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quarta-feira, 14 de agosto de 2024

Comércio e indústria do Chá em Macau no final do séc. 19

Tendo por base uma carta de 1879 assinada por José Alberto Côrte-Real e dirigida ao deputado eleito por Macau em Lisboa fica-se a saber importantes informações sobre o "Comércio e indústria do Chá em Macau" no último quartel do século 19. Existiam na altura 128 "escolhedores de chá", 13 "Fabricantes de caixas de chá", 95 "manipuladores de chá" e 43 lojas de venda.
Excertos:
"(...) Ha nesta cidade uma importante industria de preparar chá cuja producção e valor não posso determinar com inteira exactidão porque não havendo dados officiaes de que lançar mão os fabricantes e exportadores por sua parte como de ordinario succede não se prestam a dal os completos mórmente os chinas que são desconfiados e supersticiosos.
Segundo pois a nota que me foi dada em globo por via de uma das principaes agencias de exportação de cha estabelecida nesta cidade calcula-se esta exportação durante o anno de 1877 considerada como termo medio annual em 41 000 picos ou 6 000 000 de libras no valor de 630 000 taeis ou 875 000 patacas, equivalentes a 14 taeis ou 19 patacas por pico sem transporte nem direitos. Foi me logo asseverado que esta cifra não inspirava inteira confiança pois a exportação devia ser maior e mais avultado o seu valor. (...)
O pessoal nelles empregado consta de 120 operarios fixos e 853 avulsos sendo 348 homens e 505 mulheres. O numero d'estes trabalhadores avulsos varía segundo as exigencias do serviço mas calcula-se que trabalham regularmente em Macau mais de 600. Deve contar-se ainda não menos de 300 culis que se empregam em carretos e outros serviços. E mettendo em linha de conta tambem a madeira fabríco e pintura de muitos milhares de caixas combustiveis outros materiaes industrias e serviços correlativos rendas e valor de edificios das fabricas e seus armazens de escriptorios e armazens de exportadores póde presumir-se a importancia actual d'esta industria em Macau. (...) 
Procurando como subsidio complementar d'esta apreciação a contribuição paga por aquelles estabelecimentos pude verificar que eram 16 e não 15 sómente as fabricas de torrar chá, as quaes por suas licenças contribuiam todas para a fazenda com a totalidade de 450 patacas annuaes. Nas cifras de producção e de exportação fornecidas pelos fabricantes e exportadores nota-se uma discrepancia importante pois emquanto os segundos calculam a exportação em 41 000 picos e no valor de 630 000 taeis ou 875 000 patacas os primeiros accusando uma producção de 30 961 picos, cifra inferior á da exportação dão lhes o valor de 731 604 taeis ou de mais de 1 000 000 de patacas valor muito superior ao que os outros attribuem a maior porção de genero. (...)
A estatistica publicada no directorio de Hongkong avalia em 700 000 a 800 000 patacas o chá exportado annualmente de Macau para aquella colonia para onde é transportado pelos vapores que fazem carreira diaria entre as duas cidades.
O chá fabricado em Macau é especialmente destinado para exportação não sendo tambem do que mais geralmente se consome em Portugal. É comtudo certo que a maior parte vai para Inglaterra e é de Inglaterra que o mercado portuguez se abastece consumindo por mão extrangeira producto sahido da sua propria colonia.
Não é impossivel porém fabricar se aqui chá verde, o mais predilecto do nosso paiz, do mesmo modo que em tempo aqui se fabricava e voltará certamente a fabricar se logo que se estabeleça uma procura regular. Nesse tempo antes de 1870 vinham aqui navios portuguezes busca-lo para o reino mas desde aquelle anno até hoje nenhum cá voltou nem d'aqui se fez mais esse commercio directamente com as casas e praças portuguezas apezar das tentativas de alguns commerciantes. A differença de custo por que os inglezes o levam a Portugal mesmo depois de ir nacionalisar-se em Inglaterra é tal que não lhes permitte concorrencia. O chá é mandado pelos agentes inglezes para Hongkong e d'alli vai para os portos de Inglaterra em navios de retorno que o levam por fretes diminutissimos. (...)

Sobre o comércio e indústria do chá em Macau, veja-se o que diz um relatório assinado pelo Governador de Macau Francisco Teixeira da Silva, cerca de 10 anos depois, em 1888:
Á excepção da seda todos os generos de exportação tiveram um augmento rasoavel. A exportação do chá preto excedeu a do anno anterior, 14 000 picos! O chá verde appareceu no mercado este anno pela primeira vez. O commercio de Macau não vae declinando como diziam alguns pessimistas que não estudam as questões. Para entreposto commercial occupa Macau uma excellente posição e não serão as difficuldades no accesso do seu porto que lhe tirarão essa proeminencia, a qual será conservada pela navegação de juncos auxiliada pelas carreiras diarias dos vapores de Cantão e Hong Kong, comtanto que profundem os canaes do porto.
O que falta é estabelecer relações commerciaes com Timor e com Lisboa. Pensar em navegação portugueza entre esses dois pontos é um devaneio desculpavel por ser patriotico. Seria perda certa para quem se mettesse em tal empreza. Não luctam tres ou quatro vapores que a nossa praça podesse empregar n'essas carreiras com as esquadras da companhia das Messageries nem com a de outras companhias estrangeiras que exploram o trafego entre os portos da Europa e os da China e Japão.
Bastará notar que uma tonelada de chá paga hoje de frete de Fonchon para Liverpool 2 libras. O que é pratico é aproveitar a navegação estrangeira subvencionando a com a condição de tocar em Lisboa e Macau. Os navios, por maiores que sejam, poderão fundear na rada sendo dispensados do pagamento dos enormes direitos de pilotagem com que os carrega o decreto de 19 de janeiro de 1887. Dar-se-lhe-ia o exclusivo dos passageiros e da carga do governo. E para que do beneficio concedido ao chá produzido em Macau a que se refere o 12º do artigo 1º do decreto de 19 de junho de 1889 resulte algum bem, á provincia seria necessario extende-lo ao que fosse transportado em navios estrangeiros.
Assim não haverá incentivo algum que convide os capitaes a tal industria aqui, nem á navegação portugueza ahi. Quem se arriscasse a mandar navios portuguezes a Macau carregar de chá perderia no negocio por não poder competir com os estrangeiros no preço dos fretes como já disse. E para que o favor se estenda a todos os productos de Macau revogue-se o disposto no artigo 22º 3 alinea C dos preliminares da pauta das alfandegas approvada por decreto de 14 de dezembro de 1882 que diz assim: Pagam os direitos de importação em Portugal como se fossem mercadorias estrangeiras todas as mercadorias procedentes do porto franco da cidade de Macau." 

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