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segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Traços Impressionistas de Macau

Como era Macau no final da década de 1920 aos olhos de um estrangeiro? Uma das respostas possíveis está neste excerto de um artigo intitulado “Macao, replica of Portugal – an impression of Macao”, da autoria de Bella Sidney Woolf publicado no jornal “The Macao Review Illustrated” em 1929.
Bella Woolf foi autora de obras como “The Twins in Ceylon” (1909) e “How to See Ceylon” (1914). Lady Bella Southorn, como também era conhecida, era casada com Wilfril Thomas Southorn que de 1925 a 1936 foi Secretário do Governo da Colónia de Hong Kong.
O artigo foi ainda reproduzido no Boletim Geral das Colónias (vol. V nº 53 de Nov. de 1929) em Portugal com o título “Traços Impressionistas de Macau”.
«Terras há que se impõem à nossa atenção por certa feição particular. Macau acha-se neste caso, - com o exotismo que a caracteriza. Além disso, Macau sugere-nos a acção de todos esses velhos navegadores portugueses por mares desconhecidos, como o grande Vasco da Gama. A Inglaterra é também uma nação de navegadores e esta circunstância leva-nos a sentir que um elo nos prende a eles. E quanto de interessante há em ver, em mais dum ponto do Extremo Oriente, associados, com os vestígios e as recordações dos seus feitos, aos nossos compatriotas, os velhos nautas lusitanos! A dentro da sua baía, como nas colinas que a cercam, - Macau tem mantido apesar do seu exotismo um puro espírito português que ao longo dos séculos tem conservado inalteravelmente os seus traços. Assim, ao percorrer as suas ruas, numa breve visita, os meus olhos pousando nas frontarias das casas, de graciosas taboínhas verdes corridas sobre as janelas, me ocorreu este velho dizer: Il ne change pas de pays celui qui voit toujours le soleil."
Os portugueses fizeram de Macau, tão cheia de sol, uma pequena réplica da sua pátria. E a verdade é que é deveras admirável que, a poucas horas de jornada, se possa encontrar naquelas colónia um ambiente completamente diverso. Macau vibra de sonoros nomes portugueses; são os das ruas, ao longo das quais fizemos algumas milhas, a Praia Grande, Estrada de Flora, rua de S. Lourenço; e as denominações de certas instituições, como a Escola de Artes e Ofícios, o Orfanato da Imaculada Conceição, a Santa Casa da Misericórdia. A despeito da vizinhança do vasto país que é a China, a que geograficamente está ligada, - Macau não perdeu nenhuma das suas características rigidamente portuguesas, tanto que hoje, como à data da sua fundação, isto é, há quatro séculos aproximadamente, - não deixa de ser uma colónia em absoluto portuguesa. Os confortáveis salões do palácio, onde o Governador e a sua esposa (NA: refere-se a Artur Tamagnini Babosa e Maria Ana Acciaioli Tamagnini) nos fazem uma recepção amável e cortês, - ainda mais avivam, na nossa imaginação, a encantadora sugestão dos países do sul da Europa. Sobre o brunido pavimento em mosaico dessas salas, decoradas de mobília dourada e de velhos brocados, - homens e mulheres, que, pelos nomes que usam, representam algumas das famílias mais ilustras de Portugal, passam conversando na sua língua de sonoro timbre - espectáculo este que tem o que quer que seja dum estranho e fascinante sonho.
 
Sonho que prossegue... cá fora, ao percorrer-se as ruas, ao observar-se o admirável panorama que proporciona a Praia Grande, sob cujas frondes, ao longo de esbeltas avenidas, muitos moços de barba negra passeiam a par de raparigas de negros olhos; e ao visitar as nobres ruínas de S. Paulo que, duma eminência, um memento moris, dominam, entre tantas coisas risonhas e belas, a cidade. De resto, esplêndidos hotéis, escolas, hospitais, estabelecimentos de comércio. Tudo isto vão vendo os nossos olhos, até que chegamos a um jardim de recolhido aspecto, onde as árvores dizem uma venerável velhice, de longos ramos frondosos. Diante de nós está o busto de Camões, o grande cantor dos Lusíadas, que, neste local, longe dos seus, na solidão, compôs aquele poema mundialmente famoso. Da árvore que ensombra o monumento mão amiga ofereceu-me então uma vagem contendo umas sementes castanhas, luzidias, a que os botânicos, na sua peculiar indiferença, pela beleza, dão o nome de Sterculia Lanceolata ...
Para mim, - que me importa? - representa Macau, - a leal cidade, que através dos tempos brilha, forte e altiva como o génio dos homens que a fundaram.»

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