Páginas

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Festa da Lua

Gift certificate of Hin Kei bakery, famous for moon cake, wedding pastries and other goodies in old Macau.
Cupão de oferta da pastelaria Hin Kei, conhecida pelo 'bolo lunar' e demais doçarias para casamentos e épocas festivas em Macau de antigamente.
Por esta altura os chineses celebram o chamado T’Chang-Chau-Chit isto é o décimo quinto dia, do oitavo mês lunar, marcando o equinócio do Outono, que significa o fim das colheitas. Esta Festa da Lua é tb conhecida por Pat  Iut Sap Ng ou Bate-Pau (alusão à forma como os bolos eram introduzidos nas formas). A este propósito recordo um texto de Leonel Barros e deixo uma sugestão aos que queiram provar os bolos. Devem ser sempre acompanhados de chá (sem açúcar)!
"A Lua, segundo a opinião dos chineses, nesse dia, encontra-se mais redonda e mais brilhante. Reza a filosofia oriental que, nesta altura do ano, a harmonia dos elementos do yang e do ying, respectivamente masculino e feminino, começa a alterar-se, pendendo para o feminino. A essência do yang, começa a enfraquecer-se com o tempo do Verão, sendo a altura do ying exercer o seu domínio até final do Inverno, quando esse cede lugar à energia do renascimento, na Primavera.  A Lua redonda e luminosa simboliza a feminilidade e união familiar. Era costume, antigamente, familiares afastados regressarem ao lar para celebrar essa festividade da mesma forma como faziam com a passagem do Ano Novo Lunar.
São os deuses que determinam a curva da existência de todo o chinês e por isso, é da maior conveniência e utilidade estar em boas relações com eles, oferecendo-lhes ricos presentes, humilhando-se diante dos seus rostos severos e queimando em seus altares pivetes e velas, para que eles façam prosperar as suas vidas e os seus haveres. Essa tradição, essencialmente religiosa, vai passando de pais a filhos, como uma herança de família que é necessário conservar rigorosamente em todas as suas praxes.
Assim se explica o facto do novo povo chinês viver ainda agarrado a uma tradição de milénios e celebrar todos os anos, como o fazia há milhares de anos, todas as suas festas subordinadas ao calendário do ano lunar. A mais importante, porém, a mais típica, é talvez ainda a festa do Bolo Lunar cujo nome vem dos característicos bolos, que, nesta ocasião e conforme determina o rigoroso código de etiqueta chinesa, se permutam entre parentes, amigos e conhecidos. Metidos, quatro a quatro, em caixas de papelão, cuja tampa representa um motivo das várias lendas que se contam acerca da invenção e criação deste bolo, saem das pastelarias da especialidade, em grandes quantidades para irem deleitar o paladar dos convivas, em reuniões familiares ou de carácter social.
Estas reuniões constituem a forma mais expressiva de celebrar esta festividade. As reuniões familiares, geralmente realizadas nas varandas ou nos terraços voltados para a Lua, iluminadas apenas por lanternas cujas silhuetas, projectando-se nas paredes produzem um efeito estranho e exótico, destinam-se sobretudo a proporcionar a todos os membros da família alguns momentos de alegre confraternização.
As mulheres e raparigas põem todo o seu cuidado nas oferendas que fazem visto que sendo a Lua o símbolo do propício feminino, dela depende toda a sua felicidade.
Entre as ofertas à Lua não faltam nunca as frutas de forma arredondada, e por isso, as toranjas, as carambolas, os diospiros, as maçãs e as laranjas são muito procuradas apesar do seu elevado preço, por não serem frutas da estação. Além das frutas, nota-se também a presença da castanha aquática leng-kock, porque tendo a forma muito parecida com o morcego chinês, é considerada um emblema de felicidade.
Antigamente, uma das características destes reuniões era a presença dos músicos cegos que entretinham as pessoas presentes.
Os chineses põem sempre um esmero especial na ornamentação, pois consideram-na de grande importância nesta festividade. Basta observar as suas moradias, as lojas comerciais, os clubes ou recintos públicos. Nas casas de habitação esse trabalho é confiado à habilidade e bom gosto das filhas mais velhas, orientadas pela mãe. Nas lojas comerciais são os empregados os responsáveis pela ornamentação. Constituem motivos de ornamentação, as lanternas chinesas sá-tang, de formas e feitios variados e de muitas cores, em que predomina o vermelho, as borboletas que são o símbolo da longevidade e as lagostas que dão alegria e tornam-nos resignados com a nossa sorte, meios de fortuna e condição social. Os alunos das escolas ornamentam as classes com lanternas em forma de carpas e peixes dourados, que são animais que servem de estímulos nos estudos.
Esta festividade é também celebrada com muita pompa e rigor pelos camponeses, pois tendo terminado as colheitas, coincide a mesma, com um longo período de descanso. Os plantadores de arroz, aproveitam esta ocasião para prestar o culto ao Deus dos Campos, a cuja benevolência devem a sua prosperidade.
