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quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Impressões e Recordações

Quem pretender fazer a história da primeira metade do século XX em Macau não pode ignorar este nome maior da sociedade macaense: Manuel da Silva Mendes (1867-1931). Formado como bacharel (advogado) em Coimbra em 1896 cedo se juntou aos movimentos que lutavam contra a monarquia e defendiam a implantação da república. Um sonho que só viu concretizado já em Macau onde chegou em 1901 para leccionar no Liceu. Desses anos ficou o livro “Socialismo Libertário ou Anarchismo: História e Doutrina” e a curiosidade aguçada pelo Oriente em geral e pela China em particular.
De espírito multifacetado, foi professor e reitor do Liceu, advogado e juiz. Teve ainda tempo para se dedicar ao estudo da filosofia taoista (deixou obras notáveis neste domínio) e para se embrenhar nos exigentes meandros da arte chinesa, como erudito e coleccionador. Entre as múltiplas obras de arte que coleccionou destaque para a chamada cerâmica de Shec Wan/Shiwan. No início do século XX, Silva Mendes visitou diversas vezes esta região do Sul da China conhecida pela produção cerâmica. Interessou-se de tal modo que junto dos fabricantes locais encomendou peças únicas tornando-se assim o primeiro coleccionador do mundo a estudar esta forma de arte. A sua valiosíssima colecção particular constitui o espólio mais significativo do desaparecido Museu Luís de Camões e hoje pode ser apreciado no Museu de Arte de Macau. A propósito, refira-se que até há bem pouco tempo no átrio da exposição permanente no museu surgia o ano de 1876 como sendo o do nascimento de Silva Mendes quando na verdade foi em 1867. Morreu em Macau em Dezembro de 1931... há 82 anos.
Silva Mendes viveu em Macau cerca de três décadas (metade da sua vida) e escreveu em diversos jornais e revistas. Luís Gonzaga Gomes (seu aluno no Liceu de Macau) foi dos primeiros a aperceber-se da importância dos seus artigos e começou por reuni-los nas páginas do jornal “Notícias de Macau” (e nos livros “Colectânea de Artigos de MSM”) nas décadas de 1940 e 1960. Em 1979 a professora Graciete Batalha seleccionou o que considerou serem os seus textos mais significativos no livro "Macau impressões e recordações".
Para além dos textos e obras de arte, Manuel da Silva Mendes acabaria por deixar como seu legado ao território a casa que construiu de raiz na encosta da Guia, uma construção de estilo neoclássico. Na toponímia local ficou a homenagem numa rua e numa travessa com o seu nome.
PS: Muito mais há para dizer sobre a vida e a obra de Silva Mendes mas terá de ficar para uma próxima oportunidade. Estou nesta altura a finalizar a sua biografia pelo que qualquer contributo (fotos, documentos, testemunhos....) é bem-vindo e pode ser enviado para o e-mail macauantigo@gmail.com
O Tao Te Ching, da autoria de Lao Tze, é uma das obras fundamentais do taoísmo. Curioso este livro editado pela Imprensa Nacional em 1908 mas com a indicação "conferência realizada no grémio militar de Macau em 3 de Janeiro de 1909". 
Casa Silva Mendes. Construção de estilo neo-clássico que integra alguns elementos de inspiração militar, apresentando um aspecto geral sólido e imponente.

Edifício classificado de Interesse Arquitectónico, localiza-se na Colina da Guia e é actualmente sede do Instituto Internacional de Tecnologia de Software da Universidade das Nações Unidas.
Nota: artigo publicado no JTM de 30.1.2014

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