina de um automóvel” ou pelo relógio que bate as 12 badaladas. Noites tranquilas e belas, em que imagens encantadoras povoam o sono dos inocentes, fazem a autora sentir-se feliz e considerar que é uma maravilha viver em Macau.
De repente, toda esta felicidade é bruscamente abalada por “rostos amarelecidos pela fome constante” e pelo desespero de um presente cruel mas, sobretudo, pela visão de um futuro sem qualquer réstea de esperança. As ruas de Macau tornam-se palco no qual desfilam corpos e almas marcadas de forma profunda por uma guerra feita por homens que “de humano só têm a forma”.
Cidade de contrastes onde as padarias exibem pão quentinho e os mendigos, dia e noite, vagueiam em grupo à chuva e ao frio, enfrentando a escuridão da noite e das suas vidas, na esperança que uma mão caridosa lhes estenda um pedaço de pão ou uma moeda para comprar algo que lhes mitigue a fome.
É neste cenário de desespero e profunda miséria que a solidariedade e a compaixão das gentes de Macau suaviza a vida dos inúmeros refugiados de guerra e de todos os que aqui procuram um refúgio que os abrigue e os afaste do trágico destino a que as tradições sociais os tinham votado.
A mulher é a personagem central da maior parte dos contos: a mulher chinesa que sofre a discriminação e que tenta libertar-se da condição de inferioridade a que estava sujeita (concubinato, filho varão e venda das meninas); a mulher vítima da guerra que enlouquece de dor perante a impossibilidade de salvar os filhos da fome e da miséria; a mulher que, na sociedade fechada de Macau, tenta conquistar a sua liberdade e assumir-se em pé de igualdade com o homem, a nível profissional e social.
Ao lermos a biografia da autora podemos concluir que ela própria, enquanto jornalista, escritora, professora e tradutora, participa activamente neste movimento emancipatório da mulher, tendo-se afirmado, a nível profissional, num meio exclusivamente masculino."
Excerto de um artigo da autoria de  Maria de Lurdes Nogueira Escaleira publicado na Revista Macau nº 31 (Junho 2013)

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