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segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Macau por Bento da França: 1897


Bento da França morreu um ano antes da publicação deste volume (o 183) da Bibliotheca do Povo e das Escolas em 1890 em Lisboa. Cada volume custava 50 réis. Já o livro - "Macau e os seus habitantes: relações com Timor" foi editado em Lisboa em 1897. Nas primeiras páginas o autor explica a razão de ser da obra.
"A obra que apresento a publico é filha das observações feitas e apontamentos tirados durante cerca de quatro anos de permanência nas nossas possessões junto da China e da Oceania. Não tem grandes pretensões o trabalho, mas afianço que foi elaborado com amor e consciência, e creio achar-se aqui compendiado tudo de mais interessante e útil que possa importar aos que tenham interesse, ou tão somente curiosidade, em conhecer os nossos recursos e vida na antiga Cathay, ao que acresce fornecer bastas noticias sobre Timor, districto que, com o de Macau, constitue a nossa provincia ultramarina mais oriental.
Estive em terras portuguezas de alem mar, dou conta do que vi e das sensações experimentadas; d'est' arte julgo concorrer para que nos vamos todos familiarisando com os dominios coloniaes. Se vi mal e falseei as conclusões, talvez que os bons desejos de elucidar o publico dêem azo a que penna mais auctorisada me corrija os erros, estabelecendo a verdade. É sempre de vantagem ventilar estes assumptos. O plano do livro é este: Resumo da historia de Macau. Noticia geographica administrativa e política. Raças usos e costumes dos habitantes de Macau. Relações com Timor, dados sobre a ultima colónia. A primeira parte é extrahida de outra obra do audor, Subsídios para a historia de Macau, mandada publicar a expensas do ministério da marinha e ultramar em 1888. A segunda foi compilada de informações officiaes e varias rebuscas ; contém um documento curioso para os camoneanos. A terceira nasceu, principalmente, de observações (...) A quarta consta da matéria contida n'um folheto escripto por mim para a Bibliotheca do povo e das escolas, acrescentada com vários artigos que publiquei em differentes jornaes. Devo também prevenir os leitores de que, na terceira parte não tenho em vista descrever os costumes chinezes cm toda a sua interessante e complicada contextura, apresento apenas um pallido escorço do viver dos que habitam Macau. Como, todavia, a curiosidade de alguns se pode aguçar, permittam-me que lhes indique onde a poderão satisfazer. Afora outras de menor vulto, recommendâmos-lhes as seguintes publicações: 
Wenceslau de Moraes
Apontamentos de uma viagem de Lisboa á China e da China a Lisboa - Carlos José Caldeira.
Cartas da índia e da China - José Ignacio do Andrade.
Os chins de Macau - Manuel de Castro Sampaio, Hong-Kong, 1867.
La vida en el Celeste Império - Edoardo Toda, Madrid, 1887.
A China e chins - Henrique G. R., Lisboa, Montevideu, 1888.
A traveis la Chine - por Rousset.
Ten years in China - J. Thompson.


Traços do Extremo Oriente - Wenceslau de Moraes, Lisboa, 1895.
Jornadas pelo mundo. A caminho de Pekin. Em Pekin - conde do Anioso, 1800." 
Filho de Bento da França Pinto d'Oliveira, marechal-de-campo e tenente-general do Exército Português e primeiro Conde de Fonte Nova e de Maria José Tovar Pereira da Costa, casou-se com Maria Bernardina da Gama Lobo Salema de Saldanha e Sousa de quem teve sete filhos. Pertenceu ao Ministério do Exército onde desenvolveu trabalho político relacionado com os territórios ultramarinos. Realizou missões em Moçambique, Cabo Verde, Angola e no Estado Português da Índia. Foi ainda governador de Timor (1882-1883) estando dependente de Macau. Em termos de patentes foi coronel de Cavalaria, Comandante do Regimento de Cavalaria nº9 (Aquartelada em Aveiro) e tenente-general do Exército. Devido às dificuldades económicas para manter a numerosa família de filhos e enteados (ao todo onze), aceitou a nomeação para governador de Timor, local conhecido pela adversidade de condições de saúde e segurança, além dos perigos de naufrágio que tal viagem acarretava. Partiu pois com quase toda a família (mulher, sete filhos, dois enteados, governanta e um ajudante de campo). Acabou por pedir a demissão de governador de Timor um ano depois, amargurado pela perda brutal de dois filhos vitimados pela malária, cansado pela hostilidade da administração portuguesa de Macau de que dependia e minado pelas muitas intrigas locais.

"Composição dos concelhos. O concelho de Macau compõe-se das freguezias da Sé, S. Lourenço e Santo António, e dos bairros chinezes do Bazar, Patane, San-kiu, Sa-cong, Santi, Mong-há, Long-tin-chin, Long nau-chin, Tap-siac, Cheac-in-tau e Macau-siac. O concelho da Taipa é constituído pelas ilhas: Da Taipa (comprehendendo a povoação d'este nome e as de Sam-ca-chin, Leong-sà, Chioc-ca chin e Sei-cá). De Colovane (abrangendo a povoação d'este nome, e as de Lai-che-van, Tai-van, Seac-pai-van e Ko-hó). De D. João (constituída pelas povoações de Chai-gui-van, Si liong-con e Pac-sa-lau). De Tai-vong can (constando das povoações de Manio-ho, Chu-sa-van e Nga-com-chai). 
De todas estas povoações a mais importante é a da Taipa, que cresce a olhos vistos, sendo o seu commercio de peixe muito para registar. N'esta mesma ilha ha uma fortaleza, quartel do destacamento e residência do administrador do concelho, que também é commandante militar. As outras ilhas estão quasi no estado primitivo; têem umas miseráveis povoações e acham-se por agricultar. Na de D. João são albergados os homens leprosos, que não têem cura e ficam incommunicaveis; e em Colovane as mulheres, que se acham nas mesmas circumstancias. Ilha da Lapa. — Vem de molde consignarmos aqui que allegámos direitos históricos á ilha da Lapa, ou dos Padres, e que, comquanto a sua posse nos tenha sido contestada pelos chins, elles nunca estabeleceram ali auctoridades, e nós temos tido intervenção policial nas desordens entre os seus habitantes por varias vezes, e têem-nos permittido outros actos de soberania. (...)
Occupando-nos d'ella por incidente, nada mais tínhamos tenção de dizer a respeito da ilha da Lapa, ou dos Padres; porém, os boatos, ainda que felizmente desmentidos, de pretensões allemãs à occupação d'aquella ilha, levam-nos a insistir no assumpto, deixando aqui consignado ser nossa convicção que, a realisar-se tal facto, Macau tenderia para perder todos os restos de importância commercial que ainda conserva, do mesmo passo que perderia também a tranquillidade. Senão rcpare-se em que a ilha da Lapa fica fronteira á cidade do Santo Nome de Deus, e forma, para assim dizer, a margem direita do chamado rio de Macau, porto interior; attente-se em que é este o nosso ancoradouro mais seguro, embora meça apenas de lado a lado cerca de uns 600 metros, quando muito. Isto basta para se calcular o sem numero de contestações que haveria a todos os instantes por causa da soberania das aguas, quadro de navios, etc, etc. Com os chinas não acontece outro tanto, pois que elles, tacitamente e por habito inveterado, nos vão deixando ter jurisdicção nas embarcações de qualquer espécie que surjam no porto interior, e de boa mente fecham os olhos a alguma incursão que façamos nos terrenos fronteiros para levar a effeito diligencias policiaes, etc, etc."

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