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terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Semanário Ilustrado "Branco e Negro": 20 Dezembro 1896

Branco e Negro foi o nome de um semanário ilustrado publicado de 5 de Abril de 1896 a 27 de Março de 1898 (104 números) pela livraria e casa editora António Maria Pereira, sedeada na Rua Augusta n.º 50 a 54, em Lisboa. Cada exemplar custava 40 réis.
Na edição nº 38 - 20.12.21896 - foi publicado um artigo intitulado "O Oriente - Macau" ilustrado com uma gravura do hospital S. Januário.
O director da publicação, José Sarmento, escreve um pequeno texto de introdução ao essencial do artigo que é a reprodução de um texto do Conde de Arnoso sobre Macau e que surgira no livro Jornadas pelo Mundo. Sarmento escreve assim: "(...) Isto a propósito das Jornadas pelo Mundo (...) livro encantador e luminoso que nos falla d´essa impenetrável e silenciosa China, tão cheia de coisas imprevistas, tão typica, tão atrazada e por isso mesmo tão curiosa, onde ha, para quem saiba vêr, uma tão subtil e colorida analyse a fazer. É realmente de tentar este passeio ao paiz dos amarellos; e Bernardo Pindella, com raras qualidades de colorista, d´elle nos trouxe um pedaço delicioso, claro e aromal como um bosque de tamarindos. (...) Das Jornadas pelo mundo que são, n´este ponto o livro de viagens que nos traduz melhor a impressão sentida, doce impressão, como a que se tem a um pôr de sol que morre n´uma gloria d´oiro, recortamos um bello trecho sobre a cidade de Macau."

De seguida, reproduzo alguns excertos do texto do Conde de Arnoso, que chegou a Macau a 23 de Junho de 1887, juntamente com Tomás de Souza Rosa:
“Encontrar terra portugueza, a mais de 3:600 leguas de distancia da nossa querida patria, é tamanha ventura, que os cinco dias que estivemos em Macau contarão na nossa vida como para o caminhante no deserto contam as horas de descanço passadas à sombra bemfazeja das palmeiras d´um oásis. E o orgulho de ser portuguez parece crescer ainda quando, pisando a bella terra, volvemos os olhos para o passado e de memória folheamos as paginas da nossa gloriosa historia. (…)
O seminário de S. José é o unico estabelecimento de instrucção secundária da província.
Esta casa de educação soffreu um grande golpe com a expulsão dos dois unicos professores estrangeiros, jesuítas que n´ella existiam. Foi o decreto de 1871 que reorganisando o seminario de S. José, prohibiu que n´elle professassem disciplinas padres estrangeiros. Esses dois unicos jesuitas, d´um grande saber, e que tão relevantes serviços tinham prestado á mocidade estudiosa de Macau, tiveram então de sair. Um é hoje professor em Melbourne; o outro tem a seu cargo em Roma, como redactor principal, a Civittà catolica. É triste vês como um simples traço de penna pôde ter tão funestos resultados.Não se imagina a differença que existe entre os macaístas que foram ainda discípulos d´esses dois padres, e aquelles que não puderam aproveitar das suas lições. Ao sexo feminino prestam hoje relevantes serviços as irmãs de caridade italianas estabelecidas em Macau. Além de receberem as orphãos e as educarem, as suas classes são frequentadas pelas filhas de macaístas e empregados da província. Ensinam tambem a lêr e a trabalhar as ceguinhas pobres. Não se calcula a quantidade de chinas, ou absolutamente cegos ou vendo tão pouco que os fórça a trazer óculos fixos, que por toda a parte se encontram.As irmãs italianas, apezar de abençoadas por todos, não estão livres tambem de ser expulsoas um dia por algum ministro repentinamente atacado de liberal jacobinismo, formula estapafurdia e indígena muito do apreço de conspicuos conselheiros. O actual bispo de Macau, D. António de Medeiros, não descura um momento, com os eu incansável zelo, estes dois estabelecimentos de instrucção. Prelado d´uma illustração que eguala a sua virtude, não lhe serviu a purpura para descançar. Novo ainda, encontramol-o magro e pallido, mirrado pelas febres devoradoras de Timor, adquiridas na longa visita que ultimamente fez no pelo interior d´aquella ilha ás Missões por elle creadas. Durante algum tempo estivemos presos da iua palavra fluente, ouvindo-o discorrer com rara largueza de vistas e superior bom-sendo sobre o estado actual e o futuro de Timor. Uma recente lei creou felizmente um lyceu em Macau que já está funccionando”.

 
O Conde de Arnoso (título atribuído em 1895) é Bernardo Pinheiro Correia de Melo (1855-1911), também conhecido pelo pseudónimo literário de Bernardo Pindela (1855-1911). Foi Fidalgo da Casa Real, capitão do Estado-maior de engenharia, oficial às ordens do rei D. Carlos e seu secretário particular, escritor e diplomata.
Acompanhou a Pequim, em 1887, como secretário, o conselheiro Tomás Rosa numa missão diplomática, que tinha por fim celebrar um tratado com a China, e foi o negociador do convénio do primeiro de Dezembro desse ano. 
As notas dessa viagem de 9 meses (roteiro da viagem: Singapura, Saigão, Hong Kong, Macau, Xangai, Tien-Tsin e Pequim) foram reunidas num livro (ca. 440 páginas) a que chamou Jornadas pelo Mundo, publicado em 1895 pela casa editora Magalhães & Moniz, do Porto.



1 comentário:

  1. Belíssimo texto! Parabéns pelo resgate tão importante. Esse povo português, realmente tem o que contar e com que contar... Bom Natal. Próspero Ano Novo. Laerte.

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