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segunda-feira, 6 de julho de 2015

Sabe jogar Má Cheók / Mahjong?

No próximo sábado, às 15 horas, a Casa de Macau em Portugal (Av. Almirante Gago Coutinho, 142) organiza um workshop de mahjong para principiantes. Para participar basta inscrever-se através do email casademacau@mail.telepac.pt
A esse propósito recordo um texto de Ana Maria amaro, recentemente falecida, e que faz parte do seu livro "Aguarelas de Macau" e ainda o regulamento oficial do jogo em Macau.
Sugiro ainda a leitura de um outro post sobre o tema. 
Com o descer da tarde a loja escureceu e, ao fundo, no seu trono, forrado de papéis vermelhos, Buda, rabiscado e colorido, fitando os pivetes e as tigelinhas das ofertas, resplandeceu sob a pequena lâmpada escarlate, recém-acesa. Os montes de sedas arabescadas e as fazendas de felpa, esquecidas junto à grande tesoura e ao velho ferro de brasas incandescentes, foram arrumadas, em monte, ao lado das cabaias setinosas, já cozidas. Chan t’oi, a mesa redonda, das refeições, com as suas manchas gordurosas, foi, de novo, armada no escuso canto de velada luz e as 144 pedras brancas do Má Chéok, com os seus sinais coloridos, rebocadas de verde luminoso, rebolaram sobre o tampo, ensurdecedoramente. O Chong de ébano girou e o patrão, olhando, de relance, os dois empregados mais novos, que aplicavam, sob a fraca lâmpada, as últimas costuras na obra a entregar no dia seguinte, tirou, à sorte, os parceiros. Pelas grades de madeira, corridas, transversalmente, na pequena porta, por onde se podia ver toda a alfaiataria de Lao Kei, passava a luz amarelada do interior, que brincava no passeio, desenhando alongadas sombras, a rasar os esguios pivetes vermelhos que, em molho, num ângulo do degrau, espetados o chão, formavam pequenas constelações cor de púrpura.
Quatro ventos, um de cada quadrante, marcados nas quatro pedras a escuro azul, os fong, foram escolhidos por Lao Kei, entre as demais pedras e, depois de separados, colocados em linha, voltados para baixo.
Mais duas pedras, ao acaso, foram tiradas dentre aos restantes, uma par e outra ímpar que, voltadas para cima, nos extremos das outras quatro, indicavam por onde se deveria começar a contagem para sortear o banqueiro e os respectivos lugares.
O Chong de ébano foi, rapidamente, colocado sobre uma das pedras alinhadas, ao acaso, e os dois dados, de arestas rombas com o iât e o sâm em pintas vermelhas, sobressaindo das demais, pintalgadas a preto, lançados duas vezes por cada um dos jogadores.
Foi o filho mais velho do patrão quem somou maior número par de pontos e, por isso, retirou, lesto, o primeiro fong do lado da pedra par, no que foi imitado pelos demais parceiros, sucessivamente, e por ordem decrescente de pontuação.
Dentre estes fong, incógnitos calhou, pela sorte, o vento leste ou tong ao velho Lao Kei, que pôde escolher, portanto, na mesa o lugar a seu prazer. Como patrão, tomou o lugar de honra, voltado para a porta, tendo-se sentado os restantes, de acordo com os ventos correspondentes às suas pedras. Contrariamente à nossa rosa-dos-ventos, à sua direita sentou-se o nâm (o sul), à sua esquerda o pak (o norte) e, adiante de si, o sâi (o ocidente).
Na série dos ventos coube ao segundo filho de Lao Kei a pedra coberta pelo chong e foi ele, pois, o banqueiro ou chong do primeiro jogo, arrecadando, logo, a pequenina peça de ébano, os dados e as fichas, que lhe ficariam confiados.
E, então, todos já sentados, mudaram-se, convencionalmente, os ventos, passando o banqueiro a ser o vento leste e os demais parceiros, a serem os ventos correspondentes aos lugares ocupados. As pedras empilhadas foram, então, rápida e ruidosamente revolvidas, num baralhar alucinante, em que todas as mãos mexiam, envolviam e faziam rebolar, em ressonante monotonia.