Em Macau são as crianças que mais apreciam a festividade. Qualquer criança, seja ela filha dum rico ou pobre, traz consigo nesse dia a sua lanterna para iluminar a noite, passeando-se orgulhosamente pelas ruas, parques, jardins e praias. As lanternas aparecem em todas as formas que o artista consegue inventar e enchem-se as papelarias situadas na Rua dos Mercadores. São coelhos, Fénix, borboletas, peixes, caranguejos, lagostas, macacos, frutas exóticas, etc.
Lanternas: década 1970
Em Macau existem várias casas onde o bolo bate-pau é confeccionado, sendo a mais conhecida a chamada In-Hor, estabelecimento antiquíssimo com duas entradas, sendo uma na Travessa do Soriano e outra na Rua dos Mercadores. Este tipo de bolo é preparado nesse estabelecimento e seguidamente exportado para o Canadá, S. Francisco e Taiwan.
Servindo-se dum pau com formato dum pequeno remo com uma altura arredondada, mete-se nela a massa de farinha e os recheios, carregando seguidamente com a palma da mão para comprimir bem; e em seguida, bate-se o pau com força sobre a mesa, a fim de fazer expelir o bolo que depois é levado ao forno para ser assado. Uma vez pronto, o bolo apresentará uma crosta acastanhada dourada. Os bolos mais saborosos e caros são os que possuem o recheio com sementes de uvas, acrescentando-lhes duas ou três gemas de ovo salgado. Várias e interessantes lendas estão ligadas a esta festividade e a mais conhecida de todas é a que a seguir vamos descrever:
Conta-se que em tempos idos, governava uma das mais importantes cidades da China Central, um homem muito cruel, avarento e sanguinário, que tinha à sua disposição um regimento de informadores de tudo quanto corria pela cidade. Esses informadores, para o alegrar, não hesitavam em contar histórias sobre certos indivíduos, honestos cidadãos que nenhuma culpa tinham. As suas cabeças eram roladas na praça pública.
Tinham como acusação, que andavam a preparar uma rebelião ou tramando a sua morte. Essas medidas de déspota, traziam em sobressalto constante a pacífica população até que, num lindo dia de Outono, apareceu na cidade um homem com cerca de quarenta anos, que captou logo a admiração e simpatia das pessoas com quem falou, devido aos seus modos afáveis e conhecimentos demonstrados nas suas palavras de homem culto.
Fabrico de bolo lunar em Macau na década de 1970
Andou pela cidade durante vários dias a fim de se inteirar, sobretudo nos bairros circunjacentes, da condição das classes pobres, abrindo uma modesta casa de pasto perto da praça pública.  Tal foi a enchente de gente a saborear as iguarias da nova casa de chá, destacando-se os comerciantes mais ricos e de maior influência da cidade, que o governador para lá mandou os seus informadores de confiança para descobrir o que se estava a passar.
Não havia dia em que dezenas de cabeças de indefesos não rolassem por terra. Essas cabeças eram colocadas sobre um enorme estrado na praça pública, a fim de meterem medo à população. Tal foi o receio da população que foi necessário o dono da casa de chá, aquietá-los na certeza de que melhores dias chegariam muito em breve.
Resolveu então confeccionar um tipo de bolo saborosíssimo que seria oferecido a todos os residentes da cidade, mas com a condição de só poder ser comido no décimo quinto dia, da oitava lua, quando os relógios batessem meia-noite. No interior de cada um desses bolos havia uma mensagem para o início duma revolta. No dia indicado chegou finalmente o dia da libertação e todos os homens válidos fortemente armados de paus, tochas e lanternas compareceram na praça pública, a fim de enfrentarem tais informadores. Apanhados de surpresa, nada puderam fazer contra a força esmagadora da população inteira que de há muito esperava que alguém soltasse aquele grito de revolta e de libertação. A cabeça do governador e dos seus informadores rolaram pelas escadas do palácio. A população cheia de alegria foi buscar o dono da referida casa de chá para lhe entregar o governo da cidade, mas não foi possível encontrá-lo. O seu nome ficou na memoria de toda a população como símbolo de valentia em defesa dos humildes."
Artigo da autoria de Leonel Barros publicado no JTM em Setembro de 2008  

1 comentário:

  1. Lembro-me perfeitamente dos "Bolos da Lua". Havia-os com diversos recheios, uns mais doces que outros.Curiosamente eu gostava mais dos que tinham uma gema de ovo. Também apreciava muito a forma como os bolos eram embalados, em caixas muito bonitas, algumas com tampa de vidro. Quanto às lanternas, eram um espetáculo quando íamos para a rua com elas acesas. No anos 50 eram feitas de papel de seda e já começavam a surgir as lanternas em papel celofane de várias cores. Tive um coelho em papel branco que tinha 4 rodas e destinava-se a ser puxado.

    ResponderEliminar