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sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Memórias de João Martins: décadas 1940-1950 (segunda parte)

Nasci "por acaso" em Braga, em 1938, durante uma licenca graciosa do meu pai, que servira na Ilha de Mocambique como Delegado do Procurador da Republica uns anos antes. Pouco tempo vivi em Portugal, porque antes de ter um ano de idade ja estava a caminho de Mocambique e antes dos dois a caminho de Angola, onde passamos grande parte da segunda guerra, em Benguela, Luanda e Silva Porto.
Na minha primeira viagem, de Lisboa para Beira (Mocambique) em Setembro de 1939, segundo me contaram os meus pais, o nosso navio "Niassa" foi intimado por um submarino a seguir para Dakar, a fim de ser revistado. Os passageiros ficaram bastante nervosos pois nao sabiam se o submarino era aliado ou alemao, e neste caso qual seriam as consequencias, a pesar de Portugal nao ser beligerante. (Salazar decretou neutralidade, embora "colaborante" dado a sua simpatia pelo regime Nazi, como o seu colega Franco...) O submarino era ingles, apreendeu uns alemaes que iam para Angola e seguimos viagem...
Em 1945, depois da rendicao da Alemanha voltamos a Portugal seguindo em 1947 para Macau no navio "Lourenco Marques" um dos barcos alemães que estavam no Tejo e que foram apreendidos por altura da nossa entrada na I Guerra Mundial! A viagem durou 77 dias, pois o barco era movido a carvao e periodicamente tinha de se abastecer. Passamos por Dakar, Luanda, Lobito, Mossamedes, Cape Town, Durban, Lourenco Marques. Mombasa, Mauritius, Murmugao, Penang, Singapore, Manila, Hong Kong, Macau!
Em Macau vivemos até 1951, quando seguimos primeiro para Goa e depois Lourenco Marques, onde frequentei os Liceus "5 de Outubro" e "Salazar". Em Outubro de 1955, regressamos a Portugal no paquete "Angola" seguindo nessa viagem o Otelo Saraiva de Carvalho que ia frequentar a Escola do Exército e eu o 6 ano no Liceu Camões.
Depois de acabar o Liceu frequentei a velha Faculdade de Direito no Campo Santana e na Cidade Universitária, tendo como colegas uma rapaziada que se tornou mais tarde conhecida devido à "politica" como o Freitas de Amaral, Jorge Miranda, etc. e como contemporâneos o Rui Machete e o Jorge Sampaio, com quem trabalhei como Director da Seccão Desportiva no ano em que ele foi Presidente da Associação Académica de Direito sendo Vice-Presidente o meu amigo e colega Afonso de Barros (filho de Henrique de Barros, fundador do PS e sobrinho do Marcelo Caetano, que era casado com a irmã do Henrique de Barros).
Depois de ter cumprido serviço militar em Angola, trabalhei a partir de 1966 na Companhia de Diamantes de Angola como Chefe da Secção de Contencioso e Relações Públicas em Luanda ate 1975, quando regressei a Lisboa como o último Representante da Diamang antes da independência do Pais a 11 de Novembro de 1975. Desta experiencia profissional única poderia escrever um livro narrando sobretudo os últimos anos do "Estado de Angola" (curiosa designação adoptada pelo Estado Novo, que comecou por chamar Colonia, tendo ate elaborado o "Acto Colonial de 1933" e criado o "Estatuto do Indígena" (angolanos que não eram assimilados porque não tinham a quarta classe, mas que pagavam imposto se tivessem pêlos no sovaco...) depois das duras criticas da ONU a que Silva Cunha tentava contra-argumentar, foi promovida a Província e mais tarde com Moçambique e a Índia Portuguesa a "Estado"!...)
Em 1976 fui nomeado por Almeida Santos Administrador por parte do Estado da Editora Arcadia, (conhecida entre outras, pelas obras "Portugal e o Futuro" de Spínola e "Portugal Amordaçado" do Mário Soares) uma das muitas empresas falidas que pertencia ao Grupo da Seguradora Império, nacionalizada pelo companheiro Vasco na onda de nacionalizações pelo PREC com bancos e outras empresas.
Por esta altura fui nomeado pelo Conselho da Revolução para Vogal da CARSR, ou Comissão de Análise dos Recursos de Saneamento e Reclassificação, um grupo de "muchachos" com background jurídico e/ou militar, que dava pareceres sobre os recursos interpostos por pessoal do antigo regime que tinham sido sumariamente saneados com ou sem razão...
Curiosamente em 1975 o meu pai, na altura Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça Jubilado (na época em que o Supremo tinha apenas 15 juízes e não os 60/70 ou mais que tem hoje... sem se ver o retorno desse tremendo investimento...) foi nomeado Presidente da Comissão Inter-Ministerial de Saneamento e Reclassificação, cargo de que se demitiu passado uns meses por não ter paciência para aturar a anarquia que o país atravessava.
Em menos de um ano pedi a demissão para trabalhar para a McGraw-Hill International, abrindo a Editora McGraw-Hill de Portugal. O sucesso desta filial, permitiu que fosse dirigir a Editora McGraw-Hill do Brasil em 1980, em São Paulo e daí segui para Nova Iorque para Vice Presidente da Ásia-Pacífico em 1984, vivendo entre 1987/1988 em Singapura, para não ter que passar uns oito meses por ano a viajar pelo outro lado do mundo, sobretudo Austrália, Nova Zelândia e restantes países asiáticos. Foi por essa altura, em 1984, que voltei a Macau depois de ter saído havia uns 33 anos!...
Em 1988 regressei aos Estados Unidos para liderar a nova entidade Medical Publishing Group. Os bons resultados levaram a Pearson (grupo britânico proprietário da revista "The Economist", "Financial Times", Editora "Pinguin" Channel 5TV, etc) a oferecerem-me a chefia do Grupo Internacional, na altura com um volume mais de 500 milhões de dólares.
Acabei a minha vida profissional na "Thomsom" (proprietária da Thomsom Legal & Regulatory - principal fonte de informação jurídica digitalizada nos Estados Unidos, Thomsom Reuters etc.) em 2002, passando agora o tempo a jogar bridge, navegar na net e para variar...viajar.

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