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sexta-feira, 17 de março de 2023

Ragionamenti di Francesco Carletti Fiorentino (...)

Já em posts anteriores falei de Francesco Carletti (1573-1636). Para a publicação de hoje seleccionei alguns excertos sobre "Amacao" no tempo em que este mercador italiano por lá andou, no final do século 16, tendo assistido a um eclipse e sentido de perto os efeitos de um tufão. Fazem parte do livro "Ragionamenti di Francesco Carletti Fiorentino sopra le cose da lui vedute ne' suoi viaggi Si dell'Indie Occidentali, e Orientali (...) Firenze" publicado em 1701.
Publicado em Firenze (Florença) em 1701.

Primeiros tempos do assentamento português
"(...) Ao cabo de doze dias chegámos à ilha de Amacao, situada a 19 graus de norte, perto de Cantão, terra firme e cidade da China que dá o nome a uma daquelas províncias, a setenta milhas pouco mais ou menos. É uma pequena cidade sem muralhas e sem fortalezas, com umas poucas casas de portugueses, sendo chamada Cidade do Nome de Deus; e se bem que é ilha adjacente à China, contudo é governada por um Capitão Português que vai lá de Goa todos os anos com patente e provisões reais da Coroa de Portugal , para administrar a justiça aos portugueses que ali moram. (...)
Quer, como prémio por este serviço, quer para o recompensar por outros serviços prestados na Índia, em matéria de guerra, à Majestade Católica, é concedido a esse capitão o privilégio de ele só, e não outros durante aquele ano, aprontar uma nau para ir ao Japão, transportando as mercadorias que os habitantes da cidade lá mandam, as quais são compradas duas vezes ao ano, na cidade de Cantão, onde se fazem as feiras. Estas mercadorias são transportadas à Índia oriental no mês de Setembro e Outubro, e ao Japão no mês de Abril e Maio: estas últimas são principalmente seda crua, da qual se transportam em cada viagem setenta e oitenta mil libras de vinte onças cada uma, que eles chamam 'cates'. Também transportam para lá grande quantidade de drapejamentos diversos e muito chumbo (...); e ainda prata pura e zarcão e grande quantidade de almíscar com as suas vesículas, tudo o que se consome nestas partes entre estes povos.. (...)"

Culto da deusa A-Ma
Quando oferecem os alimentos nalguma festa solene, comem-nos perto do ídolo, como vi fazer em Amacao (...); esse ídolo chamava-se 'Ama', por isso a ilha é chamada Amacao, quer dizer 'lugar do ídolo Ama'. Celebram essa festa no primeiro dia da lua nova de Março, que é o seu Ano Novo, sendo celebrado por todo o reino como festa principalíssima. (...) 

Tufão
"L'anno 1599 alli 28 del mese di Luglio, ch'io mi trovava in detta Città d'Amacao, vidi rovinar più di dieci case atterrate dall acqua, e dalle furie del vento Tuffone, che è quel medesimo, che nell Isole Filippine chiamano Uracan."

No ano de 1599, aos 28 do mês de Julho quando eu estava na cidade de Macau, vi mais de 10 ou 12 casas arruinadas pela água e pela força do tufão que nas ilhas Filipinas é chamado pelos castelhanos 'Uracan'. As casas são feitas de terra misturada com cal viva; são fortificações de tantas a tantas braças com tabiques de pedra murados a cal, sendo as paredes estucadas com cal por dentro e por fora, e cobertas de telhas em tudo ao modo da Espanha. Depois de ter soprado com tanta fúria, que não se podia andar pelas ruas nem sequer mostrar lá a cara, o vento parou, tendo passado por todos os rumos da rosa dos ventos, e continuou durante dois dias. além de muitos danos, e naus que fez desviar por toda a costa e portos de China, fez também perder no porto de Amacao uma nau que tinha vindo do Reino do Sião, carregada de lenha chamada comummente pau brasil, que eles neste país chamam 'sapan'. (...)

Eclipse
Enquanto estive lá notei um grande eclipse que sucedeu no ano de 1599 aos 6 de Agosto. Vi na quinta-feira de tarde a lua que se obscureceu quase toda, estando já cheia ao aparecer, a qual saiu fora do horizonte, durando cerca de duas horas: apareceu de cor vermelha muito inflamada, e o pouco que ficava claro era da banda do norte. 
No mesmo ano, no mês de Dezembro, vindo o tempo da partida das naus que da China vão a Goa, pensei embarcar numa delas, levando as mercadorias que tinha comprado nas duas naus que partiam naquele ano."

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