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quarta-feira, 14 de julho de 2021

"Primeira circum-navegação brasileira e primeira missão do Brasil à China (1879)"

Entre 1879 e 1883 a marinha do Brasil efectuou a primeira viagem de circum-navegação tendo passado por Macau no âmbito de uma missão diplomática à China cujo principal objectivo era garantir mão de obra para a agricultura, especialmente a cultura de café (a escravatura fora abolida), nomeadamente dos chamados cules chineses que por essa altura já seguiam aos milhares, via Macau, para vários países da América do Sul.
Marli Cristina Scomazzon e Jeff Franco contam essa história num livro agora disponível intitulado "Primeira circum-navegação brasileira e primeira missão do Brasil à China (1879)".
Segundo os autores: “Nossa proposta foi recuperar uma aventura levada com heroísmo por centenas de marinheiros anônimos, alguns dos quais até perderam a vida. A viagem é um episódio da história brasileira que estava escondido em vários repositórios. Em outros arquivos foi possível recuperar os registros da primeira missão brasileira à China, envolvendo uma grande polêmica, o que é um exemplo de como os fatos evoluem na crônica da vida política do nosso país”, explicam os autores. “Escrevemos este livro com muito entusiasmo por recuperar um tema até então inédito, uma parte interessante da memória nacional e também por ser uma história repleta de curiosidades”.
A viagem de volta ao mundo, na corveta Vital de Oliveira, durou 430 dias, sendo 268 de viagem e 162 nos portos e foi comandada pelo capitão de fragata Júlio César de Noronha. 
A missão custou aos cofres imperiais 120 contos de réis e esteve a cargo de 197 homens: 22 oficiais, 126 marinheiros imperiais, 15 foguistas e 21 soldados navais. "Muitos deles marinheiros acabaram ceifados por enfermidades como o beribéri. Alguns, desertaram e outros não puderam voltar com a guarnição, pois permaneceram hospitalizados."
A rota seguida: do Rio de Janeiro para Lisboa. Em seguida, Gibraltar, Toulon, La Valeta-ilha de Malta, Áden-Iêmen, Ponta de Galle-Ceilão (actual Sri Lanka), Hong Kong, Macau (em Junho 1880), Negasaki, Yokohama, São Francisco de Califórnia, Acapulco, Valparaíso, Lota, Huamblin, Port Otoway (actual Porto Almirante Barroso), Punta Arenas, Montevidéu e regresso ao Rio de Janeiro.


Antes do período abordado neste livro já existia imigração chinesa para o Brasil via Macau, embora em número reduzido, nomeadamente para o cultivo de chá.
Numa edição de Agosto de 1871 do Diário do Rio de Janeiro pode ler-se:
"A emigração chinesa feita pelo porto de Macau continua a dar motivo a cenas horríveis, demasiadamente repetidas... A última catástrofe de que em Lisboa há noticia, é a do navio D. Juan saído de Macau a 4 de Maio com um carregamento de mais de 650 emigrantes chins, chuchaes, coolies, ou escravos brancos, que por todos esses nomes vão ali conhecidos estes emigrantes livres, os quais lançaram fogo à embarcação, sendo vítimas quase todos do seu desespero."
Num debate político em 1879, no Brasil, um deputado argumentou assim a favor da mão de obra chinesa: "O trabalhador chim, além de ter força muscular, é sóbrio, laborioso, paciente, cuidadoso e inteligente mesmo — argumenta no Senado, em 1879, o primeiro-ministro Cansanção de Sinimbu. — Por sua frugalidade e hábitos de poupança, é o trabalhador que pode exigir menor salário. Assim, deixa maior soma de lucros àquele que o tem a seu serviço. É essa precisamente uma das razões por que devemos desejá-lo para o nosso país."
O tema gerou polémica com a sociedade dividida e muitos a defender que se estava perante uma nova forma de escravatura.
Depois de intensas negociações, a 3 de outubro de 1881, um tratado foi assinado e ratificado no Brasil mas na prática nenhum chinês emigrou para o Brasil por via do acordo. Ainda assim foram estabelecidas relações diplomáticas e instalado um consulado-geral do Brasil em Xangai, em 1883.
Nesse ano o governo brasileiro ainda criou a Companhia de Comércio e Imigração Chinesa em parceira com a companhia chinesa de navegação China Merchants.

PS: no post de amanhã publicarei alguns excerto do livro referentes à passagem da missão brasileira por Macau e Hong Kong.

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