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quarta-feira, 12 de abril de 2017

Macau por J. Gabriel B. Fernandes



A 24 de Junho de 1877 é posta a circular uma nova publicação em Portugal que se denomina Revista de Lisboa, "jornal politico, noticioso, litterario e scientifico" cujo redactor principal era J. M. Pereira de Lima.
Ao longo dos primeiros seis números, J. Gabriel B. Fernandes, assina um conjunto de artigos sobre Macau que servirão de base ao livro da sua autoria publicado anos mais tarde, em 1883 pela Typografia Universal de Thomas Quintino Antunes (impressor da Casa Real), e intitulado Apontamentos para a História de Macau.
José Gabriel Bernardo Fernandes nasceu a 29 de Dezembro de 1848 em Macau (na Sé). Na altura deste livro o autor tinha 29 anos, era bacharel (advogado) formado pela Universidade Coimbra e "empregado no ministério dos negócios da fazenda".

O primeiro artigo publicado na edição nº 2 da Revista de Lisboa de 1 de julho de 1877 intitula-se "A Ouvidoria de Macau".
Em 1580 teve começo em Macau a ouvidoria na pessoa de Ruy Machado. Os ouvidores, com as enormes jurisdicçõcs que lhes foram conferidas, commettiam toda a sorte do prevaricações e abusos, até que, a pedido dos moradores (1) foi por el-rei D. João 5.°, abolido o tribunal de ouvidoria por desnecessário n'uma cidado pequena.
Mais tarde, em ordem a regular o bom andamento da justiça e salvaguardar o município das prepotências exercidas pelos governadores que se intromettiam em assumptos
proprios do Senado da Camara (2), foi restabelecida a ouvidoria pelos annos do 1784. Lazaro da Silva Ferreira, nomeado ouvidor de Macau, curou em pouco tempo de engrandecer a sua ouvidoria com novas jurisdicções, tirando-as dos juizes da terra;
projectou um novo regimento para a ouvidoria que enviou à corte o deu em resultado da publicação do dois alvarás de 26 de março de 1803 (3), em virtude dos quaes um simples juiz de primeira instancia - era ao mesmo tempo ouvidor, corregedor da comarca, provedor-mór dos defuntos e ausentes, capellas e residuos, juiz o administrador da alfandega, dos bens dos orfaos, juiz da índia o Mina, primeiro vogal o relator na junta da justiça e na da corôa, membro do conselho do governo da província, juiz privativo da administração da misericórdia, vogal da administração da fazenda, etc.
Cercados de tantas regalias e com o ordenado annual de perto de tres contos do réis, os ouvidores, julgando de direito e de facto, interpretando e applicando as leis arbitraria o soberanamente, tendo quasi o mesmo poderio que os governadores, não podiam deixar de ser mal vistos pelos habitantes da comarca.
Foi, pois, com frenético enthusiasmo, que a cidade do Santo Nome do Deus de Macau (4) respondeu aos gritos de liberdade heroicamente erguidos em Portugal nas sempre memoráveis épocas de 1820 e 1834. O decreto de 3 do abril deste ultimo anno determinou que se executasse em Macau a nova legislação sobre a reforma da justiça (5) . Pelo art. 20 do doc. do 7 de dezembro do 1 36 foi dado a Macau um juiz de direito da primeira instancia (6), com as attribuições judiciaes dos antigos ouvidores, continuando a funcionar a junta da justiça creada pelo referido alvará do 26 de março de 1803. Contudo terminaram assim muitos dos altos cargos que por bastante tempo desfructaram os antigos magistrados da ouvidoria.
Notas:
1) Em Macau chamam moradores aos negociantes ou proprietários mais conhecidos da colonia.
2) Em 1853, por conselho do bispo da diocese, elegeram os macaenses o Senado da Camara (a que por dec. de 13 de maio de 1810 foi concedido o titulo de leal), composto de dois juizes, tres vereadores e um procurador.
3) Nesse anno foi instituída a junta da justiça em Macau. O dce. de 15 de julho de 1871, divide a junta da justiça em duas secções, uma civil e outra militar. A 1ª é constituída pelo governador geral da província (como presidente, e sem voto), pelo juiz de direito (relator), por dois vogaes do conselho da província e do presidente da camara municipal; a 2ª compõe-se do governador geral (presidente, e sem voto), do juiz de direito (relator), e de quatro officiaes mais graduados na província.

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