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sexta-feira, 4 de junho de 2021

O "Passeio Público": 1ª parte

Os boulevards ou passeios públicos surgiram em meados do século 18 com um objectivo misto de espaço de recreio e exibicionismo social.  Até então jardins eram espaços de lazer privados.
Na então zona denominada de Campo de S. Francisco existia uma vasta área junto ao mar, frente ao convento de Santa Clara e ao lado do convento de S. Francisco, com uma parte em socalcos. É aqui que vai surgir  o primeiro Passeio Público do território e que estará na origem do primeiro jardim público, na segunda metade do século 19, nos tempos do governador Coelho do Amaral. 
Neste detalhe de um mapa de 1889 surge bem delineada
a área ocupada pelo denominado "Jardim de S. Francisco"

Em "Nam Van - Contos de Macau" Henrique de Senna Fernandes escreve: “A Rua da Praia Grande era a artéria chique, onde residia a gente mais abastada do tempo. Ao cair da tarde, os dandies percorriam-na, caracolando os seus alazões ou a pé, até ao Passeio Público que era o Jardim de S. Francisco, na época, um jardim fechado e muito frondoso, cumprimentando e derriçando as donzelas que vinham de cadeirinha, acompanhadas dos papás circunspectos ou da inevitável chaperone”.




Na edição de 17 de Julho de 1930 o Jornal de Macau publicou um artigo onde evoca os bons e velhos tempos do Jardim de S. Francisco:
“Ó tempora! Ó mores!… em que ali à noite se via o Governador da Província com sua família, a sociedade elegante, dando-se rendez-vous em quanto a Banda Policial ia tocando a gazza ladra de Rossini e outras melodias avoengas que se por si não despertavam atenção constituíam no entanto um motivo e dos mais belos para tornar aquele jardim num ponto de reunião de fina flor da sociedade. Ali se conversava, se discutia passeando até perto da meia-noite. porque algumas vezes os pingos anunciadores do aguaceiro obrigavam a uma fugida, não era raro ver instantaneamente organizada uma soirée no Grémio Militar. O tempora! Ó mores! Em que o Jardim de S. Francisco era como um grande salão onde se combinavam salsifrés e piqueniques”
Postal "Macao - Public Garden" publicado ca. 1890/1900

Harriet Low viveu em Macau entre 1829 e 1834 e refere-se várias vezes ao passeio público/jardim no seu diário onde escreve a 30 de Setembro de 1829: "Macau vista do mar é linda, com alguns pontos muito românticos. Chegamos lá cerca das dez horas, pegamos nas cadeiras sedan e fomos para nossa casa, de cuja aparência gostamos muito. As ruas de Macau são estreitas e irregulares, mas temos um jardim no qual prevejo muito regozijo." 
Noutra ocasião regista no diário: "O mar beijava docemente o muro da fortaleza e os tancas e juncos prendiam-se com ganchos às raízes das árvores seculares". 
Eram as árvores denominadas "banyan trees" (Árvores de Pagode) do que viria a chamar-se Jardim de S. Francisco, conhecido entre os chineses por Ká Si Lan Fá Ün, ou seja, Jardim dos Castelhanos, nome que deriva do Convento de S. Francisco, que foi fundado pelos franciscanos castelhanos.
Demolido o convento em 1861 a zona envolvente foi transformada oficialmente em jardim (murada, com dois portões e candeeiros de iluminação pública). Em 1870 surgiu nas imediações o Grémio Militar.
José Feliciano de Castilho Júnior, guarda-marinha a bordo do brigue Mondego (chegado a Macau em 1856) escreve a este propósito em 1858:
"Ha um largo arborisado á borda do mar onde se reunem ás quintas e domingos e onde nós vamos para as vermos cortar-nos nas abas (refere-se às nhonhas) e ouvirmos a musica do batalhão. É o nosso Passeio Publico."
"Annuncio" publicado no Boletim da Província de Macau e Timor: 12.7.1873

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