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sábado, 28 de junho de 2014

A 'revolução' dos hydrofoil

Nos primeiros anos da década de 1960 Harry Redl visitou Macau e fotografou-o de uma forma exemplar deixando o registo dessa passagem num livro em 1963. A viagem que fez até ao território a partir de Hong Kong foi a bordo de um ferry. “É possível partir de Hong Kong à tarde através dos barcos de carreira, chegar a Macau ao entardecer, fazer uma rápido tour no crepúsculo, jantar, jogar no casino e voltar de barco (com cabine para dormir) depois da meia noite, a tempo de chegar a Hong Kong na madrugada", escreveu acrescentando que Macau merecia mais do que uma visita rápida e superficial. No regresso a Hong Kong Harry faria a viagem de forma muito mais rápida. De hidroavião em pouco mais de 15 minutos. Mas os tempos das ligações lentas (cerca de 4 horas) por via marítima estavam a acabar.

Na edição de 28 de Setembro de 1963 o "Notícias de Macau" informa que "O senhor Teddy Yip, sócio-director da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A.R.L, após uma visita aos Estados Unidos da América, segui para Itália onde visitou as oficinas navais de Messina, na Sicília, onde encomendou para a S.T.D.M., o primeiro hidroplanador, para as novas carreiras rápidas, cómodas e confortáveis, entre Macau e Hong-Kong, que aquela companhia concessionária tenciona estabelecer a partir de Janeiro de 1964. O hidroplanador encomendado, deverá chegar a Macau no fim deste ano (1963). Tem a marca de P.T. 20, 20, 7 metros de comprimento e lotação para 72 passageiros, podendo cobrir normalmente a distância de 35 milhas por hora e, atingindo 45 milhas a sua velocidade máxima."
A 18 de Fevereiro de 1964 chegava a tão esperada notícia. "Procedente de Messina, Itália, chegou, anteontem, a Hong-Kong, o primeiro hidroplanador, adquirido pela Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (S.A.R.L.) para as carreiras entre Macau e o vizinho porto britânico. Este hidroplanador, que recebeu o nome de "Coloane", tem as seguintes características: comprimento - 69; máquinas com 1 330 H.P.; velocidade - 32,4 nós. Dispõe de 65 lugares (assentos almofadados, semelhantes aos dos aviões). Após umas viagens experimentais, fará brevemente as anunciadas carreiras, entre os dois portos vizinhos, sendo a viagem de uma hora apenas. Carreiras rápidas, confortáveis e acessíveis, pois que as passagens custarão apenas $15 e $20 patacas."
A 29 de Fevereiro o "Notícias de Macau" fazia o ponto de situação. "O hidroplanador "Coloane", recentemente chegado a Hong-Kong, procedente de Messina, Itália, já fez duas viagens experimentais no vizinho porto britânico. Esta moderna unidade, adquirida pela "Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, "S.A.R.L" , como se sabe, destina-se às carreiras entre os portos vizinhos e será explorada pela Companhia de Navegação "Son Tak", de que é proprietário o sr. Henry Fock, um dos sócios-directores da "S.T.D.M".
Espera-se que inicie as anunciadas viagens nos princípios do próximo mês de Março (1964). Para a sua atracação, utilizar-se-á a nova ponte, em construção, no Porto Exterior,
cuja obra está sendo adaptada para esse fim."
A primeira viagem efectuou-se a 16 de Março de 1964 e a partir de então o quotidiano em Macau alterava-se. Primeiro foi contrato de concessão do jogo assinado entre o governo e a STDM e agora eram as ligações rápidas que iriam trazer mais forasteiros a uma cidade até ali muito pacata. Aliás, os dois assuntos estão interligados. O jogo só fazia sentido com jogadores e esses, nesse início da década de 1960, vinham de Hong Kong.
Os hydrofoil vieram revolucionar as ligações marítimas entre Macau e Hong Kong e, por via disso, a ligação do território com o mundo exterior. Começaram a operar em 1964 ainda o terminal do Porto Exterior (que começou por ser de madeira) não estava prontos. As embarcações atracavam num batelão colocado naquela zona.
Anúncio no "Notícias de Macau"

Já no final da década duas empresas asseguravam as ligações diariamente. Uma delas, a Hong Kong Macao Hydrofoil Co., fazia 17 viagens diárias com o Flying Albatross, Flying Skimmer, Flying Kingfisher, Flying Phoenix, Flying Swift e Flying Heron. A outra empresa assegurava apenas oito ligações com as embarcações Guia, Penha e Coloane, embora este último tivesse um estatuto diferente. Ficava normalmente em standby e reforça o serviço aos fins de semana. Havia partidas (de Macau e de Hong Kong) a cada hora e meia. No Verão operava entre as 7h45 e as 18h30. Os bilhetes variavam entre as 10 patacas (dias úteis) e as 20 patacas (fim de semana e feriados).


António Cambeta, era agente da Polícia Marítima e Fiscal, tendo feito serviço nessa condição na ponte-cais do Porto Exterior. "Esta ponte cais era constituída por dois batelões, que tinham dois cais de atracação, uma sala com bar, um pequeno espaço no corredor onde se encontravam instalados os Serviços de Migração, um corredor, em madeira, que vinha dar para a Avenida, e quase na saída existia um espaço, que tinha um pequeno quarto, e tinha um balcão, usado pelo agente da Polícia Marítima e Fiscal, para verificação de bagagens. Na parte de fora, encontrava-se a bilheteira da companhia.Era ponte pequena, sem condições, onde os passageiros não tinham comodidades algumas, pois não havia salas de espera, com assentos, era a sala, rectangular, onde existia um bar, que os passageiros aguardavam a sua vez de embarcar.

Ao agente da PMF, competia assegurar a boa ordem do cais, assistir ao embarque de passageiros, contando correctamente o seu número, se, por lapso ou descuido na contagem, embarca-se um passageiro a mais o hidroplanador, depois de largar, regressaria ao porto de Macau, afim de desembarcar o passageiro, originando uma perda de tempo e sendo punido, disciplinarmente o agente da PMF. Era um pontão que dava imenso trabalho e dores de cabeça, não só aos funcionários da companhia, mas igualmente ao agente da PMF e PSP (Serviços de Migração) ali em serviço."
Anúncio de 1966
Só por curiosidade, refira-se que no filme da saga de James Bom, "O Homem da Pistola Dourada" (1974), o protagonista viaja no hidroplanador “Flying Sandpiper”, da Hong Kong Macau Hydrofoil Co. Ltd. Importa ainda referir que não obstante o aumento da oferta tendo como grande atractivo a rapidez, os 'velhinhos' ferrys que atracavam no Porto Interior continuaram operacionais até ao início da década de 1980, sendo mesmo os preferidos de muita das gentes de Macau. Os que não tinham pressa e os que não tinham muito dinheiro. Desses tempos ficam na memória nomes como Fat Shan, Tak Shing, Tai Loy, Tung Shan, entre outros.
Artigo da autoria de JB publicado no JTM 19.6.2014

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