O jogo não era forte e as flores foram retiradas e feitos, lentamente, 17 montinhos, de duas pedras, sobrepostas, que cada parceiro colocou à sua frente, formando um pequeno muro ou muralha que, em conjunto, desenhou um pequeno quadrado, a meio da mesa.
Logo o chong iniciou o jogo, lançando os dois dados. Como somou cinco pontos e esta soma atribuia-lhe a vantagem da segunda jogada, agitou, mais uma vez, os dois pequeninos cubos rombos, de marfim, somando, desta feita sete pontos pelo que, contando doze montes de pedras, da direita para a esquerda, abriu a muralha.
Uma vez a muralha aberta, foram desta retiradas, lesta e sucessivamente, em alternados grupos de duas, catorze pedras, pelo chong e treze pelos demais parceiros, que, rapidamente, as iam alinhando em sua frente, agrupando-as, já. por sequências ou pares.
Breve expectativa precedeu o lançamento, na mesa, da primeira pedra, pelo banqueiro.
O parceiro nâm tirou uma pedra da muralha, jogando uma das suas e, por fim, cada um, foi comprando uma pedra e deitando outra, na mesa, prosseguindo o jogo, entusiasticamente, na mira de fazer pongs ou kongs, chis e pares, em especial de trunfos ou ventos para ganhar a fazer alguns fanes. As pedras eram batidas, fragorosas. uma a uma, em sucessão, sobre a mesa de madeira dura … E a noite avançava e os jogos sucediam-se, entremeados de exclamações de kong ou pong, de quem completava os tão desejados grupos, necessários para ganhar. Finalmente, fazia-se má chéok, terminando cada jogo pelo grito feliz de quem acabava de completar o seu último conjunto.
As rodas verdes e vermelhas, os esguios bambus, os ventos, os chinas, e os capitães ou trunfos, voltavam a desemparelhar-se para, sobre a mesa, mais uma vez, ruidosamente, se confundirem, nas suas capinhas cor de jade, voltadas para cima.
A animação do jogo aumentava com o suceder das horas e o entusiasmo recrudescia, recrudescendo a velocidade e ampliando-se os ruídos das arestas dos pequenos prismas, rebolando, uns sobre os outros, em dissonância de atrito sobre a dura teca ou pau rosa do tampo da mesa. Entretanto, os últimos pontos iam sendo dados pelos aprendizes na setinosa cabaia acolchoada a entregar no dia seguinte, o que já não faria “perder a face” ao comprometido alfaiate que, no seu entusiasmo de jogador, já, por completo, a olvidara.
Na loja próxima, sobre a pequena mesa rectangular, de tampo laçado, com as suas gavetinhas próprias para guardar fichas e pagamentos, outra partida de má chéok iniciara-se também e, cá fora, os ruídos sobrepunham-se, interferindo-se e multiplicando-se.
Na noite, cada som e cada ressonância do entrechocar das pedras, eram ampliados pelo silêncio e pela escuridão e levados, ao longo dos passeios, transbordando de cada porta, de cada janela gradeada. Lá dentro, no ambiente morno, onde o cheiro a pano recém-engomado, tudo envolvia, os grandes espelhos prateados, pintalgados de caracteres, reflectiam, indiferentes, a repetida cena de todos os serões... No seu trono vestido de papéis vermelhos, o Kwan Kong, um Deus-herói protector dos comerciantes, olha a cena banal, do alto do seu cavalo, em cujas crinas escuras, a extremidade das suas barbas ponteagudas e ancestrais, se perdem e se confundem e, nos seus lábios indefiníveis parece desenhar-se um pálido e condescendente sorriso de cumplicidade.

Glossário:
 
Chi – Seqüência de três pedras do mesmo naipe
Chông – Peça, geralmente em ébano, com uma cavidade circular, por onde se vê um disco que gira no interior, onde estão marcados os quatro ventos.
Chóng – Nome porque é designado o banqueiro
Fan – Designa dever, o que corresponde a dobrar a pontuação final, por cada um
Fong – Vento
lat – Um
Kong – Grupo de quatro pedras iguais
Má chéok – Antigo jogo de cartas chinês. O mesmo que mahjong
Nâm – Sul
Pak – Norte
Sai – Oeste
Tóng – Leste
Fong – Grupo de três pedras iguais
Sâm – Três

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