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sábado, 20 de janeiro de 2018

Exemplos de "consciência ecológica" no século XIX

No Boletim da Província de Macau e Timor, de 15 de Fevereiro de 1883 - Suplemento ao nº 6, Constantino José de Brito assina o Relatório da Direcção das Obras Públicas da Província de Macau e Timor relativo ao Ano de 1882, datado de 30 de Janeiro de 1883. Ali pode ler-se:
"1882 - "O principal jardim da cidade é o de S. Francisco, no fundo do qual existiam os restos duma cascata a desmoronar-se, e que foi reconstruída, dando-se uma nova disposição, tendo também sido substituído na casa do guarda o madeiramento do telhado, que tinha sido destruído pela formiga branca. O jardim é cercado duma balaustrada, que também foi reparada.
Como o prédio em que o Tribunal da Procuratura actualmente funciona tinha vizinho ao jardim de S. Francisco um quintal que deixaria de ser aproveitado, apesar do governo satisfazer ao mosteiro de Sta. Clara a renda correspondente, trata-se de o reunir ao jardim para recreio do público, por isso que no quintal existem algumas árvores frondosas, cuja sombra deve ser bastante agradável, na estação calmosa. E como o jardim de S. Francisco não tem árvores desenvolvidas, mas apenas arbustos e flores, deve tornar-se digno de muito apreço o acrescentamento que vai ter e ainda seria para desejar que se lhe acrescentasse um canto do largo de S. Francisco, onde se acham uns casebres, e de modo que ficassem incluídas no jardim as duas copadas e formosas árvores que ali existem."

O Jardim de S. Francisco é tido como primeiro jardim público de Macau. Na época, existiam outros, casos do jardim do Chunambeiro, do jardim particular da "horta da Mitra, jardim da Flora e do Jardim da Gruta de Camões.
Em 1881 Tancredo Caldeira de Casal Ribeiro, "agrónomo do districto de Aveiro" é nomeado para exercer o "logar de agronomo da provincia de Macau e Timor”.
Tancredo Caldeira do Casal Ribeiro (1856- ?) licenciou-se em 1897 pelo Instituto Geral de Agricultura, em Lisboa, e exerceu funções em Macau entre 1881 e 1886, tendo sido também professor no Seminário de S. José.
Entre os anos de 1883 e 1887 foram mandadas plantar pelo Governador Tomás da Rosa 60.000 árvores em Macau, a maioria na colina da Guia. Ora se tivermos em conta o recenseamento geral da população, efectuado a 31 de Dezembro de 1878 - "68.086 habitantes europeus, chinas e de outras nacionalidades" - dá praticamente uma árvore por cada habitante.
Lúcio Augusto da Silva assina o Relatório do Serviço de Saúde Pública na Cidade de Macau, Relativo ao Ano de 1882, datado de 30 de Março de 1883 publicado no Boletim da Província de Macau e Timor onde se inclui um relatório acerca da arborização de Macau pelo agrónomo Tancredo Caldeira do Casal Ribeiro: 

"(...) Confiado este ramo de serviço desde há muito à direcção das obras publicas, era no orçamento d'esta repartição que estava consignada a verba para esses trabalhos, verba mesquinha e insufficiente, englobada na dos jardins publicos e portanto sujeita a ficar mais reduzida, sempre que estes reclamassem qualquer obra de maior vulto. N'estas circumstancias, para evitar difficuldades de escripturação, continuaram as despezas a ser feitas por via d'esta repartição, sendo as folhas de trabalho processadas semanalmente pelo systema ali seguido. A escacez da verba applicada á arborisação não tinha permittido que até aqui se desse o desenvolvimento que merece um ramo tão importante de serviço, porque em Macau não basta arborisar as estradas, é mister tambem povoar as montanhas agora aridas e escalvadas e que tão feio aspecto apresentam ao viajante que se dirige a Macau. É tristonha e desagradavel a impressão que se sente ao entrar na rada e mais tarde no porto quando se vêem alvejar as casas destacando entre as pequenas montanhas nuas, manchadas de espaço a espaço pelo saibro avermelhado. Foi essa a impressão que senti ao entrar pela primeira vez n'esta cidade, e dei-me por feliz, quando encarregado d'estes trabalhos, por poder contribuir, na acanhada proporção dos meus recursos, para o aformoseamento d'essas montanhas que cobertas de vegetação poderão transformar esta colonia em verdadeira Cintra do sul da China. (...)
Assim, ficamos a saber que "plantaram-se por duas vezes em julho de 1883 e março de 1884 as seguintes especies.
Pinus sinensis - 20,000 pés; Cupressus japonica - de cada uma 300 pés; Aleurites triloba;
Ailanthus glandulosa; Poinciana pulcherrima; Laurus camphora; Ficus elastica; Erytrina; e
Morus alba - 3,000 pés." 

Macau no século 19
Augusto Pereira Tovar de Lemos no Relatório do Serviço Médico da Província de Macau e Timor, referido ao ano de 1885, datado de 1 de Fevereiro de 1886 com publicação no Boletim da Província de Macau e Timor escreve:
"A utilidade que resulta da arborisação, o elevadíssimo papel que ella assume na hygiene publica é tão conhecido e demonstrado que me abstenho de demorar, repetindo o que já é do dominio publico. Basta que diga que breve se devem sentir os beneficos efeitos da cultura emprehendida pelo Ex. mo Sr. Governador.
O arvoredo que, tirado d'um viveiro da quinta da Flora cuidadosamente tratado foi transplantado para varios pontos da cidade e em especial para a cordilheira que por E circunda o grande largo denominado Flora, já hoje se apresenta viçoso e bonito. A cultura é em larga escala, e entre os cinco ou seis annos lucrarão a hygiene e o aformoseamento da cidade. Aquelles montes que pela sua nudez, pelo seu granito, e rochas em pontos a descoberto impressionavam tristemente o viajante, aqueles montes que pela sua natureza mais convidavam a trabalhos de dynamite, e mais pareciam proprios a fornecer pedra para construção de casas, do que para alimentar em seu seio um vegetal qualquer, converter-se-ão em formosos cerrados bosques. O estrangeiro que visitar Macau receberá as mais gratas impressões."
Veja-se outro exemplo de "consciência ecológica" no século 19. Em 1871 é publicado pelo Leal Senado O Código de Posturas do Leal Senado e a Conservação das Árvores: 
Artigo 1. ° É prohibido prender, ou atar qualquer cousa ás arvores, que estiverem em terreno publico, ou subir a ellas; embora d'isso não provenha damno immediato, punivel pelo artigo subsequente: sob pena de $1 de multa. Art. 2. ° É igualmente prohibido varejar as mesmas arvores, atirar-lhes pedras, páus, ou cousas semelhantes, quebrar-lhes alguma haste ou vergontea, ou finalmente deterioaral-as por qualquer outro modo: sob pena de $2 de multa. Art. 3. ° Incorre no quintuplo da pena comminada no artigo antecedente, quem cortar, ou arrancar pela raiz qualquer d'essas arvores, não estando munido de licença da camara; ou quem tendo esta licença não cumprir todo, ou em parte as condições, com que ella for concedida.

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